INQ - 1315 - Sessão: 10/04/2019 às 18:30

RELATÓRIO

Trata-se de inquérito policial instaurado pela Polícia Federal de Caxias do Sul, por requisição do órgão do Ministério Público Eleitoral com atuação perante a 48ª Zona Eleitoral, para apurar a possível prática do crime previsto no art. 299 do Código Eleitoral durante a campanha das eleições de 2016 no Município de São Francisco de Paula e, ainda, o previsto no art. 350 do mesmo diploma - falsidade ideológica na prestação de contas eleitorais -, por MARCOS AGUZZOLI e THIAGO CARNIEL TEIXEIRA, eleitos, respectivamente, prefeito e vice-prefeito daquele Município (fls. 2-144 e 166-265).

O delegado federal remeteu o expediente para este Tribunal solicitando autorização para prosseguimento das investigações, em virtude do investigado MARCOS AGUZZOLI ter sido eleito para o cargo de prefeito do Município de São Francisco de Paula no pleito de 2016 (fl. 144).

Após manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral (fls. 147-155), foi proferido despacho reconhecendo a competência desta Corte para o processamento do presente inquérito, com fundamento no art. 29, inc. X, da Constituição Federal (fl. 163).

As investigações prosseguiram perante a Delegacia de Polícia Federal de Caxias do Sul, tendo a autoridade policial concluído o inquérito e entendido prejudicada a análise relativa ao art. 350 do Código Eleitoral, em face da aprovação das contas dos então investigados. Já em relação ao delito previsto no art. 299 do mesmo diploma legal, promoveu o indiciamento de MARCOS AGUZZOLI e de THIAGO CARNIEL TEIXEIRA (fls. 254-265).

Nesta instância, com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral requereu o declínio da competência ao Juízo Eleitoral da 48ª Zona de São Francisco de Paula, amparada na recente interpretação restritiva conferida pelo Supremo Tribunal Federal ao instituto do foro por prerrogativa de função (art. 102, inc. I, al. “b”, da Constituição Federal), quando apreciou a Questão de Ordem na Ação Penal Originária n. 937/RJ (fls. 270-276.).

É o relatório.

VOTO

O presente inquérito policial foi instaurado para averiguar a possível prática dos delitos de corrupção eleitoral durante a campanha de 2016, consistente na distribuição de combustível a eleitores em troca de apoio e de votos, e de falsidade ideológica na prestação de contas de campanha, tipificados, respectivamente nos arts. 299 e 350 do Código Eleitoral, por MARCOS AGUZZOLI e THIAGO CARNIEL TEIXEIRA, eleitos prefeito e vice-prefeito do Município de São Francisco de Paula.

Ao encerrar a instrução do inquérito, a autoridade policial concluiu ter restado prejudicada a análise do crime de falsidade ideológica, mas promoveu o indiciamento dos investigados como incursos nas penas do art. 299 do Código Eleitoral.

Como esta Corte havia firmado a sua competência para o processamento do presente procedimento, com base no art. 29, inc. X, da Constituição Federal, pelo fato de o investigado MARCOS AGUZZOLI ter sido eleito prefeito do Município de São Francisco de Paula nas eleições de 2016 (fl. 163), após a remessa dos autos a esta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral postulou a declinação de competência ao Juízo da 48ª Zona Eleitoral de São Francisco de Paula, sob o seguinte fundamento (fl. 276):

No caso concreto, os indiciados MARCOS ANDRE AGUZZOLLI e THIAGO CARNIEL TEIXEIRA, quando da suposta prática da infração penal, não se encontravam no execício do mandato de Prefeito Municipal de São Francisco de Paula ou de qualquer outro cargo com prerrogativa de foro.

Logo, diante da interpretação restritiva conferida ao foro por prerrogativa de função pelo Supremo Tribunal Federal na Ação Penal n. 937 e do princípio da parametricidade, conclui-se que, ausente a competência desse colendo TRE-RS, esta Procuradoria Regional Eleitoral não detém atribuição para a formação da opinio delicti no presente inquérito. (grifos no original)

Como se sabe, o foro por prerrogativa de função está previsto em diversas disposições da Constituição Federal de 1988 e, no caso de prefeito, a prerrogativa encontra-se disciplinada no artigo 29, inc. X, do texto constitucional, in verbis:

Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:

(…)

X- julgamento do Prefeito perante o Tribunal de Justiça;

(…).

Em se tratando do cometimento de crimes eleitorais, sob a ótica da simetria, a competência para processar e julgar o titular do executivo municipal é do Tribunal Regional Eleitoral do respectivo Estado (Ac. de 8.4.2014 no HC no 42907, rel. Min. Gilmar Mendes).

A questão posta pelo Procurador Regional Eleitoral nestes autos trata dos critérios para a definição de tal competência.

Argumenta o ilustre Procurador que, ao decidir a Questão de Ordem suscitada pelo eminente Ministro Luiz Roberto Barroso nos autos da Ação Penal n. 937/RJ, o Supremo Tribunal Federal definiu o contexto de aplicação do foro por prerrogativa de função, restringido sua incidência a crimes cometidos durante o mandato e em função dele.

Embora o precedente da Corte Suprema tenha sido proferido em contexto atinente ao cargo de deputado federal, o próprio Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Inq n. 4703/DF, de relatoria do Min. Luiz Fux, julgado em 12.6.2018, afirmou que o entendimento também é válido relativamente a Ministros de Estado.

Desde então, vários tribunais do país – incluindo este Regional (Inq n. 333, Rel. Des. Eleitoral João Batista Pinto Silveira, J. Sessão de 25.9.2018, e Inq n. 4753, Rel. Des. Eleitoral Luciano André Losekann, J. Sessão de 08.11.2018) – tomando o acórdão como orientação, passaram a aplicar a mesma linha interpretativa para outras hipóteses de foro privilegiado.

No caso sob exame, o crime de corrupção eleitoral foi cometido, em tese, durante a campanha eleitoral relativa ao pleito de 2016.

Portanto, forçoso reconhecer que o delito cuja prática se atribui aos então candidatos aos cargos de prefeito e vice-prefeito do Município de São Francisco de Paula, MARCOS AGUZZOLI e THIAGO CARNIEL TEIXEIRA, não foi cometido durante o exercício do cargo e, por conseguinte, como bem observado pelo d. Procurador Regional Eleitoral, não guarda relação com as atribuições a ele inerentes.

Dessa sorte, com base nas definições apontadas pelo Supremo Tribunal Federal sobre a matéria e na esteira do entendimento recentemente adotado por este Tribunal, impõe-se determinar a baixa dos autos ao Juízo da 48ª Zona Eleitoral de São Francisco de Paula, uma vez que o crime imputado a MARCOS AGUZZOLI e THIAGO CARNIEL TEIXEIRA não teria sido cometido quando o primeiro ocupava o cargo de prefeito ou em razão do seu exercício.

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo acolhimento da promoção da Procuradoria Regional Eleitoral a fim de declinar da competência ao Juízo da 48ª Zona Eleitoral de São Francisco de Paula para que, encaminhados os autos ao Promotor Eleitoral oficiante, adote as medidas que entender cabíveis quanto às investigações da prática do crime de corrupção eleitoral (art. 299 do Código Eleitoral) por MARCOS AGUZZOLI e THIAGO CARNIEL TEIXEIRA durante as eleições de 2016.