INQ - 5248 - Sessão: 12/11/2018 às 18:00

RELATÓRIO

Trata-se de inquérito policial instaurado para apurar hipotética prática do delito de corrupção eleitoral, previsto no art. 299 do Código Eleitoral, supostamente praticado por AFFONSO FLAVIO ANGST, então candidato a Prefeito de Arroio do Sal, e JORGE ANTONIO SILVEIRA DOS SANTOS, coordenador da campanha eleitoral.

A eventual prática do crime de corrupção eleitoral teria ocorrido no dia 06.10.2012, por volta das 16h30min, no posto de combustível Primeiro, em Arroio do Sal, ocasião em que foram abastecidos veículos mediante a apresentação de autorizações numeradas e controladas pelo então candidato a Prefeito, com o auxílio de seu coordenador de campanha.

A autoridade policial apresentou relatório sem indiciamento (fls. 57-60). Em seguida, sobreveio aos autos promoção do Ministério Público Eleitoral requerendo o declínio da competência a este Tribunal, em face de o candidato investigado ter sido alçado à Chefia do Executivo Municipal (fl. 63).

O magistrado a quo acolheu a manifestação ministerial (fl. 64) e remeteu o inquérito a este Tribunal.

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral, com vista dos autos, requereu a fixação da competência originária e a remessa dos autos à Secretaria de Controle Interno e Auditoria (SCI) para efetuar diligência (fl. 68-68v.).

Em decisão de 17.5.2017 (fl. 70), foi fixada a competência originária desta Corte para o processamento e julgamento de eventual ação penal, em razão da garantia àquele agente público de foro especial por prerrogativa de função.

Com nova vista, a Procuradoria Regional Eleitoral requisitou a continuidade das investigações, mediante a reinquirição dos investigados, a fim de se apurar possível conduta prevista no art. 350 do Código Eleitoral (fls. 81-82).

Realizada a diligência pela Polícia Federal, esta procedeu ao indiciamento, em 03.7.2018, de AFFONSO FLAVIO ANGST como incurso no delito tipificado no art. 350 do Código Eleitoral, em virtude de omissão de valores gastos em campanha eleitoral, sem o devido lançamento na respectiva prestação de contas encaminhada à Justiça Eleitoral (fl.91).

Na sequência, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo declínio de competência ao Juízo da 85ª Zona Eleitoral – Torres, com esteio na recente interpretação restritiva conferida pelo Supremo Tribunal Federal ao foro por prerrogativa de função, por ocasião do julgamento da Ação Penal n. 937 (fls. 103-108v.).

É o relatório.

VOTO

Nos termos do art. 29, inc. X, da Constituição Federal, a competência originária para processamento e julgamento de ação penal em razão dos fatos apurados nos presentes autos seria deste Tribunal, pois o indiciado ocupa o cargo de Prefeito do Município de Arroio do Sal.

Ocorre que, em recente decisão, por maioria, o Supremo Tribunal Federal assentou nova interpretação a respeito do tema, a fim de restringir a aplicação do foro por prerrogativa de função apenas aos delitos praticados no exercício do cargo e com pertinência às funções exercidas, ressalvadas as hipóteses em que, encerrada a instrução processual, o feito se encontre em fase de alegações finais.

A nova compreensão fundamenta-se nas disfuncionalidades verificadas na conformação atual do instituto, que foi concebido como uma garantia em razão da relevância do cargo ou da função desempenhada, a fim de se resguardar a liberdade e a independência de atuação dos agentes, não ostentando caráter pessoal.

Todavia, o Pretório Excelso observou que a aplicação ampla da prerrogativa, a par de afastar os tribunais de sua função precípua, ocasiona a morosidade da prestação jurisdicional, notadamente em relação aos processos com tramitação no âmbito daquela Corte. Ademais, acarreta restrição ao princípio do duplo grau de jurisdição, em decorrência da supressão da análise das ações por instâncias inferiores.

Com efeito, em que pese à decisão tenha sido proferida para o cargo de deputado federal, pondero que o referido posicionamento passou a ser adotado em diversos tribunais, em homenagem aos princípios da isonomia e da simetria.

Nesse sentido, destaco os seguintes precedentes deste Regional:

INQUÉRITO POLICIAL. SUPOSTA PRÁTICA DOS DELITOS TIPIFICADOS NOS ARTS. 324, 325 E 326, C/C 327, INC. III, E ART. 350, TODOS DO CÓDIGO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2016. PREFEITO. PRERROGATIVA DE FORO. NOVA INTERPRETAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. LIMITAÇÃO AO EXERCÍCIO DO CARGO. DECLÍNIO DE COMPETÊNCIA.

O Supremo Tribunal Federal assentou nova interpretação para restringir a aplicação do foro por prerrogativa de função apenas aos delitos praticados no exercício do cargo e com pertinência com as funções exercidas. Investigação por suposta prática de crimes em período anterior à assunção ao cargo de prefeito. Acolhimento da preliminar ministerial. Insubsistência da competência criminal originária por prerrogativa de foro.

Declínio da competência.

(TRE-RS, INQ n. 83-32.2017.6.21.0000, relator Des. Eleitoral EDUARDO AUGUSTO DIAS BAINY, sessão de 11.10.2018)

INQUÉRITO. CRIME ELEITORAL. ART. 324 DO CÓDIGO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2016. NOVO ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PRERROGATIVA DE FORO. LIMITAÇÃO AO EXERCÍCIO DO CARGO. CANDIDATO AO CARGO DE PREFEITO NA ÉPOCA DO FATO. DECLÍNIO DE COMPETÊNCIA.

Suposta prática de crime durante debate eleitoral que antecedeu ao pleito, período em que o investigado detinha apenas a condição de candidato ao cargo de prefeito. Novo posicionamento do Supremo Tribunal Federal no sentido de limitar o foro por prerrogativa de função às hipóteses em que a prática delitiva ocorrer no exercício do cargo e em decorrência de suas atribuições. Alinhamento deste Tribunal à nova interpretação. Não subsiste a competência originária criminal desta Corte, reconhecida ao juízo eleitoral de primeiro grau. Acolhida a promoção ministerial.

(TRE-RS, RE n. 3-33.2018.6.21.0162, relator Des. Eleitoral JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, sessão de 25.9.2018.)

No caso dos autos, destaca-se que, conquanto o indiciado ocupe o cargo de Prefeito do Município de Arroio do Sal, os fatos objeto da investigação, consistentes na inserção de informações inverídicas na prestação de contas, ocorreram no contexto da campanha ao pleito de 2012, não havendo pertinência alguma com o atual mandato, para o qual foi reeleito em 2016.

Por esse motivo, não é competente este Tribunal para processar e julgar originariamente o Prefeito AFFONSO FLAVIO ANGST pelos fatos objeto do presente inquérito.

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo acolhimento da promoção ministerial, declinando da competência ao Juízo da 85ª Zona Eleitoral – Torres, a fim de que, encaminhados os autos ao Promotor Eleitoral oficiante, adote as medidas que entender cabíveis.