Ag/Rg - 2529 - Sessão: 20/06/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de agravo regimental interposto por GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA. contra decisão monocrática prolatada pelo Dr. Silvio Ronaldo Santos de Moraes (fls. 671-672v.) que não conheceu, por manifesta ausência de interesse recursal, de agravo de instrumento (fls. 02-24) interposto em face da determinação do Juízo Eleitoral da 74ª Zona – Alvorada que, em sede de cumprimento de sentença requerido pela ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO, concedeu o prazo previsto no art. 523 do Código de Processo Civil para satisfação voluntária da pena pecuniária fixada pela sentença a título de astreintes (fl. 647).

Em suas razões (fls. 720-741), defende o cabimento do agravo de instrumento, sustentando que a determinação de pagamento voluntário prevista no art. 523 do CPC possui caráter decisório, traços de coercibilidade e perigo de dano, dado que prevê a incidência de multa de 10% em caso de descumprimento, sendo passível de recurso. Afirma que a decisão do juízo a quo não procedeu ao preceito prévio de acertamento das astreintes, que alcançam quantia superior a 18 milhões, numerário que reputa excessivo, confiscatório, fora dos parâmetros da razoabilidade e da proporcionalidade e caracterizador de enriquecimento sem causa. Alega haver relevante controvérsia acerca do termo inicial e final da incidência da penalidade, pois desconsiderada a data real de cumprimento da obrigação. Assevera que não deve prevalecer o entendimento pela ocorrência de supressão de instância caso o Tribunal altere o quantum antes de o valor ser impugnado na instância ordinária, pois as astreintes podem ser revistas em qualquer momento e fase processual, inclusive de ofício. Colaciona jurisprudência confortando sua tese. Postula a reforma da decisão para que seja recebido o recurso por instrumento, a fim de ser suspensa a eficácia da decisão a quo e revogado ou reduzido o valor das astreintes.

O processo foi distribuído a minha relatoria em razão das férias do titular.

É o relatório.

VOTO

O presente agravo não merece prosperar.

A petição de agravo de instrumento somente não foi recebida porque a agravante não dirigiu ao juízo a quo nenhuma linha de insurgência quanto ao valor da execução, conforme reconhecidamente assume.

Não se desconhece que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, acompanhada pelo Tribunal Superior Eleitoral, admite a possibilidade de revisão até mesmo de ofício do valor das astreintes, a qualquer tempo e inclusive após o trânsito em julgado da decisão.

No entanto, a leitura dos autos do processo que originou a cominação de astreintes, cuja cópia foi juntada integralmente a este feito, evidencia que em nenhum momento foi levada à instância ordinária a alegação de erro no cálculo do prazo de descumprimento da ordem judicial, ou de que o valor é exorbitante, confiscatório, fere a razoabilidade e a proporcionalidade.

Após o trânsito em julgado da sentença, a União, legitimada para cobrança de astreintes fixadas nos processos eleitorais, apresentou, já sob a vigência do Código de Processo Civil de 2015, requerimento de cumprimento de sentença, tendo por objeto a quantia de R$ 18.558.575,36, relativa a astreintes arbitradas na tutela antecipada, multa esta confirmada e majorada por ocasião da sentença condenatória.

A decisão objeto do agravo de instrumento apenas determinou a intimação da empresa Google Brasil Internet Ltda. para pagamento do débito no prazo de 15 dias, na forma do art. 523 do CPC (fl. 647), devendo ser levado em conta o disposto no art. 524 do CPC ao determinar que o cumprimento da sentença terá por base a memória de cálculo apresentada pelo credor.

Com efeito, o cumprimento da sentença não se efetiva de forma automática, ou seja, logo após o trânsito em julgado da decisão. Cabe ao credor o exercício de atos para o regular cumprimento da decisão condenatória, devendo requerer ao juízo que dê ciência ao devedor sobre o montante apurado, consoante memória de cálculo discriminada e atualizada.

Desse modo, o juízo de origem tão somente instaurou a fase de cumprimento de sentença, que tem por objeto o cálculo apresentado pela exequente, facultando, como prevê a lei, o pagamento voluntário da obrigação pelo devedor.

Anoto que o julgado do STJ trazido à colação na petição de agravo regimental (REsp 1187805/AM, Rel. Ministro Sidnei Beneti, terceira turma, julgado em 05.11.2013, DJe 27.11.2013) não se amolda à questão posta nos autos, pois consta da íntegra do acórdão que o principal argumento para o provimento do apelo pautou-se no fato de que o caso envolvia execução provisória e a matéria ainda se encontrava sub judice, tendo em vista a existência de recursos pendentes de julgamento no STJ, situação que afastava a exigibilidade e a certeza do título executivo.

Dessa forma, prevalece o entendimento de que a alegação de excesso de execução é matéria reservada à impugnação ao cumprimento de sentença, não se operando a preclusão ainda que haja ciência inequívoca da decisão que determina o pagamento espontâneo com base nos cálculos inicialmente apresentados pelo credor (STJ, EDcl nos EDcl no AREsp 202.458/MS, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, terceira turma, julgado em 24.9.2013, DJe 02.10.2013).

Com base nesse entendimento, o agravo de instrumento não foi conhecido por ausência de interesse recursal, sob o fundamento de que inexiste, até o momento, prejuízo à parte agravante, dado que  sequer impugnada a fase executiva.

Em verdade, causa espécie que, na instância ordinária, a agravante silencie quanto ao despacho que concede prazo para pagamento voluntário da obrigação, nada requerendo ao magistrado da execução, e interponha sucessivos recursos a este Tribunal, primeiro o de agravo de instrumento e, agora, o de agravo regimental, postulando a readequação do valor.

Não houve nenhuma provocação da parte para que o juízo de origem proceda à adequação do valor, constando no Sistema de Acompanhamento de Processual - SADP, que o prazo para oferecimento de impugnação está em curso, com contagem em dias úteis, conforme decisão prolatada em 02.05.2017.

Porém, a legislação processual comum prevê meios específicos para impugnação da quantia devida em fase de cumprimento de sentença, na forma do art. 525 do CPC. Faculta-se até mesmo o pagamento do valor que o executado entende devido, acompanhado da respectiva memória discriminada do cálculo (art. 526 do CPC).

A decisão ora recorrida sequer defendeu que o valor está dentro dos parâmetros da razoabilidade ou que não é passível de revisão. Apenas ponderou-se que todas as matérias invocadas no agravo de instrumento, inclusive a alegação de excesso de execução, estão abrangidas pelo art. 525 do CPC, que prevê o oferecimento, no juízo da execução, de impugnação ao cumprimento de sentença.

Art. 525. Transcorrido o prazo previsto no art. 523 sem o pagamento voluntário, inicia-se o prazo de 15 (quinze) dias para que o executado, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos próprios autos, sua impugnação.

§ 1o Na impugnação, o executado poderá alegar:

I - falta ou nulidade da citação se, na fase de conhecimento, o processo correu à revelia;

II - ilegitimidade de parte;

III - inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação;

IV - penhora incorreta ou avaliação errônea;

V - excesso de execução ou cumulação indevida de execuções;

VI - incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução;

VII - qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que supervenientes à sentença.

 

Em respeito ao duplo grau de jurisdição descabe, portanto, qualquer consideração sobre a correção pretendida dos valores antes de ser provocada a manifestação do juízo a quo.

Com esse entendimento, os seguintes precedentes:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECURSO RECEBIDO COMO AGRAVO REGIMENTAL. FUNGIBILIDADE. MULTA DO ART. 475-J DO CPC. CIÊNCIA INEQUÍVOCA. PRECLUSÃO. INOCORRÊNCIA. MATÉRIA PRÓPRIA DA IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. NÃO INCIDÊNCIA NA ESPÉCIE. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. SOLIDARIEDADE. IMPOSSIBILIDADE, CASO A DECISÃO DE ARBITRAMENTO NÃO TENHA DECIDIDO A RESPEITO. ART. 23 DO CPC. 1. Admitem-se como agravo regimental embargos de declaração opostos a decisão monocrática proferida pelo relator do feito no Tribunal, em nome dos princípios da economia processual e da fungibilidade, quando ausentes os vícios do art. 535 do CPC e evidente o caráter infringente das razões recursais. 2. A alegação de excesso de execução por indevida inclusão da multa do art. 475-J do CPC é matéria reservada à impugnação ao cumprimento de sentença, não se operando a preclusão ainda que haja ciência inequívoca da decisão que determinou sua inclusão nos cálculos inicialmente apresentados pelo credor. 3. "O cumprimento da sentença não se efetiva de forma automática, ou seja, logo após o trânsito em julgado da decisão. De acordo com o art. 475-J combinado com os arts. 475-B e 614, II, todos do CPC, cabe ao credor o exercício de atos para o regular cumprimento da decisão condenatória, especialmente requerer ao juízo que dê ciência ao devedor sobre o montante apurado, consoante memória de cálculo discriminada e atualizada." (REsp 920.274/MS, Corte Especial, Rel.p/acórdão Ministro João Otávio de Noronha, DJe 31.5.2010). 4. A solidariedade entre os réus sucumbentes relativa ao pedido principal não se estende aos ônus sucumbenciais, salvo se a decisão que os arbitrou expressamente dispuser a respeito. 5. Embargos de declaração do BANCO DO BRASIL S/A recebidos como agravo regimental e provido. 6. Agravo regimental de PAULO TADEU HAENDCHEN E OUTRO desprovido.

(EDcl nos EDcl no AREsp 202.458/MS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 24.9.2013, DJe 02.10.2013.)

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. OBRIGAÇÃO DE PAGAMENTO DE QUANTIA CERTA. DETERMINAÇÃO DO JUÍZO DE ORIGEM DE INTIMAÇÃO DO DEVEDOR PARA O CUMPRIMENTO VOLUNTÁRIO DA SENTENÇA, NOS TERMOS DO ART. 523 DO CPC/2015. RECURSO DA EXEQUENTE. A intimação para o cumprimento voluntário da sentença, nos termos do art. 523 do CPC/2015, abrange os valores indicados pelo credor, conforme previsto no art. 524 do CPC/2015. Não houve, portanto, qualquer consideração do juízo de origem sobre a adequação, ou não, das rubricas pretendidas pela credora, o que depende de eventual insurgência do devedor, no momento processual oportuno. Inexistência, portanto, de qualquer prejuízo à credora. Consequente ausência de interesse recursal. AGRAVO DE INSTRUMENTO NÃO CONHECIDO.

(TJ-RS - AI: 70070249164 RS, Relator: Mylene Maria Michel, Data de Julgamento: 10.11.2016, Décima Nona Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 14.11.2016.)

 

AGRAVO LEGAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DESPACHO PARA CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. IRRECORRIBILIDADE. AGRAVO LEGAL NÃO PROVIDO. 1. O agravante visa combater o comando cristalizado na sentença, o que só é viável por meio do recurso de Apelação (art. 513, CPC). 2. O artigo 504, do CPC, estatui que "dos despachos de mero expediente não cabe recurso". Como se sabe, o despacho de mero expediente, ou ordinatório, é aquele simplesmente impulsiona o procedimento, a fim de dar andamento ao processo, sem nada decidir. 3. O ato judicial que determina o cumprimento da sentença é irrecorrível, pois não tem cunho decisório e não vulnerou qualquer direito processual da agravante. 4. Agravo legal não provido.

(TJ-PE - AGV: 3631049 PE, Relator: Bartolomeu Bueno, Data de Julgamento: 09.4.2015, 3ª Câmara Cível, Data de Publicação: 17.4.2015.)

 

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do agravo regimental.