RE - 681 - Sessão: 19/09/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso (fls. 225-234) interposto por JOSÉ AIRTON MENDES, candidato a vereador, em face de sentença do Juízo da 110ª Zona Eleitoral (fls. 211-218), que – nos autos de Ação de Impugnação de Mandato Eletivo por captação ilícita de sufrágio e abuso do poder econômico e político, movida em 30.12.2016 contra a Coligação RENOVAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO DE CIDREIRA, bem como contra os candidatos eleitos, no pleito de 2016, ALEXSANDRO CONTINI DE OLIVEIRA (prefeito) e GILBERTO DA COSTA SILVA (vice-prefeito) –, julgou improcedente o pedido em razão de insuficiência probatória.

Nas razões, o recorrente aduziu que a sentença [sic]: “[…] se alberga no depoimento da informante [MARA FRAGA], em detrimento da denunciante [NARA REGINA], que foi coerente com as declarações que prestara perante o MPE e que, inclusive, apresentou prova material do depósito em conta bancária do marido [...]”. Afirmou que o fato de NARA REGINA trocar de partido ou alternar seu apoio político a este ou aquele candidato não pode servir de pretexto para diminuir-lhe a credibilidade. Acrescentou que, conforme jurisprudência do TSE, “a circunstância de a compra de voto ter sido confirmado por uma única testemunha não retira a credibilidade nem a validade da prova”. Requereu o provimento do recurso, para ser julgada procedente a ação e cassados os diplomas dos representados.

Com contrarrazões (fls. 243-252), nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que se manifestou pelo desprovimento do recurso (fls. 256-263v.).

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade

O procurador do recorrente foi intimado via publicação de nota de expediente em 17.5.2017 (fl. 221), quarta-feira, e o recurso, interposto em 22.5.2017 (fl. 225), segunda-feira, dentro do tríduo legal, sendo, portanto, tempestivo.

Presentes os demais pressupostos de admissibilidade, dele conheço.

Preliminar de ilegitimidade passiva para a causa

De ofício, reconheço a ilegitimidade passiva para a causa da coligação impugnada, RENOVAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO DE CIDREIRA (PP - PTB - REDE - DEM), de Cidreira, na medida em que o procedimento impugnatório objetiva o mandato político, inexistindo qualquer relação com a coligação.

Nesse sentido, os arestos deste Tribunal:

Recurso. Ação de impugnação de mandato eletivo. Decadência. Art. 14, § 10, da Constituição Federal. Eleições 2012.

Acolhida preliminar de ilegitimidade passiva, já que a ação impugnatória objetiva o mandato político, não cabendo ao partido ou à coligação ingressar no polo passivo da demanda. Opera-se a decadência quando ajuizada a ação após o prazo estabelecido pela Constituição Federal. Manutenção da sentença.

Provimento negado.

(TRE-RS – RE 3-24.2014.6.21.0081 – Rel. Dr. Leonardo Tricot Saldanha – J. Sessão de de 7.8.2014.)

 

Recurso. Ação de impugnação de mandato eletivo. Falta de abertura de conta bancária para movimentações financeiras de campanha eleitoral e irregularidades em prestação de contas de comitê financeiro. Abuso do poder econômico. Improcedência.

Ilegitimidade passiva ad causam da agremiação recorrida, uma vez que o procedimento impugnatório objetiva o mandato político, inexistente qualquer relação com o partido.

Não demonstrada pelos recorrentes, nas condutas inquinadas de ilegais imputadas aos recorridos, a possibilidade de repercussão no resultado do pleito, conforme exigido em firme e uníssona jurisprudência das Cortes Eleitorais para a caracterização do abuso do poder econômico.

Provimento negado.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 325073, Acórdão de 19.10.2010, Relator Dr. Jorge Alberto Zugno, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 184, Data 22.10.2010, Página 2.) (Grifei.)

 

Recurso. Impugnação de mandato eletivo.

O partido político não é parte legítima passiva na ação de impugnação de mandato, por não abrangido pela relação jurídica subjacente.

Comprovados os atos de distribuição ilegal de medicamentos do município e de cestas básicas em troca de votos, assim como o uso do cargo público para tanto, restaram comprovados os fatos imputados ao vereador eleito, devendo ser mantido o julgamento de procedência da ação e, em consequência, a cassação do mandato de vereador e inelegibilidade imposta por três anos.

Recurso provido em parte.

(TRE-RS, Recurso em Ação de Impugnação de Mandato Eletivo n. 172005, Acórdão de 18.11.2005, Relatora Dra. Maria José Schmitt Sant'anna, Publicação: DJE - Diário de Justiça Estadual, Tomo 227, Data 06.12.2005, Página 96.) (Grifei.)

Logo, a coligação demandada deve ser excluída do polo passivo.

Mérito

No mérito, cuida-se de apreciar Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME), pela qual os impugnados e candidatos eleitos, ALEXSANDRO CONTINI DE OLIVEIRA (prefeito) e GILBERTO DA COSTA SILVA (vice) teriam cometido captação ilícita de sufrágio e abuso do poder econômico e político, em razão da oferta de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) em troca do voto da eleitora NARA REGINA DE QUADROS GONSALVES, a teor do disposto nos arts. 41-A da Lei n. 9.504/97 e art. 22 da LC n. 64/90, in verbis:

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinquenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar n. 64, de 18 de maio de 1990.

§ 1º Para a caracterização da conduta ilícita, é desnecessário o pedido explícito de votos, bastando a evidência do dolo, consistente no especial fim de agir.

§ 2º As sanções previstas no caput aplicam-se contra quem praticar atos de violência ou grave ameaça a pessoa, com o fim de obter-lhe o voto.

§ 3º A representação contra as condutas vedadas no caput poderá ser ajuizada até a data da diplomação.

§ 4º O prazo de recurso contra decisões proferidas com base neste artigo será de 3 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no Diário Oficial.

 

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito: [...]

A inicial imputa aos impugnados os seguintes fatos:

Em 21 de outubro de 2016, a Sra. NARA REGINA DE QUADROS GONSALVES, procurou o Ministério Público da Comarca de Tramandaí para aliviar-se da pressão interna que vinha sofrendo, para dar um sossego à sua consciência, tendo em vista fatos que com ela se passaram no período pré eleitoral.

Na presença do representante do Ministério Público Eleitoral, NARA REGINA relatou que o candidato ALEX CONTINI lhe ofereceu a quantia de R$ 920,00 (novecentos e vinte reais) em troca de seu voto para o cargo de Prefeito de Cidreira.

Através da candidata MARA FRAGA, a sra. NARA foi convidada para ir até a residência de ALEX. Lá comparecendo, o candidato ofereceu-lhe quatro mil reais, parcelados até a data das eleições. Aceita a proposta, já no dia 11 de julho, foi depositado na conta do marido da denunciante a quantia de R$ 920,00 (documento anexo).

Na sequência, MARA FRAGA lhe passou a quantia de R$ 840,00, referente a uma das parcelas combinadas, quantia da qual passou recibo entregue a MARA FRAGA, para comprovar o recebimento perante ALEX.

Arrependida do ato que praticou, pois tem consciência da ilicitude praticada, como parte passiva da captação de sufrágio cometida pelo então candidato, hoje Prefeito eleito de Cidreira, a sra. NARA tentou devolver o dinheiro, porém sem sucesso.

Tais fatos foram testemunhados por JANAINA, que conforme as declarações de NARA REGINA, por escrito, conforme documento anexo.

[…]

Nesse contexto, ressalto que a narrativa fática relativa à captação ilícita de sufrágio, em tese, é admissível como hipótese de cabimento de ação de impugnação de mandato eletivo, como faz ver o seguinte aresto do TSE:

ELEIÇÕES 2008. PREFEITO. VICE-PREFEITO. VEREADOR. AIME. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. CONDENAÇÃO. CASSAÇÃO. MANDATO. AUSÊNCIA. POTENCIALIDADE. PROVIMENTO.

1. É firme a jurisprudência desta Corte em admitir a apreciação da prática de captação ilícita de sufrágio como uma das hipóteses de cabimento da AIME, sob a perspectiva de o ilícito praticado ser espécie do gênero corrupção.

2. Não se aplica às eleições de 2008 a nova redação do art. 22, inciso XIV, da LC nº 64/1990, dada pela LC nº 135/2010, que afastou o conceito de potencialidade lesiva e introduziu requisito menos contundente, revelado na natureza grave do ato praticado.

3. A procedência da AIME com fundamento em captação ilícita de sufrágio exige a demonstração da potencialidade lesiva dos atos praticados, nos termos da jurisprudência firmada nas eleições de 2008.

4. Recurso especial provido.

(TSE – RESPE n. 356177 – Rel. Min. Gilmar Ferreira Mendes – DJE de 01.4.2016.)

Prossigo.

O impugnante, ora recorrente, juntou, na exordial, termo de declaração prestado por NARA REGINA perante o Ministério Público Eleitoral local (fl. 16-18) e denúncia encaminhada à Ouvidoria do TRE-RS (fls. 19-20). Acostou cópia do extrato bancário de conta-poupança em nome de WALTER DOS SANTOS (fl. 21) informando o depósito em dinheiro – não identificado –, na quantia de R$ 920,00, em 11 de julho de 2016. Fez acompanhar ainda de declarações subscritas por NARA REGINA (fl. 22) e JANAÍNA NADIR FARIAS DE CHAGAS (fl. 23 e v.).

Realizada audiência de instrução (fls. 126-141v.), procedeu-se à oitiva de 6 (seis) testemunhas.

NARA REGINA DE QUADROS GONSALVES, única testemunha arrolada pelo impugnante ouvida em juízo (fls. 132-136v.), afirmou [sic]:

J: Dona Nara. Em resumo o que diz a inicial que o Alex Contini teria oferecido R$ 4.000,00 para que a senhora votasse nele para prefeito.

T: Sim. E duas vagas na prefeitura, que seria para minha filha e pro meu neto.

J: Além o valor, duas vagas?

T: É. Tratei com ele diretamente.

J: Certo. E como é que seria pago esse valor?

T: Ele me depositou na minha conta R$ 920,00, na conta do meu marido, na agência de Pinhal, Balneário Pinhal. Aí depois ele me deu mais, lá pelo dia 28… O Pavão, que era o assessor dele, entregou para Mara Fraga. E aí, ahn, ela me repassou R$ 850,00, né.

J: Sim.

T: R$ 875,00, alguma coisa assim. Aí ela me pediu, ela tinha uma agenda, ela me pediu, aí eu coloquei com a minha letra o valor, o valor que ficava pra trás e assinei. Aí ela assim: “assina que eu tenha que mostrar pra ele, para prestar contas”.

[…]

J: A senhora tinha contato direito [sic] com o Alex Contini?

T: Direto. Nós sentamos, tomamos café… E, aí eu ai até ficar, assim, ahn… tava ali, sempre tirei fotos, tenho foto bastante com ele. Fui no dia da convenção entendeu, dia da convenção, em 31…

[…]

T: Fiquei de devolver em dezembro com o décimo terceiro. Que meu marido disse: “devolve que não é nosso”.

J: Além desse depósito bancário que a senhora afirma que foi feito por ele, a senhora tem alguma outra prova disso?

T: Tem a Janaína que viu. Ela estava servindo cafezinho, ela ouviu o trato.

J: Quem é essa Janaína?

T: Janaína é a guria que trabalhava na casa da Mara Fraga, entendeu? Aí ela trabalhava lá…

[…]

Adv.: Quando então é que o Alex tornou a lhe procurar para oferecer…

T: Ah, foi antes. Foi em junho. No dia 05 de junho, às 14 horas, nós marcamos na casa da Mara Fraga.

Adv: Tá. E a senhora foi levada até a presença dele por quem?

T: Não, eu e ele… A gente se dá. A gente se conhece há anos, né, vinte anos.

Adv: Qual foi a participação da Mara Fraga naquele episódio?

T: Foi na casa dela. Às 14 horas na casa dela.

Adv: Então eu pergunto. A Mara Fraga agiu de alguma forma para lhe colocar em contato com o Alex para ele lhe oferecer…

T: Não. Já tinham me pedido para eu dar um apoio pra ele. Eu me lembro que… ahn… Que era uma mudança, uma inovação, né, tudo. E eu aceitei. Aí vim conversar. Aí ela disse: “tá, marquei com o Alex às 14 horas aqui em casa”.

Adv: Chegando lá o Alex já foi logo lhe oferecendo…

T: Não, nós conversamos. A gente não tem inimizade, né. O problema todo… Ficamos conversando aí. Eu disse pra ele: “Alex, acontece que é difícil, né”. Pegar, não, como é que vai ficar, é difícil. Até eu instruí ele, até que não acreditava que ele fosse vencer a eleição, e aí falei pra ele…

Adv: Mas que tava assim […] focando?

T: […] R$ 4.000,00…

Adv: […] quando é que ele lhe ofereceu o dinheiro?

T: Naquele dia. Às 14 horas. Já eram 3 horas, a gente já tinha conversado, tomado café. Aí eram os R$ 4.000,00…

Adv: Ele lhe ofereceu algum cargo na prefeitura também?

T: Como?

Adv: Algum cargo…

T: Tá, dois cargos. Um pra minha filha e um pro meu neto.

[…]

No que se refere à prova material carreada aos autos, não foi possível qualquer inferência, de forma a concluir-se pela veracidade dos fatos alegados na inicial, haja vista que não restou identificado o autor do aludido depósito bancário, em espécie, no valor de R$ 920,00.

Por sua vez, MARA LÚCIA DE ANDRADE FRAGA (fls. 139v.-141v.), arrolada pelos impugnados, dá outra versão aos fatos [sic]:

J: Vamos lá, dona Mara. Dona Nara Regina alega […] que o Alex ofereceu pra ela quatro mil reais em troca de voto. Isso seria pago de uma forma parcelado então e o depósito teria sido feito na conta do marido, do seu Valter, que seria o marido da dona Nara Regina, no valor de R$ 920,00 e teria mais um valor de R$ 840,00, R$ 850,00, não sei […] que a senhora teria entregue para Nara mediante recibo. Começo perguntado o que a senhora sabe sobre essa oferta de dinheiro para a dona Nara.

T: Bom, dessa oferta que a senhora se refere eu não sei. Eu sei do pedido dela pra minha pessoa.

J: O que a Dona Nara pediu pra senhora?

T: Bom, se a senhora permite, eu conheço a Dona Nara, quando então coordenei o programa bolsa família por cinco anos no município, enquanto ela era a conselheira e estabelecemos uma ótima, inclusive uma excelente relação, tanto que ela inclusive me ajudou inclusive na adoção de uma filha que eu tenho como conselheira. Até estranhei o fato da denúncia muito distorcida. O que ocorreu foi que ela me procurou já nessa qualidade de uma pessoa bem íntima, bem próxima, independente de política, me pedindo ajuda, porque ela tinha, na época, né, um junho, julho, um carro financiado no nome da vereadora Maria Vicentina, que é uma vereadora que a filha dela era assessora, enfim, e esse carro estaria em busca e apreensão.

J: A filha de quem, a filha da Nara seria assessora dessa […]?

T: Sim […]. Bem como a Janaína que fez uma declaração aqui também foi assessora da Maria Vicentina.

J: Uhum.

T: Então e a vereadora tinha dito pra ela, vereadora na época, tinha dito pra ela que se ocorresse a busca e apreensão do veículo ela pegaria o veículo de volta…

J: Essa vereadora Maria Vicentina?

T: Isso. Aí ela me solicitando ajuda e dizendo que a vereadora se referiu dessa forma, que pegaria o carro de volta, pagaria, né, a dívida para não ir a busca e apreensão e devolveria o dinheiro para ela que ela havia pago da mesma forma, mensalmente, e que ela não podia perder o veículo, ela e seu Valter eram pessoas idosas, enfim e tal. Me pediu um apelo que ela precisava de dois mil reais emprestados pra isso. Aí eu, bom, eu não tenho, eu não disponho desse valor, porque na época eu era autônoma, né, e aí digo bom, não disponho desse valor, mas vou tentar te ajudar, foi de onde eu fui e procurei uma pessoa amiga, é, até porque dinheiro não se pede pra estranho e pedi, interpelei ela, e pedi que a pessoa tava inclusive quando ela me solicitou o empréstimo ela me mostrou ela que o marido tinha o marido é aposentado da brigada e tinha um precatório para receber e que ela sanaria a dívida comigo posterior quando ela recebesse. Aí eu procurei a Nara Machado, né, que possui recursos, e ela disse 'não tem problema Mara, não seria a primeira vez que eu te emprestaria um valor' porque realmente a gente tem uma relação próxima e ela muitas vezes me emprestou dinheiro, eu não teria problema de te emprestar e ainda inclusive sinalizou 'só que tu vai te meter em confusão, tu tem confiança nessa pessoa?' e eu digo bom até então é uma pessoa que eu sempre me relacionei bem, ela coloca, eu até fiz lá, eu tenha na minha rede social lá, ela me elogiando com meu trabalho no programa, ela me elogiando como pessoa né, porque eu adotei, enfim, nós tínhamos uma boa relação, então com relação a estes valores, Doutora, foi exatamente a forma que aconteceu foi essa e eu assumo responsabilidade por isso.

A narrativa fática de MARA FRAGA encontra respaldo e coerência nos depoimentos de NARA MACHADO FRAGA (fls. 129-131), RAQUEL DA SILVA CARDOZO (fl. 137), VALTER PEDROZO MACHADO (fl. 137 e v.) e ALEXANDRE PORCHER MORAES (fl. 139 e v.).

Já a testemunha JANAÍNA NADIR FARIA DAS CHAGAS, arrolada pelo impugnante – que subscreve a declaração de fl. 23 e v. e afirma ter presenciado os fatos –, deixou de comparecer a juízo, sobrevindo aos autos sua retratação, ocorrida antes mesmo do ajuizamento da presente AIME – em 29 de novembro de 2016 –, perante a Promotoria de Justiça de Tramandaí (fls. 164-166), destacando-se o seguinte trecho [sic]:

[…]

Advertida de que caso esteja faltando com a verdade responderá pelo crime de denunciação caluniosa, a depoente diz que não está mentindo.

Lida novamente a declaração da fl. 10 para a depoente e novamente perguntado se a declaração é verdadeira, a depoente resolve se RETRATAR afirmando que quem lhe ditou a declaração foi a denunciante Nara Regina e a candidata cassada Maria Vicentina. Elas foram atrás da depoente dizendo que deveria fazer uma declaração para ser entregue ao Promotor de Justiça fazendo tal denúncia contra o candidato Alex Contini. A RETRATAÇÃO consiste no trecho da carta da fl. 10 e deste depoimento de que o candidato eleitora Alex Contini teria oferecido dois cargos de assessoria, bem como quatro mil reais em troca de voto e apoio ao candidato. Não presenciou tal situação. Porém, mantém o seu depoimento de ter vista a entrega do dinheiro sem ter escurado o motivo pelo qual houve a entrega do dinheiro. Não sabe qual foi o valor do dinheiro entregue por Mara Fraga, tampouco para que era. Também se RETRATA no sentido de ter dito neste depoimento que presenciou Pavão, o assessor de Alex Contini, na casa de Mara com um envelope na mão. Não presenciou isto. RETRATA-SE na parte de seu depoimento que afirmou ter visto o candidato Alex Contini oferecendo vantagem em troca de voto. O candidato Alex Contini frequentava a casa de Mara Fraga. RETRATA-SE, novamente, acerca do teor de seu depoimento em que disse que ouviu Mara Fraga dizer que precisava que ela assinasse uma folha para mostrar para Alex Contini. Não ouviu nada disto. Por fim, RETRATA-SE de ter dito, neste depoimento, que presenciou o assessor Pavão falando que o restante do dinheiro seria depositado na conta bancária do marido da denunciante, pois, em realidade, também não presenciou tal fato. Está desconfiada que a família Sessim esteja por trás disto, mas não tem como precisar.

Ressalta que quem lhe ditou a declaração da fl. 10 foi a própria Nara Regina, sendo que Vicentina ainda falou para Nara, ex-conselheira tutelar, para não envolver a depoente nisto. Afirma que a Nara começou a lhe ditar uma primeira declaração em que a depoente não aceitou assinar. Conversou com a sua mãe e decidiu que não assinaria pois estava exagerada a declaração, a qual falava em cestas básicas por parte do candidato Alex, porém nada disso presenciou e está arrependida de ter assinado uma declaração de fatos que não são verídicos, bem como ter iniciado este depoimento faltando com a verdade.

(Grifos no original.)

Portanto, a ocorrência do ilícito está consubstanciada unicamente no depoimento de NARA REGINA, e desamparada de outros elementos probatórios. Ademais, o seu depoimento em juízo mostrou-se frágil, impreciso e evasivo. A credibilidade também restou seriamente comprometida em razão da retratação levada a efeito por JANAÍNA NADIR FARIA DAS CHAGAS, ao ser ouvida perante o Ministério Público Eleitoral local (fls. 164-166).

No ponto, peço vênia para colacionar trecho da sentença proferida pelo juízo a quo, cujos fundamentos adoto como razões de decidir, verbis (fls. 211-218) [sic]:

[…]

De toda prova citada, conclui-se que não há como dar absoluta credibilidade a denúncia feita por Nara Regina, não se mostrando uma pessoa confiável diante dos interesses políticos envolvidos e de sua inconstância partidária. Ainda, a prova documental juntada, em especial o depósito em dinheiro da fl. 21, nada acrescentam, na medida produzidas de forma unilateral e sem a devida identificação no depositante. De fato, o depoimento de Janaína ao Ministério Público Eleitoral deixa dúvidas quanto à credibilidade dos relatos de Nara Regina, não havendo nenhum outro elemento de prova, testemunhal ou documental, que afastem qualquer dúvida sobre a suposta captação ilícita de sufrágio.

[…]

Com efeito, competia ao impugnante, para caracterização do abuso de poder econômico ou político, provar, extreme de dúvidas, que os impugnados tenham praticado os atos ilícitos a si imputados (compra de voto e de apoio político) e, além disso, beneficiado-se desse agir, bem como que a conduta de abuso de poder econômico ou político teve potencialidade lesiva para influir no resultado da eleição para prefeito. Entretanto, não se desfez o impugnante do ônus de provar os fatos alegados com a finalidade de constatar-se tais abusos, impondo a improcedência da ação.

Do exame dos autos, enfim, não se evidenciam provas robustas de que houve, pelos demandados, efetivamente, compra de votos e/ou abuso do poder econômico ou político.

O abuso de poder econômico caracteriza-se “quando o uso de parcela do poder financeiro é utilizada indevidamente, com o intuito de obter vantagem, ainda que indireta ou reflexa, na disputa do pleito”. Já o abuso de poder político “se caracteriza pela vinculação do agente do ilícito mediante mandato eletivo” (ZILIO, Rodrigo López. Direito Eleitoral. 5.ed., Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2016, p. 542).

Na captação ilícita de sufrágio – art. 41-A da Lei n. 9.504/97 –, segundo as lições de José Jairo Gomes:

[…] para que um fato seja imputado ao candidato e este, em consequência, seja eleitoralmente responsabilizado, há mister que se demonstre a existência de liame entre o seu agir e o aludido fato; essa conexão pode decorrer até mesmo de omissão. De modo que a culpa (em sentido amplo) do candidato deve ser evidenciada, pois, se isso não ocorresse, sua responsabilização se fundaria em mera presunção. (Grifei.)

A captação ilícita de sufrágio, deflagradora de abuso de poder, deve restar devidamente provada nos autos, não servindo para tanto a mera alegação infundada, que não se mantém diante dos depoimentos colhidos.

A prova coletada não se mostra suficiente para demonstrar a participação dos ora recorridos.

Consoante pacífica jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a ocorrência do ilícito do art. 41-A da Lei das Eleições exige prova segura e robusta a demonstrá-la:

RECURSO ESPECIAL. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. PROVA ROBUSTA. AUSÊNCIA. PROVIMENTO.

1. Considerando a contradição da prova analisada pela Corte Regional, não há como se entender pela configuração da captação ilícita de sufrágio, a qual demanda a presença de prova robusta e inconteste, o que não se verifica na hipótese dos autos.

2. Recurso especial provido.

(TSE – AC 79143 – Rel. Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA – DJE de 23.5.2014.)

 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2012. PREFEITO. VEREADOR. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO E ABUSO DO PODER ECONÔMICO. DESPROVIMENTO.

1. Consoante a atual jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a licitude da prova colhida mediante interceptação ou gravação ambiental pressupõe a existência de prévia autorização judicial e sua utilização como prova em processo penal.

2. A prova testemunhal também é inviável para a condenação no caso dos autos, tendo em vista que as testemunhas foram cooptadas pelos adversários políticos dos agravados para prestarem depoimentos desfavoráveis.

3. As fotografias de fachadas das residências colacionadas aos autos constituem documentos que, isoladamente, são somente indiciários e não possuem a robustez necessária para comprovar os ilícitos.

4. A condenação pela prática de captação ilícita de sufrágio ou de abuso do poder econômico requer provas robustas e incontestes, não podendo se fundar em meras presunções. Precedentes.

5. Agravo regimental desprovido.

(TSE – Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 92440 – Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA – DJE de 21.10.2014.)

 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ART. 41-A DA LEI 9.504/97. ELEIÇÕES 2012. AUSÊNCIA DE CONFIGURAÇÃO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. DESNECESSIDADE.

1. A configuração de captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei 9.504/97) demanda a existência de prova robusta de que a doação, o oferecimento, a promessa ou a entrega da vantagem tenha sido feita em troca de votos, o que não ficou comprovado nos autos.

2. Conforme a jurisprudência do TSE, o fornecimento de comida e bebida a serem consumidas durante evento de campanha, por si só, não configura captação ilícita de sufrágio.

3. A alteração das conclusões do aresto regional com fundamento nos fatos nele delineados não implica reexame de fatos e provas. Na espécie, a mudança do que decidido pela Corte Regional quanto à finalidade de angariar votos ilicitamente foi realizada nos limites da moldura fática do acórdão, sem a necessidade de reexame fático-probatório.

4. Agravo regimental não provido.

(TSE – Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 47845 – Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA – DJE de 21.5.2015.)

Ainda, em caráter exemplificativo, os seguintes precedentes deste Regional:

Recurso. Representação. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Improcedência. Eleições 2016.

Para a configuração da captação ilícita de sufrágio, necessária a conjugação de elementos subjetivos e objetivos que revistam uma situação concreta.

Incontroversa a entrega de material de construção para eleitor. Todavia, carece de prova o envolvimento dos representados e a intenção específica exigida pelo comando - a obtenção de votos. Recebimento do material precedido do regular processo administrativo perante a prefeitura, em razão de política municipal de habitação de interesse social e saneamento. Ausente prova da captação ilícita de sufrágio.

Provimento negado.

(TRE-RS – RE n. 19515 – Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz – J. Sessão de Julgamento de 29.11.2016.)

 

Recurso. Representação. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Eleições 2016.

1. Preliminar. Licitude da gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro. Hipótese em que desnecessária a autorização judicial. Por consequência, afastada a nulidade de testemunho por derivação.

2. Vedada pela legislação eleitoral a entrega ou oferta de vantagens para a obtenção do voto do eleitor. Não é exigido pedido expresso de voto, bastando apenas que a oferta ocorra com a finalidade de obter voto.

3. A ajuda financeira a familiar de eleitora, conhecida do candidato de longa data, bem como o fornecimento de gasolina para que pudesse comparecer às urnas, não evidencia suposta compra de votos. Reafirmado, em algumas passagens do diálogo, que a eleitora não estava obrigada a votar no candidato. Inexistente, na espécie, prova robusta a revelar a captação ilícita de sufrágio.

Provimento.

(TRE-RS – RE n. 57243 – Rel. Dr. Jamil Andraus Hanna Bannura – J. Sessão de 7.3.2017.)

Portanto, diante da insuficiência do caderno probatório, inexiste, a meu sentir, comprovação inconteste da prática imputada aos recorridos, não se admitindo, in casu, a imposição das severas sanções previstas na legislação de regência.

Nesse mesmo passo, o posicionamento do Procurador Regional Eleitoral (fls. 256-263v.), de cujo parecer aproveito a seguinte passagem:

[…]

Com efeito, a jurisprudência é uníssona no sentido de que a prova do ato consubstanciador do abuso de poder econômico, fraude e corrupção eleitoral deve ser coesa, contundente, exigindo um conjunto robusto do comprometimento do bem jurídico tutelado pela norma de regência – a normalidade e legitimidade do pleito -, o que não se verifica nos autos, onde, convém repetir, a prova mostra-se frágil e insuficiente, conforme fundamentos da bem- lançada sentença. 

[…]

Portanto, sopesados os elementos que compõem o conjunto probatório, mas persistindo dúvidas importantes que não permitem caracterizar inequivocamente a prática dos ilícitos suscitados na petição inicial, resta injustificável a aplicação de severa consequência, como a que se afigura a desconstituição do mandato, razão pela qual opino pelo desprovimento da insurgência recursal.

Portanto, dentro desse contexto, a negativa de provimento ao recurso, com a conformação da sentença de improcedência, é medida que se impõe.

 

Dispositivo

Diante do exposto, declaro a ilegitimidade passiva para a causa da Coligação RENOVAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO DE CIDREIRA (PP - PTB - REDE - DEM), determinando a sua exclusão do processo e, na linha do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, VOTO pelo desprovimento do recurso interposto por JOSÉ AIRTON MENDES.