RE - 28677 - Sessão: 04/12/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por REGINALDO DA LUZ PUJOL contra a sentença que desaprovou sua prestação de contas referente às eleições municipais de 2016, para o cargo de vereador, e determinou o recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 20.330,00, em razão da infringência aos arts. 29, § 1º-A, e 55 da Resolução TSE n. 23.463/15 (fls. 350-351).

Em suas razões recursais, discorre sobre a regularidade da aplicação dos recursos oriundos do Fundo Partidário, ao argumento de que os gastos realizados com serviços advocatícios foram revertidos à consultoria e à assessoria jurídica durante o período da campanha eleitoral. Alega o equívoco na declaração firmada pelo advogado, sob o fundamento de que o candidato não respondeu a processo de representação durante o pleito eleitoral. Sustenta que o recibo juntado supre a apresentação da nota fiscal. Informa que a norma regente não exige a demonstração da regularidade da situação dos prestadores de serviço. Pondera o excesso no juízo de desaprovação das contas, invocando a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, com arrimo na jurisprudência do TSE. Pugna pelo recebimento do recurso no duplo efeito e requer a reforma da sentença, a fim de que sejam julgadas aprovadas as contas, ainda que com ressalvas, e afastada a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional. Junta documento (fls. 355-363).

Foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou, preliminarmente, pelo não recebimento do apelo no efeito suspensivo e pela desconsideração do novo documento apresentado com o recurso. No mérito, manifestou-se pelo desprovimento (fls. 372-379).

É o breve relatório.

 

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta provimento.

Inicialmente, o recorrente postula a suspensão dos efeitos da sentença até o trânsito em julgado da decisão final, pretensão amparada pela Resolução TSE n. 23.463/15, que prevê a aplicação de sanções apenas após o trânsito em julgado da decisão que sentencia as contas, nos termos dos arts. 68, 72 e 73.

Na sequência, a prefacial relativa ao não conhecimento dos novos documentos apresentados pelo recorrente,  arguida pela Procuradoria Regional Eleitoral, comporta rejeição.

No âmbito dos processos de prestação de contas, expedientes que têm preponderante natureza declaratória e possuem como parte apenas o prestador, este Tribunal, sempre com ressalvas apresentadas pela douta Procuradoria Regional Eleitoral, tem concluído, em casos excepcionais, pela aceitação de novos documentos acostados com a peça recursal e não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, quando sua simples leitura puder sanar irregularidades e não houver necessidade de nova análise técnica.

Potencializa-se o direito de defesa, especialmente quando a juntada da nova documentação for capaz de influenciar positivamente no exame da contabilidade, de forma a prestigiar a conclusão pela retidão na aplicação de recursos e realização de despesas.

Assim, rejeito a preliminar e conheço do novo documento juntado com a peça recursal.

No mérito, as contas foram desaprovadas pela existência de duas irregularidades, quais sejam: a) utilização de recursos do Fundo Partidário com serviços jurídicos destinados à defesa do candidato em processo judicial, em infringência ao art. 29, § 1º-A, da Resolução TSE 23.463/15; e b) realização de despesa, no valor de R$ 330,00, com recursos do Fundo Partidário, sem a apresentação da nota fiscal respectiva, violando o disposto no art. 55 da Resolução TSE 23.463/15.

A respeito dos serviços advocatícios registrados na contabilidade, adianto que a sentença merece ser reformada, senão vejamos.

O art. 29, § 1º-A, da Resolução TSE n. 23.463/15 expressamente disciplina que os honorários referentes à contratação de serviços de advocacia e de contabilidade não caracterizam gastos eleitorais:

§ 1º-A Os honorários referentes à contratação de serviços de advocacia e de contabilidade relacionados à defesa de interesses de candidato ou de partido político em processo judicial não poderão ser pagos com recursos da campanha e não caracterizam gastos eleitorais, cabendo o seu registro nas declarações fiscais das pessoas envolvidas e, no caso dos partidos políticos, na respectiva prestação de contas anual. (Incluído pela Resolução n. 23.470/2016)

No caso em tela, entendo que a demonstração de que a contratação de serviços advocatícios se deu exclusivamente para assessoria e consultoria jurídica não pode ser infirmada pela parte final da declaração à fl. 194, seja pela retratação do advogado quanto ao seu conteúdo (fl. 363), seja, precipuamente, pela inexistência de registro de representação ajuizada pelo candidato ou movida em seu desfavor durante o pleito eleitoral, conforme consulta realizada no Sistema de Acompanhamento de Documentos e Processos (SADP) deste Tribunal, o que converge para a tese do recorrente. Salienta-se que a descrição do serviço na nota fiscal juntada na contabilidade informa a prestação de consultoria e assessoria jurídica, em conformidade com a determinação regulamentar (fl. 105).

Nesse sentido, colaciono ementa de recente julgado deste Regional:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Contabilização de serviços advocatícios. Art. 29, §§ 1º e 1º-A, da Resolução TSE n. 23.463/15. Eleições 2016.

Parecer conclusivo e manifestação ministerial de piso pela rejeição das contas. Proferida sentença de desaprovação sem que tenha sido oportunizada prévia manifestação à candidata acerca das irregularidades apontadas, conforme previsão do art. 64, § 4º, da Resolução TSE n. 23.463/15. Decisão consubstanciada na ausência de registro de gastos e dos respectivos recibos, referentes à contratação de serviços advocatícios durante a prestação de contas. Ainda que, nesta instância, tenha sido verificado o vício procedimental, deixa-se de reconhecer de ofício a nulidade, em virtude da possibilidade de decisão favorável quanto ao mérito, sem representar qualquer prejuízo à interessada.

Diferenciação conceitual entre o serviço advocatício prestado em processo judicial contencioso e o serviço de consultoria jurídica realizado em favor das campanhas eleitorais. Entendimento do Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que os honorários relativos aos serviços advocatícios e de contabilidade referentes a processo jurisdicional contencioso não são considerados gastos eleitorais de campanha. Situação distinta do serviço de consultoria, atividade-meio prestada durante a campanha eleitoral, paga com recursos provenientes da conta de campanha, constituindo gasto eleitoral que deve ser declarado de acordo com os valores efetivamente pagos. Inteligência do disposto no art. 29, §§ 1º e 1º-A, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Demonstrada a outorga da procuração no mês de outubro de 2016, excluindo a obrigação contraída do rol de despesas de campanha. Não identificada impropriedade ou irregularidade na prestação, devem ser aprovadas as contas.

Provimento.

(Recurso Eleitoral n. 24846, Acórdão de 07.03.2017, Relator DES. CARLOS CINI MARCHIONATTI, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 39, Data 09.03.2017, Página 5.) (Grifei.)

Dessarte, tratando-se de recurso destinado ao pagamento de serviços de consultoria e assessoria jurídica, e não relativo à defesa em processo judicial contencioso, escorreita a contabilização do valor como gasto eleitoral.

Logo, reputo superada a irregularidade, devendo ser afastada a determinação de recolhimento da quantia respectiva (R$ 20.000,00) ao Tesouro Nacional.

Por fim, quanto à falta de apresentação da nota fiscal relativa à despesa, no valor de R$ 330,00, realizada com recursos do Fundo Partidário, observo que a decisão proferida no juízo a quo não comporta reforma no particular.

O art. 55 da Resolução TSE 23.463/15, ao disciplinar a comprovação da arrecadação de recursos e da realização de gastos, dispõe:

Art. 55. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser realizada por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

Tratando-se de recursos oriundos do Fundo Partidário, que ostentam natureza de verba pública, a exigência do controle é reforçada pelo art. 60, parágrafo único, da Resolução TSE 23.463/15, que impõe a análise dos comprovantes de utilização dessas receitas de forma manual, a fim de verificar a correta aplicação dos valores.

Na situação sob exame, em relação à despesa com alimentação no valor de R$ 330,00, registrada em nome do fornecedor JLM Moto Bar LTDA-ME, entendo que não pode ser atribuído o valor de documento fiscal ao recibo simples emitido (fl. 80). Friso que não se trata de exigir do recorrente a demonstração da regularidade da situação do prestador de serviço, mas sim o cumprimento das determinações regulamentares relativas à aplicação de recursos financeiros na campanha.

Ademais, não se pode olvidar que situações que envolvem fornecedores de produtos ou serviços sem registro ativo nas instituições competentes (Junta Comercial ou Receita Federal) ou com número reduzido de empregados podem ser indicativas de utilização de empresas de fachada para desvio de recursos de campanha, caixa 2 ou outras formas de corrupção eleitoral.

Analisando o teor do documento à fl. 195, constato que a aplicação do recurso não pode ser considerada como regular. Saliento que a mera declaração do fornecedor não supre a exigência normativa, mormente por se tratar de recursos de natureza pública.

Portanto, deve ser mantida a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da referida quantia, nos exatos termos do art. 72, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Entrementes, embora seja devido o registro de ressalva, há de se considerar que o valor absoluto da irregularidade (R$ 330,00), em comparação com o montante de gastos escriturados (R$ 205.158,04), alcança a expressão de apenas 6,21% dos recursos aplicados na campanha, não se revelando razoável, tampouco proporcional, manter a desaprovação das contas.

Esse é o entendimento do egrégio Tribunal Superior Eleitoral:

 

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PRÍNCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. "Com base na compreensão da reserva legal proporcional, nem toda irregularidade identificada no âmbito do processo de prestação de contas autoriza a automática desaprovação de contas de candidato ou de partido político, competindo à Justiça Eleitoral verificar se a irregularidade foi capaz de inviabilizar a fiscalização" (AgR-REspe 2159-67, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 11.3.2016).

2. Com relação à falha de omissão de receitas e despesas, consistiu ela no valor de R$ 295,20, a qual a própria Corte de origem assinalou não ser "capaz de levar à desaprovação das contas, sendo o caso de anotação de ressalvas, conforme o art. 68, II, da Res. TSE 23.463/2016".

3. Não obstante, o Tribunal a quo entendeu apta a ensejar a desaprovação das contas a irregularidade alusiva a doação que consistiu em recurso de origem não identificada. Todavia, conforme consta da decisão regional, é certo que a falha apontada correspondeu a aproximadamente 12% do total de recursos arrecadados para campanha eleitoral, mas é de se ponderar que se trata de uma campanha para vereador e o valor absoluto corresponde a R$ 1.000,00, a revelar o seu caráter diminuto, o que permite a aprovação com ressalvas.

4. Para fins de aplicação do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade no âmbito dos processos de prestação de contas, a gravidade da falha tem relevância para a aferição da questão, mas outras circunstâncias podem ser ponderadas pelo julgador no caso concreto, notadamente se o vício, em termos percentuais ou absolutos, se mostra efetivamente expressivo.

Precedente: AgR-AI 211-33, red. para o acórdão Min. Henrique Neves, DJe de 19.8.2014.

Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral nº 27324, Acórdão, Relator(a) Min. ADMAR GONZAGA, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 29/09/2017) (Grifei.)

Ante o exposto, rejeitada a matéria preliminar, VOTO pelo parcial provimento do recurso para aprovar as contas com ressalvas e reduzir a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional à quantia de R$ 330,00.