RE - 25596 - Sessão: 23/08/2017 às 17:00

 

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por PAULO CÉSAR LÂNGARO em face da sentença proferida pelo Juízo Eleitoral da 100ª Zona (fls. 394-398v.), que julgou parcialmente procedente a representação eleitoral, ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, deixando de aplicar a pena de cassação do mandato, mas condenando o ora recorrente à multa no valor de R$ 5.320,50, em razão da prática de conduta vedada, prevista no art. 73, inc. VII, da Lei n. 9.504/97, relativa à realização de despesas com publicidade institucional, no primeiro semestre do ano das eleições, em valor superior à média dos gastos no primeiro semestre dos três últimos anos que antecedem o pleito.

Nas razões recursais (fls. 403-417), o recorrente aduz que não ordenou todas as despesas descritas no primeiro semestre de 2016. Afirma que esteve à frente do Poder Legislativo de Tapejara durante apenas 4 meses e 15 dias, sendo responsável pelo pagamento de “R$ 9.300,00 mais R$ 2.240,00”, e não do valor total gasto no semestre. Sustenta que as publicidades contratadas não visaram promover ou divulgar as ações do presidente do legislativo. Alega que as sessões da Câmara Municipal começaram a ser transmitidas pela rádio local somente a partir do segundo semestre de 2014 e que, em 2016, houve a divulgação de audiência pública para homologação de nomes de logradouros e prédios públicos. Entende que tais fatos justificam a elevação da despesa de 2016 em relação aos anos anteriores. Assevera que a prova testemunhal confirma as circunstâncias aludidas e que não teve nenhum benefício eleitoral com as publicidades. Refere que não está demonstrado nos autos que os gastos tiveram capacidade de afetar a paridade com os demais candidatos ou, mesmo, que tenham sido promovidos com o intuito eleitoral. Ressalta que o valor despendido em 2016 é, inclusive, menor que o gasto de 2015. Ao final, requer a reforma da decisão, para julgar improcedente a representação e afastar a multa imposta.

Em contrarrazões (fls. 431-436), o MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL argumenta que a conduta e a responsabilidade do recorrente está comprovada pelo acervo probatório e que é desnecessária a demonstração de desequilíbrio no pleito ou de benefício pessoal e direto do agente para a caracterização do ilícito. Pugna pelo desprovimento do recurso.

Com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 440-447).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito propriamente dito, cuida-se de representação ajuizada com fundamento na prática de conduta vedada, consistente na realização de despesas com publicidade da Câmara de Vereadores de Tapejara no primeiro semestre de 2016, em montante superior à média dos primeiros semestres dos três anos imediatamente anteriores, quais sejam, 2013, 2014 e 2015, contrariando, assim, o art. 73, inc. VII, da Lei n. 9.504/97.

O teor do comando é o seguinte:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[…]

VII - realizar, no primeiro semestre do ano de eleição, despesas com publicidade dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, que excedam a média dos gastos no primeiro semestre dos três últimos anos que antecedem o pleito;

A redação acima transcrita foi implementada com a Lei n. 13.165/15, a denominada Reforma Política, que alterou o parâmetro de cálculo da média a ser considerado para verificação do excesso.

Antes da inovação legislativa, apesar de alguns posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais em sentido diverso, prevalecia a interpretação literal do dispositivo, no sentido de que o cálculo era feito comparando-se o gasto do primeiro semestre do ano eleitoral com a média do transcurso total dos exercícios anteriores, ou seja, considerando os anos inteiros, o que redundava em nítida desproporcionalidade e, portanto, dava azo à ocorrência de distorções.

Entretanto, a partir da vigência da nova redação, comparação entre períodos idênticos a partir da verificação das médias semestrais, levando em conta a primeira metade de cada ano, redundou na facilitação da tarefa de perceber eventuais excessos.

Na hipótese, é incontroverso que, no primeiro semestre do ano de 2016, o Poder Legislativo Municipal de Tapejara realizou gastos com publicidade acima dos efetuados no mesmo período dos anos anteriores.

Nesse sentido, transcrevo trechos da sentença, que bem examinou a matéria, os quais incorporo como razões de decidir, pela riqueza de dados e considerações:

De acordo com os documentos das fls. 26/33, as despesas com publicidade foram as que seguem:

Primeiro semestre de 2016: R$ 17.530,00

Primeiro semestre de 2015: R$ 17.850,00

Primeiro semestre de 2014: R$ 3.455,50

Primeiro semestre de 2013: R$ 4.285,00

A média dos gastos com publicidade no primeiro semestre dos três últimos anos que antecederam o pleito foi R$ 8.530,16 (oito mil quinhentos e trinta reais e dezesseis centavos).

Contudo, somente no primeiro semestre de 2016 as despesas com publicidade somaram R$ 17.530,00 (dezessete mil quinhentos e trinta reais) ou seja, mais que o dobro da média dos gastos com publicidade no primeiro semestre dos três últimos anos que antecederam o pleito.

Portanto, verifica-se a prática da conduta vedada, sendo prescindível a análise pormenorizada da intenção de cada publicidade.

Ademais, tendo a Lei 13.165/2015 entrado em vigor em 29 de setembro de 2015, deveria o representado atentar para a proibição legal antes de autorizar as despesas acima da média.

Ainda que a transmissão ao vivo das sessões do legislativo tenha sido postulada pela população, deveria o representado, como Presidente da Casa Legislativa, verificar se a contratação da despesa não infringiria a lei, e somente depois autorizá-la. Ademais, como legislador, deveria ter conhecimento integral da Lei das Eleições.

Por derradeiro, ressalto que no julgamento de condutas vedadas previstas no art. 73 da Lei das Eleições descabe analisar a potencialidade dos fatos ou do caráter eleitoreiro da conduta.

Aqui, basta a adequação típica do fato à norma.

O dispêndio com publicidade institucional durante o primeiro semestre do ano da eleição, 2016, foi R$ 17.530,00, o que corresponde a um valor gasto a mais na ordem de significativos 105% da média de despesas no mesmo período dos três anos anteriores (R$ 8.530,16).

A responsabilidade do então detentor do cargo de Presidente da Câmara de Vereadores de Tapejara no ano das eleições, Paulo César Lângaro, é igualmente indubitável, vez que detentor da autoridade para ordenar e realizar os gastos em questão.

O recorrente sustenta, entretanto, que não pode ser responsabilizado pelo total de gastos do semestre em questão, pois somente esteve à frente do Poder Legislativo Municipal durante 4 meses e 15 dias do período.

De fato, os documentos de folhas 60-63 dão conta que Paulo César Lângaro afastou-se da capitania da Casa Legislativa nos interstícios de 18.3.2016 a 17.4.2016 e de 04.5.2016 a 19.5.2016, ocasiões nas quais foi substituído pelo vice-presidente da Casa, Daniel de Mattos.

Entretanto, consoante se infere dos documentos de folhas 245-266, durante os 45 dias em que ocupou o cargo no lugar do representado, Daniel de Mattos efetuou o pagamento de R$ 5.290,00 dos gastos totais sob análise.

Assim, ainda que se exclua a despesa realizada pelo substituto, tem-se que Paulo César Lângaro foi responsável direto pela liquidação de R$ 12.240,00, representando um gasto de R$ 3.709,84 acima do teto legalmente estabelecido, ou de 43% a mais que o limite permitido.

Destarte, o excesso de despesa representa uma quantia relevante, especialmente considerando o valor acrescido à média em termos percentuais. Além disso, a monta, ainda que tomada em termos absolutos, ostenta significância por representar um investimento em conteúdo jornalístico projetado sobre um diminuto município do interior (com apenas 16.556 eleitores), tornando incabível a exclusão da infração sob ponderações vinculadas a juízos de proporcionalidade ou razoabilidade.

Com a mesma compreensão, anoto a doutrina de Rodrigo López Zilio (Direito eleitoral. 5. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2016, p. 586):

Em suma, o bem jurídico tutelado pelas condutas vedadas é o princípio da isonomia entre os candidatos, não havendo que se exigir prova de potencialidade lesiva de o ato praticado afetar a lisura do pleito. Do exposto, a prática de um ato previsto como conduta vedada, de per si e em regra – salvo fato substancialmente irrelevante – é suficiente para a procedência da representação com base no art. 73 da LE, devendo o juízo de proporcionalidade ser aferido, no caso concreto, para a aplicação das sanções previstas pelo legislador (cassação do registro ou do diploma, multa, suspensão da conduta, supressão dos recursos do fundo partidário).

Assim, não sendo flagrantemente ínfimo o quantum sobejante, a aplicação dos mencionados princípios circunscreve-se à dosimetria do sancionamento legal.

Ademais, a circunstância de o representando, apesar de eleito vereador em 2016, haver obtido um resultado de votos inferior ao do pleito de 2012 não descaracteriza a infração.

O art. 73, caput e § 8º, da Lei n. 9.504/97 comina a sanção pecuniária ao agente público responsável pela conduta, ou seja, aquele que praticou o verbo típico, independente do fato de ser ou não candidato ou beneficiário direto da ação.

Para a perfectibilização da hipótese legal basta que a publicidade do órgão público guarde pertinência com os cargos em disputa e sobre a esfera federativa de sua abrangência, detendo potencialidade para repercutir sobre o pleito vindouro. Exatamente como ocorre com os atos da Câmara Municipal em relação à eleição ou reeleição de sua vereança.

No que concerne à interpretação do dispositivo legal telado, a respeitável sentença entendeu que o art. 73, inc. VII, da Lei das Eleições adota a expressão “despesas com publicidade” em sentido genérico, abrangendo a utilidade pública, mercadológica, legal e institucional.

Nessa linha, a douta magistrada a quo parece agasalhar o escólio de Rodrigo López Zilio (op. cit., p. 621-622), assim redigido:

O inc. VII do art. 73 da LE adota a expressão “despesas com publicidade” em sentido genérico. De acordo com o art. 3º, inc. V, do Decreto n. 6.555, de 08 de setembro de 2008 – que “dispõe sobre as ações de comunicação do Poder Executivo Federal e dá outras providências” –, a publicidade se classifica em: de utilidade pública; institucional; mercadológica e legal. Ao empregar a expressão “despesas com publicidade”, esse dispositivo abrange a utilidade pública, mercadológica, legal e institucional. De outra parte, a al. b do inc. VI do art. 73 da LE se restringe à publicidade institucional.

De outro lado, na aplicação do dispositivo em referência, esta Casa sedimentou sua jurisprudência em outro sentido, ao entendimento de que devem ser excluídas as rubricas de publicidade legal, tais como as concernentes a leis, decretos e editais, e aquelas que envolvem grave e urgente necessidade pública, a fim de resguardar o direito de acesso a informação dos atos estatais pelo cidadão e atender à finalidade da norma, que expressamente se refere à publicidade institucional.

A ilustrar o posicionamento, elenco as seguintes ementas:

Recurso. Conduta vedada. Propaganda institucional. Art. 73, inc. VII, da Lei n. 9.504/97. Prefeito e vice. Procedência. Multa. Eleições 2012.

Alegado excesso de despesas com publicidade institucional no ano do pleito com ultrapassagem da média de gastos dos três últimos anos.

Erro material do cálculo no parecer contábil ao deixar de distinguir despesas com publicidade de natureza oficial e às provenientes de publicidade tipicamente institucional.

Não caracterizado excesso de despesas com publicidade. Afastadas as penalidades impostas.

Provimento.

(Recurso Eleitoral n. 30598, ACÓRDÃO de 24.10.2014, Relatora DESA. FEDERAL MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 195, Data 28.10.2014, Página 4.) (Grifei.)

 

Embargos de declaração com pedido de atribuição de efeitos infringentes. Alegada ocorrência de omissão no aresto que deu provimento a recurso e condenou o embargante à multa por infringência ao inc. VII do art. 73 da Lei n. 9.504/97.

A publicação de atos legais/oficiais não se confunde com a publicidade institucional destinada à divulgação dos atos da administração pública, não sendo computados para fins de aferição do limite previsto no art. 73, inc. VII, da Lei n. 9.504/97. Valores decorrentes de atos administrativos vinculados.

Efeitos infringentes para negar provimento ao recurso ministerial e manter a improcedência da representação.

Acolhimento.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 72666, Acórdão de 23.9.2014, Relator DR. LEONARDO TRICOT SALDANHA, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 172, Data 25.9.2014, Página 2.) (Grifei.)

Entretanto, no caso concreto a discussão sobre o ponto resulta ociosa, tendo em vista que os documentos às folhas 205-244, consistentes em notas de empenho, notas fiscais e reproduções de matérias jornalísticas, demonstram que as divulgações realizadas envolveram típicos anúncios publicitários institucionais, externas às ressalvas admitidas por esta Corte, pois visando exclusivamente fortalecer a imagem do Poder Legislativo e de seus integrantes, a partir da divulgação de seus atos e realizações, tais como a transmissão das sessões legislativas e informativos sobre atos oficiais.

Com especial referência, o recorrente alega que o gasto de R$ 2.240,00 com a divulgação em rádios do “edital de audiência pública para homologação de nomes para denominação de logradouros e prédios públicos” (fls. 77-102) deve ser excluído do montante questionado.

Entretanto, não há notícias de que matérias destacadas, ou qualquer outra, tal como materializadas, tenham por desiderato o cumprimento de imposições legais determinadas.

Diversamente, o chamamento à referida “audiência pública” na programação de duas emissoras de rádio locais não encontra previsão na Lei Municipal n. 2.373/2001, que cria o “programa de consulta popular” no Município de Tapejara, ou em outro diploma legal, a lhe qualificar como ato administrativo vinculado.

Dessa forma, tal publicidade igualmente representa uma discricionária divulgação das atividades do Poder Legislativo, ainda que, acessoriamente, anuncie uma exortação à participação da comunidade, sendo descabida a sua retirada do somatório de gastos com publicidade.

Nessa senda, a lei eleitoral atenta justamente aos princípios da transparência, da informação e da participação popular, não prescreve uma descontinuidade completa da publicidade institucional no primeiro semestre do ano eleitoral.

O escopo da conduta vedada em comento é, em realidade, garantir que o evento eleitoral não sirva de oportunidade para a potencialização dos gastos publicitários dos órgãos públicos, acarretando, ainda que de forma indireta, uma maior exposição aos seus membros ou gestores, em prejuízo à paridade de oportunidades entre os candidatos.

Na mesma senda, leciona Rodrigo López Zilio (Op. cit., p. 621):

O objetivo do legislador é sofrear a difusão massiva de publicidade institucional em ano eleitoral, afetando a voluntariedade de opção de sufrágio do eleitor, com quebra na igualdade de oportunidade entre os candidatos. O legislador tenciona evitar que o administrador concretize uma forma indireta de financiamento público de campanha, sob o pretexto da efetivação do princípio da publicidade.

Para tal desiderato, a norma não só permite a permanência dos gastos publicitários no primeiro semestre do ano eleitoral, como reclama a harmonia da despesa com aquelas realizadas nos anos anteriores ao pleito, presumindo a malbaratação da impessoalidade administrativa e da isonomia eleitoral como decorrência da inobservância dessa imposição legal.

No tocante ao parâmetro eleito para fins de reconhecimento do tempo das despesas, equivocou-se o julgador a quo ao definir “as datas dos pagamentos como critério para aferição da média”.

Com efeito, o TSE já consolidou o entendimento no sentido de que, para fins de aferição dos limites indicados no inc. VII do art. 73 da Lei n. 9.504/97, devem ser consideradas somente as contratações efetivamente prestadas, sendo a liquidação da despesa o parâmetro apropriado para tanto.

Nesse sentido é a dicção doutrinária de José Jairo Gomes (Direito eleitoral. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2016, p. 765):

Em tal quadro, o inc. VII do art. 73 da LE só pode se referir às despesas liquidadas, ou seja, às obrigações já adimplidas pela parte contratada, a qual tem direito subjetivo ao pagamento.

Destarte, as “despesas” e “gastos” a serem considerados são aqueles liquidados, ainda que as respectivas obrigações não tenham sido adimplidas ou pagas ao credor pelo órgão contratante.

É a compreensão acolhida também pela Corte Eleitoral Superior:

Recurso especial. Representação. Conduta vedada. Art. 73, VII, da Lei n. 9.504/97.

1. O Tribunal Regional Eleitoral entendeu não configurada a conduta vedada do art. 73, VII, da Lei n. 9.504/97, reconhecendo que as despesas com publicidade em Município, efetivamente realizadas em 2012, não ultrapassaram o limite legal. Diante das premissas contidas no voto condutor da decisão recorrida, seria necessário reexaminar os fatos e as provas contidas nos autos para concluir, ao contrário, que foram realizados gastos acima da média legal no ano da eleição. Incidem, no particular, as Súmulas 7 do STJ e 279 do STF.

2. O art. 73, VII, da Lei n. 9.504/97 previne que os administradores públicos realizem no primeiro semestre do ano da eleição a divulgação de publicidade que extrapole o valor despendido no último ano ou a média dos três últimos, considerando-se o que for menor. Tal proibição visa essencialmente evitar que no ano da eleição seja realizada publicidade institucional, como meio de divulgar os atos e ações dos governantes, em escala anual maior do que a habitual.

3. A melhor interpretação da regra do art. 73, VII, da Lei das Eleições, no que tange à definição - para fins eleitorais do que sejam despesas com publicidade -, é no sentido de considerar o momento da liquidação, ou seja, do reconhecimento oficial de que o serviço foi prestado - independentemente de se verificar a data do respectivo empenho ou do pagamento, para fins de aferição dos limites indicados na referida disposição legal.

4. A adoção de tese contrária à esposada pelo acórdão regional geraria possibilidade inversa, essa, sim, perniciosa ao processo eleitoral, de se permitir que a publicidade realizada no ano da eleição não fosse considerada, caso a sua efetiva quitação fosse postergada para o ano seguinte ao da eleição, sob o título de restos a pagar, observados os limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

(Recurso Especial Eleitoral n. 67994, Acórdão, Relator Min. Henrique Neves da Silva, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 242, Data 19.12.2013.) (Grifei.)

Segundo a definição inserta no art. 63 da Lei n. 4.320/64, a liquidação da despesa pública consiste “na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito”.

Na espécie, o relatório à folha 12, bem como as cópias dos empenhos às folhas 68-163, devidamente atestados pela autoridade, demonstram que a integralidade das despesas em perspectiva restaram liquidadas e adimplidas no mesmo período em aferição, qual seja, no primeiro semestre do ano de 2016. Assim, a modificação do critério temporal de realização do gasto – liquidação ou pagamento – não acarreta alteração das conclusões quanto à configuração da infração eleitoral.

Cabe esclarecer que a conduta vedada de que tratam os autos possui as mesmas características das demais condutas vedadas previstas ao longo do art. 73 da Lei n. 9.504/97, de maneira que descabe indagar acerca do seu potencial de influenciar no pleito ou de afetar a isonomia entre os candidatos.

Nesse sentido, trago novamente à baila a lição de José Jairo Gomes (Op. cit., p. 742), segundo o qual:

Tendo em vista que o bem jurídico protegido é a igualdade no certame, a isonomia nas disputas, não se exige que as condutas proibidas ostentem aptidão ou potencialidade para desequilibrar o pleito ou alterar seu resultado. Ademais, é desnecessária a demonstração do concreto comprometimento ou do dano efetivo às eleições, já que a “só prática da conduta vedada estabelece presunção objetiva da desigualdade” (TSE – Ag. nº 4.246/MS – DJ16-9-2005, p. 171).

E o TSE também assim entende:

REPRESENTAÇÃO. PREFEITO E VICE-PREFEITO. PRETENSA OCORRÊNCIA DE CONDUTA VEDADA A AGENTE PÚBLICO. VIOLAÇÃO AO ART. 275 DO CÓDIGO ELEITORAL. OMISSÃO NÃO CONFIGURADA. EDUCAÇÃO. NÃO CARACTERIZADA, PARA FINS ELEITORAIS, COMO SERVIÇO PÚBLICO ESSENCIAL. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA NON REFORMATIO IN PEJUS. ART. 73, INCISO V, DA LEI Nº 9.504/97. CONTRATAÇÃO DE SERVIDORES NO PERÍODO DE TRÊS MESES QUE ANTECEDE O PLEITO ELEITORAL. CONFIGURAÇÃO. MERA PRÁTICA DA CONDUTA. DESNECESSÁRIO INDAGAR A POTENCIALIDADE LESIVA. FIXAÇÃO DA REPRIMENDA. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

[...]

6. A configuração das condutas vedadas prescritas no art. 73 da Lei nº 9.504/97 se dá com a mera prática de atos, desde que esses se subsumam às hipóteses ali elencadas, porque tais condutas, por presunção legal, são tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre os candidatos no pleito eleitoral, sendo desnecessário comprovar-lhes a potencialidade lesiva.

7. Nos termos da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, caracterizada a infringência ao art. 73 da Lei das Eleições, é preciso fixar, com base na observação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, a reprimenda adequada a ser aplicada ao caso concreto.

[...]

(TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 45060, Acórdão de 26.9.2013, Relatora Min. LAURITA HILÁRIO VAZ, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 203, Data 22.10.2013, Página 55-56.) (Grifei.)

 

ELEIÇÕES 2010. CONDUTA VEDADA. USO DE BENS E SERVIÇOS. MULTA.

1. O exame das condutas vedadas previstas no art. 73 da Lei das Eleições deve ser feito em dois momentos. Primeiro, verifica-se se o fato se enquadra nas hipóteses previstas, que, por definição legal, são "tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais". Nesse momento, não cabe indagar sobre a potencialidade do fato.

2. Caracterizada a infração às hipóteses do art. 73 da Lei 9.504/97, é necessário verificar, de acordo com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, qual a sanção que deve ser aplicada. Nesse exame, cabe ao Judiciário dosar a multa prevista no § 4º do mencionado art. 73, de acordo com a capacidade econômica do infrator, a gravidade da conduta e a repercussão que o fato atingiu. Em caso extremo, a sanção pode alcançar o registro ou o diploma do candidato beneficiado, na forma do § 5º do referido artigo.

3. Representação julgada procedente.

(TSE, Representação n. 295986, Acórdão de 21.10.2010, Relator Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 220, Data 17.11.2010, Página 15.) (Grifei.)

Como asseverado, a adequação típica do fato contenta-se com o preenchimento dos aspectos objetivos contidos no dispositivo legal, sendo despicienda a afetação concreta da disputa eleitoral.

Nessa esteira, o elemento subjetivo da conduta resta aperfeiçoado com o simples dolo de exceder as despesas publicitárias médias no interstício versado, em descumprimento do art. 73, inc. VII, da Lei n. 9.504/97. Portanto, desnecessária a análise do intuito eleitoral específico, que é presumido pela norma a partir da inobservância da imposição legal.

Destarte, está caracterizado o irregular aumento dos dispêndios publicitários no ano do pleito, descumprindo-se o art. 73, inc. VII, da Lei n. 9.504/97.

Por fim, o recorrente foi sancionado exclusivamente com a pena de multa, com base no art. 73, § 4º, da Lei das Eleições, estabelecida no mínimo legal, não merecendo reparos a sentença no ponto.

 

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.