RE - 35867 - Sessão: 04/12/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por GIAN ANTÔNIO PEDROSO contra a sentença que desaprovou sua prestação de contas, referente às eleições municipais de 2016 para o cargo de vereador, em razão das seguintes irregularidades: a) recebimento de recursos de origem não identificada, no valor de R$ 122,00; b) divergências entre os dados dos doadores registrados na contabilidade dos constantes na base de dados da Secretaria da Receita Federal do Brasil; c) falta de escrituração de doações recebidas pelo candidato nas contas dos doadores, que totalizaram a quantia de R$ 340,00; d) ausência de comprovação de que os veículos e o imóvel cedidos para campanha integram o patrimônio dos respectivos doadores; e e) recebimento de recursos provenientes de pessoa que não tem capacidade econômica para realizar doação. Além disso, a decisão determinou a devolução ao doador ou, na impossibilidade de identificação, o recolhimento ao Tesouro Nacional, da quantia de R$ 122,00 (fls. 93-94).

Em suas razões recursais, esclarece que os recursos considerados como sendo de origem não identificada são provenientes de doação de adesivos digitais realizada pelo candidato a prefeito. Informa ter corrigido as divergências apontadas por meio da prestação de contas retificadora. Alega ter demonstrado na contabilidade a propriedade dos bens cedidos para campanha. Argumenta que a doação recebida de pessoa que não tem capacidade econômica é estimável em dinheiro, e não financeira. Requer a reabertura da instrução processual. Subsidiariamente, pugna pela reforma da sentença, para aprovar as contas com ressalvas. Junta novos documentos (fls. 97-100).

Foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou, preliminarmente, pela desconsideração dos novos documentos apresentados com o recurso. No mérito, manifestou-se pelo desprovimento do apelo (fls. 107-110v).

É o breve relatório.

 

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

A preliminar relativa ao não conhecimento dos novos documentos apresentados pelo recorrente merece rejeição.

No âmbito dos processos de prestação de contas - expedientes que têm preponderante natureza declaratória e possuem como parte apenas o prestador - este Tribunal, sempre com ressalvas apresentadas pela douta Procuradoria Regional Eleitoral, tem concluído, em casos excepcionais, pela aceitação de novos documentos, acostados com a peça recursal e não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, quando sua simples leitura pode sanar irregularidades e não há necessidade de nova análise técnica.

Potencializa-se o direito de defesa, especialmente quando a juntada da nova documentação mostra capacidade de influenciar positivamente no exame da contabilidade, de forma a prestigiar a conclusão pela retidão na aplicação de recursos e realização de despesas.

Assim, rejeito a preliminar e conheço dos novos documentos juntados com a peça recursal.

No mérito, as contas foram desaprovadas em razão das seguintes irregularidades: a) recebimento de recursos de origem não identificada, no valor de R$ 122,00; b) divergências entre os dados dos doadores registrados na contabilidade dos constantes na base de dados da Secretaria da Receita Federal do Brasil; c) falta de escrituração de doações recebidas pelo candidato nas contas dos doadores, que totalizaram a quantia de R$ 340,00; d) ausência de comprovação de que os veículos e o imóvel cedidos para campanha integram o patrimônio dos respectivos doadores; e e) recebimento de recursos provenientes de pessoa que não tem capacidade econômica para realizar a doação.

Passo a análise de cada um dos apontamentos.

Inicialmente, a respeito do recebimento de recursos de origem não identificada, na quantia de R$ 122,00, observo que o candidato, na ocasião da apresentação das contas, juntou recibo eleitoral e nota fiscal que comprovam a liceidade do recurso (fl. 68), tratando-se de material gráfico doado pelo candidato a prefeito.

Em relação à arrecadação de recursos na campanha entre candidatos e partidos políticos, o art. 19, §2º, da Resolução TSE n. 23.463/15, dispõe:

Art. 19. Os bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro doados por pessoas físicas devem constituir produto de seu próprio serviço, de suas atividades econômicas e, no caso dos bens, devem integrar seu patrimônio.

[...]

§ 2º Partidos políticos e candidatos podem doar entre si bens próprios ou serviços estimáveis em dinheiro, ou ceder seu uso, ainda que não constituam produto de seus próprios serviços ou de suas atividades. (Grifei.)

Consoante de extrai da disposição normativa, não se exige que o objeto da doação integre o patrimônio do doador ou constitua produto de seus próprios serviços quando a transferência de recursos é realizada entre candidatos ou partidos políticos.

Desse modo, não se verifica irregularidade na arrecadação da quantia, cuja origem restou devidamente demonstrada. Consequentemente, deve ser afastada a determinação de recolhimento do valor ao Tesouro Nacional.

A respeito das divergências entre os dados dos doadores registrados na contabilidade dos constantes na base de dados da Secretaria da Receita Federal do Brasil, constato que as inconsistências apontadas referem-se a erros materiais irrelevantes, atribuídos à grafia incorreta dos nomes dos doadores (fls. 63 e 89v.).

Portanto, a falta não interfere no exame das contas, tampouco atesta em desfavor de sua confiabilidade, razão pelo qual entendo como superada, com arrimo no art. 69 da Resolução TSE n. 23.463/15, que dispõe:

Art. 69. Erros formais e materiais corrigidos ou tidos como irrelevantes no conjunto da prestação de contas não ensejam sua desaprovação e aplicação de sanção.

Quanto à escrituração de doações, que totalizaram a quantia de R$ 340,00, recebidas de outros prestadores e não contabilizadas nas respectivas contas, constato que as notas fiscais juntadas às fls. 68-70 comprovam a origem dos aludidos recursos, atingindo o fim colimado pelo batimento.

Assim, a ausência de contabilização pelos doadores dos recursos não tem o condão de refletir negativamente nas contas do recorrente, sob pena de se admitir a responsabilização reflexa, a despeito de qualquer previsão normativa.

Por isso, não subsiste a inconsistência apontada.

Na sequência, a sentença apontou a falha relativa à ausência de comprovação de que os veículos e o imóvel cedidos para uso na campanha integram o patrimônio dos respectivos doadores.

De acordo com o art. 23, § 2º c/c o art. 28, § 6º, I, da Lei n. 9.504/97, com as alterações trazidas pela Lei n. 13.165/15, ficam dispensadas de comprovação as receitas provenientes da cessão de bens móveis, limitada ao valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) por pessoa cedente:

Art. 23. Pessoas físicas poderão fazer doações em dinheiro ou estimáveis em dinheiro para campanhas eleitorais, obedecido o disposto nesta Lei.

[…]

§ 2º As doações estimáveis em dinheiro a candidato específico, comitê ou partido deverão ser feitas mediante recibo, assinado pelo doador, exceto na hipótese prevista no § 6o do art. 28. (Redação dada pela Lei n. 12.891, de 2013)

[…]

Art. 28. A prestação de contas será feita:

[…]

§ 6o Ficam também dispensadas de comprovação na prestação de contas:(Incluído pela Lei n. 12.891, de 2013)

I - a cessão de bens móveis, limitada ao valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) por pessoa cedente; (Incluído pela Lei n. 12.891, de 2013)

A regra está reproduzida no art. 55, § 3º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.463/15, merecendo transcrição os precedentes que determinam sua aplicação:

Eleições 2016. Recurso eleitoral. Prestação de contas de candidato. Omissão de despesa não caracterizada. Doação entre candidatos. Cessão de veículo. Elevado gasto com combustível. Despesa de valor ínfimo. Contas aprovadas com ressalvas. Recurso provido.

I - Doações estimáveis devidamente identificadas atingem a finalidade da norma eleitoral, qual seja a identificação da origem e do destino dos recursos arrecadados durante a campanha.

II - Ficam dispensadas de comprovação as receitas provenientes da cessão de bens móveis, limitada ao valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) por pessoa cedente, segundo o art. 23, §2º c/c o art. 28, §6º, I, da Lei n. 9.504/97, com as alterações trazidas pela Lei n. 13.165/2015.

[...]

V - Contas aprovadas com ressalvas. Recurso conhecido e no mérito, provido.

(TRE-RO, RECURSO ELEITORAL n 47397, ACÓRDÃO n 136/2017 de 29.5.2017, Relatora ANDRÉA CRISTINA NOGUEIRA, Publicação: DJE/TRE-RO - Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral, Tomo 98, Data 01.6.2017, Página 4/5.) (Grifei.)

Recurso Eleitoral. Prestação de contas de campanha. Candidato a Vereador. Eleições 2016. Desaprovação.I - Apesar de algumas das irregularidades terem ocorrido apenas no âmbito da prestação de contas parcial (alíneas "a" e "b"), outras persistiram até mesmo com o encerramento da campanha eleitoral, como foi o caso da falta de comprovação da cessão do veículo em que utilizado o combustível declarado (alínea "c"), cuja regularização se deu somente antes de prolatada a sentença, após o prazo determinado pela legislação (fls. 106/108).II - Mais grave que isso é a ausência de registros na prestação de contas dos recursos estimáveis arrecadados (alínea "d"), sob a justificativa de que a legislação dispensou a emissão de recibos eleitorais para a cessão de bens móveis até o valor de R$ 4.000,00. Nesse ponto, ainda que se tratasse da cessão de bens móveis, a dispensa da emissão dos recibos não afasta, por exigência do §4º do mesmo dispositivo legal, a obrigatoriedade de serem registrados na prestação de contas os valores das operações em questão.(…)

(TRE-RJ, RECURSO ELEITORAL n 19556, ACÓRDÃO de 21/06/2017, Relator ANTONIO AURÉLIO ABI RAMIA DUARTE, Publicação: DJERJ – Diário da Justiça Eletrônico do TRE-RJ, Tomo 172, Data 28.6.2017, Página 15/26.) (Grifei.)

Na situação dos autos, ainda que dispensada a comprovação da cessão, verifico que o prestador juntou na ocasião da apresentação das contas os recibos eleitorais e o comprovante de propriedade de um dos veículos – placa IDR 1415 (fl. 65). Quanto ao outro, placa IFB 4724, o documento do automóvel foi juntado com as razões recursais (fl. 102).

Entrementes, no tocante ao bem imóvel, observo que o prestador apenas apresentou o termo de cessão e o recibo eleitoral (fls. 81-82), não comprovando a propriedade do bem. Saliento, nesse caso, que a norma eleitoral não dispensa a aludida demonstração.

Ocorre que a falta de apresentação do documento, por si só, não se reveste de potencialidade para interferir no exame das contas, tampouco malfere a sua transparência e confiabilidade.

Isso porque não se contesta a veracidade da declaração firmada pelo cedente, além de inexistir sinalização quanto ao recebimento de recursos oriundos de fonte vedada.

Logo, considerando que a irregularidade representa apenas 3,83% dos recursos arrecadados da campanha, não se revela proporcional e razoável o juízo de desaprovação das contas, razão pela qual considero a falha como uma ressalva na escrituração.

Nesse sentido, colaciono recente julgado desta Corte:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Bens ou serviços estimáveis em dinheiro. Art. 19 da Resolução TSE n. 23.463/15. Eleições 2016.

Os bens ou serviços estimáveis em dinheiro doados por pessoas físicas e jurídicas devem constituir produto de seu próprio serviço ou de sua atividade econômica. Doação em desconformidade com o citado regramento. Considerando o valor doado de pequena monta, e a possibilidade de identificação do doador, plausível fazer uso dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas.

Provimento parcial.

(RE n. 151-23.2016.6.21.0127. Rel. Desembargador Paulo Afonso Brum Vaz. Julgado em 11.05.2017, unânime).

Por fim, quanto ao recebimento de recursos provenientes de pessoa que não tem capacidade econômica, verifico que o objeto da doação em exame consiste na cessão de uso de veículo na campanha, que representa receita estimável em dinheiro (fls. 79 e 102).

Nesse caso, assiste razão ao argumento do prestador no sentido de que não se reveste de juridicidade a aferição da capacidade econômica na hipótese de o recurso não ser em pecúnia, pois a ratio essendi da exigência apenas se justifica para certificar a real autoria da doação, que, na situação dos autos, resta demonstrada com o comprovante de propriedade do bem cedido para campanha.

Colho, em relação ao tema, o seguinte precedente:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Arrecadação e gastos de recursos em campanha eleitoral. Resolução TSE n. 23.463/15. Eleições 2016.

Recebimento de recursos de beneficiários do programa “Bolsa Família” e utilização de recursos próprios considerados, pelo magistrado de piso, incompatíveis com os rendimentos do candidato. Desaprovação na origem.

Preliminar de nulidade da sentença afastada. Prestação apresentada de acordo com o rito simplificado, previsto no art. 28. § 9º, da Lei n. 9.504/97. Não providenciado, pelo julgador originário, a diligência estampada no art. 2º, § 2º, da Instrução Normativa TSE n. 18/16, que permite ao juiz a requisição de informações a candidatos, partidos políticos, doadores, fornecedores e a terceiros, quando existentes indícios de irregularidades na campanha eleitoral. Juntada de farta documentação em grau recursal. Não identificada irregularidade atribuída ao prestador de contas, é possível apreciá-las, sem necessidade de conversão do rito em ordinário ou a realização de novas diligências.

Parecer técnico pela aprovação das contas e manifestação ministerial de piso pela aprovação com ressalvas. Demonstrado que as doações estão discriminadas como “receitas estimáveis em dinheiro", decorrentes da cessão de bens móveis. Emissão dos recibos eleitorais e dos respectivos instrumentos de cessão, bem como comprovadas as suas propriedades por meio dos certificados de registro e licenciamento de veículo. Atendidos os requisitos do art. 18, inc. II, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Eventual fraude no recebimento de verbas sociais pelos doadores deve ser apurada na esfera competente, sem repercussão na análise da regularidade das contas ora em apreciação. Ausentes elementos nos autos a demonstrar falta de capacidade econômica do candidato prestador, não se pode presumir que os recursos próprios utilizados são incompatíveis com os respectivos rendimentos. Aprovação das contas.

Provimento.

(Recurso Eleitoral n 26748, ACÓRDÃO de 16.02.2017, Relator(a) DES. CARLOS CINI MARCHIONATTI, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 29, Data 20.02.2017, Página 4 )

Dessarte, as falhas apontadas não se revestem de gravidade. Ademais, afasta-se a conclusão pela existência de recursos de origem não identificada e a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

Ante o exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso para aprovar as contas com ressalvas e afastar a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.