RE - 54845 - Sessão: 26/09/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por ARNILDO IVO PRIEBE (fls. 46-51), candidato ao cargo de vereador do Município de Cerro Branco, contra sentença do Juízo da 10ª Zona Eleitoral (fls. 43-44v.), que desaprovou as contas referentes às eleições de 2016 em virtude (a) da juntada de contrato de prestação de serviços advocatícios sem a informação do valor estimável correspondente, (b) da realização de gastos com combustível sem a consequente locação ou cessão de veículo, (c) de omissão no encaminhamento de relatório financeiro acerca dos recursos financeiros recebidos, (d) da identificação de despesas na conta relativa ao Fundo Partidário, sem a emissão de cheque, com a realização de pagamento por intermédio de dinheiro e (e) da realização de retiradas em dinheiro, na conta de outros recursos, por intermédio de cheques compensados diretamente no caixa e, posteriormente, efetuados os pagamentos das despesas com dinheiro.

Em suas razões recursais, como forma de justificar a sua pretensão, aludiu à documentação que integra os autos, à jurisprudência vigorante e ao instituto da boa-fé. Requereu a reforma da sentença para que as contas sejam julgadas aprovadas.

Foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou, preliminarmente, pela anulação da sentença e pelo retorno dos autos à origem; no mérito, pelo desprovimento do recurso (fls. 57-64).

Proferido despacho com a determinação de que a parte recorrente fosse intimada acerca da preliminar de nulidade da sentença suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral (fl. 66), sobreveio certificação de transcurso do prazo sem manifestação do interessado (fl. 70).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo (fls. 45-46) e preenche os demais requisitos de admissibilidade, razão por que dele conheço.

Passo à análise da questão preliminar suscitada pelo Ministério Público Eleitoral.

A Procuradoria Regional Eleitoral lançou manifestação no sentido da nulidade da decisão de primeiro grau, ao fundamento de que houve omissão quanto à necessidade de transferência dos valores relativos ao uso indevido e à ausência de comprovação de gastos com recursos do Fundo Partidário, a teor do disposto nos arts. 32 e 72, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Com efeito, dentre outras irregularidades, o examinador técnico das contas apontou o pagamento “de despesas no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) na conta Fundo Partidário de n. 06.010387.0-1 (fl. 19) sem emissão de cheque, tendo realizado retiradas em dinheiro da conta bancária para pagamento de tais despesas.” (fl. 29)

Entretanto, mesmo acolhendo o parecer técnico conclusivo e reconhecendo como principal elemento para a reprovação das contas o fato de que “foram identificadas despesas no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) na conta do Fundo Partidário, sem a emissão de cheque, com a realização de pagamento através de dinheiro”, e que, “em razão da utilização de recursos em espécie (inclusive do Fundo Partidário) para o pagamento de despesas de campanha, circunstância que diminui o potencial de controle da Justiça Eleitoral sobre os recursos utilizados” (fl. 44), a sentença foi omissa quanto à consequência legal de determinar o recolhimento dos respectivos montantes ao Tesouro Nacional, a teor do disposto no § 1º do art. 72 da resolução de regência, verbis:

Verificada a ausência de comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário ou a sua utilização indevida, a decisão que julgar as contas determinará a devolução do valor correspondente ao Tesouro Nacional no prazo de cinco dias após o trânsito em julgado, sob pena de remessa dos autos à representação estadual ou municipal da Advocacia-Geral da União para fins de cobrança.

Ressaltou o órgão ministerial que a inobservância do ordenamento jurídico e a ausência de fundamentação, matérias de ordem pública, não estão acobertadas pela preclusão, motivo pelo qual os autos devem retornar à origem para que nova decisão seja proferida.

Com acerto, uma vez que a Resolução TSE n. 23.463/15 estabelece que os valores em tela devem ser devolvidos ao Tesouro Nacional como consequência lógica daquela constatação.

A absoluta omissão da sentença sobre o ponto, para determinar o recolhimento ou para afastá-lo, caracteriza inequívoca ausência de fundamentação sobre dispositivo regulamentar, ocasionando a nulidade da sentença, conforme já entendeu esta Corte, em recente caso de circunstâncias análogas, do qual se extraiu a seguinte ementa:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. PRELIMINAR. SENTENÇA NULA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. VÍCIO INSANÁVEL. ELEIÇÕES 2016.

Preliminar de nulidade da sentença acolhida. Silêncio da sentença com relação à penalidade de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional. Não operada preclusão, pois matéria de ordem pública. Vício insanável que conduz nulidade absoluta. Retorno à origem.

Nulidade.

(RE 315-30, Rel. Dr. Sílvio Ronaldo Santos de Moraes, julg. em 27.6.2017.)

Colho ainda do referido julgamento a manifestação do Dr. Luciano Losekann, que bem sintetiza a questão:

Como foi ressaltado pelo ilustre Procurador Regional Eleitoral, é matéria de ordem pública, e não se opera preclusão; até porque, na eventualidade de recurso da Procuradoria Regional Eleitoral para o TSE, este anulará o acórdão, retornando os autos ao primeiro grau para apreciação ou não do art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15. O citado artigo é consequência natural do reconhecimento de que houve uma irregularidade na prestação de contas, e o juiz deveria ter se pronunciado sobre a questão. Então, sobre isso não se opera a preclusão; é matéria de ordem pública que não fica sanada com eventual recurso exclusivo do recorrente. Por esses motivos, acolho a preliminar.

Dessa forma, estando eivada por vício insanável, visto que omissa sobre questão cuja incidência é decorrência legal da irregularidade apurada, a sentença deve ser anulada.

Diante do exposto, VOTO pela anulação da sentença, determinando o retorno dos autos ao Juízo da 10ª Zona Eleitoral para que se manifeste expressamente sobre as consequências legais da utilização de valores relativos ao uso indevido e à ausência de comprovação de gastos com recursos do Fundo Partidário.