REl - 0600045-87.2024.6.21.0076 - Voto Relator(a) - Sessão: 26/05/2025 00:00 a 27/05/2025 23:59

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, trata-se de recurso eleitoral interposto pelo Diretório Estadual do PARTIDO DA RENOVAÇÃO DEMOCRÁTICA – PRD e seus dirigentes, insurgindo-se contra a sentença que indeferiu o pedido de regularização da omissão de prestação de contas do Diretório Municipal do extinto Patriota, atinentes às Eleições Gerais de 2018.

Em que pese o esforço argumentativo dos recorrentes para equiparar o presente feito àqueles em que se reconheceu a regularização de contas anuais, as prestações de contas eleitorais possuem natureza jurídica diversa, pois se destinam a aferir o cumprimento das normas específicas, atinentes à arrecadação e aplicação de recursos no contexto da disputa eleitoral, não se confundindo com a obrigação de prestação de contas relativas à manutenção ordinária do partido político.

Logo, ainda que, eventualmente, a agremiação partidária não esteja inadimplente em relação às suas contas de exercício financeiro, persiste o dever da Justiça Eleitoral de assegurar a regularidade e a fiscalização das contas de campanha, ainda que não tenha ocorrido movimentação financeira, mediante a adoção das providências técnicas indispensáveis à aferição da higidez das informações prestadas.

O procedimento de regularização da omissão de prestação de contas eleitorais é disciplinado pelo art. 80, § 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19, que assim dispõe:

Art. 80 (...).

[...].

§ 2º O requerimento de regularização:

I - pode ser apresentado:

a) pela candidata ou pelo candidato interessada(o), para efeito da regularização de sua situação cadastral;

b) pelo órgão partidário cujo direito ao recebimento da quota do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha esteja suspenso ou pelos hierarquicamente superiores;

II - deve ser autuado na classe Regularização da omissão de prestação de contas eleitorais, consignando-se os nomes das(os) responsáveis, e distribuído por prevenção à juíza ou ao juiz ou relatora ou relator que conduziu o processo de prestação de contas a que ela(ele) se refere;

III - deve ser instruído com todos os dados e documentos previstos no art. 53 desta Resolução utilizando-se, em relação aos dados, o sistema de que trata o art. 54;

IV - não deve ser recebido com efeito suspensivo;

V - deve observar o rito previsto nesta Resolução para o processamento da prestação de contas, no que couber, com a finalidade de verificar:

a) eventual existência de recursos de fontes vedadas;

b) eventual existência de recursos de origem não identificada;

c) ausência de comprovação ou irregularidade na aplicação de recursos oriundos do Fundo Partidário e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC);

d) outras irregularidades de natureza grave.

§ 3º Caso constatada impropriedade ou irregularidade na aplicação dos recursos do Fundo Partidário e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou no recebimento dos recursos de que tratam os arts. 31 e 32 desta Resolução, a candidata ou o candidato ou o órgão partidário e as(os) suas(seus) responsáveis serão intimadas(os) para fins de devolução ao erário, se já não demonstrada a sua realização.

§ 4º Recolhidos os valores mencionados no § 3º deste artigo, ou na ausência de valores a recolher, a autoridade judicial deve decidir sobre o deferimento, ou não, do requerimento apresentado, decidindo pela regularização, ou não, da omissão, aplicando ao órgão partidário e às (aos) suas(seus) responsáveis, quando for o caso, as sanções previstas no § 5º do art. 74 desta Resolução.

§ 5º A situação de inadimplência do órgão partidário ou da candidata ou do candidato somente deve ser levantada após:

I - o efetivo recolhimento dos valores devidos; e

II - o cumprimento das sanções impostas na decisão prevista nos incisos I e II do caput e no § 4º deste artigo.

 

O dispositivo transcrito evidencia que o processamento do pedido de regularização da omissão de prestação de contas exige a realização de análise técnica prévia, destinada à verificação da inexistência de irregularidades materiais graves, como o recebimento de recursos de fontes vedadas, de origem não identificada ou a aplicação irregular de verbas públicas.

Embora a documentação apresentada não tenha atendido integralmente às exigências formais previstas na Resolução, os elementos disponíveis devem ser submetidos à avaliação técnica da Justiça Eleitoral, com consulta aos bancos de dados bancários e financeiros, de modo a instruir o feito com os extratos eletrônicos eventualmente encaminhados à Justiça Eleitoral e com as informações relativas ao recebimento de recursos do Fundo Partidário, do Fundo Especial de Financiamento de Campanhas, de fonte vedada e/ou de origem não identificada, bem como demais dados disponíveis.

Ademais, conforme bem salientado no parecer da Procuradoria Regional Eleitoral:

No caso concreto, consta dos autos extrato da prestação de contas final da agremiação recebida via sistema SPCE (ID 45798334), com movimentação zerada. Assim, e considerando a peculiaridade noticiada, relativa à extinção do órgão partidário devido à fusão entre os partidos PTB e Patriota, cabe a verificação pelo setor técnico a respeito de eventual existência de recursos de fonte vedada, de origem não identificada, e de recebimento de recursos do Fundo Partidário ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, tal qual realizado nas situações análogas, conforme indicado nos anexos do recurso, com base nos extratos eletrônicos disponibilizados pelo TSE.

A execução dos procedimentos técnicos de exame é providência essencial, inclusive, para confirmar o efetivo comprometimento das contas ante os demonstrativos omitidos pelo partido prestador, uma vez que este Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul já reconheceu que a ausência de documentos, quando que não compromete a fiscalização das contas, constitui mera falha formal, conforme se extrai da seguinte ementa:

REQUERIMENTO. REGULARIZAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2019. PARTIDO POLÍTICO . DIRETÓRIO ESTADUAL. AUSÊNCIA DE CONCILIAÇÃO BANCÁRIA E DE REMESSA DA ESCRITURAÇÃO CONTÁBIL. FALHA FORMAL. EXISTÊNCIA DE DOCUMENTOS A DEMONSTRAR A AUSÊNCIA DE MOVIMENTAÇÃO DE RECURSOS . POSSIBILIDADE DE FISCALIZAÇÃO DAS CONTAS ELEITORAIS. AFASTADA A SANÇÃO DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PEDIDO DEFERIDO. 1 . Requerimento de regularização em omissão de contas, relativas ao exercício financeiro de 2019, de diretório estadual de partido político. 2. Informada pelo órgão técnico a ausência de movimentação nas contas bancárias da agremiação e o não recebimento de recursos do Fundo Partidário. Entendimento de que a Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais Previdenciários e de Outras Entidades e Fundos – DCTF, encaminhada pelo partido à Receita Federal, é insuficiente e não substitui a remessa da escrituração contábil . 3. A Escrituração Contábil Digital equivale à versão digital do Livro Diário e Livro Razão e seus auxiliares, os quais devem identificar a) a origem e o valor das doações e contribuições; b) as pessoas físicas com as quais tenha o órgão partidário transacionado, com a indicação do nome e do CPF do doador ou contribuinte, ou do CNPJ, em se tratando de partido político; e c) os gastos de caráter eleitoral, assim considerados aqueles definidos no art. 26 da Lei n. 9 .504/97, bem como o detalhamento de gastos e ingresso de recursos de qualquer natureza. 4. Posicionamento deste Tribunal Regional Eleitoral no sentido de que a ausência de documentos como os da espécie em questão não impede a fiscalização das contas eleitorais. Trata–se, na realidade, de mera falha formal, de modo que, se a falta não constitui motivo para desaprovar as contas, não é razoável, ou proporcional, que seja ela impeditiva na busca da regularidade . Assim, a ausência de conciliação bancária, ou dos demonstrativos referidos, não impede a regularização das contas, tendo em vista que os demais elementos trazidos demonstram a inexistência de movimentação de recursos pelo partido. 5. Pedido deferido. Afastada a sanção de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário .

(TRE-RS - RROPCO: 06002318120236210000 PORTO ALEGRE - RS 060023181, Relator.: Volnei Dos Santos Coelho, Data de Julgamento: 23.07.2024, Data de Publicação: DJE-144, data 26.07.2024.) Grifei.

 

Diante desse cenário, a ausência dos procedimentos técnicos de exame, a cargo da Justiça Eleitoral, inviabiliza o julgamento seguro da regularidade material da prestação de contas, impondo-se, por conseguinte, a anulação da sentença, com retorno dos autos à origem para o adequado saneamento da instrução.

Eventuais questões relacionadas à abertura de conta bancária específica, acaso identificadas, deverão ser apreciadas à luz dos elementos de prova constantes dos autos e da jurisprudência aplicável, sem prejuízo da avaliação técnica quanto à movimentação financeira.

Alinho-me, nesse sentido, ao parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, que, com acerto, apontou a imprescindibilidade da reabertura da instrução para a realização da análise técnica prevista na legislação eleitoral.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo parcial provimento do recurso, para anular a sentença proferida e determinar o retorno dos autos à origem, a fim de que se proceda à reabertura da instrução processual, com a necessária análise técnica e, se for o caso, com a oportunidade de complementação documental pelos recorrentes, nos termos da fundamentação.