RE - 20996 - Sessão: 03/10/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso interposto por FLAVI ALMEIDA DE VARGAS em face da sentença do Juízo da 136ª Zona Eleitoral que desaprovou, com fulcro no art. 68, inc. III, da Resolução TSE n. 23.463/15, a prestação de contas referente à campanha eleitoral de 2016. A desaprovação decorreu da realização de doação no valor de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) sem a observância da transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação, em infringência ao disposto nos arts. 18, § 1º, e 32 da já mencionada resolução. A decisão determinou o recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional.

Em suas razões, o candidato invoca o prequestionamento da matéria constitucional, consistente na ampla defesa. Aduz ter sido o autor do depósito realizado em desacordo com a forma prevista no art. 18, §1º, da Resolução TSE n. 23.463/15. Sustenta ter sido induzido em erro pela instituição financeira, a quem imputa o equívoco da operação bancária. Alega a ausência de má-fé. Requer seja oportunizada a retificação da escrituração, para o fim de registrar a doação, ou, não sendo possível, postula pela devolução da quantia ao doador. Solicita conhecimento e posterior provimento do recurso, a fim de reformar a sentença para aprovar as contas.

Conferida vista à Promotoria de Justiça Eleitoral, que se manifestou pelo regular processamento do recurso interposto.

Nesta instância, os autos foram à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 60-62).

É o breve relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo.

No mérito, as teses da defesa não merecem prosperar. O parecer técnico (fl. 35) identificou irregularidades relativas à forma de arrecadação de recursos financeiros pelo candidato, que, a despeito da obrigatoriedade de realização de transferência eletrônica, foi efetuada por meio de depósito em espécie, infringindo o disposto no art. 18, §1º, da Resolução TSE n. 23.463/15, in verbis:

Art. 18. As pessoas físicas somente poderão fazer doações, inclusive pela Internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços.

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se na hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, na impossibilidade, recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 26. (Grifei.)

Nesse ponto, impende salientar que não merece prosperar a atribuição da responsabilidade à instituição financeira, na medida em que é dever do candidato diligenciar o cumprimento da legislação eleitoral, sobre a qual é defeso arguir o desconhecimento. Outrossim, tendo em vista que a inconsistência refere-se à natureza da operação bancária, e não à sua escrituração, inviável se mostra o pleito de retificação das contas no particular.

Entrementes, ressalvo que o recorrente poderia firmar a verossimilhança de suas alegações a partir da demonstração da origem da doação. Cito a juntada, por exemplo, de extratos da conta-corrente particular com a retirada da referida importância na mesma data, o que não se verificou.

Com efeito, considerando que o depósito em espécie da importância de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), em 24 de agosto de 2016, ultrapassa a quantia de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) e foi utilizado para realizar as despesas de campanha, não é possível deferir a sua devolução ao doador, hipótese apenas admitida quando não utilizada a quantia recebida indevidamente.

Em relação a tal cenário, esta Corte já se posicionou quanto à necessidade do recolhimento total ao Tesouro Nacional. Neste sentido:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPÓSITOS EM ESPÉCIE ACIMA DO LIMITE LEGAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. ART. 18, § 1º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.463/15. ATRIBUIÇÃO DE EFEITOS INFRINGENTES. ACOLHIMENTO. CONTAS DESAPROVADAS. RECOLHIMENTO AO ERÁRIO. ELEIÇÃO 2016.

1. Alegação de omissão e de contradição no acórdão que, por maioria, aprovou as contas de candidato.

2. Omissão no exame da origem da quantia depositada em espécie, R$ 6.050,00, sem a transferência eletrônica exigida para valor igual ou superior a R$ 1.064,10. Acolhimento.

A decisão colegiada procedeu à análise da origem dos recursos impugnados por meio da apreciação dos comprovantes de depósito, que limitam-se a descrever a forma utilizada – em dinheiro - e a identificar o próprio candidato como depositante. Interpretação que nega eficácia ao art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15, ao permitir que as doações sejam dissimuladas por meio do repasse de valores em espécie, posteriormente depositados pelo próprio beneficiário em sua conta de campanha. Declaração de bens do candidato entregue à Justiça Eleitoral demonstrando apenas a propriedade de dois automóveis, inexistente registro de posse de dinheiro em espécie ou em conta bancária.

3. Contradição existente no decisum que considerou regular o depósito em espécie, de R$ 6.050,00, realizado diretamente na conta do candidato. O art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15 não faz distinção entre eleitores e candidatos. Por tratar-se de modalidade de doação de pessoa física, valores repassados pelo próprio candidato à sua campanha também devem observar a exigência normativa de transferência eletrônica. A finalidade é justamente coibir a possibilidade de manipulações e transações transversas que ocultem ou dissimulem eventuais ilicitudes, como a utilização de fontes vedadas de recursos e a desobediência aos limites de doação. Irregularidade que representa 78% do total da arrecadação e transcende em mais de 5 (cinco) vezes o valor de referência a partir do qual a disciplina legal afirma a compulsoriedade de transferência eletrônica. Falha grave, que repercute na confiabilidade das informações e impede a efetiva fiscalização das contas ofertadas.

4. Embargos acolhidos. Atribuição de efeitos infringentes. Contas desaprovadas. Recolhimento de R$ 6.050,00 ao Tesouro Nacional.

(E.Dcl. no RE 203-27.2016.6.21.0092, Relator Des. Jorge Luís Dall'Agnol, Sessão de 26.07.17.)

 

De outra banda, não há se cogitar a aplicação do princípio da razoabilidade e considerar a ausência de má-fé do recorrente para o fim de relevar a irregularidade apontada, tendo em vista que a quantia impugnada representa 83,33% dos gastos da campanha.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo a desaprovação das contas de FLAVI ALMEIDA DE VARGAS referentes à campanha eleitoral de 2016 e a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da importância de R$ 2.500,00.