RE - 25755 - Sessão: 03/10/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por JEFERSON PEREIRA DE OLIVEIRA (fls. 53-59), concorrente ao cargo de vereador no Município de Caxias do Sul, contra sentença do Juízo da 136ª Zona Eleitoral que desaprovou as contas referentes às eleições municipais de 2016 (fls. 47-49), tendo em vista o depósito de R$ 1.150,00 na conta de campanha, sem a observância da transferência eletrônica estabelecida pelo art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Em suas razões recursais, alegou que a falha representa mero equívoco formal, incapaz de prejudicar a confiabilidade das contas. Requereu a aprovação das contas ou, subsidiariamente, que os valores sejam devolvidos à pessoa física do doador.

Foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 65-67v.).

É o breve relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo (fls. 51-53) e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão porque dele conheço.

Cuida-se de prestação de contas apresentada por JEFERSON PEREIRA DE OLIVEIRA, candidato ao cargo de vereador no pleito de 2016, no Município de Caxias do Sul.

O juízo de primeiro grau desaprovou a contabilidade em razão de um depósito realizado, no valor de R$ 1.150,00, sem observar a determinação de transferência eletrônica prevista no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15 para valores acima de R$ 1.064,10.

O art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15 assim dispõe:

As pessoas físicas somente poderão fazer doações, inclusive pela Internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços.

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se na hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, na impossibilidade, recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 26. (Grifei.)

Como visto, a partir do patamar de R$ 1.064,10 o depósito deve ser realizado por meio de transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário.

No caso, os extratos trazidos aos autos demonstram inequivocamente que a conta de campanha do recorrente recebeu aporte financeiro consubstanciado em depósito em dinheiro no valor de R$ 1.150,00 (fl. 27).

Oportunizada manifestação pelo juízo de origem, o candidato informou tratar-se de recursos próprios alocados na campanha ao arrepio da lei por simples equívoco.

Assim, incontroverso que o candidato depositou em sua conta de campanha valores, em espécie, superiores ao limite máximo fixado na Resolução TSE n. 23.463/15. Incontestável também que tais valores foram efetivamente utilizados na campanha do recorrente, conforme comprova o extrato da movimentação financeira que integra a prestação de contas (fls. 03-04).

No entanto, não foi possível a identificação da origem mediata da doação, não tendo sido acostado elemento probatório nesse sentido, como ocorreria, por exemplo, com a demonstração de que os recursos advieram da conta-corrente da pessoa física do candidato.

Nesse cenário, não desconheço que a exigência normativa de que as doações de campanha, mesmo que provenientes do próprio candidato, sejam feitas por meio de transferência eletrônica, visa coibir a possibilidade de manipulações e transações ilícitas, como a utilização de fontes vedadas de recursos e a desobediência aos limites de doação.

Ocorre que se está diante de um valor irrisório de R$ 1.150,00. O montante é consideravelmente próximo daquele de R$ 1.064,10 (a diferença é de R$ 85,90), utilizado na Resolução TSE n. 23.463/15 como parâmetro até o qual é afastada a compulsoriedade da utilização da transferência eletrônica para doações de campanha (art. 18, § 1º) e permitido o gasto pessoal de apoiamento pelo eleitor, independentemente de contabilização (art. 39, caput).

Trata-se, portanto, de cifra referencial para o estabelecimento da modicidade em matéria de gastos eleitorais, apta a excepcionar, inclusive, preceitos gerais cogentes afetos à movimentação de recursos em campanha e passível de ser utilizada analogicamente como paradigma de insignificância de valores que não comprometem a regularidade da contabilidade.

Nessa linha, trago o seguinte julgado desta Corte em caso análogo, da lavra do Dr. Eduardo Augusto Dias Bainy:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. MODALIDADE SIMPLIFICADA. CANDIDATO. VEREADOR. DOAÇÃO ESTIMÁVEL EM DINHEIRO. ADESIVOS. COMBUSTÍVEIS. LUBRIFICANTES. PRODUTO DO PRÓPRIO SERVIÇO, DA ATIVIDADE ECONÔMICA OU DO PATRIMÔNIO DO DOADOR. INFRINGÊNCIA. SISTEMA SIMPLIFICADO. DOCUMENTOS. BOA-FÉ. TRANSPARÊNCIA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO. ELEIÇÕES 2016.

As doações estimáveis em dinheiro devem ser acompanhadas de provas de se tratar de serviço prestado pelo doador ou bem de seu patrimônio, por força do disposto no art. 18, inc. II, da Resolução TSE n. 23.463/2015. Realizada doação, pela própria candidata, de adesivos, combustíveis e lubrificantes, sem que tais bens constituíssem produto ou serviço da atividade econômica da doadora, em descompasso com o art. 19, caput, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Impacto percentual da irregularidade mitigado pela modalidade simplificada da prestação das contas. Sistema adotado para movimentações financeiras que correspondam a, no máximo, vinte mil reais. Apresentação de documentos e esclarecimentos sobre as transações financeiras em campanha. Inexistência de indício de má-fé a revelar a transparência da contabilidade apresentada. Aprovação com ressalvas.

Provimento.

(TRE/RS – RE 244-40 – Rel. Dr. EDUARDO AUGUSTO DIAS BAINY – j. Sessão de 19.7.2017)

Conforme se retira desse julgado, “a própria evolução normativa, em direção à prestação de contas simplificada, espelha o fato de que muitas candidaturas são conduzidas de maneira extremamente simples, comunitária, com a ajuda das pessoas próximas, como o caso dos autos: trata-se de candidata que colocou seu nome à disposição do eleitorado com poucos recursos, cujo manejo, ainda que destituído da estrita observância dos procedimentos formais, é, a priori, incapaz de prejudicar a fiscalização da Justiça Eleitoral ou comprometer a normalidade do pleito”.

E prossegue o digno relator do recurso em referência, cujos fundamentos incorporo às minhas razões de decidir:

Na mesma senda, o Tribunal Superior Eleitoral sufraga o entendimento de que, na análise das prestações de contas, admissível a aplicação dos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade diante da exiguidade dos valores envolvidos em termos absolutos e da ausência de comprovada má-fé. Destaco as seguintes ementas:

ELEIÇÕES 2012. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. IRREGULARIDADES. VALOR ABSOLUTO DIMINUTO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. POSSIBILIDADE.

1. Voto da minoria no sentido de aplicar ao caso as súmulas 211 e 7 do STJ e 282 do STF.

2. Maioria formada no sentido de que os valores absolutos das irregularidades registradas no acórdão regional, - R$ 50,00, R$ 51,10 e R$ 225,00 - permitem a análise do recurso especial e justificam, no caso, a aprovação das contas, com ressalvas, em face da aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade que têm sido admitidos pelo Tribunal Superior Eleitoral nos processos de prestação de contas.

Agravo regimental, agravo e recurso especial providos para reformar o acórdão regional e julgar as contas aprovadas, com ressalva.

(Agravo de Instrumento n. 102663, Acórdão, Relatora Min. Maria Thereza Rocha de Assis Moura, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Volume , Tomo 216, Data 16.11.2015, Página 126-127.)

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. CAMPANHA ELEITORAL DE 2012. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Na linha da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, uma vez constatadas falhas formais e materiais que, em seu conjunto, não prejudicam a análise das contas, não revelam a má-fé do partido e alcançam valores absolutos e relativos ínfimos, é possível a aprovação com ressalvas, nos termos do art. 30, § 2º, da Lei nº 9.504/97.

2. As falhas constatadas alcançaram o montante de 1,58% dos recursos arrecadados na campanha, o que permite a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Precedentes: PC nº 3880-45, de minha relatoria, DJe de 27.8.2014; AgR-AI nº 7327-56, rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 11.10.2013.

Prestação de contas aprovada com ressalvas.

(Prestação de Contas n. 130241, Acórdão, Relator Min. Henrique Neves da Silva, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 115, Data 19.6.2015, Página 11.)

RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2008. VEREADOR. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. DOAÇÃO ESTIMÁVEL EM DINHEIRO. SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. AUSÊNCIA DE EMISSÃO DE RECIBO ELEITORAL. CONTROLE DAS CONTAS. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. APROVAÇÃO DAS CONTAS COM RESSALVAS.

1. Na espécie, a recorrida recebeu doação estimável em dinheiro - consistente na prestação de serviços advocatícios - e não emitiu o recibo eleitoral correspondente.

2. "Muito embora os serviços advocatícios não tenham relação direta com a divulgação da campanha política, constituem ato acessório a esse fim e, por isso, configuram gasto eleitoral que exige a emissão do respectivo recibo e sua contabilização na prestação de contas" (REspe 38875/MG, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado na sessão de 11.11.2014).

3. O Tribunal Superior Eleitoral já assentou o entendimento de que a ausência de emissão de recibo eleitoral na prestação de contas caracteriza-se como irregularidade insanável, pois impossibilita o efetivo controle das contas por parte da Justiça Eleitoral. Precedentes.

4. Apesar de representar a totalidade dos recursos arrecadados na campanha, o valor diminuto em termos absolutos - qual seja R$ 800,00 (oitocentos reais) - justifica a aplicação na espécie dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas.

5. Recurso especial desprovido.

(Recurso Especial Eleitoral n. 956112741, Acórdão, Relator Min. João Otávio de Noronha, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 42, Data 04.3.2015, Página 215.)

Lembro, ainda, que na sessão de 23.3.2017, este Plenário julgou o Recurso Eleitoral n. 80-91, cuja relatoria foi do Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz. Muito embora naquele caso a campanha tenha alcançado valor maior (R$ 51.360,83), e a irregularidade sob exame também tenha sido de superior monta (R$ 1.650,00), houve passagem do voto condutor que se ajusta ao caso dos autos, no sentido de que a Corte deve se ater ao valor nominal envolvido, e considerar “os vetores da razoabilidade e da proporcionalidade e a ausência de má-fé”. O referido precedente restou assim ementado:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Bens ou serviços estimáveis em dinheiro. Art. 68, inc. III, da Resolução TSE n. 23.463/15. Eleições 2016.

Os bens ou serviços estimáveis em dinheiro doados por pessoas físicas e jurídicas devem constituir produto de seu próprio serviço ou de sua atividade econômica, segundo art. 19 da Resolução TSE n. 23.463/15. Doação em desconformidade com o citado regramento. Considerando o valor doado de pequena monta, e a identificação do doador por meio do recibo apresentado, plausível fazer uso dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas.

Provimento.

(Prestação de Contas n. 8091, Acórdão de 23.3.2017, Relator Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, unânime.)

(Grifei.)

Ainda, na mesma linha, trago o seguinte precedente desta Casa:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Doação estimável em dinheiro. Resolução TSE n. 23.463/15. Eleições 2016. Doação financeira realizada pelo próprio candidato por meio de depósito bancário, contrariando o disposto na Resolução TSE n. 23.463/15, que exige transferência eletrônica. Irregularidade que não impediu a identificação da fonte de financiamento da campanha eleitoral, restando atendida a finalidade da norma.

Ausência de registro de doação ou cessão de veículo automotor, pertencente ao próprio candidato. Irregularidade formal que não prejudica a fiscalização da contabilidade.

Recebimento de recurso estimável em dinheiro – adesivos – sem comprovação de que constitui produto do próprio serviço do doador. Falha que representa percentual insignificante, não comprometendo a confiabilidade das contas.

Aplicação do princípio da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas. Provimento.

(TRE/RS – RE 74-84 – Rel. DR. LUCIANO ANDRÉ LOSEKANN – J. Sessão de 5.4.2017)

Igualmente no RE n. 545-59, também da lavra do Dr. Luciano André Losekann e julgado em 20.6.2017, em caso com fato idêntico ao destes autos, observa-se a mesma linha de raciocínio, verbis:

No tocante à doação de R$ 1.100,00, resultante da contribuição de Karin Crescencio da Luz, tem-se que a cifra é diminuta e ultrapassa em modestos R$ 36,00 aquela de R$ 1.064,10, utilizada pela Resolução TSE n. 23.463/15 como parâmetro até o qual é afastada a compulsoriedade da utilização da transferência eletrônica para doações de campanha (art. 18, § 1º).

Entendo que a substancial proximidade com o valor referencial aduzido autoriza que se admita a insignificância da transação, em atendimento material à inteligência da mencionada faculdade normativa, eis que o extrapolamento em questão não é apto a ocasionar maior comprometimento à lisura e regularidade das contas.

Nesse trilhar, remanesceria a impropriedade referente à realização de doação por meio de transação bancária com incorreta identificação do CPF da pessoa física doadora, conforme estipula o art. 18, inc. I, da Resolução TSE n. 23.463/15. Contudo, a recorrente fez a oferta oportuna de todos os documentos e esclarecimentos solicitados ao conhecimento de suas operações financeiras, consoante alhures referido, não havendo indícios de má-fé na elaboração de suas contas.

Desse modo, muito embora o impacto percentual da presente irregularidade nas contas seja da ordem de 25% (vinte e cinco por cento) do total de receitas (R$ 4.259,38), tenho que tal falha deve ser considerada meramente formal, diante dos saneamentos efetivados e da insignificância da cifra, eis que incapaz de comprometer a confiabilidade do balanço contábil.

(Grifei.)

Por fim, anoto que o recorrente fez a oferta oportuna dos documentos e esclarecimentos solicitados ao conhecimento de suas transações financeiras em campanha, não havendo indício de má-fé na elaboração de suas contas. Ademais, houve a identificação do doador por seu CPF no momento do depósito (fl. 27).

Considerando o valor excedente ao permitido pela legislação de regência, a falha abrange apenas 3,1% do somatório de recursos financeiros arrecadados (R$ 2.750,00), e muito embora a quantia total objeto do depósito aproxime-se de 40% da totalidade das receitas, tenho que as contas merecem aprovação com ressalvas, sobremodo em se tratando de prestação de contas sob o rito simplificado e com diminuta movimentação total, incapaz de comprometer a confiabilidade das contas.

Logo, dentro desse contexto, tenho que as contas mereçam ser aprovadas com ressalvas.

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso interposto por JEFERSON PEREIRA DE OLIVEIRA, para aprovar com ressalvas as contas relativas ao pleito de 2016 em Caxias do Sul, com fulcro no art. 68, inc. II, da Resolução TSE n. 23.463/15.