RE - 49932 - Sessão: 03/10/2017 às 17:00

 

RELATÓRIO

A COLIGAÇÃO UNIDOS PARA RENOVAR E CRESCER interpõe recurso em face da sentença que julgou improcedente a representação por condutas vedadas a agentes públicos proposta contra os candidatos não eleitos a prefeito e a vice-prefeito do Município de Coxilha, CLEMIR JOSÉ RIGO e FERNANDO DE ALBUQUERQUE, o então prefeito de Coxilha, JÚLIO CÉSAR MESQUITA CENI, e a COLIGAÇÃO PARA FAZER MAIS E MELHOR, considerando não ter sido comprovada a prática da conduta vedada descrita no art. 73, inc. IV, da Lei n. 9.504/97, porque os materiais de construção entregues aos eleitores originaram-se de programa social e em razão da ausência de provas da finalidade eleitoral das condutas.

Em suas razões recursais, afirma que os recorridos intensificaram a distribuição gratuita de materiais de construção para grupos familiares economicamente vulneráveis em troca de votos, em datas próximas das eleições municipais, de modo a beneficiá-los na disputa eleitoral. Sustenta que a cultura política instaurada pela administração municipal de Coxilha procede dessa forma para se perpetuar no poder. Assevera que a prefeitura incrementou as despesas com referidos insumos, no ano eleitoral, em 44%, conforme média de gastos públicos e a prova acostada aos autos. Aponta que a contratação dos gastos foi realizada sem a realização de licitação, restando manifesto o fim promocional de beneficiar as candidaturas dos recorridos. Invoca a incidência do disposto no art. 73, inc. IV e § 10, da Lei n. 9.504/97. Postula a reforma da decisão, para o fim de serem condenados os recorridos.

Com as contrarrazões, os autos foram encaminhados a esta instância e remetidos em vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que se manifestou, preliminarmente, pela regularização da representação processual da parte recorrente e, no mérito, pelo desprovimento do recurso.

A representação processual da COLIGAÇÃO UNIDOS PARA RENOVAR E CRESCER foi devidamente regularizada.

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a sentença julgou o pedido condenatório improcedente com base nos seguintes argumentos:

No caso, a Coligação representante imputa ao representado Julio César Ceni, na condição de Prefeito Municipal de Coxilha, a prática da conduta vedada tipificada no art. 73, inc. IV, da Lei n. 9.504/97, de modo a beneficiar os demais representados no pleito eleitoral.

Entretanto, o frágil almanaque probatório trazido aos autos, resumido às fotografias das fls. 13/16, pois sequer arroladas testemunhas pela representante, não se mostra apto a demonstrar a prática da conduta vedada descrita na inicial.

A análise das fotografias encartadas nas fls. 13/16 não permite concluir que o representado Júlio, valendo-se do cargo de Prefeito Municipal, tenha feito uso promocional em favor de candidato da distribuição de material de construção para famílias carentes, de modo a beneficiar os demais representados, sequer sendo possível aquilatar se tais fotografias efetivamente foram produzidas durante o período eleitoral e em que local.

Ditas fotografias nem mesmo mostram a suposta distribuição de material de construção pela Administração Municipal de Coxilha.

Por outro lado, as despesas municipais com aquisição de materiais de construção para doação, demonstradas pelo documentos encartados aos autos, como bem ressaltado pelo Ministério Público Eleitoral no parecer das fls. 127/128, também ocorreram em anos anteriores e integram o Programa de Política Habitacional de Interesse Social para pessoas de baixa renda do Município de Coxilha, programa amparado em lei municipal.

Ademais, o aumento nos gastos com o programa durante o ano de 2016 não foi significativo, de modo a caracterizar a conduta vedada imputada aos representados ou mesmo afetar a igualdade de oportunidades entre os candidatos ao pleito eleitoral deste ano.

A procedência da representação, com a aplicação das sanções correspondentes, exige a certeza que somente uma prova retilínea e sem vacilações pode trazer, características que evidentemente não se fazem presentes no reduzido arcabouço probatório colacionado aos autos.

Desse modo, ausente prova segura da efetiva ocorrência da conduta vedada caracterizada pelo distribuição gratuita de bens custeados pelo Poder Público em benefício de candidato, partido político ou coligação, a derrocada da pretensão veiculada pela representante, a qual não se desincumbiu de seu ônus probatório, é o resultado que se descortina inafastável.

Não obstante o esforço da recorrente, as razões recursais apresentadas não tem o condão de infirmar essa conclusão.

Relativamente à conduta vedada prevista no art. 73, inc. IV, c/c § 10, ambos da Lei n. 9.504/97, assim dispõem os aludidos dispositivos:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[...]

IV - fazer ou permitir uso promocional em favor de candidato, partido político ou coligação, de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo Poder Público;

[…]

§ 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa. (Incluído pela Lei n. 11.300, de 2006)

A vedação busca resguardar a isonomia entre os candidatos, proibindo aos agentes públicos não a execução de programas sociais, mas o seu uso promocional, a distribuição de bens ou serviços públicos com desvio de finalidade, para beneficiar a sua candidatura.

Nesse sentido, a lição de José Jairo Gomes:

Para a configuração do vertente inciso IV, é preciso que o agente use “distribuição gratuita de bens e serviços” em prol de candidato. Aqui não se trata de reprimir a distribuição em si mesma, mas sim o uso promocional e eleitoreiro que dela se faça. Não se exige que durante o período eleitoral o programa social antes implantado seja abolido, ou tenha interrompida ou suspensa sua execução. Relevante para a caracterização da figura em exame é o desvirtuamento do sentido da própria distribuição, a sua colocação a serviço de candidatura, enfim, o seu uso político-promocional.

(Direito Eleitoral, 13ª ed., 2017, p. 697.)

Na hipótese dos autos, confrontando-se a prova com os fatos apontados, não há como afirmar tenham os recorridos desbordado das ações próprias do administrador, visto que a administração pública não pode ser interrompida, nem mesmo em período eleitoral, pois as necessidades de um município estão sempre presentes.

O instituto da reeleição coloca o candidato da situação claramente em relação de vantagem diante dos demais candidatos. Não se desconhece essa circunstância. Neste passo, a realização de obras ou o fornecimento de insumos à população, durante o último ano de mandato com eventual influência nas eleições, fazem parte, de forma indissociável, do atual sistema de eleições majoritárias, que permite a reeleição, fato já incorporado no texto constitucional.

Contudo, importa registrar que os recorridos sequer foram eleitos, visto que restaram derrotados nas urnas.

Não se pode desconsiderar que o fornecimento de materiais de construção foi executado em período próximo ao pleito eleitoral, e que este fato pode ter indiretamente beneficiado os candidatos recorridos com alguns votos. No entanto, a prática de conduta vedada ou de abuso de poder não restou suficientemente comprovada.

Não é possível concluir pela configuração de ilícito eleitoral, pois, nos termos da sentença recorrida, as despesas da administração municipal de Coxilha com aquisição de materiais de construção para doação à população também ocorreram em anos anteriores e integram o Programa de Política Habitacional de Interesse Social para pessoas de baixa renda do município.

Assim, o agir dos recorridos estava amparado por programa instituído por lei municipal, não podendo, ainda que executado próximo ao pleito eleitoral, ser caracterizado como conduta vedada.

 

Com essas razões, concluo deva ser mantida a improcedência da ação.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso.