RE - 39594 - Sessão: 08/11/2017 às 16:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por ANDREA CRISTINA DE OLIVEIRA contra a sentença que desaprovou sua prestação de contas relativa à campanha eleitoral de 2016 para o cargo de vereador. O juízo de origem entendeu caracterizado o recebimento de recursos de origem não identificada, no tocante à cessão ou à locação de veículo, no valor de R$ 1.000,00, e de divergência entre a conta bancária declarada na prestação de contas e aquela identificada nos extratos eletrônicos (fl. 15 e v.).

Em suas razões (fls. 18-22), sustenta que o veículo utilizado na campanha era de sua propriedade, e indica o art. 28, § 6o, inc. I, da Lei n. 9.504/97, dispositivo que dispensa a comprovação de cessão de bens móveis até o valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) por cedente. Aduz não ter havido observância ao princípio da economia processual, ao não ter sido intimada para apresentar esclarecimentos, e afirma que as intimações realizadas por intermédio do mural eletrônico prejudicaram os procuradores nas eleições de 2016. Postula a reforma da sentença para que sejam aprovadas as contas.

Nesta instância, a Procuradoria Regional opinou, preliminarmente, pela nulidade da sentença, a fim de que seja determinada, pelo juízo de origem, o recolhimento dos valores pertinentes às doações de bens estimáveis em dinheiro, considerados de origem não identificada. No mérito, manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 30-35).

Foi oportunizada a manifestação da parte recorrente sobre a matéria preliminar arguida no parecer ministerial (fl. 37), prazo que transcorreu in albis (fl. 41).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo. A sentença foi publicada em 12.12.2016 (fl. 16), e o recurso foi apresentado antes mesmo de tal evento, na data de 10.12.2016 (fl. 18).

Presentes os demais pressupostos, está a merecer conhecimento.

Preliminar da PRE: Nulidade de sentença

A Procuradoria Regional Eleitoral argui preliminar pela nulidade da sentença recorrida, ao argumento central de negativa de aplicação das normas de regência atinentes ao tema, especificamente os comandos que determinam o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, nos casos em que constatado o recebimento de recursos de origem não identificada, art. 19 da Resolução TSE n. 23.463/15.

Afasto a preliminar.

Note-se que o Código de Processo Civil em vigor adotou, de forma expressa, a preferência pelo exame do mérito da demanda. Assim, sempre que possível, os magistrados e tribunais pronunciar-se-ão acerca da questão de fundo da causa.

Nessa linha, e segundo o art. 282, § 2º, do CPC, “Quando puder decidir o mérito a favor da parte a quem aproveite a decretação da nulidade, o juiz não a pronunciará nem mandará repetir o ato ou suprir-lhe a falta”.

É o caso dos autos.

Conforme o art. 23, § 2º, combinado com o art. 28, § 6º, inc. I, da Lei n. 9.504/97, com as alterações trazidas pela Lei n. 13.165/15, ficam dispensadas de comprovação as receitas provenientes da cessão de bens móveis, limitada ao valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) por cedente:

Art. 23. Pessoas físicas poderão fazer doações em dinheiro ou estimáveis em dinheiro para campanhas eleitorais, obedecido o disposto nesta Lei.

[…]

§ 2º As doações estimáveis em dinheiro a candidato específico, comitê ou partido deverão ser feitas mediante recibo, assinado pelo doador, exceto na hipótese prevista no § 6o do art. 28. (Redação dada pela Lei nº 12.891, de 2013)

[…]

 

Art. 28. A prestação de contas será feita:

[…]

§ 6º Ficam também dispensadas de comprovação na prestação de contas: (Incluído pela Lei nº 12.891, de 2013)

I - a cessão de bens móveis, limitada ao valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) por pessoa cedente; (Incluído pela Lei n. 12.891, de 2013)

E o comando vem reproduzido no art. 55, § 3º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.463/15, merecendo transcrição os precedentes que determinam sua aplicação:

Eleições 2016. Recurso eleitoral. Prestação de contas de candidato. Omissão de despesa não caracterizada. Doação entre candidatos. Cessão de veículo. Elevado gasto com combustível. Despesa de valor ínfimo. Contas aprovadas com ressalvas. Recurso provido.

I - Doações estimáveis devidamente identificadas atingem a finalidade da norma eleitoral, qual seja a identificação da origem e do destino dos recursos arrecadados durante a campanha.

II - Ficam dispensadas de comprovação as receitas provenientes da cessão de bens móveis, limitada ao valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) por pessoa cedente, segundo o art. 23, §2º c/c o art. 28, §6º, I, da Lei n. 9.504/97, com as alterações trazidas pela Lei n. 13.165/2015.

[...]

V - Contas aprovadas com ressalvas. Recurso conhecido e no mérito, provido.

(TRE-RO, RECURSO ELEITORAL n 47397, ACÓRDÃO n. 136/2017 de 29.5.2017, Relatora ANDRÉA CRISTINA NOGUEIRA, Publicação: DJE/TRE-RO - Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral, Tomo 98, Data 01.6.2017, Página 4-5) (Grifei.)

 

Recurso Eleitoral. Prestação de contas de campanha. Candidato a Vereador. Eleições 2016. Desaprovação.I - Apesar de algumas das irregularidades terem ocorrido apenas no âmbito da prestação de contas parcial (alíneas "a" e "b"), outras persistiram até mesmo com o encerramento da campanha eleitoral, como foi o caso da falta de comprovação da cessão do veículo em que utilizado o combustível declarado (alínea "c"), cuja regularização se deu somente antes de prolatada a sentença, após o prazo determinado pela legislação (fls. 106/108).II - Mais grave que isso é a ausência de registros na prestação de contas dos recursos estimáveis arrecadados (alínea "d"), sob a justificativa de que a legislação dispensou a emissão de recibos eleitorais para a cessão de bens móveis até o valor de R$ 4.000,00. Nesse ponto, ainda que se tratasse da cessão de bens móveis, a dispensa da emissão dos recibos não afasta, por exigência do §4º do mesmo dispositivo legal, a obrigatoriedade de serem registrados na prestação de contas os valores das operações em questão. [...]

(TRE-RJ, RECURSO ELEITORAL n. 19556, ACÓRDÃO de 21.6.2017, Relator ANTONIO AURÉLIO ABI RAMIA DUARTE, Publicação: DJERJ - Diário da Justiça Eletrônico do TRE-RJ, Tomo 172, Data 28.6.2017, Página 15-26.) (Grifei.)

Na espécie, a irregularidade trata de cessão de veículo, no valor de R$ 1.000,00, de sua propriedade, limitando-se o julgador a entender pela existência de falha devido à ausência, exatamente, da devida comprovação da propriedade do automóvel.

Considerando que a apresentação desse documento não é necessária, por força da exceção prevista no art. 55, § 3º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.463/15, somando-se ao fato de que houve, no momento de registro da candidatura, a indicação do veículo como integrante dos bens da candidata, há de ser afastada a conclusão pela existência de recurso de origem não identificada nas contas, circunstância que também é óbice ao acolhimento da preliminar arguida pela PRE.

Portanto, rejeito a prefacial e considero provido o recurso, no ponto.

Preliminar da recorrente ANDREA: ausência de contraditório e de ampla defesa

Ainda, merecem esclarecimentos as alegações relativas às intimações realizadas durante a tramitação do processo.

A candidata foi intimada a prestar esclarecimentos sobre o relatório de exame das contas, na pessoa do seu advogado, por intermédio de publicação do Diário Eletrônico – DEJERS, constando do ato o nome e o número da OAB do procurador constituído (fl. 12).

Inexiste nulidade. A preliminar é de ser afastada.

As publicações, no decorrer do feito, seguiram as determinações dos arts. 64 e 84 da Resolução TSE n. 23.463/15. Note-se que, no relativo ao novel uso do mural eletrônico, não há como entender como “desconhecida” uma prática devidamente noticiada – tanto que utilizada com sucesso em todo o estado do Rio Grande do Sul, para a realização de intimação de milhares de candidatos, sem que tenha havido notícias de problemas.

Ademais, é cediço que a característica do processo judicial eleitoral é a celeridade, mormente durante o lapso compreendido pela realização das convenções partidárias até a diplomação dos eleitos. Tal microssistema demanda peculiaridades de forma a, inclusive, não sofrer incidência de determinados comandos do Código de Processo Civil.

Nessa toada, a intimação das partes via mural eletrônico: com a Publicação da Portaria P n. 259/16, o método tornou-se legítimo e utilizável, como de fato ocorreu, repito, sem maiores contratempos.

Afasto também esta preliminar.

 

Mérito

No caso posto, foi constatada uma grave e insanável irregularidade: a conta bancária declarada na prestação de contas é diferente daquela identificada nos extratos eletrônicos.

Trata-se de defeito fundamental no relativo à prestação de informações à Justiça Eleitoral e, ao cabo, à própria sociedade, pois a situação inviabilizou o exame da contabilidade, malferindo a transparência dos recursos auferidos e utilizados na campanha eleitoral.

Ademais, o recurso interposto apresenta insurgência meramente genérica quanto a esse item da decisão, aduzindo, em suma, ter carecido de “bom senso” o magistrado na origem, ao instruir o feito.

Repito: a conta indicada na prestação de contas é diferente daquela em que foram manejados os valores.

A sentença recorrida não merece reparos, neste item.

 

ANTE O EXPOSTO, rejeito a matéria preliminar e VOTO pelo parcial provimento do recurso para o fim de afastar a irregularidade referente ao recebimento de recurso de origem não identificada, por força da exceção prevista no art. 55, § 3º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.463/15, mantendo os demais termos da sentença recorrida, que decidiu pela desaprovação das contas.