RE - 29571 - Sessão: 01/08/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recursos eleitorais interpostos por MIGUEL ÂNGELO GASPARETTO e ODEMAR PAULO RAIMONDI, reeleitos Prefeito e Vice do Município de Ronda Alta, conjuntamente com ALDAIR PAULO PASQUETTI, advogado e Secretário Municipal de Administração, e ALINE PRIORI, advogada e assessora jurídica municipal, e pelo PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA - PDT DE RONDA ALTA, em face da sentença que julgou parcialmente procedente ação de investigação judicial eleitoral para o fim de condená-los ao pagamento de multa e declará-los inelegíveis, impondo a pena de cassação dos diplomas expedidos aos candidatos, pela prática de abuso de poder político e conduta vedada mediante cedência de servidores públicos em benefício da campanha eleitoral, na forma do art. 73, inc. III, da Lei n. 9.504/97, além de julgar extinta a ação relativamente à coligação representada Ronda Alta no Caminho Certo, por ilegitimidade passiva, e improcedentes os pedidos em face do representado LEOMAR KAKÁ INÁCIO, titular da Secretaria Municipal do Índio (fls. 451-457v.).

No recurso dos representados MIGUEL ÂNGELO GASPARETTO, ODEMAR PAULO RAIMONDI, ALDAIR PAULO PASQUETTI e ALINE PRIORI, é suscitada a preliminar de ausência de fundamentação da sentença quanto à justificativa para as penas impostas, apontando que os embargos de declaração opostos para sanar tal omissão foram desacolhidos. No mérito, alegam a inocorrência de ilicitude, em razão de a atuação dos servidores em benefício da campanha ter ocorrido fora do horário de expediente de trabalho. Pontuam que o cargo político de secretário municipal e o cargo em comissão de assessor jurídico não se submetem a regime de carga horária predefinida. Sustentam não haver vedação para que um secretário municipal figure como representante de coligação partidária. Asseveram a inexistência de provas sobre a prática de condutas vedadas e a falta de gravidade das circunstâncias. Invocam os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade, e a ausência de desequilíbrio no pleito. Colacionam doutrina e jurisprudência. Postulam a reforma da decisão (fls. 475-492)

Nas razões apresentadas pelo representante PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA - PDT DE RONDA ALTA, a agremiação sustenta ter restado comprovado que o servidor LEOMAR KAKÁ INÁCIO, na qualidade de Secretário Municipal do Índio, trabalhou durante o período de expediente da prefeitura em benefício dos candidatos à reeleição e da Coligação Ronda Alta no Caminho Certo, realizando campanha na área indígena. Assevera que os candidatos reeleitos forneceram alimentos a eleitores em troca de votos, em uma reunião de mulheres, e que utilizaram um automóvel da municipalidade para distribuição de propaganda eleitoral. Tece considerações sobre a prova, colaciona doutrina, jurisprudência e postula a reforma da sentença para que o recorrido LEOMAR KAKÁ INÁCIO seja condenado nas mesmas penas impostas a ALDAIR PAULO PASQUETTI e ALINE PRIORI. Junta documentos (fls. 494-511).

Em contrarrazões, MIGUEL ÂNGELO GASPARETTO, ODEMAR PAULO RAIMONDI e LEOMAR KAKÁ INÁCIO suscitam a preliminar de ausência de legitimidade e de interesse recursal do PDT DE RONDA ALTA para oferecer recurso quanto a fatos imputados aos candidatos MIGUEL ÂNGELO GASPARETTO e ODEMAR PAULO RAIMONDI, uma vez já terem sido condenados na sentença. No mérito, postulam o desprovimento do recurso interposto (fls. 517-526).

O PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA - PDT DE RONDA ALTA ofereceu contrarrazões, requerendo a rejeição da matéria preliminar suscitada pelos representados e o desprovimento do recurso (fls. 529-540).

A Procuradoria Regional Eleitoral opina pelo afastamento das preliminares arguidas e pelo desprovimento dos recursos interpostos. Além disso, requer o encaminhamento de cópia dos autos ao Ministério Público de Ronda Alta (fl. 544-v.).

É o relatório.

 

VOTOS

Dr. Silvio Ronaldo Santos de Moraes (relator):

Os recursos são regulares, tempestivos e comportam conhecimento.

Preliminares

Inicialmente, consigno que não prospera a preliminar de ausência de legitimidade e de interesse recursal do Partido Democrático Trabalhista - PDT de Ronda Alta para oferecer recurso quanto aos fatos imputados aos candidatos Miguel Ângelo Gasparetto e Odemar Paulo Raimondi.

A petição inicial imputou aos representados a prática de cinco atos que consistem, em tese, em infrações eleitorais, e o pedido condenatório foi julgado parcialmente procedente, uma vez que a condenação foi motivada por apenas dois dos fatos narrados, a saber: cedência de cada um dos servidores públicos Aldair Paulo Pasquetti e Aline Priori, em benefício da campanha eleitoral.

Assim, caracterizada está a sucumbência recíproca, sendo lícito ao representante, que restou parcialmente vencido, postular a procedência integral da ação e a condenação dos recorridos com base em todos os fatos apontados.

Na hipótese vertente, além do afastamento do pleito condenatório relativo à alegação de cedência do servidor Leomar Kaká Inácio em benefício da campanha eleitoral, a sentença considerou improcedentes os pedidos de condenação por suposta distribuição de alimentos em uma reunião feminina, e por uso de veículo do Poder Público Municipal para realização de propaganda eleitoral.

Embora ao final das razões apresentadas a legenda limite-se a postular o provimento do apelo quanto ao recorrido Leomar Kaká Inácio, a leitura completa da peça recursal evidencia que o partido recorrente, autor da ação, também ataca a improcedência do pedido condenatório quanto aos fatos imputados contra Miguel Ângelo Gasparetto e Odemar Paulo Raimondi, que foram considerados não comprovados pela sentença.

A doutrina distingue os institutos de sucumbência formal e material, merecendo serem transcritos os ensinamentos do ilustre jurista Daniel Amorim Assumpção Neves (Manual de Direito Processual Civil. Vol. Único, 2ª ed., São Paulo: Ed. Método, 2011, p. 620-622):

- Sucumbência FORMAL: ocorre quando a parte não consegue aquilo que poderia ter processualmente obtido em virtude do pedido formulado ao órgão jurisdicional.

- Sucumbência MATERIAL: diz respeito aos aspectos materiais do processo. A análise aqui não é processual, mas sim sobre o bem ou os bens da vida que a parte poderia obter em virtude do processo judicial e que não obteve em razão da decisão judicial. Essa discrepância entre o desejado no mundo prático e o praticamente obtido no processo gera a sucumbência material da parte.

A partir dessa concepção, tem-se que todas as vezes que houver sucumbência formal haverá também a material. Se a parte não conseguiu a providência processual requerida, isso significa que, no mundo real, também não obteve o bem da vida pretendido. Todavia, pode haver a sucumbência material sem que exista a sucumbência formal, ou seja, a parte obteve a providência processual, mas não conseguiu exatamente o bem da vida desejado (no caso telado, a procedência da ação quanto a todos os fatos alegados na inicial).

Na hipótese vertente, a decisão recorrida não entregou tudo que era possível, enquanto ato processual (condenação dos candidatos às penas de cassação do diploma expedido, multa no grau máximo e declaração da inelegibilidade), e não exauriu as possibilidades da posição jurídica no processo, pois julgou a ação improcedente quanto a três fatos, sendo viável a interposição do recurso para obtenção de uma valia dessa posição jurídica.

Tal qual alguns interesses necessitam, para serem alcançados, da via judicial, porque não são obtidos extrajudicialmente, o mesmo se dá quanto à necessidade e utilidade na apresentação do recurso.

Restará configurado o interesse processual sempre que este, para ser tutelado em toda sua extensão, dependa da interposição do recurso.

Assim, há manifesto interesse recursal da legenda, razão pela qual a preliminar merece rejeição.

 

Relativamente à arguição de falta de fundamentação da sentença recorrida para a aplicação da pena imposta aos representados, observa-se que a petição inicial requereu sua condenação às penas previstas no art. 73 da Lei das Eleições e art. 22 da Lei de Inelegibilidades, com expressa menção ao pedido de cassação dos registros de candidatura ou do diploma dos candidatos.

A sentença, por sua vez, condenou Miguel Ângelo Gasparetto e Odemar Paulo Raimondi ao pagamento de multa equivalente a R$ 15.000,00 (quinze mil reais) cada, determinou sua inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 08 (oito) anos subsequentes ao pleito eleitoral de 2016, e cassou-lhes os diplomas de eleitos, merecendo transcrição o seguinte excerto das razões de decidir (fl. 455v.):

Desta feita, constatada a evidente prática de conduta vedada e de abuso de poder político durante o período eleitoral, em favor da Coligação Ronda Alta no Caminho Certo, a que estão vinculados os candidatos à reeleição dos cargos majoritários, os réus Miguel Ângelo Gasparetto e Odemar Paulo Raimondi, mediante a utilização de servidor público, cumpre a imposição de penalidade à luz do art. 73, §§ 4º e 5º, da Lei nº 9.504/97 e art. 22, inc. XIV, da Lei Complementar n. 64/90.

Analisando o teor da decisão recorrida, verifica-se que a julgadora monocrática motivou a decisão de forma clara, valendo-se para tal, além das provas documentais que instruíram a peça inicial, da prova testemunhal produzida em audiência.

Destaca-se, ademais, que não se deve confundir fundamentação sucinta com sua ausência, e isso porque o que acarreta a nulidade do decisum é a absoluta ausência de fundamentação.

Segundo o entendimento do TSE, “o art. 93, IX, da Constituição Federal não exige que a decisão seja extensa, desde que seja devidamente motivada” - Precedentes: AgR-RMS n. 518, relator Ministro Ayres Britto, DJ de 16.4.2008; AgR-AI-STF n. 372.797, rel. Min. Carlos Velloso, e AgR-REspe n. 227-04/MG, rel. Min. Henrique Neves da Silva, julgado em 20.3.2014.

De igual modo, colho na jurisprudência do STJ:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. VERIFICAÇÃO DE OCORRÊNCIA DE LESÃO GRAVE E IRREPARÁVEL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. DECISÃO MANTIDA.

 

1. A decisão que analisa pedido de concessão de efeito suspensivo ao agravo de instrumento interposto no Tribunal de origem pode ter fundamentação sucinta, que não se confunde com falta de motivação.

(...)

3. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no AREsp 158873 RJ, Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, DJe 16.04.2013.)

Nada obstante, a questão relativa à adequação das sanções impostas, especificamente quanto à gravidade das circunstâncias ou à proporcionalidade de sua aplicação, é matéria que será debatida quando da análise do mérito recursal.

Com essas considerações, rejeito a prefacial.

 

Mérito

a) Cedência dos servidores públicos Aldair Paulo Pasquetti e Aline Priori em benefício da campanha eleitoral

Passo à análise das razões apresentadas, relativamente à alegação de cedência dos servidores públicos Aldair Paulo Pasquetti, advogado e secretário municipal de administração, e Aline Priori, advogada e assessora jurídica, em benefício da campanha eleitoral dos candidatos Miguel Ângelo Gasparetto e Odemar Paulo Raimondi.

A sentença recorrida considerou comprovada a prática da conduta vedada prevista no art. 73, inc. III, da Lei das Eleições, que trata da cedência do servidor ou uso de seus serviços, para campanha eleitoral, durante o horário de expediente normal:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

III - ceder servidor público ou empregado da administração direta ou indireta federal, estadual ou municipal do Poder Executivo, ou usar de seus serviços, para comitês de campanha eleitoral de candidato, partido político ou coligação, durante o horário de expediente normal, salvo se o servidor ou empregado estiver licenciado;

A decisão apontou que Aldair Paulo Pasquetti e Aline Priori trabalharam, em horário de expediente, a serviço da campanha eleitoral dos candidatos Miguel Ângelo Gasparetto e Odemar Paulo Raimondi, sem prévio licenciamento dos cargos públicos ocupados junto à prefeitura, conforme seguinte excerto das razões de decidir (fl. 455v.):

Isso porque, os réus Miguel Ângelo Gasparetto e Odemar Paulo Raimondi foram beneficiados com as condutas praticadas pelo Secretário Municipal de Governo e Administração e pela Assessora Jurídica, a uma porque, administrativamente, tiveram pedidos relacionados às suas candidaturas defendidos pelos servidores suprarreferidos, a exemplo dos documentos antes mencionados; a duas porque deixaram destoar a finalidade pública da atividade que deveria ser praticada enquanto servidores, em favor próprio e da Coligação que integravam.

Os fatos foram considerados comprovados pelos documentos das fls. 28-60 e 348-406 dos autos.

As provas são constituídas de documentos diversos, subscritos por Aldair Paulo Pasquetti, e por uma petição assinada por Aline Priori, na condição de advogados e procuradores da Coligação Ronda Alta no Caminho Certo, pela qual o candidato à reeleição como prefeito Miguel Ângelo Gasparetto concorria, bem como pelas procurações outorgando a Aldair e a Aline os poderes para representá-lo em juízo (fls. 58 e 399).

Ressalto que devem ser desconsideradas as peças judiciais produzidas após a realização do pleito, dado que a conduta vedada descrita no inc. III do art. 73 da Lei n. 9.504/97 é proibida apenas durante o período de campanha eleitoral, ou seja, até a data da eleição, nos termos da expressa redação desse dispositivo legal, que veda a cedência de servidores públicos “para comitês de campanha eleitoral”, e da objetividade da norma, que protege a isonomia entre os candidatos.

Além disso, do exame dos autos, constata-se que, relativamente a Aline Priori, só há uma prova a demonstrar que teria a servidora trabalhado em benefício da campanha eleitoral dos candidatos da situação, consistente na contestação das fls. 49-57, protocolada perante o cartório eleitoral, em 14.9.2016, às 14h03min, em nome da Coligação Ronda Alta no Caminho Certo, subscrita por ambos os servidores, Aldair e Aline, na qualidade de advogados da coligação.

 

Aldair Paulo Pasquetti, por sua vez, era o representante da referida coligação junto à Justiça Eleitoral, conforme Demonstrativo de Atos Partidários – DRAP – acostado à fl. 29.

Para comprovar a cedência do servidor em benefício da campanha dos candidatos reeleitos, foram acostados aos autos os documentos das fls. 31 e 40-43, pertinentes a atas indicando sua participação em duas reuniões políticas, realizadas em 1º.8.2016, uma segunda-feira, às 18h, e em 19.8.2016, uma sexta-feira, às 15h (essa última ata também está nas fls. 383-388).

Nas razões de reforma, Aldair aponta que a reunião sobre propaganda eleitoral, ocorrida no dia 19.8.2016, uma sexta-feira, às 15h, foi realizada fora do horário do expediente na prefeitura, que, nas sextas-feiras, compreende o período das 7h às 13h, conforme Decreto Municipal n. 1606/2015, que colacionou às fls. 157-158 dos autos.

Referido ato normativo instituiu o turno único na Administração Municipal de Ronda Alta. Nos outros dias da semana, o horário de atendimento do Executivo Municipal é das 8h às 12h, e das 13h30min às 17h30min, não havendo, também, contrariedade à lei no comparecimento à reunião realizada fora desse interregno.

Assim, resta comprovada a inexistência de qualquer ilegalidade quanto ao comparecimento dos servidores a essas duas reuniões.

O representante também acostou aos autos a documentação das fls. 32, 59, 365, 376-378, que retrata ofícios emitidos pela Coligação Ronda Alta no Caminho Certo, dirigidos ao Juízo Eleitoral, subscritos pelo servidor Aldair na condição de representante da coligação. O primeiro (fl. 32), foi emitido em 11.8.2016 e não aponta data de protocolo; o segundo (fl. 59 e fl. 400), de 23.9.2016, foi entregue ao cartório eleitoral em 23.9.2016, às 14h16min; o terceiro (fl. 365), datado de 29.8.2016, foi protocolado nesse mesmo dia, às 18h01min; o quarto (fl. 376), de 18.8.2016, foi protocolado em 19.8.2016, às 16h53min; o quinto (fl. 377), de 11.8.2016, foi protocolado em 12.8.2016, às 16h36min; e o sexto (fl. 378, idêntico ao da fl. 382), de 19.9.2016, foi apresentado ao cartório em 19.9.2016, às 17h.

Nas fls. 368-370, foi juntado um pedido de providências entregue ao cartório eleitoral em 30.9.2016, às 15h23min, também em nome da coligação em questão, e assinado por Aldair, enquanto procurador do órgão partidário.

Nas fls. 60 (idêntica à fl. 401), 375 e 389, foram juntadas certidões atestando a intimação e notificação de Aldair, na condição de representante da referida coligação, nos dias 26.9.2016 (segunda-feira), 1º.10.2016 (sábado) e 13.9.2016 (terça-feira). Na fl. 379 (idêntica à fl. 381), foi acostada ata de audiência judicial eleitoral realizada em 26.9.2016, às 9h, na qual Aldair trabalhou como procurador da coligação. Quanto às mídias de propaganda eleitoral, constam nos autos as intimações recebidas por Aldair às fls. 362 (idêntica à da fl. 363), de 24.8.2016, às 17h47min, e 367v., de 12.9.2016, sem horário.

Em sua defesa, os servidores afirmam que o cargo de secretário municipal não se submete a regime fixo de horário. E mais, Aldair revelou que, nos documentos trazidos aos autos apenas firmou sua assinatura por ser o representante da coligação partidária, não tendo elaborado as peças pessoalmente ou trabalhado nelas durante o período de serviço prestado à municipalidade.

Os recorridos também defendem que o trabalho intelectual relativo à produção dos textos jurídicos colacionados aos autos não foi realizado durante o horário de expediente, e, sim, fora do período de trabalho junto à municipalidade.

Entendo razoável considerar que esses argumentos socorrem o pleito de afastamento da condenação no tocante à servidora Aline Priori, uma vez que, de toda a farta prova juntada aos autos, o partido representante, ora recorrente, só conseguiu demonstrar sua atuação por meio de um único documento, a saber, sua assinatura em uma peça processual, também subscrita por Aldair. Não há nenhum outro elemento a evidenciar tenha ela desempenhado serviços advocatícios, ou outro trabalho, em benefício da campanha eleitoral dos recorridos durante o horário de expediente junto à Prefeitura de Ronda Alta.

Assim, para Aline Priori, tenho que a prova é por demais fraca e dúbia de que a servidora tenha sido cedida em benefício da campanha eleitoral, merecendo ser reformada a sentença no ponto.

Quanto a Aldair, a conclusão é diversa, diante da robusta prova de que o servidor trabalhou ativamente em prol da campanha dos candidatos que apoiava, em dias úteis e durante o funcionamento da prefeitura, merecendo registro o fato de que muitos documentos destinados à Coligação Ronda Alta no Caminho Certo foram recebidos e firmados pelo servidor na condição de seu representante junto à Justiça Eleitoral, em dias de horário normal da administração pública.

Cito, como exemplo, a documentação das fls. 60, 375 e 389, em que constam as certidões de intimação e de notificação de Aldair na condição de representante da referida coligação, numa segunda-feira, dia 26.9.2016, e terça-feira, dia 13.9.2016. Além disso, há nos autos prova de que também na segunda-feira, dia 26.9.2016, às 9h, o servidor patrocinou a defesa da coligação em audiência realizada perante o juízo eleitoral (fl. 379).

Para além desses documentos, há nos autos os diversos ofícios subscritos pelo servidor e entregues ao cartório eleitoral em dias de expediente normal na administração municipal, sendo manifesto o seu empenho e trabalho constante na campanha eleitoral dos candidatos reeleitos, justamente durante o período vedado pela legislação, entre agosto e setembro do ano da eleição (fls. 32, 59, 365, 376-378).

A consistência dessas provas conduz ao juízo de convicção da infração cometida, principalmente porque o servidor recebia intimações, notificações e participava de audiências durante o horário de trabalho, momento em que deveria estar concentrado em sua atividade como Secretário de Administração do Município, cargo da mais alta e relevante importância no âmbito do Poder Executivo Municipal.

Ademais, a jurisprudência sobre o tema assenta que as hipóteses de conduta vedada previstas no art. 73 da Lei n. 9.504/97 têm natureza objetiva. Verificada a presença dos requisitos necessários a caracterizar a violação da norma proibitiva, cabe ao julgador aplicar as sanções previstas nos §§ 4º e 5º do referido artigo. Colaciono os precedentes:

ELEIÇÕES 2012. AGRAVOS REGIMENTAIS. RECURSOS ESPECIAIS. AGRAVOS DE INSTRUMENTO. AIJE. CONDUTA VEDADA. CONTRATAÇÃO DE SERVIDORES. APLICAÇÃO DE MULTA. FINALIDADE ELEITORAL. DESNECESSIDADE. ASSISTÊNCIA SIMPLES. NÃO IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO PELO ASSISTIDO. AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE DA ASSISTENTE PARA RECORRER. AUSÊNCIA DE RECURSO DO ASSISTIDO. ILEGITIMIDADE RECURSAL. MANUTENÇÃO DO ACÓRDÃO REGIONAL. DESPROVIMENTO.

1. A Corte de origem entendeu configurada a conduta vedada pelo inc. V do art. 73 da Lei n° 9.504/97, haja vista a não demonstração do caráter excepcional abrigado pela alínea d do mencionado dispositivo. A alteração dessa conclusão implicaria, efetivamente, o reexame de fatos e provas, o que não é permitido em sede de recurso especial eleitoral, a teor das Súmulas nos 7/STJ e 279/STF.

2. A configuração das condutas vedadas prescritas no art. 73 da Lei nº 9.504/97 se dá com a mera prática de atos, desde que esses se subsumam às hipóteses ali elencadas.

3. Falta legitimidade à assistente simples para interpor recurso, quando o assistido não manifesta vontade de recorrer.

4. Agravos regimentais desprovidos.

(TSE, Agravo de Instrumento n. 51527, Acórdão, Relatora Min. Luciana Christina Guimarães Lóssio, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 222, Data 25.11.2014, Página 153-154.)

 

REPRESENTAÇÃO. PREFEITO E VICE-PREFEITO. PRETENSA OCORRÊNCIA DE CONDUTA VEDADA A AGENTE PÚBLICO. VIOLAÇÃO AO ART. 275 DO CÓDIGO ELEITORAL. OMISSÃO NÃO CONFIGURADA. EDUCAÇÃO. NÃO CARACTERIZADA, PARA FINS ELEITORAIS, COMO SERVIÇO PÚBLICO ESSENCIAL. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA NON REFORMATIO IN PEJUS. ART. 73, INCISO V, DA LEI Nº 9.504/97. CONTRATAÇÃO DE SERVIDORES NO PERÍODO DE TRÊS MESES QUE ANTECEDE O PLEITO ELEITORAL. CONFIGURAÇÃO. MERA PRÁTICA DA CONDUTA. DESNECESSÁRIO INDAGAR A POTENCIALIDADE LESIVA. FIXAÇÃO DA REPRIMENDA. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
(...)
6. A configuração das condutas vedadas prescritas no art. 73 da Lei nº 9.504/97 se dá com a mera prática de atos, desde que esses se subsumam às hipóteses ali elencadas, porque tais condutas, por presunção legal, são tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre os candidatos no pleito eleitoral, sendo desnecessário comprovar-lhes a potencialidade lesiva.
7. Nos termos da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, caracterizada a infringência ao art. 73 da Lei das Eleições, é preciso fixar, com base na observação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, a reprimenda adequada a ser aplicada ao caso concreto.
8. Sendo a diferença entre a chapa vencedora, composta pelos ora Recorrentes, e a segunda colocada de 725 (setecentos e vinte e cinco) votos, o reduzido número - 8 (oito) - de contratações temporárias reputadas como irregulares não teve influência deletéria no transcurso normal das eleições de 2012 à Prefeitura de Corinto/MG, de forma a comprometer a normalidade e a legitimidade do pleito.
9. Recurso especial conhecido e parcialmente provido para deferir o registro de candidatura dos Recorrentes aos cargos de prefeito e vice-prefeito do Município de Corinto/MG, mantida, entretanto, a multa aplicada ao primeiro recorrente.

(TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 45060, Acórdão, Relatora Min. Laurita Hilário Vaz, Publicação: RJTSE - Revista de jurisprudência do TSE, Volume 24, Tomo 4, Data 26.09.2013, Página 392.)

Portanto, relativamente ao recorrido Aldair Paulo Pasquetti, há farta prova nos autos, suficiente para a formação de juízo de certeza e estreme de dúvidas, de que o servidor dedicou-se ativamente ao trabalho em benefício da campanha eleitoral dos candidatos à reeleição como prefeito e vice-prefeito do Município de Ronda Alta, durante o período vedado pelo art. 73, inc. III, da Lei n. 9.504/97, merecendo ser mantida a sua condenação.

 

b) Cedência do servidor público Leomar Kaká Inácio em benefício da campanha eleitoral

Quanto ao servidor Leomar Kaká Inácio, que exercia o cargo de Secretário Municipal do Índio, a sentença concluiu que, da prova coligida nos autos, não se constata seu efetivo envolvimento em campanha eleitoral durante período de expediente.

Apontou o julgador monocrático que as ocorrências policiais acostadas aos autos fazem somente prova unilateral das alegações do partido representante, que as fotografias e a nota fiscal indicando a aquisição de carne junto ao Matadouro Serafin não demonstram a relação do fato com a realização de propaganda eleitoral em horário de expediente do servidor, ou mesmo que o produto tenha sido destinado ao oferecimento em jantares e almoços durante a campanha política, ou utilizado no encontro com mulheres durante a campanha eleitoral.

Essa conclusão não foi infirmada pelas razões de reforma aduzidas pelo PDT de Ronda Alta.

De fato, as alegações trazidas nas ocorrências policiais acostadas aos autos às fls. 62, 63 e 66 - nas quais afirmava-se que o servidor e o cacique da tribo indígena impediram pessoas de fazer campanha eleitoral da coligação adversária à dos candidatos da situação - não foram devidamente comprovadas nos autos.

Igualmente, as fotografias das fls. 70 e 71, retratando pessoas e automóveis, são insuficientes para caracterizar prova de qualquer infração eleitoral, e sequer indicam a data do fato.

As pessoas ouvidas em juízo (mídia à fl. 342), Andila Inácio Belfort, que prestou depoimento como testemunha, e Fernanda Belfort, ouvida como informante, não comprovaram ter o servidor participado de comícios durante o horário de expediente da prefeitura.

Ausente prova cabal acerca da realização de atos de campanha durante o horário de trabalho do servidor público, é inviável a procedência da alegação de prática da conduta vedada descrita art. 73, inc. III, da Lei n. 9.504/97, merecendo ser mantida a improcedência da condenação, conforme concluído na sentença.

 

c) Utilização de um automóvel público para a distribuição de propaganda eleitoral

No tocante à utilização de um automóvel da municipalidade para a distribuição de propaganda eleitoral, assim decidiu o juízo a quo (fl. 456v.):

C) Quanto à utilização de veículo do município de Ronda Alta em campanha eleitoral:

Nesse tocante, sinale-se que dos documentos anexados aos autos, das declarações prestadas pelas testemunhas e do vídeo acostado, não se pode verificar de maneira inconteste que o automóvel da administração foi usado em campanha eleitoral, retando frágil o caderno probatório relativo ao vedado no art. 73, inc. I, da Lei n. 9.504/97.

Para provar a alegação, foi juntada aos autos, à fl. 78, uma mídia contendo o arquivo “propaganda em carro público”, que apresenta curta filmagem (13 segundos) de um veículo de placas IPG 3515, de propriedade da administração pública de Ronda Alta. O vídeo mostra que, no banco traseiro do automóvel, havia três convites da campanha eleitoral dos recorridos.

Considerando tratar-se de apenas três convites, deixados no banco de trás do veículo, e que não houve prova da efetiva distribuição de propaganda ou do uso do bem público em benefício da campanha, tem-se que a prova também é bastante fraca em relação a essa imputação, merecendo ser mantida a improcedência no ponto.

 

d) Distribuição de alimentos durante eventos de campanha e em reunião de mulheres

De igual modo, não foi produzida prova de que os candidatos Miguel e Odemar tenham sido os responsáveis pela distribuição de alimentos durante eventos de campanha ou tenham se envolvido na reunião de mulheres.

O evento, cujo convite virtual, divulgado pela rede social Facebook, consta à fl. 254, não anuncia qualquer bandeira partidária e, a todo efeito, foi realizado em reduzida comunidade.

Em juízo, a testemunha Janete Bratz (mídia à fl. 342), que participou do encontro feminino em questão, afirmou que as pessoas combinaram de levar um lanche. De igual forma, na audiência de instrução, Cristine Pedrossini confirmou que a refeição foi preparada pelas próprias participantes do evento.

Ainda que os candidatos tenham comparecido e realizado discurso na ocasião, não logrou o recorrente demonstrar a alegada ilicitude ou utilização do evento para cometimento de qualquer infração eleitoral, devendo também ser mantida a sentença quanto a esse fato.

 

Conclusão

Estabelecido, assim, o exame do mérito recursal e das razões de reforma, mostra-se necessário tecer algumas considerações sobre a penalização dos candidatos a prefeito e vice-prefeito reeleitos.

O art. 73, § 8º, da Lei n. 9.504/97 estabelece que “aplicam-se as sanções do § 4º aos agentes públicos responsáveis pelas condutas vedadas e aos partidos, coligações e candidatos que delas se beneficiarem”.

Na hipótese dos autos, não há dúvidas de que os candidatos foram beneficiados com a prática da conduta vedada, assim como a sua coligação partidária.

Conforme leciona Rodrigo López Zilio, a cessão do servidor público pode ocorrer a qualquer título e sob qualquer pretexto, seja a título gratuito, oneroso, eventual, transitório ou definitivo. Igualmente, é desnecessária a aferição de eventual ilicitude na cessão do servidor, já que a regularidade na cessão do servidor não torna lícita a conduta. O uso do serviço, do mesmo modo, ocorre em quaisquer de suas espécies e formas:

Caracteriza-se como conduta vedada a cessão de servidor público e o uso de seus serviços “para comitês de campanha eleitoral”. Tendo por base o desiderato de preservação da isonomia de oportunidade entre os candidatos, somente uma ampla interpretação dessa expressão pode proporcionar uma proteção suficiente ao bem jurídico tutelado. Por consequência, a ex-pressão “para comitês de campanha eleitoral” corresponde na vedação de cessão de servidor público e uso de seus serviços para a prática de atos de campanha – quaisquer que sejam –, em horário normal de expediente. Assim, essa expressão não se restringe à prática de ato exclusivo de pedido de voto ou de convencimento do eleitor, incluindo qualquer atividade – ainda que administrativa – que tenha vinculação com a campanha eleitoral de candidato, partido ou coligação. Pode-se exemplificar como atos abarcados pela expressão “para comitês de campanha eleitoral”, a condução de veículos e bens em atividade de campanha eleitoral, o agendamento de reuniões, comícios e entrevistas, a participação em atos de fiscalização do processo eleitoral perante a Zona Eleitoral e a efetiva distribuição de material de propaganda. No mesmo toar, ainda, caracteriza essa conduta vedada a cessão de servidores públicos, vinculados ao departamento de limpeza urbana, em horário de expediente e sem a respectiva licença, para preparar local destinado a comício de candidato a reeleição ou apoiado pelo atual mandatário da circunscrição. Portanto, a expressão “para comitês de campanha eleitoral” alcança qualquer atividade vinculada à campanha eleitoral do candidato, partido ou coligação, abrangendo tanto a coordenação como a execução das atividades mencionadas.

 

Também não importa a natureza do vínculo estabelecido entre o servidor e a Administração Pública: veda-se a utilização e cessão do servidor efetivo, concursado ou não, com contrato temporário, cargo em comissão, função comissionada. Neste sentido, aliás, revela-se adequada a opção do legislador pela nomenclatura “servidor público”, que apresenta sentido amplo, abrangendo todo e qualquer vínculo com a Administração Pública. 

(Direito Eleitoral. 5ª. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2016, pp. 603-604).

 

José Jairo Gomes, por sua vez, salienta que a regra em apreço não impede que servidor público de forma espontânea se engaje na campanha, colaborando com os candidatos e partidos que lhe pareçam simpáticos. Porém, salienta o ilustre doutrinador:

Todavia, deve o servidor guardar discrição. Não poderá atuar em prol de candidatura “durante o horário de expediente normal”, muito menos na repartição em que desempenha as funções de seu cargo, tampouco poderá ser cedido pelo ente a que se encontra vinculado. A vedação alcança os servidores de todas as categorias, inclusive os ocupantes de cargos comissionados, conforme entendeu o TSE no julgamento do AMC no 1636/PR (DJ, v. 1, 23-9-2005, p. 128).

(Direito eleitoral. 12. ed.São Paulo: Atlas, 2016, pp. 750).

Dessa forma, a sanção por condutas vedadas é aplicada tanto ao agente público responsável pelo órgão que publicou a notícia como aos partidos, coligações e candidatos beneficiados com a publicidade institucional, independentemente da sua participação ativa na prática do ilícito, conforme pacificado na jurisprudência:

ELEIÇÕES 2012. RECURSO ESPECIAL. FAC-SÍMILE. DISPENSABILIDADE. APRESENTAÇÃO. ORIGINAIS. APLICAÇÃO. RES.-TSE N° 21.711/2004. AÇÕES. ELEITORAIS. PREVALÊNCIA. RATIO PETENDI SUBSTANCIAL. ABUSO DE PODER. NÃO CONFIGURAÇÃO. DESVIRTUAMENTO. FESTIVIDADE PRIVADA. PATROCÍNIO. PREFEITURA. PROMOÇÃO. PESSOAL. BENEFÍCIO. CANDIDATURA. CONDUTA VEDADA. ART. 73, I, DA LEI Nº 9.504/97. CESSÃO. BENS. MUNICÍPIO. INCIDÊNCIA. MULTA. PARCIAL PROVIMENTO.

[...]

3. O desvirtuamento de festividade tradicional, de caráter privado, mas patrocinada pela prefeitura local, em favor da campanha dos então investigados, embora não evidencie, na espécie, o abuso do poder econômico e político, ante a ausência de gravidade das circunstâncias que o caracterizaram, configura a conduta vedada do art. 73, I, da Lei nº 9.504/97, uma vez que os bens cedidos pela municipalidade para a realização do evento acabaram revertendo, indiretamente, em benefício dos candidatos.

4. De acordo com o art. 73, § 8º, da Lei nº 9.504/97, estarão sujeitos à multa do § 4º os agentes públicos responsáveis pelas condutas vedadas, bem como os partidos, coligações e candidatos que se beneficiarem com a prática ilícita, sendo, portanto, desnecessária a demonstração da participação ativa do candidato, para a aplicação da penalidade pecuniária.

5. No caso, é suficiente a aplicação tão somente da pena de multa, porquanto a cassação dos diplomas se revelaria, no contexto dos autos, medida desproporcional à ilicitude cometida, uma vez não prejudicada a normalidade do pleito, tampouco a essência do processo democrático, pela disputa livre e equilibrada entre os candidatos.

6. Recursos especiais parcialmente providos, para afastar as sanções de inelegibilidade e cassação do diploma, aplicando-se, contudo, multa individual aos representados no valor de 50 mil (cinquenta mil) UFIRs, com fundamento no art. 73, § 4º, da Lei nº 9.504/97.

(TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 13433, Acórdão de 25.08.2015, Relator Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Relator designado Min. JOSÉ ANTÔNIO DIAS TOFFOLI, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 189, Data 05.10.2015, Página 137.)

 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PUBLICIDADE INSTITUCIONAL. PERÍODO VEDADO. MULTA. APLICAÇÃO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. DESPROVIMENTO.

1. Basta a veiculação da propaganda institucional nos três meses anteriores ao pleito para a caracterização da conduta prevista no art. 73, VI, b, da Lei nº 9.504/97, independentemente do momento em que autorizada.

2. Não se pode eximir os representados da responsabilidade pela infração, ainda que tenha ocorrido determinação em contrário, sob pena de ineficácia da vedação estabelecida na legislação eleitoral.

3. Ainda que nem todos os representados tenham sido responsáveis pela veiculação da publicidade institucional, foram por ela beneficiados, motivo pelo qual também seriam igualmente sancionados, por expressa previsão do § 8º do art. 73 da Lei nº 9.504/97.

4. Divergência jurisprudencial não configurada.

5. Agravo regimental desprovido.

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 35517, Acórdão de 01.12.2009, Relator Min. MARCELO HENRIQUES RIBEIRO DE OLIVEIRA, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Data 18.02.2010, Página 26.)

Nesses termos, os candidatos a prefeito e a vice-prefeito restaram beneficiados pelo exercício da advocacia realizado pelo servidor durante o seu horário de expediente junto à municipalidade, razão pela qual a sanção deve ser aplicada a ambos, nos termos dos parágrafos 4º, 5º e 8° do art. 73 da Lei n. 9.504/97:

§ 4º O descumprimento do disposto neste artigo acarretará a suspensão imediata da conduta vedada, quando for o caso, e sujeitará os responsáveis a multa no valor de cinco a cem mil UFIR.

§ 5° Nos casos de descumprimento do disposto nos incisos do caput e no § 10, sem prejuízo do disposto no § 4º, o candidato beneficiado, agente público ou não, ficará sujeito à cassação do registro ou do diploma.

(...)

§ 8º Aplicam-se as sanções do § 4º aos agentes públicos responsáveis pelas condutas vedadas e aos partidos, coligações e candidatos que delas se beneficiarem.

Observo, outrossim, que a ação foi julgada improcedente quanto à coligação beneficiária, e que esse ponto da sentença não foi atacado nem foi objeto do recurso interposto, razão pela qual descabe a reforma da decisão, sob pena de violação à máxima da non reformatio in pejus.

 

Penalidades

No tocante à pena aplicada, Aldair Paulo Pasquetti foi condenado ao pagamento de multa individual no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) e à declaração da inelegibilidade. Miguel Ângelo Gasparetto e Odemar Paulo Raimondi foram condenados ao pagamento de multa individual de R$ 15.000,00, à declaração da inelegibilidade e à cassação de seus diplomas, pela prática de condutas vedadas relativamente a dois fatos.

Entretanto, na aplicação da penalidade, há de se observar os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, realizando-se a ponderação entre o bem jurídico tutelado – igualdade na disputa eleitoral – e a gravidade da conduta.

Tendo em conta a conclusão pelo afastamento da condenação quanto a um dos fatos considerados na sentença, tenho que a sanção pecuniária deve ser reduzida ao mínimo legal para Aldair Paulo, à razão de R$ 5.320,50, equivalente a 5 mil UFIR. Para cada um dos candidatos beneficiados com a prática da conduta vedada, a penalidade também deve ser diminuída para duas vezes o mínimo legal, totalizando a importância de R$ 10.641,00.

Além disso, conquanto antijurídicos, os atos praticados não tiveram gravidade para, por si só, desequilibrar o pleito a ponto de afetar a legitimidade e a normalidade das eleições, principalmente levando-se em conta que se está concluindo pelo uso dos serviços de um único servidor público em benefício da campanha eleitoral.

A respeito deste tema, a elucidativa jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral assenta que, para afastar determinado mandato eletivo obtido nas urnas, compete à Justiça Eleitoral, com base na compreensão da reserva legal proporcional, verificar a existência de grave ilícito eleitoral, suficiente para ensejar as severas e excepcionais sanções de cassação de diploma e de declaração de inelegibilidade:

ELEIÇÕES 2008. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DE PODER ECONÔMICO E POLÍTICO. DECLARAÇÃO DE INELEGIBILIDADE. DESPROVIMENTO.

1. A atuação da Justiça Eleitoral deve ocorrer de forma minimalista, tendo em vista a possibilidade de se verificar uma judicialização extremada do processo político eleitoral, levando-se, mediante vias tecnocráticas ou advocatícias, à subversão do processo democrático de escolha de detentores de mandatos eletivos, desrespeitando-se, portanto, a soberania popular, traduzida nos votos obtidos por aquele que foi escolhido pelo povo. A posição restritiva não exclui a possibilidade de a Justiça Eleitoral analisar condutas à margem da legislação eleitoral. Contudo, para afastar legalmente determinado mandato eletivo obtido nas urnas, compete a esta Justiça especializada, com base na compreensão da reserva legal proporcional e em provas lícitas e robustas, verificar a existência de grave abuso, suficiente para ensejar a severa sanção da cassação de diploma e/ou declaração de inelegibilidade. 

2. Quanto ao abuso de poder, nos termos da nova redação do art. 22, inciso XVI, da Lei Complementar nº 64/1990, não se analisa mais a potencialidade de a conduta influenciar no pleito (prova indiciária da interferência no resultado), mas "a gravidade das circunstâncias que o caracterizam". Todavia, por se referir ao pleito de 2008, aplica-se ao caso dos autos a jurisprudência da época que ainda condicionava a configuração do abuso de poder à análise da potencialidade apta a desequilibrar o pleito.

3. Subsiste interesse recursal em decorrência do advento da Lei Complementar nº 135/2010.

4. Abuso do poder político e econômico. Doação de material esportivo mais de 1.000 pares de tênis distribuídos em junho e julho de 2008 com ampla divulgação, atingindo praticamente todos os alunos da rede pública municipal. O acórdão regional demonstrou que: i) o programa social não se encontrava em execução orçamentária em 2007, tampouco existia lei a amparar a doação realizada por meio de abertura de créditos adicionais especiais, porquanto a lei que os haveria aprovado também teria condicionado sua utilização ao exercício do ano de 2007; ii) a conduta teve potencialidade para desequilibrar a eleição.

5. Inviável no caso concreto novo reenquadramento jurídico dos fatos, pois necessário seria o reexame das provas dos autos, o que não se admite em recurso especial eleitoral.

6. Recurso desprovido.

(TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 1627021, Acórdão de 30.11.2016, Relator Min. GILMAR MENDES, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 20.3.2017, Página 90.) (Grifei.)  

Assim, ainda que a ação seja processada com base no rito do art. 22 da LC n. 64/90, a penalidade de inelegibilidade prevista no inc. XVI do referido dispositivo legal depende de juízo de ponderação da gravidade das circunstâncias que envolvem os fatos.

Da mesma forma, a cassação do registro ou do diploma não é medida impositiva, uma vez que o § 5° do art. 73 da Lei das Eleições apenas dispõe estarem os candidatos beneficiados sujeitos à cassação do registro ou do diploma.

Na hipótese dos autos, é suficiente à reprimenda da conduta vedada em questão a pena pecuniária, nos termos fixados pelo juízo a quo, pois a manutenção das demais sanções cominadas na sentença não atenderia ao princípio da proporcionalidade, em relação ao seu subprincípio ou máxima parcial da necessidade ou exigibilidade, nos termos da mais moderna doutrina (Exames inerentes à proporcionalidade, em: ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios – da definição à aplicação dos princípios jurídicos -, 11 ed., São Paulo: Malheiros Editores, 2010, p. 167-169).

Com essas razões, tenho que a violação mostra-se demasiadamente diminuta para atrair as sanções de cassação do diploma e de declaração da inelegibilidade, medidas que se apresentam fora dos parâmetros da razoabilidade e da proporcionalidade de apenamento para este tipo de conduta.

Nesse sentido, os seguintes precedentes:

AGRAVOS REGIMENTAIS. RECURSOS ESPECIAIS ELEITORAIS. ELEIÇÕES 2012. PREFEITO. REPRESENTAÇÃO. CONDUTA VEDADA AOS AGENTES PÚBLICOS. ART. 73, III, DA LEI 9.504/97. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. INCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO.

1. Consoante a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a incidência das sanções de multa e de cassação do diploma (art. 73, §§ 4º e 5º, da Lei 9.504/97) deve observar os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

2. No caso dos autos, os agravados foram multados pela prática da conduta vedada do art. 73, III, da Lei 9.504/97, pois o Secretário Adjunto de Saúde de Pirapora/MG e sua assistente ordenaram que duas agentes comunitárias convidassem gestantes durante o horário de expediente para palestras e consultas médicas que ocorreriam em 1º.9.2012. Esse convite, porém, teve como real objetivo a participação dessas pacientes na gravação de programa eleitoral.

3. Considerando que o ilícito foi praticado uma única vez e contou com a participação de somente quatro servidores, a imposição de multa no mínimo legal a cada um dos agravados revela-se consentânea com esses princípios.

4. Agravos regimentais desprovidos.

(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 122594, Acórdão de 25.06.2014, Relator Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Publicação: DJ - Diário de justiça, Tomo 148, Data 12.8.2014, Página 100-101.)

 

Recurso. Representação. Conduta vedada a agente público. Art. 73, inc. III, da Lei n. 9.504/97. Multa. Eleições 2012. Alegada utilização de servidores municipais, em horário de expediente, para campanha eleitoral. Conduta vedada comprovada apenas em relação a um servidor público. Reconhecido o evidente benefício à campanha dos candidatos da chapa majoritária. Imposição da reprimenda prevista no § 8º do art. 73 da Lei das Eleições. Fato, entretanto, sem gravosidade suficiente a ensejar a penalidade de cassação do diploma. Provimento parcial.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 34505, Acórdão de 12.11.2014, Relator DR. LEONARDO TRICOT SALDANHA, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 207, Data 14.11.2014, Página 02.)

 

Recurso eleitoral. Ação de investigação judicial eleitoral. Conduta vedada aos agentes públicos. Pedido de cassação de registro ou diploma. Pedido de decretação de inelegibilidade. Aplicação de multa. Prefeito, candidatos à eleição majoritária e assessor jurídico do município.

Não há litisconsórcio passivo necessário entre coligação e candidatos em sede de AIJE para apuração de condutas vedadas.

Cedência e uso dos serviços advocatícios de servidor público em horário de expediente. Jornada de trabalho declinada como " à disposição do prefeito " não flexibiliza expediente mínimo prefixado, ao revés, dilata esse horário. O exercício legal de advocacia privada é exceção às condutas vedadas e deve ser provado nos autos, não sendo suficiente a sua mera alegação. Ônus da prova incumbe a quem alega a exceção.

Multa cominada em seu valor mínimo, ausente gravidade que justifique a cassação de diploma.

Não cabe cominar inelegibilidade quando o único sustentáculo da ação é conduta vedada.

Deram provimento ao recurso.

(TRE-RS,Recurso Eleitoral n. 32688, Acórdão de 23.09.2014, Relator DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 172, Data 25.09.2014, Página 2.)

 

Recurso. Ação de investigação judicial eleitoral. Eleições 2012.

Interposição contra prefeito e vice eleitos, além de chefe anterior do executivo municipal. Alegada prática das condutas vedadas capituladas nos incs. I e III do art. 73 da Lei das Eleições e abuso de poder político. Procedência da demanda no juízo originário. Cassação dos registros de candidatura dos mandatários recentemente eleitos e declaração de inelegibilidade dos três recorrentes por oito anos. Fixação de multa, aplicada individualmente. Comprovado o aproveitamento de servidores municipais habilitados para o exercício da advocacia, em horário de expediente, para representação e defesa dos interesses da coligação e dos candidatos recorrentes, caracterizando a prática continuada da conduta vedada prevista no inc. III do art. 73 a Lei n. 9.504/97. Inexistência de nexo de causalidade entre as ilegalidades supostamente havidas nos contratos de transporte escolar celebrados pelo município e a contratação de transporte feito pela Coligação durante a campanha. Inocorrência, igualmente, do alegado uso indevido de bem público, não restando  configurada a prática de abuso de poder prevista no art. 22 da Lei Complementar n. 64/90. Aplicação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, para afastar a cassação dos diplomas dos candidatos eleitos e a declaração de inelegibilidade imposta aos atuais mandatários e ao ex-prefeito demandado. Manutenção da sanção pecuniária individual a todos os representados, no valor de 25.000 UFIR.

Ação cautelar extinta.

Parcial provimento ao recurso.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 19153, Acórdão de 13.03.2013, Relator DR. JORGE ALBERTO ZUGNO, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 47, Data 15.03.2013, Página 6.)

 

ANTE O EXPOSTO, afasto as preliminares suscitadas e VOTO pelo desprovimento do recurso interposto pelo PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA - PDT DE RONDA ALTA e pelo parcial provimento do apelo dos representados MIGUEL ÂNGELO GASPARETTO, ODEMAR PAULO RAIMONDI, ALDAIR PAULO PASQUETTI e ALINE PRIORI, para julgar improcedentes os pedidos condenatórios em face de ALINE PRIORI e, reduzir a sanção pecuniária fixada na sentença à razão de R$ 5.320,50 (cinco mil trezentos e vinte reais e cinquenta centavos) para ALDAIR PAULO PASQUETTI, e de R$ 10.641,00 (dez mil seiscentos e quarenta e um reais), de forma individualizada, para MIGUEL ÂNGELO GASPARETTO e ODEMAR PAULO RAIMONDI, afastando a determinação de inelegibilidade e de cassação dos diplomas dos candidatos.

Autorizo o pedido de cópias solicitado pela Procuradoria Regional Eleitoral.

 

(Após votar o relator, afastando as questões preliminares, negando provimento ao apelo do partido e dando parcial provimento ao recurso dos representados, pediu vista o Des. Eleitoral Luciano Losekann. Demais julgadores aguardam o voto-vista. Julgamento suspenso.)