INQ - 4203 - Sessão: 09/09/2019 às 14:00

RELATÓRIO

Cuida-se de inquérito policial instaurado para apurar a eventual prática do crime de corrupção eleitoral (CE, art. 299) perpetrada por GILNEI ARLINDO LUCHESE, prefeito e candidato à reeleição, nas eleições de 2016, que teria, por intermédio de terceiros, oferecido vantagens a eleitores em troca de votos na sua candidatura.

Após iniciada a investigação, houve o declínio da competência para segunda instância da Justiça Eleitoral (fls. 17 e 18) e a fixação da competência originária pelo TRE-RS (fls. 23-24 e 26).

A Polícia Federal procedeu à análise do manuscrito e da mídia digital e à identificação de pessoas, bem como coleta de depoimentos. Foram juntados documentos.

Ao final, o inquérito policial foi relatado sem indiciamentos.

A Procuradoria Regional Eleitoral requer o declínio da competência ao Juízo Eleitoral da 53ª Zona Eleitoral – Sobradinho, com jurisdição sobre o município de Lagoa Bonita do Sul.

É o relatório.

VOTO

Sabe-se que, por simetria, nos termos do art. 29, inc. X, da Constituição Federal, a competência originária para processamento e julgamento de ação penal por prerrogativa de foro, no caso de crime eleitoral cometido, em tese, por chefes do executivo municipal, é deste Tribunal Regional.

Contudo, no julgamento da Questão de Ordem da Ação Penal n. 937, proferida no mês de maio de 2018, o Supremo Tribunal Federal assentou nova interpretação a respeito do tema, para restringir a aplicação do foro por prerrogativa de função apenas aos delitos praticados no exercício do cargo e, importante: com pertinência às funções exercidas.

Isso porque o instituto, originalmente concebido como garantia da liberdade e independência de atuação, em razão da relevância do cargo ou função desempenhada, passou a sofrer notórias disfuncionalidades.

Nesse contexto, conforme o entendimento jurisprudencial inaugurado no julgamento da Questão de Ordem na AP 937, restringindo o foro por prerrogativa de função aos crimes contemporâneos ao mandato e a ele relacionados, consolidou-se no sentido de que a finalidade da reeleição, por si só, não configura relação com o exercício de mandato eletivo, sendo, por isso, insuficiente para atrair a incidência do foro por prerrogativa de função.

A hipótese investigativa diz respeito, exclusivamente, à entrega de dinheiro em espécie a eleitores em troca de seus votos e dos votos de seus familiares na candidatura à reeleição do então prefeito, sem qualquer indício de que tais valores tenham sido alcançados por meio de programas sociais municipais ou que provenham dos cofres públicos.

O dinheiro em espécie é benesse que pode ser oferecida e entregue por qualquer cidadão, independente do exercício ou não de mandato de prefeito, motivo pelo qual se conclui que os fatos investigados não foram praticados em razão do ofício, e sim, exclusivamente, na qualidade de candidato.

Assim, deve ser reconhecida a perda superveniente do foro por prerrogativa de função de GILNEI ARLINDO LUCHESE perante este Tribunal Regional Eleitoral, decorrente da interpretação restritiva conferida ao instituto pelo Supremo Tribunal Federal na Questão de Ordem na AP n. 937, conforme entendimento sedimentado nesta Corte:

INQUÉRITO. CRIME ELEITORAL. ART. 324 DO CÓDIGO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2016. NOVO ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PRERROGATIVA DE FORO. LIMITAÇÃO AO EXERCÍCIO DO CARGO. CANDIDATO AO CARGO DE PREFEITO NA ÉPOCA DO FATO. DECLÍNIO DE COMPETÊNCIA.

Suposta prática de crime durante debate eleitoral que antecedeu ao pleito, período em que o investigado detinha apenas a condição de candidato ao cargo de prefeito. Novo posicionamento do Supremo Tribunal Federal no sentido de limitar o foro por prerrogativa de função às hipóteses em que a prática delitiva ocorrer no exercício do cargo e em decorrência de suas atribuições. Alinhamento deste Tribunal à nova interpretação. Não subsiste a competência originária criminal desta Corte, reconhecida ao juízo eleitoral de primeiro grau. Acolhida a promoção ministerial.

(RE n. 3-33, julgado em 25-9-2018, Relator: Des. Federal João Batista Pinto Silveira.)

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo declínio da competência ao Juízo da 53ª Zona Eleitoral – Sobradinho, com jurisdição sobre o Município de Lagoa Bonita do Sul, a fim de que, aberta vista dos autos ao ilustre membro do MPE oficiante, adote as providências que entender cabíveis.

É o voto.