E.Dcl. - 20327 - Sessão: 26/07/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de embargos de declaração (fls. 77-84) opostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL em face do acórdão de fls. 69-72, que, por maioria, deu provimento ao recurso interposto para julgar aprovadas as contas de OSCAR SCHUSTER NETO relativas às eleições de 2016, no Município de Arroio Grande, nas quais concorreu ao cargo de vereador.

Em suas razões, o Parquet eleitoral apontou omissões e contradições. Requereu a atribuição de efeitos infringentes ao recurso, a fim de que as contas sejam julgadas desaprovadas, bem como seja determinado o recolhimento da quantia tida por irregular – R$ 6.500,00 – ao Tesouro Nacional.

Ante a possibilidade de concessão de efeitos infringentes aos embargos, determinei fosse dada vista ao embargado, para, querendo, manifestar-se no prazo de 5 (cinco) dias, conforme o art. 1.023, § 2º, do Código de Processo Civil (fl. 87).

Oportunizada manifestação ao embargado, o prazo concedido transcorreu in albis (certidão de fl. 91).

Após, vieram os autos a mim conclusos.

É o relatório.

 

VOTO

Os embargos declaratórios são tempestivos (fls. 75-77) e preenchem os demais pressupostos de admissibilidade, razão por que deles conheço.

No mérito, inicialmente consigno que os aclaratórios servem para afastar obscuridade, dúvida, contradição ou omissão que emergem do acórdão, nos termos do art. 275, inc. II, do Código Eleitoral.

Para perfeita elucidação da tese lançada, transcrevo os argumentos lançados pelo embargante (fls. 77-84):

2.2 Da omissão referente à efetiva análise quanto à origem do recurso depositado de forma irregular pelo candidato

Em que pese vencido o Relator, que entendeu pela irregularidade do depósito em espécie de R$ 6.050,00, desaprovando as contas, tanto ele como o acórdão do TRE-RS entenderam que a doação em questão foi oriunda do próprio candidato. Seguem trechos do acórdão (fls. 70v.-71):

[…] Dr. Jamil Andraus Hanna Bannura (relator): [...]

Os elementos trazidos aos autos, especialmente os comprovantes de depósito eletrônico à fl. 22, autorizam a inferência de que os recursos sob análise são provenientes de doação do próprio candidato, pessoa física, em favor da sua campanha eleitoral. Destarte, não há impossibilidade de identificação do doador, única situação que, na dicção legal, implicaria no recolhimento do numerário ao Tesouro Nacional. [...]

Des. Carlos Cini Marchionatti:

Com todo o respeito, pois, e cuidadoso em meu modo de considerar e julgar, expresso voto divergente, que também tem apoio em caso anterior julgado pelo Tribunal e da Relatoria do eminente Desembargador Paulo Afonso, caracterizado no Recurso Eleitoral 209-03, assim ementado, no que mais importa sobre candidato que doou a si próprio mediante depósito bancário: "Irregularidade que não impediu a identificação do doador originário – o próprio candidato. Tendo sido identificada a fonte de financiamento da campanha eleitoral, resulta atendida a finalidade da norma".

Em benefício do candidato doador a si mesmo, está justificado o que ocorreu, sem nenhuma irregularidade ou infração nas circunstâncias do caso.

As circunstâncias determinantes, pois, de fato, legais e regulamentares, são as de que o eleitor podia doar individualmente ao candidato R$ 1.064,10, e o próprio candidato doou a si próprio R$ 6.050,00, mediante depósito bancário. É legal a doação feita pelo candidato a si próprio nos limites permitidos. Quando a doação é feita por eleitor ao candidato, exige-se transferência eletrônica e bancária na conta da campanha eleitoral especialmente aberta para tal fim. Na eleição municipal de 2016, para vereador, a soma das doações podia alcançar regularmente R$ 10.000,00.

Relacionando-se uma coisa com a outra, tem-se que o candidato doou a si mesmo dentro do limite legal e regulamentar, mediante depósito bancário na conta específica.

Penso que tudo está certo e demonstrado, razão pela qual dou provimento ao recurso e julgo prestadas as contas do recorrente como candidato a vereador. [...]

Contudo, depreende-se que o referido acórdão resta omisso quanto à efetiva análise da origem do recurso, porquanto ausente uma análise exauriente dos fatos no tocante, o que, além de negar vigência ao disposto no art. 18, §1º, da Resolução do TSE n. 23.463/15, impossibilita a fiscalização pela Justiça Eleitoral.

Entendeu o TRE-RS pela identificação da origem do recurso pela simples análise dos comprovantes de depósito à fl. 22, os quais apenas descrevem a forma do valor depositado – dinheiro – e o depositante do valor.

No entanto, tais comprovantes não podem, por si sós, ser considerados aptos a comprovar efetiva origem do recurso.

Ocorre que essa interpretação nega eficácia à Resolução TSE n. 23.463/15, visto que permite que doadores facilmente ocultem suas contribuições, bastando entregar valores em espécie ao candidato para que este, então, os depositasse como se seus fossem.

Ressalta-se que a mera existência do depositante, no comprovante de depósito, não comprova a real origem do recurso.

Ademais, destaca-se que, da análise da declaração de bens à Justiça Eleitoral do candidato, a qual encontra-se no sítio eletrônico do TSE, depreende-se que o candidato não possuía dinheiro em espécie e nem valores em conta corrente, pois declarou apenas a propriedade de dois automóveis. Tal fato corrobora, ainda mais, a ausência da efetiva comprovação da origem dos recursos.

Logo, a conduta perpetrada por OSCAR SCHUSTER NETO é justamente o que o art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15 busca evitar, qual seja o depósito de valores em espécie sob a alegação de serem recursos próprios, impossibilitando a real identificação da origem dos recursos e, inclusive, permitindo a ocultação de doações.

Sendo assim, ante a ausência de efetiva comprovação quanto à origem dos recursos irregularmente arrecadados e utilizados, devem as contas ser desaprovadas e o montante ser considerado recurso de origem não identificada, nos termos do art. 18, §3º, c/c art. 26, ambos da Resolução TSE nº 23.463/15. Segue o referido art. 26, in litteris:

Art. 26. O recurso de origem não identificada não pode ser utilizado por partidos políticos e candidatos e deve ser transferidos ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

I - a falta ou a identificação incorreta do doador; e/ou

II - a falta de identificação do doador originário nas doações financeiras; e/ou (…)

§ 6º Não sendo possível a retificação ou a devolução de que trata o § 5º, o valor deverá ser imediatamente recolhido ao Tesouro Nacional.

Aliás, nesse mesmo sentido, inclusive, este TRE-RS recentemente posicionou-se no julgamento do RE n. 282-79, na sessão do dia 03.5.2017, da Relatoria do Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz julgando desaprovadas as contas ante a inobservância do art. 18, §1º, da Resolução TSE n. 23.463/15. Segue trecho da ementa do julgado mencionado:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Doação financeira. Depósito direto. Resolução TSE n. 23.463/15. Eleições 2016.

Preliminar afastada. Oportunizada manifestação do prestador para fins de demonstração da origem do valor depositado em sua conta. Ato precluso, haja vista o caráter jurisdicional do procedimento de prestação de contas.

O recebimento de recurso financeiro por meio de depósito bancário contraria o disposto no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15, que exige transferência eletrônica. Incontroversa a realização de depósito em dinheiro na conta bancária eleitoral em quantia que representa elevada porcentagem em relação ao total de recursos arrecadados. Fato que prejudica a confiabilidade das contas e leva à sua desaprovação. [...]

Assim, o acórdão deve ser integrado, a fim de que seja devidamente analisada a questão da identificação da origem do montante depositado de forma irregular – R$ 6.050,00 –, tendo em vista a importância da transparência e da possibilidade de uma efetiva fiscalização pela Justiça Eleitoral dos valores arrecadados e aplicados na campanha, bem como a pertinência ao caso, tendo em vista que a irregularidade em questão, por si só, enseja a desaprovação das contas e a ausência de identificação – aduzida no parecer às fls. 63-66 e ora reiterada –, leva à determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional, nos termos da sentença.

 

2.3 Da contradição quanto ao reconhecimento da regularidade da doação, ensejando a inaplicabilidade do art. 18, §1º, da Resolução TSE n. 23.463/15

Entendeu o TRE-RS pela regularidade do montante de R$ 6.050,00, em espécie, depositado na conta do candidato, por ser recurso próprio, aprovando as contas, embora tenha considerado o Relator irregular a forma de doação, ante a inobservância do §1º do art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15, entendendo esse, inclusive, pela desaprovação. Segue trecho do julgado:

[…] Dr. Jamil Andraus Hanna Bannura (relator): [...]

É incontroverso nos autos que o candidato realizou o depósito em dinheiro em sua conta bancária eleitoral no valor de R$ 6.050,00, violando o art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15, o qual exige que as doações financeiras desse importe sejam efetuadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do benefíciário, verbis:

Art. 18. [...]

§1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação.

A exigência normativa de que as doações realizadas pelo próprio candidato, acima de R$ 1.064,10, sejam feitas por meio de transferência eletrônica visa, justamente, coibir a possibilidade de manipulações e transações transversas que ocultem ou dissimulem eventuais ilicitudes, como a utilização de fontes vedadas de recursos e a desobediência aos limites de doação.

Outrossim, a irregularidade em tela envolve a elevada cifra de R$ 6.050,00, que representa 78% do total de recursos arrecadados (R$ 7.716,33), e transcende em mais de 5 (cinco) vezes o valor de referência a partir do qual a disciplina legal afirma a compulsoriedade da transferência eletrônica das doações eleitorais.

Desse modo, sobressai que a mácula nas contas é grave, bem como ostenta aptidão para prejudicar a confiabilidade das informações e impedir a fiscalização, pela Justiça Eleitoral, da adequação contábil aos ditames legais insculpidos na Resolução TSE n. 23.463/15 e na Lei n. 9.504/97.

[...]

Des. Carlos Cini Marchionatti:

Com todo o respeito, pois, e cuidadoso em meu modo de considerar e julgar, expresso voto divergente, que também tem apoio em caso anterior julgado pelo Tribunal e da Relatoria do eminente Desembargador Paulo Afonso, caracterizado no Recurso Eleitoral 209-03, assim ementado, no que mais importa sobre candidato que doou a si próprio mediante depósito bancário: "Irregularidade que não impediu a identificação do doador originário – o próprio candidato. Tendo sido identificada a fonte de financiamento da campanha eleitoral, resulta atendida a finalidade da norma".

Em benefício do candidato doador a si mesmo, está justificado o que ocorreu, sem nenhuma irregularidade ou infração nas circunstâncias do caso.

As circunstâncias determinantes, pois, de fato, legais e regulamentares, são as de que o eleitor podia doar individualmente ao candidato R$ 1.064,10, e o próprio candidato doou a si próprio R$ 6.050,00, mediante depósito bancário. É legal a doação feita pelo candidato a si próprio nos limites permitidos. Quando a doação é feita por eleitor ao candidato, exige-se transferência eletrônica e bancária na conta da campanha eleitoral especialmente aberta para tal fim. Na eleição municipal de 2016, para vereador, a soma das doações podia alcançar regularmente R$ 10.000,00.

Relacionando-se uma coisa com a outra, tem-se que o candidato doou a si mesmo dentro do limite legal e regulamentar, mediante depósito bancário na conta específica.

Penso que tudo está certo e demonstrado, razão pela qual dou provimento ao recurso e julgo prestadas as contas do recorrente como candidato a vereador. (...)

Além da grande contradição existente no acórdão no tocante ao voto do Relator e ao voto divergente, tem-se que o entendimento vencedor – voto divergente – não só negou vigência ao §1º do art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15, como adotou posicionamento contrário ao disposto no referido artigo.

Tem-se que o art. 18, principalmente o §1º, da Resolução TSE n. 23.463/15 não faz distinção entre eleitores e candidatos. Dessa forma, ainda que se trate de valores depositados pelo candidato, o repasse de recursos próprios à campanha eleitoral está sujeito ao disposto no art. 18, §1º da Resolução TSE nº 23.463/15, por se tratar de modalidade de doação física:

Art. 18. As pessoas físicas somente poderão fazer doações, inclusive pela Internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços.

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação. (Grifado.)

Nesse sentido, conforme destacado no parecer desta PRE (fls. 63-66), destacam-se decisões do TRE-RS, TRE-SP e TRE-MG:

Recurso. Prestação de contas de candidato à vereança. Eleições 2012. Consideradas, pelo julgador originário, como não prestadas as contas, dada a ausência de documentos obrigatórios.

A falta de documentos não enseja o enquadramento das contas como não prestadas. Contas apresentadas e recepcionadas eletronicamente, acompanhadas de documentação passível de análise. Demonstrativos preenchidos, extratos bancários, notas fiscais e recibos eleitorais, estes últimos incompletos e irregularmente preenchidos. Ausência de recibos eleitorais correspondentes às doações a título de recursos próprios. Falha que compromete a demonstração contábil e macula, de modo irreversível, a prestação das contas.

Reforma da sentença para desaprovar as contas.

Provimento.

(Recurso Eleitoral n. 25078, Acórdão de 19.11.2013, Relator DR. LUIS FELIPE PAIM FERNANDES, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 216, Data 22.11.2013, Página 2.)

RECURSO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. ELEIÇÕES 2012. DESAPROVAÇÃO NA ORIGEM. IRREGULARIDADES: DIFERENÇA ENTRE A PRESTAÇÃO DE CONTAS FINAL E RETIFICADORA, SEM APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTAÇÃO COMPROBATÓRIA; EMISSÃO DE RECIBOS ELEITORAIS APÓS A ENTREGA A PRESTAÇÃO DE CONTAS FINAL; INCONSISTÊNCIA NA DOAÇÃO DE RECURSOS PRÓPRIOS; CESSÃO DE AUTOMÓVEL COMO ESTIMADO, ORINDO DE RECURSOS PRÓPRIOS, CONTUDO O BEM NÃO INTEGRAVA O PATRIMÔNIO DO CANDIDATO EM DATA ANTERIOR AO REGISTRO.

- TRATA-SE DE RECURSO INTERPOSTO EM FACE DA R. SENTENÇA QUE DESAPROVOU A PRESTAÇÃO DE CONTAS DO CANDIDATO, REFERENTE À CAMPANHA ELEITORAL DE 2012.

- A D. PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL E O ÓRGÃO TÉCNICO DESTE TRIBUNAL OPINARAM PELO DESPROVIMENTO DO RECURSO.

- IRREGULARIDADES NÃO SANADAS QUE COMPROMETEM A REGULARIDADE E CONFIABILIDADE DAS CONTAS. RECURSO DESPROVIDO.

(RECURSO n. 21405, Acórdão de 12.09.2014, Relatora DIVA PRESTES MARCONDES MALERBI, Publicação: DJESP – Diário da Justiça Eletrônico do TRE-SP, Data 19.9.2014)

Prestação de contas. Candidato a Deputado Estadual. Eleições de 2014.(…) Doações de recursos próprios sem comprovação de lastro. Doações atribuídas a terceiros referentes a recibos não assinados pelos supostos doadores. Configuração de RONI em ambos os casos. […] Contas desaprovadas. Determinação de transferência ao Tesouro Nacional dos recursos de origem não identificada em omissão de despesas, doação direta e dos recursos de fonte vedada.

Aplicação dos arts. 28 e 29 da Resolução n. 23.406/14/TSE.

Determinação de depósito do valor correspondente à sobra de campanha na conta bancária do partido. Disposição do § 1º do inciso II do art. 39 da Resolução n. 23.406/14/TSE.

(PRESTAÇÃO DE CONTAS n. 428312, Acórdão de 30.7.2015, Relator VIRGÍLIO DE ALMEIDA BARRETO, Relator designado PAULO ROGÉRIO DE SOUZA ABRANTES, Publicação: DJEMG - Diário de Justiça Eletrônico - TREMG, Data 20.8.2015)

Inclusive, seguindo este raciocínio, o TRE-RJ emitiu orientação no sentido de incidir o disposto no art. 18, §1º, da Resolução TSE n. 23.463/15 aos recursos próprios dos candidatos:

ATENÇÃO: o candidato que doar recursos próprios para sua campanha ou para a campanha de outros candidatos/partidos deverá observar a obrigatoriedade de que trata o § 1º do art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15, uma vez que se trata de doação de pessoa física. (Grifos no original)

Além de não ter sido demonstrada a devida comprovação da origem, não restou devidamente observada a exigência do art. 18, §1º, da Resolução TSE n. 23.463/15. Logo, não há se falar em regularidade da doação.

Ressalta-se, ainda, que é dever do candidato abster-se de utilizar valores recebidos em desacordo com o disposto no art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15, devendo restituí-los ao doador, salvo impossibilidade, caso em que deve se proceder ao recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional, conforme o § 3º do citado artigo, in litteris:

Art. 18. […] §3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, na impossibilidade, recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 26. (Grifado).

Dessa forma, não poderia o candidato ter utilizado o valor depositado em desacordo com o art. 18, §1º, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Sendo assim, ante a irregularidade da doação recebida e a ausência de efetiva comprovação quanto à origem dos recursos irregularmente arrecadados e utilizados, devem as contas ser desaprovadas e o montante ser considerado recurso de origem não identificada, nos termos do art. 18, §3º, c/c art. 26, ambos da Resolução TSE n. 23.463/15.

Por fim, como anteriormente ressaltado, o TRE-RS já se posicionou no sentido da desaprovação das contas ante a inobservância do art. 18, §1º, da Resolução TSE n. 23.463/15, no julgamento do RE n. 282-79, em 03.5.2017. Segue trecho do julgado mencionado:

[…] No mérito, a contabilidade foi desaprovada em razão do depósito de R$ 1.500,00 diretamente na conta de campanha eleitoral do candidato, em desconformidade com o art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15.

O prestador de contas alega que a doação em tela ocorreu por meio de recursos próprios e que por erro bancário houve o depósito em espécie.

Entretanto, a alegação veio destituída de prova, sendo que o recorrente sequer trouxe aos autos comprovante de saque de sua conta-corrente pessoal, circunstância que poderia ensejar alteração no juízo de mérito de sua contabilidade.

Assim, sendo incontroverso nos autos que o candidato realizou o depósito em dinheiro em sua conta bancária eleitoral no valor de R$ 1.500,00, violando o art. 18, §1º, da Resolução TSE n. 23.463/15, o qual exige que as doações financeiras desse importe sejam efetuadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação, é de ser mantida a desaprovação.

A exigência normativa de que as doações pelo próprio candidato, acima de R$ 1.064,10, sejam feitas por meio de transferência eletrônica visa, justamente, coibir a possibilidade de manipulações e transações transversas que ocultem ou dissimulem eventuais ilicitudes, como a utilização de fontes vedadas de recursos e a desobediência aos limites de doação. (Grifado.)

Logo, é necessário que seja sanada a contradição do acórdão, haja vista que, em conformidade com o art. 18, §1º, da Resolução TSE n. 23.463/15 e com o próprio entendimento do TRE-RS acima, inviável seria a manutenção do entendimento de regularidade da doação em questão, devendo ser as presentes contas desaprovadas, bem como determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia depositada de forma irregular.

2.4 Da contradição e omissão quanto ao juízo de proporcionalidade referente à irregularidade em questão

Embora tenha disposto o Relator que a irregularidade em questão – inobservância do §1º do art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15 – corresponde a 78% do total de recursos arrecadados, o TRE-RS deu provimento ao recurso do candidato, vencido em parte o Relator, tendo restado insculpido que a quantia módica permitiria a aprovação das contas, nos termos do que segue:

[…] Dr. Jamil Hanna Bannura (relator): […]

Outrossim, a irregularidade em tela envolve a elevada cifra de R$ 6.050,00, que representa 78% do total de recursos arrecadados (R$ 7.716,33), e transcende em mais de 5 (cinco) vezes o valor de referência a partir do qual a disciplina legal afirma a compulsoriedade da transferência eletrônica das doações eleitorais.

Desse modo, sobressai que a mácula nas contas é grave, bem como ostenta aptidão para prejudicar a confiabilidade das informações e impedir a fiscalização, pela Justiça Eleitoral, da adequação contábil aos ditames legais insculpidos na Resolução TSE n. 23.463/15 e na Lei n. 9.504/97. [...]

Des. Carlos Cini Marchionatti:

Com todo o respeito, pois, e cuidadoso em meu modo de considerar e julgar, expresso voto divergente, que também tem apoio em caso anterior julgado pelo Tribunal e da Relatoria do eminente Desembargador Paulo Afonso, caracterizado no Recurso Eleitoral 209-03, assim ementado, no que mais importa sobre candidato que doou a si próprio mediante depósito bancário: "Irregularidade que não impediu a identificação do doador originário – o próprio candidato. Tendo sido identificada a fonte de financiamento da campanha eleitoral, resulta atendida a finalidade da norma".

Em benefício do candidato doador a si mesmo, está justificado o que ocorreu, sem nenhuma irregularidade ou infração nas circunstâncias do caso.

As circunstâncias determinantes, pois, de fato, legais e regulamentares, são as de que o eleitor podia doar individualmente ao candidato R$ 1.064,10, e o próprio candidato doou a si próprio R$ 6.050,00, mediante depósito bancário. É legal a doação feita pelo candidato a si próprio nos limites permitidos. Quando a doação é feita por eleitor ao candidato, exige-se transferência eletrônica e bancária na conta da campanha eleitoral especialmente aberta para tal fim.

Na eleição municipal de 2016, para vereador, a soma das doações podia alcançar regularmente R$ 10.000,00.

Relacionando-se uma coisa com a outra, tem-se que o candidato doou a si mesmo dentro do limite legal e regulamentar, mediante depósito bancário na conta específica.

Penso que tudo está certo e demonstrado, razão pela qual dou provimento ao recurso e julgo prestadas as contas do recorrente como candidato a vereador. […]

Dr. Luciano André Losekann:

Senhora Presidente, eminentes Colegas:

Acompanho o voto divergente do eminente Des. Marchionatti, pois não vislumbro irregularidade na doação feita pelo próprio candidato a sua candidatura, em valores módicos, pelo que estou, também, a dar provimento ao recurso aviado. [...]

Dr. Eduardo Augusto Dias Bainy:

Apesar do percentual levantado pelo eminente colega Sílvio, eu também acompanho a divergência pelo entendimento esposado pelo colega Luciano, quando refere que é módica a quantia e, por essa razão, também acompanho a divergência, Senhora Presidente. [...]

Ocorre que é nítida a contradição existente no acórdão, pois, tendo sido vencido apenas em parte o Relator, de um lado o montante de R$ 6.050,00 representa (i) 78% do total de recursos arrecadados (R$ 7.716,33) e transcende em mais de 5 (cinco) vezes o valor de referência a partir do qual a disciplina legal afirma a compulsoriedade da transferência eletrônica das doações eleitorais, enquanto de outro (ii) é módica a irregularidade.

Ademais, é clara a omissão no tocante à necessidade de dupla análise estipulada pelo TSE para a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, qual seja “[...] (i) exiguidade, em termos nominais e absolutos, dos valores que ensejaram a irregularidade e (ii) exiguidade, em termos percentuais, dos valores cotejados com o montante arrecadado e despendido nas campanhas” (Recurso Especial Eleitoral n. 183369, Acórdão, Relator Min. Luiz Fux, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 239, Data 19.12.2016, Página 32-33).

Diante de todo o exposto, o acórdão deve ser integrado, a fim de que seja (i) devidamente analisada a origem do recurso depositado de forma irregular; (ii) reconhecida a aplicabilidade do art. 18 da Resolução do TSE n. 23.463/15 aos recursos próprios dos candidatos; bem como de (iii) reconhecida a gravidade da irregularidade por corresponder a 78% do total de recursos arrecadados e ser elevado o seu valor nominal.

(Grifos no original.)

Com a mais respeitosa vênia ao ilustre redator do recurso embargado, os aclaratórios opostos merecem ser acolhidos, ao efeito de lhes serem conferidos efeitos infringentes e desaprovadas as contas apresentadas. E o faço, sob o viés da omissão e contradição apontadas pelo Procurador Regional Eleitoral, com o objetivo primordial de alinhar o julgamento do presente feito ao dos demais casos congêneres, à luz da jurisprudência desta Casa sobre a matéria.

Prossigo.

Com efeito, cuida-se de prestação de contas apresentada por OSCAR SCHUSTER NETO, candidato ao cargo de vereador no pleito de 2016, no Município de Arroio Grande.

O juízo de primeiro grau desaprovou a contabilidade (fl. 47-49) com base no relatório técnico conclusivo de fl. 44, o qual apontou que o candidato realizou um depósito em espécie de R$ 4.050,00 (quatro mil e cinquenta reais), no dia 17.8.2016, e outro de R$ 2.000,00 (dois mil reais), no dia 18.8.2016, contrariando, com isso, o estabelecido no art. 18, §1º, da Resolução TSE n. 23.463/15, verbis:

As pessoas físicas somente poderão fazer doações, inclusive pela Internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços.

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se na hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, na impossibilidade, recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 26.

(Grifei.)

Como visto, a partir do patamar de R$ 1.064,10 o depósito deve ser realizado por meio de transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário.

No caso, os extratos trazidos aos autos (fl. 22) demonstram inequivocamente que a conta de campanha do recorrente recebeu os aportes financeiros consignados no relatório do examinador técnico responsável.

Oportunizada manifestação pelo juízo de origem a esse respeito, o candidato silenciou, vindo a fazê-lo somente em grau de recurso, asseverando ser suficiente à aprovação das contas a identificação do seu CPF nos extratos dos depósitos eletrônicos, os quais teriam sido realizados por meio de recursos próprios.

Assim, incontroverso que o candidato depositou, em sua conta de campanha, valores, em espécie, superiores ao limite máximo fixado na Resolução TSE n. 23.463/15. Incontestável também que tais valores foram efetivamente utilizados na campanha do recorrente, conforme comprovam os extratos da movimentação financeira que integram a sua prestação de contas (fls. 06-07).

Ocorre que não foi possível a identificação da origem mediata das doações, não tendo sido acostado elemento probatório nesse sentido, como ocorreria com a demonstração de que os recursos advieram, por exemplo, da conta-corrente da pessoa física do candidato. A exigência normativa de que as doações de campanha, mesmo que provenientes do próprio candidato, sejam feitas por meio de transferência eletrônica, visa a coibir justamente a possibilidade de manipulações e transações ilícitas, como a utilização de fontes vedadas de recursos e a desobediência aos limites de doação.

Considerando o valor total irregularmente arrecadado, a falha abrange 78,40% da totalidade das receitas percebidas (R$ 7.716,33). Não só o valor absoluto da irregularidade é significativo, mas também o percentual não é irrelevante, pois tem essa característica aquele que se amolda, via de regra, dentro de 10% do total da movimentação da campanha, consoante jurisprudência desta Corte e do TSE.

Adentro na análise da determinação da sentença de recolhimento, ao Tesouro Nacional, do valor de R$ 6.050,00, para confirmá-la, com base no atual entendimento deste Tribunal sobre a matéria.

Para tanto, adoto como razões de decidir o fundamento lançado pela Procuradoria Regional Eleitoral no parecer das folhas 63-66:

Salienta-se que é dever do candidato abster-se de utilizar valores recebidos em desacordo com o disposto no art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15, devendo restituí-los ao doador, salvo impossibilidade, caso em que deve se proceder ao recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional, conforme o § 3º do citado artigo, in verbis (Grifado):

Art. 18. […]

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, na impossibilidade, recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 26.

Logo, a desaprovação, na forma do art. 68, inciso III, da Resolução referida, somada ao recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 18, § 3º, c/c art. 26, ambos da mesma Resolução, é medida que se impõe.

(Grifos no original.)

Dessarte, nesse contexto, em razão da gravidade da irregularidade apontada, com prejuízo à confiabilidade e à fiscalização das contas subjacentes, o acolhimento dos aclaratórios é medida que se impõe.

Diante do exposto, VOTO pelo acolhimento dos embargos declaratórios, para, saneando os vícios apontados e integrando o acórdão, atribuir-lhes efeitos modificativos no sentido de julgar desaprovadas as contas de OSCAR SCHUSTER NETO, relativas às eleições municipais de 2016, e determinar o recolhimento de R$ 6.050,00 (seis mil e cinquenta reais) ao Tesouro Nacional.