RC - 418 - Sessão: 02/05/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo Ministério Público Eleitoral (fls. 62-64v.) contra sentença do Juízo Eleitoral da 141ª Zona Eleitoral de Santo Antônio das Missões que absolveu NOEMI TEIXEIRA DE MORAES da prática do crime de difamação eleitoral (art. 325 do CE) e GIVANILDO FOLK ROBALO da prática do crime de injúria eleitoral (art. 326 do CE), ambos por insuficiência de provas.

O órgão do Ministério Público Eleitoral em atuação junto à 141ª Zona denunciou os recorridos NOEMI TEIXEIRA DE MORAES e GIVANILDO FOLK ROBALO como incursos, respectivamente, nas sanções dos arts. 325 e 326 do Código Eleitoral, pela prática dos fatos delituosos assim descritos na peça acusatória das fls. 02-03:

FATO 01:

No dia 12 de setembro de 2016, por volta das 13h34min, nesta cidade de Santo Antônio das Missões, em página da rede social Facebook, a denunciada NOEMI TEIXEIRA DE MORAES difamou Lanine Balbé na propaganda eleitoral, ou visando a fins eleitorais de propaganda, imputando-lhe fato ofensivo a sua reputação.

Na oportunidade, a denunciada NOEMI TEIXEIRA DE MORAES, utilizando-se de sua página pessoal no Facebook, postou o seguinte comentário, aqui transcrito na íntegra: “Amei a atitude da vereadora, arrancar a bandeira de uma 40. Ridículo. É assim que tu quer voto? Por isso não se elegeu a quatro anos atraz e não vai se eleger de novo. Vem arranca a minha bandeira vereadora se tu é bem mulher.” (fl. 06 do expediente). Ato contínuo, a denunciada identificou a Vereadora como sendo Laline Balbé (fl. 08 do expediente).

 

FATO 02: No dia 12 de setembro de 2016, por volta das 13h34min, nesta cidade de Santo Antônio das Missões, em página da rede social Facebook, o denunciado GIVANILDO FOLK ROBALO injuriou a ofendida Laline Balbé, na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro.

Na ocasião o denunciado GIVANILDO FOLK ROBALO utilizando-se de sua página pessoal no Facebook, postou o seguinte comentário, aqui transcrito na íntegra: “Mas na verdade essa (elementa) numca c elegeu vereadora. Emtro por k o vereador titular tava ciemte do k vai vir a tona (ou já veio) E pulo do barco pessoa vulgar k nunca TV respeito nem dos companheiro político. Gosto d mais da politica mas o RESPEITO pelas pessoas seja quem for. AINDA VIGORA” (fl. 09 do expediente).

A denúncia foi recebida em 23.02.2017 (fl. 41).

Após serem citados (fl. 41v.), os réus apresentaram defesa (fls. 42 e 44).

Durante a instrução, foram ouvidas a vítima e uma testemunha arrolada pela defesa e, ao final, interrogados os réus (fl. 47 e CD de fl. 68).

Instruído o processo, as partes apresentaram alegações finais (fls. 50-52 e 54-57), sobrevindo sentença de improcedência da denúncia, forte no art. 386, inc. VII, do CPP (fls. 58-60).

Inconformado, recorreu o MPE de primeiro grau, alegando que tanto a materialidade quanto a autoria dos delitos restaram comprovadas pelo registro policial das fls. 07-08 e pelos depoimentos colhidos nas fases policial e judicial.

Em contrarrazões, os recorridos sustentaram inexistir, nos autos, provas de que as condutas tenham sido praticadas em contexto de propaganda eleitoral ou com fins eleitorais.

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo provimento do recurso e requereu a execução provisória da condenação.

É o relatório.

 

 

VOTO

O recurso merece ser conhecido, porquanto interposto no prazo de dez dias previsto no art. 362 do Código Eleitoral (fls. 60-62).

À luz do art. 109 do Código Penal - CP, não há ocorrência de prescrição dos fatos com a capitulação delitiva contida na inicial.

No mérito, as condutas imputadas aos recorridos consistiram na publicação, durante a campanha eleitoral de 2016, de postagens por eles realizadas em seus perfis pessoais na rede social Facebook, com supostos conteúdos ofensivos à reputação, à dignidade e ao decoro da então vereadora e candidata à reeleição, Laline Balbé.

Reproduzo na íntegra os textos em questão:

NOEMI TEIXEIRA DE MORAES:

Amei a atitude da vereadora, arrancar a bandeira de uma 40. Ridículo. É assim que tu quer voto? Por isso não se elegeu a quatro anos atraz e não vai se eleger de novo. Vem arranca a minha bandeira vereadora se tu é bem mulher.” (fl. 06 do expediente). Ato contínuo, a denunciada identificou a Vereadora como sendo Laline Balbé (fl. 08 do expediente).

GIVANILDO FOLK ROBALO:

Mas na verdade essa (elementa) numca c elegeu vereadora. Emtro por k o vereador titular tava ciemte do k vai vir a tona (ou já veio) E pulo do barco pessoa vulgar k nunca TV respeito nem dos companheiro político. Gosto d mais da politica mas o RESPEITO pelas pessoas seja quem for. AINDA VIGORA

De acordo com a inicial acusatória, ao assim agir, NOEMI e GIVANILDO teriam incorrido, respectivamente, nas sanções dos arts. 325 e 326 do Código Eleitoral, os quais dispõem, in verbis:

Art. 325. Difamar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação:

Pena - detenção de três meses a um ano, e pagamento de 5 a 30 dias-multa.

Art. 326. Injuriar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda, ofendendo-lhe a dignidade ou o decôro:

Pena - detenção até seis meses, ou pagamento de 30 a 60 dias-multa.

A sentença combatida (fls. 58-60) julgou improcedente a ação penal e absolveu os acusados, sob os seguintes fundamentos:

No caso em tela, analisando as provas produzidas nos autos, possível denotar que não encontra-se presente elemento essencial para que se configure a injuria ou difamação eleitoral, qual seja, ter sido a conduta praticada em contexto de propaganda eleitora ou visando fins eleitorais.

Embora se faça menção à condição de candidata ou mesmo ao voto, tais questões, de fato, inserem-se em uma "discussão" havida entre os réus e outras pessoas, que teria como conteúdo principal o fato de a vítima teria segurado e/ou rasgado uma bandeira do partido contrário, quando passava de carro em frente ao Diretório respectivo, o que, inclusive, não foi negado pela mesma.

A circunstância de as postagens terem sido realizadas em período próximo às eleições, por si só, não se mostra suficiente para caracterizar crime eleitoral, sendo imprescindível, como dito, a comprovação da presença dos elementos normativos do tipo, acima citados, que apontem, com clareza, a intenção de que as postagens surtissem algum efeito no que pertine ao pleito eleitoral.

Não é o caso.

Assim, sem prejuízo de se considerarem reprováveis as postagens realizadas pelos réus (o que poderia se configurar difamação ou injuria nos moldes dos arts. 139 e 140, do CP), no que pertine aos tipos penais com base nos quais foram denunciados, a absolvição de impõe.

Adianto que meu voto é no mesmo sentido da decisão combatida, pois entendo atípicos os fatos narrados.

Explico.

O ilícito eleitoral visa resguardar bens e valores relativos à lisura do alistamento eleitoral, à liberdade do eleitor e do voto e à higidez do processo eleitoral.

Entre os crimes eleitorais, destacam-se os crimes contra a honra e, dentre estes, a difamação e a injúria, previstos respectivamente nos arts. 325 e 326 do Código Eleitoral.

No caso concreto, materialidade e autoria encontram-se comprovadas estreme de dúvidas, seja pelos documentos acostados, seja pelo reconhecimento do fato pelos próprios réus, que admitiram ter divulgado os textos impugnados.

Restou incontroverso, também, que as mensagens foram postadas na rede social Facebook, de modo público, em 12.9.2016, durante o período de campanha eleitoral, portanto.

É preciso ter presente, contudo, que, nos delitos eleitorais contra a honra, faz-se necessário determinar o elemento anímico. Para tanto, assume especial relevo a análise não só do conteúdo das mensagens, mas, principalmente, do contexto em que foram proferidas.

Passo, então, à análise de cada um dos delitos.

a) Crime de difamação eleitoral imputado à recorrida NOEMI

O tipo objetivo do delito de difamação, previsto na legislação eleitoral, consiste em difamar alguém na propaganda eleitoral ou visando a fins de propaganda.

Em primeiro lugar, destaco que a postagem realizada por NOEMI não se deu em sede de propaganda.

Também não vislumbro, no comentário, “fins de propaganda”, ou, em outras palavras, finalidade de produzir efeito nas eleições.

Em sua defesa, NOEMI esclareceu que não fez campanha para nenhum candidato no pleito de 2016 e que o comentário não teve qualquer conotação política. Afirmou, ainda, que apenas exprimiu opinião pessoal sobre a atitude da vítima, que julgou não recomendável para “uma senhora da sociedade e representante do povo”.

Embora a ofendida Laline e a recorrida Noemi apresentem versões divergentes acerca do fato que deu origem às postagens, a única testemunha ouvida na instrução (mídia na fl. 68), Leonardo Maciel Zacarias, confirmou a versão da ré no sentido de que Laline teria arrancado a bandeira da mão de uma senhora que estava na calçada em frente ao “diretório do 40”, rasgando-a e arremessando-a ao chão.

A análise do texto de autoria da recorrida NOEMI e da situação concreta que rodeia a sua divulgação evidencia, a meu sentir, opinião particular sobre a participação da vítima no evento.

Ainda que severos os dizeres, a manifestação impugnada não caracteriza o delito de difamação eleitoral, posto que ausente o elemento subjetivo do tipo penal de difamação eleitoral, essencial à caracterização do crime, qual seja, a intenção de influenciar a vontade eleitoral dos seus destinatários.

Colho da jurisprudência deste Regional o seguinte julgado, a título exemplificativo:

Recurso criminal. Difamação. Facebook. Art. 325 c/c art. 327, inc. III, ambos do Código Eleitoral. Eleições 2016.

Caracteriza o crime de difamação, previsto no art. 325 do Código Eleitoral, a imputação a certa pessoa de um fato determinado, durante a propaganda eleitoral, apto a influenciar no resultado do pleito. Necessárias, para caracterização do delito, as presenças do elemento subjetivo - animus difamandi - e do elemento objetivo, consistente na imputação do fato ofensivo a alguém.

Publicação no Facebook de mensagem postada no perfil da denunciada, após o início do período de propaganda eleitoral, sobre suposta criação de secretaria apenas para beneficiar o detentor do cargo público, sem qualquer contraprestação em benefício da coletividade. Texto característico de embate à atuação de governo e aos agentes públicos, relativo a fatos políticos acontecidos no município. Evidenciada crítica eleitoral autorizada pelo ordenamento jurídico, a ensejar a atipicidade da conduta. Ausente, ainda, a vontade de ofender a honra da vítima. Dolo não caracterizado. Inexistência do elemento subjetivo da difamação. Absolvição.

Provimento.

(RC n. 16759 – Relator Dr. Eduardo Augusto Dias Bainy –  Sessão do dia 25.5.2017.) (Grifei.)

Assim, não vislumbro, na ofensa atribuída a NOEMI, a presença do elemento subjetivo do tipo em apreço, devendo ser confirmada, no ponto, a sentença atacada.

Nesse cenário, a conclusão sentencial não podia ser outra.

 

b) Crime de injúria eleitoral imputado ao recorrido GIVANILDO

A injúria eleitoral é contemplada no art. 326 do Código Eleitoral, nos seguintes termos:

Art. 326. Injuriar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro.

Como visto, à semelhança do que ocorre na difamação eleitoral, o tipo do art. 326, caput, do CE requer a presença de um elemento subjetivo específico, um plus, ou seja, deve haver o animus eleitoral.

Trata-se, portanto, de delito que apenas se apresenta na seara da propaganda eleitoral. Em outras palavras, a conduta do agente deve ter a especial finalidade de produzir efeito nas eleições.

Nesse sentido, a jurisprudência desta Casa, conforme ilustra a ementa abaixo:

RECURSO CRIMINAL. INJÚRIA VISANDO A FINS DE PROPAGANDA. ART. 326 DO CÓDIGO ELEITORAL. PRELIMINAR AFASTADA. CRIME DE AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA. INÉPCIA DA INICIAL NÃO CARACTERIZADA. POSTAGEM EM REDE SOCIAL. MANIFESTAÇÃO PESSOAL. CRÍTICA A DEPUTADO. AUSENTE A INTENÇÃO DE OFENDER. FATO ATÍPICO. REFORMA DA SENTENÇA. ABSOLVIÇÃO. PROVIMENTO.

Preliminar. O crime de injúria na propaganda eleitoral não admite ação penal pública condicionada à manifestação do ofendido ou de seu representante legal, em razão do interesse público que envolve a matéria, segundo entendimento firmado pelo Tribunal Superior Eleitoral. Prevalência no Direito Penal Eleitoral da regra de que as ações penais eleitorais são públicas incondicionadas. Afastada a alegada inépcia da inicial por motivo da não recepção pela Constituição Federal do art. 355 do Código Eleitoral.

Mérito. Postagem em rede social, pela denunciada, de texto com conteúdo injurioso à vítima, visando a fins de propaganda eleitoral. Incontroversa a divulgação da mensagem, em período de campanha. Caracterizada, entretanto, manifestação de opinião pessoal, desvinculada de qualquer conotação política, exprimindo seu ponto de vista a respeito do discurso realizado por deputado. Comentário veiculado dentro do contexto em que proferido, não havendo nos autos a comprovação de que o tenha realizado de forma a ofender a honra subjetiva do parlamentar. Ausente o animus difamandi vel injuriandi, ou seja, a intenção deliberada de ofender. Fato criminalmente atípico. Não configurado, assim, o crime do art. 326 do Código Eleitoral. Reforma da sentença para absolver a recorrente.

Provimento.

(RC n. 613 – Relator Dr. Luciano André Losekann – Sessão do dia 19.12.2017.)

Em que pese tenha assumido a autoria da postagem na rede social Facebook, o réu negou que houvesse relação com a campanha. Afirmou, ao contrário, tratar-se de opinião desabonadora a respeito do incidente e da postura da ofendida.

Com efeito, os dizeres em tela, mesmo que deselegantes, permaneceram nos limites da crítica autorizada pelo ordenamento jurídico, não havendo elemento de ofensa hábil a caracterizar crime eleitoral contra a honra.

O Ministério Público Eleitoral de primeiro grau, por sua vez, não logrou demonstrar a existência de um sentido especificamente eleitoral ou da intenção de se produzir efeito nas eleições. A ausência desse sentido ou intenção descaracteriza a injúria eleitoral, sendo, portanto, atípico o fato à luz do Direito Eleitoral.

Assim, não comprovado o intuito eleitoral, tenho por não tipificada a prática do delito.

À vista dessas considerações, dessarte, tenho que os fatos narrados na denúncia são criminalmente atípicos, razão pela qual deve ser mantida a decisão de improcedência da denúncia.

 

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso interposto pelo Ministério Público Eleitoral, mantendo a sentença que absolveu NOEMI TEIXEIRA DE MORAES e GIVANILDO FOLK ROBALO.