E.Dcl. - 39941 - Sessão: 11/07/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de embargos de declaração opostos por ALDI MINETTO e LUCIANO VANDERLEI LUTZER em face do acórdão das fls. 263-272-v. que, à unanimidade, afastou a preliminar de nulidade da gravação ambiental e acolheu a prefacial de nulidade de prova documental, negando provimento ao recurso quanto ao mérito.

Em suas razões (fls. 277-289), os embargantes sustentam haver omissões no acórdão em relação ao descumprimento do dever de autorreferenciamento imposto pelo novo Código de Processo Civil quando do exame da tese de nulidade da gravação ambiental e à ausência de participação do candidato LUCIANO na conduta. Requereram o recebimento, processamento e conhecimento dos embargos, bem como a concessão de efeitos infringentes à decisão integrada.

Vieram conclusos.

É o relatório.

 

VOTO

Tempestividade dos embargos

Cabe afirmar a tempestividade dos embargos de declaração. O acórdão foi publicado no dia 19.6.2017, segunda-feira, e os embargos foram opostos no dia 22.6.2017, quinta-feira, terceiro dia útil após a publicação da decisão embargada.

Contando-se o tríduo legal na forma do art. 219 do CPC, são tempestivos.

Mérito

No mérito, os embargantes sustentam haver omissão no acórdão, nos termos do art. 1.022, parágrafo único, inc. II, do Código de Processo Civil, uma vez que a decisão deixou “de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento” (art. 489, § 1º, inc. VI, do CPC).

Verifico que os recorrentes submeteram a lide à apreciação dessa Corte mencionando como precedentes o RO n. 190461/RR, de 21.08.2012, e o AgR-RO n. 2.260, de 13.4.2010 (fls. 205-226), ambos do Tribunal Superior Eleitoral.

O acórdão, por sua vez, assim fixou:

Inicialmente, cumpre sublinhar que a gravação juntada aos autos não foi obtida por meio de interceptação, meio de prova no qual terceiro, geralmente estranho aos interlocutores, capta o conteúdo de diálogos. Tal modo de produção probatória é efetivamente sujeito à reserva judicial, por força do art. 5º, inc. XII, da Constituição Federal.

Aqui, houve gravação, de fato clandestina, sem o conhecimento dos interlocutores Aldi Minetto e Daniel Giordani Maciel. Ocorre que a clandestinidade não implica, necessariamente, ilicitude, conforme se verá.

Conforme precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral, não há que se falar em necessidade de autorização judicial ou presença em inquérito, pois não houve interceptação, e sim gravação por um dos envolvidos no diálogo. Ademais, a decisão monocrática veio suportada em sólida, irretocável fundamentação, nos vieses doutrinário e jurisprudencial.

Nessa toada, saliento que o STF, em regime de repercussão geral, já assentou a validade da gravação ambiental como espécie de prova:

Ação penal. Prova. Gravação ambiental. Realização por um dos interlocutores sem conhecimento do outro. Validade. Jurisprudência reafirmada. Repercussão geral reconhecida. Aplicação do art. 543-B, § 3º, do CPC. É lícita a prova consistente em gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro.

(RE 583.937-QO-RG, Rel. Min. Cezar Peluso, julgamento em 19.11.2009, Plenário, DJE de 18.12.2009.)

É certo, a título de argumentação, que, em alguns casos, o conteúdo da gravação ambiental deve estar submetido à tutela da intimidade ou privacidade, nos termos do art. 5º, inc. X, da CF, mormente naquelas situações em que a conversa, em si, tratar de temas que mereçam a tutela desses direitos fundamentais e, com o devido sopesamento, conclua-se pelo privilégio à proteção da esfera privada dos envolvidos, afastando-se, topicamente, a primazia do interesse público – aqui, de fato, o TSE possui alguns precedentes restritivos.

Contudo, tais restrições tratam de hipóteses extremas, de especial tutela da intimidade – aquelas que nem mesmo o interlocutor poderia vir a testemunhar sobre o conteúdo versado.

E é aqui que se torna possível realizar a devida separação daqueles assuntos em que se permite a gravação ambiental, relativamente àqueles em que ela não é possível: o direito fundamental à intimidade visa preservar o assunto conversado, e não o método de prova. Ou seja, tudo aquilo que não invade a esfera privada do interlocutor pode ser, sim, objeto de gravação ambiental.

Como já dito, não se olvida que há decisões do TSE que restringem a utilização de tal espécie probatória, ainda que tenha sido realizada por um dos interlocutores – e nessa linha são os precedentes trazidos pelos recorrentes. Mas o assunto merece lupa, pois o órgão de cúpula vinha sendo mais restritivo na admissão da gravação como meio de prova judicial especialmente no período entre o ano de 2013 até o início de 2015, pois antes, sobretudo entre 2008 a 2012, o e. Superior já construía precedentes pela licitude da gravação ambiental.

Uma jurisprudência um tanto pendular, portanto.

E, recentemente, houve um novo movimento daquela Corte Superior, no sentido de admitir como prova a gravação ambiental realizada, por exemplo, em lugares públicos, o que teve início no REspe 637-61/MG, Rel. Ministro Henrique Neves, DJE de 21.5.2015, quando se decidiu:

RECURSOS ESPECIAIS. AÇÃO CAUTELAR. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DO PODER ECONÔMICO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO.

Recurso especial da Coligação Cuidando de Nossa Cidade para Você

1. Na linha do entendimento majoritário, a eventual rejeição de um fundamento suscitado no recurso eleitoral não torna o recorrente parte vencida. O interesse recursal, que pressupõe o binômio necessidade/utilidade, deve ser verificado a partir do dispositivo do julgado. Precedentes: REspe nº 185-26, rel. Min. Dias Toffoli, DJE de 14.8.2013; REspe nº 35.395, rel. Min. Arnaldo Versiani, DJE de 2.6.2009.

2. Se a Corte de origem concluiu que as provas documentais e testemunhais seriam inservíveis e pouco esclarecedoras em relação à segunda conduta imputada na AIJE, a revisão de tal entendimento demandaria o reexame de fatos e provas, providência vedada em sede de recurso especial, a teor das Súmulas 279 do Supremo Tribunal Federal e 7 do Superior Tribunal de Justiça.

Recurso especial não conhecido.

Recurso especial e ação cautelar de Francisco Lourenço de Carvalho

1. "A contradição que autoriza a oposição dos declaratórios é a existência no acórdão embargado de proposições inconciliáveis entre si, jamais com a lei nem com o entendimento da parte" (ED-RHC nº 127-81, rel. Min. Laurita Vaz, DJE de 2.8.2013).

2. Nos termos da atual jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a gravação ambiental realizada por um dos interlocutores, sem o conhecimento de um deles e sem prévia autorização judicial, é prova ilícita e não se presta à comprovação do ilícito eleitoral, porquanto é violadora da intimidade. Precedentes: REspe nº 344-26, rel. Min. Marco Aurélio, DJE de 28.11.2012; AgRRO nº 2614-70, rel. Min. Luciana Lóssio, DJE de 7.4.2014; REspe nº 577-90, rel. Min. Henrique Neves, DJE de 5.5.2014; AgRRespe nº 924-40, rel. Min. João Otávio de Noronha, DJE de 21.10.2014.

3. As circunstâncias registradas pela Corte de origem indicam que o discurso objeto da gravação se deu em espaço aberto dependências comuns de hotel, sem o resguardo do sigilo por parte do próprio candidato, organizador da reunião. Ausência de ofensa ao direito de privacidade na espécie, sendo lícita, portanto, a prova colhida.

4. O quadro fático delineado no acórdão regional não revela a mera tentativa de obtenção de apoio político, pois, em diversas passagens, o que se vê são os pedidos expressos de voto e o oferecimento de vantagem aos estudantes. Incidência, na espécie, das Súmulas 279 do Supremo Tribunal Federal e 7 do Superior Tribunal de Justiça.

5. Ação cautelar proposta com o objetivo de conferir efeito suspensivo ao recurso especial julgada improcedente.

Recuso especial conhecido e desprovido. Ação cautelar julgada improcedente.

O Tribunal, por maioria, desproveu o recurso de Francisco Lourenço de Carvalho, nos termos do voto do Relator. Vencida a Ministra Luciana Lóssio.

Nessa linha, julgados deste Tribunal Regional Eleitoral, representados pelas ementas abaixo colacionadas:

Ação Penal. Imputação da prática do crime de corrupção eleitoral. Art. 299 do Código Eleitoral. Eleições 2012.

Competência originária deste Regional para o julgamento, em razão do foro privilegiado por prerrogativa de função.

Matéria preliminar afastada. Licitude da gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem conhecimento do outro. Entendimento sedimentado em sede de repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal. Não evidenciada a inépcia da inicial, vez que clara a descrição dos fatos.

Distribuição de cestas básicas a eleitores em troca de voto. Conjunto probatório frágil quanto à compra de votos narrada na inicial. Prova testemunhal contraditória, embasada em depoimentos de eleitores comprometidos com adversário político, que não conduz à certeza acerca da materialidade dos fatos alegados. Imprescindível, para um juízo de condenação na esfera criminal, a verdade material, alcançada por meio da

produção de provas do fato e da respectiva autoria. Improcedência.

(Ação Penal de Competência Originária n. 46366, Acórdão de 02.12.2015, Relator DES. FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ, DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 223, Data 04.12.2015, Página 4.)

 

Recurso. Ação de investigação judicial eleitoral. Representação. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Condenação. Vereador. Cassação do diploma. Eleições 2016.

Afastadas as prefaciais de nulidade de gravação ambiental realizada por um dos interlocutores e de prova testemunhal. Teor de conversa não protegido pela privacidade. Provas não sujeitas à cláusula de sigilo. Sendo lícita a gravação, não se caracteriza como ilícita por derivação a prova consistente em depoimento de testemunha.

Entrega de dinheiro, a duas eleitoras identificadas, condicionada a promessas de voto. Comprovado o especial fim de agir para obter-lhes o voto, circunstância apta a configurar a captação ilícita de sufrágio. Cassação do diploma decorrente da simples prática do ilícito, independentemente do grau de gravidade da conduta. Incidência obrigatória. Fixação da multa de maneira adequada, bem dimensionada para o caso em tela.

Provimento negado.

Por unanimidade, negaram provimento ao recurso e determinaram providências nos termos do voto do relator.

(RE n, 573-28, acórdão de 17.02.2017, Rel. Dr. Jamil Andraus Hanna Bannura. DEJERS de 21.02.2017.)

[…]

Como se percebe, não há vício de omissão no ponto, sobretudo porque a decisão mencionou que a validade da gravação ambiental restou pacificada pelo Supremo Tribunal Federal em regime de repercussão geral (RE 583.937-QO-RG). Ademais, foram traçados comentários sobre o caráter pendular da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral acerca do tema, com menção a acórdãos que configurariam superação dos precedentes mencionados pelos recorrentes, em decisões posteriores àquelas invocadas.

Afasto, dessa forma, a omissão apontada.

O segundo argumento trazido diz respeito à omissão quanto à análise da participação do candidato LUCIANO na conduta.

Aqui, duas considerações: a sentença cassou os diplomas de prefeito e vice-prefeito da Cidade de Vitória das Missões, conferidos, respectivamente, a ALDI e LUCIANO, em relação ao pleito de 2016, nos termos do art. 41-A da Lei n. 9.504/97, condenando-os, ainda, conforme preconiza o art. 89 da Resolução TSE n. 23.457/15, ao pagamento de multa no valor convertido de R$ 21.282,00 (vinte e um mil duzentos e oitenta e dois reais) para cada um, e o acórdão embargado manteve hígida tal decisão. Nos embargos, os recorrentes colacionam precedentes que tratam da imposição de inelegibilidade, razão pela qual não se prestam a esclarecimentos neste caso.

Ademais, a inelegibilidade não foi discutida nestes autos, e sua caracterização deve ser analisada em eventual pedido de registro de candidatura.

Feita a distinção do caso em julgamento para afastar os precedentes invocados, passo à segunda consideração, e anoto que o recurso inaugural da instância ad quem, em vinte páginas de suas razões, veiculou apenas um parágrafo no qual LUCIANO é mencionado, dentro do tópico “Conduta do contestante Aldi” (fl. 216), não trazendo qualquer argumento em sua defesa nem requerendo a expressa manifestação acerca de sua participação nos fatos, motivo pelo qual a tese trazida nos embargos constitui inovação.

Os embargos, dessa forma, não merecem ser acolhidos.

 

Diante do exposto, VOTO pelo conhecimento e rejeição dos embargos de declaração.

Observe a secretaria a intimação, inclusive, dos procuradores nomeados no instrumento da fl. 290, os quais também devem providenciar a juntada aos autos do documento original, no prazo de 03 (três) dias.