RE - 77937 - Sessão: 05/09/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso (fls. 576-583) interposto pela Coligação UNIDOS POR IBIRAPUITÃ (PDT - PSC - PTB - PSB) em face de sentença do Juízo da 54ª Zona Eleitoral (fls. 567-573v.) que julgou improcedente, por insuficiência probatória, a Ação de Investigação Judicial Eleitoral movida contra os candidatos que integraram a chapa majoritária da Coligação UNIDOS POR UM IBIRAPUITÃ MELHOR (PP - PMDB), ROSEMAR HENTGES e JOSÉ NICOLODI PROVENCI, eleitos, respectivamente, prefeito e vice de Ibirapuitã/RS, no pleito municipal de 2016.

Em suas razões a recorrente sustentou que as condutas cuja prática foi atribuída aos recorridos – abuso de poder, uso indevido de meio de comunicação, captação ilícita de sufrágio, arregimentação de eleitores, propaganda de boca de urna e propaganda eleitoral extemporânea – restaram plenamente comprovadas nos autos, assim como seu impacto na eleição. Requereu a conversão do feito em diligência, para que sejam solicitadas, às agências bancárias de Ibirapuitã, informações acerca da existência de contas em nome dos recorridos e de terceira pessoa que não integrou a lide, além daquelas já informadas nos autos, bem como a abertura de prazo para análise dos extratos bancários (fls. 508-515v. e 517-527) trazidos após a realização da audiência de instrução. No mérito, pugnou pelo provimento do recurso, para ser julgada procedente a ação, cassados os diplomas dos recorridos, e condenados ao pagamento de multa, sendo-lhes ainda declarada a inelegibilidade para as eleições que se realizarem nos oito anos subsequentes ao pleito de 2016.

Com contrarrazões (fls. 586-613), nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que se manifestou pelo desprovimento do recurso (fls. 618-626).

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade

Os procuradores da recorrente foram intimados via publicação de nota de expediente em 05.4.2017 (fls. 574-575v.), e o recurso foi interposto em 06.4.2016 (fl. 576), sendo, portanto, tempestivo, visto que interposto dentro do tríduo legal. Presentes os demais pressupostos de admissibilidade, dele conheço.

Preliminares

1- Dos pedidos de conversão do feito em diligência e de concessão de prazo:

A recorrente requereu a reabertura da instrução para que sejam oficiadas as agências bancárias de Ibirapuitã e solicitadas informações acerca da existência ou não de outras contas bancárias em nome dos recorridos e do Sr. Eder Lodi, além das informadas, assim como a abertura de prazo para análise dos extratos bancários juntados após a audiência de instrução (fl. 583).

No que concerne ao pedido de conversão do feito em diligência, conforme pacífico entendimento do egrégio TSE, “o art. 270 do Código Eleitoral permite a juntada de documentos na fase recursal perante os tribunais regionais eleitorais nas hipóteses de coação, fraude, uso de meios de que trata o art. 237 ou emprego de processo de propaganda ou captação de sufrágios” (ED em AR em RESPE n. 44208, Relator designado Min. João Otávio de Noronha DJE: 27.10.2015).

Todavia, o dispositivo não desvirtua o curso normal da ação, segundo o qual a instrução probatória deve ser realizada no momento oportuno, perante o juízo de primeiro grau e antes da sentença. Assim, a produção de provas na fase recursal é medida excepcional.

In casu, não há razões para o acolhimento do pleito da recorrente, conforme bem pontuou o nobre Procurador Regional Eleitoral (fl. 619 e v.):

O pedido de conversão do julgamento em diligência já fora analisado e afastado pelo magistrado à origem, in verbis:

Não há elementos nos autos que indiquem que os representados titularizem contas que não as subjacentes aos extratos acostados aos autos. Ademais, como adiante se verá, a eventual existência de outras contas não teria o condão de alterar o deslinde a ser dado ao feito. Indefiro, pois, o requerimento de que o feito seja convertido em diligência a fim de que sejam expedidos ofícios às agências bancárias de Ibirapuitã.

(Grifei.)

Já no que diz respeito ao pedido de concessão de prazo para análise dos extratos juntados aos autos após a audiência de instrução, melhor sorte não socorre à recorrente. Os documentos em questão vieram aos autos em 07.3.2017 (fl. 500), e as partes foram intimadas, por meio de nota de expediente publicada em 20.3.2017 (fl. 535), para apresentar alegações finais, o que efetivamente fizeram em 22.3.2017 (fls. 536-540 e 541-558) – restando claro que tiveram oportunidade de se manifestar acerca da documentação em questão.

Assim, porquanto regular o processamento do feito, e, inclusive, oportunizadas, pelo juízo de origem, a apresentação de manifestação e a juntada de documentos, entendo descabida a pretensão de reabertura de prazo para análise de documentos aos quais a parte já teve acesso.

Dessa forma, devem ser indeferidos ambos os pedidos – a conversão do feito em diligências e o pedido de concessão de prazo para análise dos referidos documentos -, prosseguindo-se o julgamento do recurso.

Destaco.

2- Preliminares de ofício:

2.1- Arregimentação de eleitores ou Boca de Urna:

De acordo com a recorrente, no dia da eleição, os representados utilizaram a sede do comitê eleitoral de campanha e dois estabelecimentos comerciais locais, um deles de propriedade do recorrido ROSEMAR, assim como ruas adjacentes aos referidos locais, para realizar a chamada “propaganda de boca de urna”, ocasionando o desequilíbrio do pleito.

A conduta configura, em tese, o tipo previsto nos arts. 66, inc. II, da Resolução TSE n. 23.457/15 e 39, § 5º, inc. II, da Lei n. 9.504/97, in verbis:

Resolução TSE n. 23.457/15

Art. 66 Constituem crimes, no dia da eleição, puníveis com detenção de seis meses a um ano, com a alternativa de prestação de serviços à comunidade pelo mesmo período, e multa no valor de R$ 5.320,50 (cinco mil, trezentos e vinte reais e cinquenta centavos) a R$ 15.961,50 (quinze mil, novecentos e sessenta e um reais e cinquenta centavos):

[...]

II - a arregimentação de eleitor ou a propaganda de boca de urna;

 

Lei n. 9.504/97

Art. 39 [...]

§ 5º. Constituem crimes, no dia da eleição, puníveis com detenção, de seis meses a um ano, com a alternativa de prestação de serviços à comunidade pelo mesmo período, e multa no valor de cinco mil a quinze mil UFIR:

[...]

II - a arregimentação de eleitor ou a propaganda de boca de urna;

Trata-se, assim, de crime de ação pública incondicionada, como são as ações penais eleitorais, nos termos do art. 355 do Código Eleitoral, a ser promovida exclusivamente por denúncia do Ministério Público Eleitoral, conforme estabelece o art. 129, inc. I, da Constituição Federal, não sendo, portanto, a representação a peça processual hábil ao desencadeamento do processo que visa à sua apuração e julgamento.

Nesse sentido, a jurisprudência:

Recurso criminal. Investigação da prática da conduta prevista no art. 39, § 5º, inc. III, da Lei n. 9.504/97. Propaganda de "boca de urna". Eleições 2010.

Irresignação contra sentença que, de ofício, determinou o arquivamento do expediente, considerando tratar-se de matéria administrativa por infração às normas municipais, e não infração penal.

A titularidade da ação penal eleitoral, nos termos do art. 355 do Código Eleitoral, é privativa do Ministério Público, cabendo ao Parquet a análise da viabilidade do oferecimento da denúncia ou o requerimento do arquivamento do expediente investigatório.

Não configurada a hipótese de propositura imediata de denúncia - pois ausente qualquer elemento apontando para a autoria do suposto delito – constitui coação indevida à liberdade de locomoção dos recorridos o pedido de designação de audiência para oferecimento de transação penal.

Provimento e concessão de habeas corpus de ofício por esta Corte Eleitoral, na forma do § 2º do art. 654 do Código de Processo Penal.

(TRE-RS - RC n. 4431 – Relator: Dr. Leonardo Tricot Saldanha – P. Sessão de 13.3.2013.) (Grifei.)

Por essa razão, diante da inadequação da via eleita, impõe-se seja afastado, de ofício, seu processamento no âmbito da presente AIJE, nos termos do art. 330, inc. III, do CPC - a ensejar a  extinção do feito sem resolução do mérito.

2.2- Propaganda Extemporânea:

A coligação recorrente atribuiu aos representados a prática de propaganda eleitoral irregular, pois realizada na véspera e no dia da eleição, em desacordo com a legislação de regência e com acordo celebrado perante o Juízo da 54ª ZE.

Começo por consignar que, para as eleições de 2016, as representações, as reclamações e os pedidos de resposta previstos na Lei n. 9.504/97 foram regulamentados pela Resolução TSE n. 23.462/15, não sendo, portanto, a ação de investigação judicial eleitoral do art. 22 da Lei Complementar n. 64/90 o meio adequado para manejo da demanda pela realização de propaganda extemporânea.

Além disso, a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é firme no sentido de que a representação para apurar propaganda eleitoral irregular, com violação à Lei n. 9.504/97, deve ser ajuizada até a data do pleito, sob pena do reconhecimento da perda do interesse de agir do representante (Agravo Regimental em Agravo de Instrumento n. 343978, Acórdão de 10.11.2015, Relatora: Min. Luciana Christina Guimarães Lóssio, DJE, Tomo 231, Data 07.12.2015, p. 63; Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 18234, Acórdão de 25.6.2015, Relatora: Min. Maria Thereza Rocha de Assis Moura, DJE, Data 24.9.2015; Recurso em Representação n. 295549, Acórdão de 19.5.2011, Relator: Min. Marcelo Henriques Ribeiro de Oliveira, DJE, Data 1°.8.2011, p. 216-217).

Este Regional firmou entendimento no mesmo sentido, conforme se verifica das ementas abaixo reproduzidas:

Recurso. Representação. Propaganda eleitoral irregular. Folhetos. Falta de interesse de agir. Art. 14, § 7º, da Resolução TSE n. 23.457/15 c/c art. 37, § 1º, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2016.

Jurisprudência da Corte superior no sentido do ajuizamento até a data do pleito de representação por propaganda eleitoral irregular. Proposta representação - por derramamento de “santinhos” nas ruas e calçadas adjacentes aos locais de votação – quando já transcorridos dezesseis dias da eleição. Evidenciada a falta de interesse de agir.

Extinção do feito sem resolução do mérito.

(TRE-RS - RE 40718, Relator: Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, Data de Julgamento: 16.02.2017.)

 

Recursos. Representação. Propaganda eleitoral. Folhetos. Falta de interesse processual. Art. 14, § 7º, da Resolução TSE n. 23.457/15 c/c art. 37, § 1º, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2016.

A representação por propaganda eleitoral irregular deve ser ajuizada até a data do pleito. Entendimento firmado pelo Tribunal Superior Eleitoral. Proposta representação - por "derramamento de santinhos” nas ruas e calçadas adjacentes aos locais de votação – quando já transcorridos dezesseis dias da eleição. Evidenciada a falta de interesse processual.

Extinção do feito sem resolução do mérito.

(TRE-RS - RE 411-55, Relator: Dr. Luciano André Losekann, Data de Julgamento: 28.3.2017.)

 

RECURSO. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL. DERRAMAMENTO DE “SANTINHOS” NO DIA DO PLEITO. FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL. EXTINÇÃO DO FEITO. ELEIÇÃO 2016.

A representação para apurar propaganda eleitoral irregular, com violação à Lei n. 9.504/97, deve ser ajuizada até a data da eleição. Entendimento firmado pelo Tribunal Superior Eleitoral. Propaganda em bem público, no dia da eleição, mediante derramamento de "santinhos" em frente a local de votação. Representação protocolada no dia seguinte ao do pleito. Evidenciada a perda do interesse de agir.

Extinção do feito sem julgamento do mérito.

(TRE-RS - RE 7233, Relator: Dr. Eduardo Augusto Dias Bainy, Data de Julgamento: 20.6.2017.)

No presente caso, a ação foi protocolada apenas em 06.12.2016 (fl. 02), ou seja, mais de dois meses após as eleições, impondo-se, assim, o reconhecimento da ausência de interesse de agir.

Desse modo, no ponto, o feito deve ser extinto de ofício, sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, inc. VI e § 3º, do CPC.

Mérito

No mérito, cuida-se de apreciar ação de investigação judicial eleitoral (AIJE) pela prática, durante a campanha eleitoral de 2016, no Município de Ibirapuitã, de condutas alegadamente caracterizadoras de abuso de poder, uso indevido de meio de comunicação e captação ilícita de sufrágio.

Adianto que o juízo de primeiro grau realizou apurada análise dos fatos, nada havendo a ser modificado na sentença atacada.

De modo a bem delimitar os fatos imputados aos recorridos na petição inicial (fls. 02-58 e 77-88), convém proceder ao exame distinto de cada caso, conforme segue:

1- Abuso de Poder - uso indevido de meio de comunicação e uso do grupo de doadores de sangue “Pró-Vida”:

De acordo com a petição inicial, no período compreendido entre meados de agosto e o dia 30.9.2016, José Provenci, na condição de presidente da Rádio Princesa – rádio comunitária de Ibirapuitã –, utilizou-se da estrutura do referido veículo de comunicação, bem como do serviço de seu diretor e locutor, Sr. Eder Lodi, e da empresa Carisma Produções, de propriedade deste último, para produzir programas de propaganda eleitoral para a campanha da chapa. Sustentou a representante que tais serviços teriam sido pagos pela Câmara de Vereadores e que não foram declarados na prestação de contas dos recorridos.

Apresentou, a título de prova do alegado, print de postagem publicada na página de Eder Lodi no Facebook, acostada à fl. 28, do que seria a gravação de vídeo utilizado na campanha dos recorridos.

Acrescentou ainda que o recorrido José Provenci utilizou o perfil do Sr. Eder Lodi na rede social Facebook para veicular, mediante pagamento, propaganda eleitoral da chapa por ele integrada.

Aduziu também a recorrente que, embora afastado do cargo de Secretário de Saúde à época da disputa majoritária, José Provenci manteve-se à frente da entidade beneficente “Grupo Pró-Vida”, organismo que presta serviço social na área de saúde pública, além de permanecer integrando os Conselhos Municipais de Saúde e de Desenvolvimento, preservando, assim, seu poder político em benefício da campanha eleitoral. Afirmou, por derradeiro, que as fotos juntadas às fls. 34 e 36 comprovam o alegado.

No ponto, os recorridos informaram que:

a) o recorrido José Provenci afastou-se da direção da Rádio Princesa em 02.01.2014, para assumir cargo na administração municipal (fls. 208-211);

b) os programas de propaganda eleitoral não foram gravados nas dependências da referida rádio, e mais, não tiveram com ela qualquer vinculação. Arguiram que os serviços não foram cobrados, mas passados à campanha como doação estimada em dinheiro, circunstância que se encontra devidamente declarada (fls. 364-368) na prestação de contas n. 736-03.2016.6.21.0054, cuja cópia foi acostada a estes autos (fls. 243-442), sendo inverídica, portanto, a alegação de que teriam sido pagos pela Câmara de Vereadores;

c) ao contrário do afirmado pela representante, a Rádio Princesa, o Sr. Eder Lodi e a empresa Carisma Produções têm perfis distintos na rede social Facebook (fls. 163-166), e as manifestações de Eder Lodi em favor da candidatura dos recorridos foram publicadas em seu perfil pessoal, e não nos perfis das referidas empresas;

d) conforme constou da sentença, a recorrente não logrou comprovar o alegado, como lhe competia;

e) Provenci desligou-se do Conselho Municipal de Saúde concomitantemente à sua exoneração do cargo de Secretário Municipal de Saúde, em 31.12.2015, e do COMUDE (Conselho Municipal de Desenvolvimento), em 23.6.2016;

f) não há no processo qualquer prova que demonstre a utilização do grupo “Pró-Vida” para obtenção de vantagem na disputa eleitoral. Ao contrário, os recorridos teriam feito prova de que a atuação efetiva de José Provenci ocorreu à época em que exercia o cargo de Secretário de Saúde, ressaltando ainda que as atividades desenvolvidas pelo referido organismo foram suspensas durante o período da campanha.

A sentença vergastada adotou, a título de fundamentação, o parecer do Ministério Público de primeiro grau (fls. 559-565v.), que assim analisou as questões:

[...]

Pelo que foi possível apurar dos autos, não há evidências concretas de abuso do poder econômico em relação aos fatos apontados pela representante.

Isso porque os propalados ilícitos apontados sequer foram comprovados à saciedade nos autos, haja vista que as provas referidas são insuficientes a demonstrar qualquer conluio ou articulação fraudulenta a desaguar em irregularidade eleitoral.

Pois bem.

A apontada irregularidade envolvendo a ligação de José Nicolodi Provenci com Éder Lodi, de forma a manchar e desequilibrar o pleito com abuso de poder econômico, não ficou demonstrada.

Nesse sentido, não há prova cabal de que os programas eleitorais foram editados nas dependências da rádio comunitária, afora a fotografia da f. 28 que supostamente informa as dependências da rádio e a frágil alegação de que Éder Lodi realizou campanha irregular para os representados por meio da rádio e da produtora.

Não há nenhum ilícito aparente na veiculação de imagens de gravações que nem sequer identificam a utilização indevida de meio de comunicação não autorizado.

Não há, outrossim, demonstração de que Éder Lodi tivesse sido contratado para realizar a campanha da chapa vencedora como publicitário e que desse contrato tivesse resultado algum favorecimento.

Portanto, ao que se infere dos autos, não se encontra demonstrado o abuso do poder econômico quanto ao item apontado.

[...]

Conforme devidamente esclarecido pelos representados, com fundamento em declaração emitida pela atual Presidente do Grupo “Pró-Vida”, Rejane Terezinha Dorst, José Nicolodi Provenci teve participação no precitado grupo apenas na época em que estava à frente da Secretaria Municipal de Saúde de Ibirapuitã, sendo que, durante o período eleitoral de 2016, as atividades do referido grupo foram suspensas.

Os elementos de prova traduzidos por imagens são frágeis, sendo que a prova testemunhal não foi capaz de elucidar o fato à saciedade.

Saliente-se ter o investigado José Provenci acostado aos autos (fls. 151-152), declarações de membros do Grupo “Pró-vida” de que não fazia parte da atual diretoria da entidade e que sua participação apenas teria se dado na época em que era secretário de saúde do município.

Pelo que se constata, a participação do vice-prefeito eleito se deu com observância ao preconizado pela legislação eleitoral, tendo havido descompatibilização de suas atividades públicas e sociais, antes dos prazos estabelecidos pela lei eleitoral, isto é, três meses antes da eleição para o cargo que pretendia, conforme determinado no art. 1°, inc. III, alínea “b”, e inc. IV, al. “a”, da LC 64/90, o que ocorreu de fato e de direito, considerando que todas as atividades se deram antes desse prazo. Do mesmo modo, não veio aos autos qualquer documento a demonstrar a participação ativa do investigado no grupo, durante o período eleitoral, com vistas à sua promoção pessoal e política.

Portanto, não há nenhuma demonstração de ingerência do vice-prefeito eleito no Grupo “Pró-Vida” que pudesse causar vantagem indevida ao candidato, tendo ele se desincompatibilizado em tempo hábil.

[...]

Não merece reforma o decisum.

A finalidade precípua da AIJE é apurar o uso indevido, o desvio ou o abuso do poder econômico, político ou de autoridade, bem como a utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social em benefício de candidato ou partido político.

Uma vez configurado o ilícito, a procedência da representação instrumentalizada leva à declaração de inelegibilidade de todos os que para ele tenham contribuído, por oito anos, e à cassação do registro ou diploma do beneficiado.

Esta a legislação de regência:

LC 64/90

Art. 19

As transgressões pertinentes à origem de valores pecuniários, abuso do poder econômico ou político, em detrimento da liberdade de voto, serão apuradas mediante investigações jurisdicionais realizadas pelo Corregedor-Geral e Corregedores Regionais Eleitorais.

Parágrafo único. A apuração e a punição das transgressões mencionadas no caput deste artigo terão o objetivo de proteger a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou do abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta, indireta e fundacional da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

[...]

Art. 22

Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito: [...]

XIV - julgada procedente a representação, ainda que após a proclamação dos eleitos, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes à eleição em que se verificou, além da cassação do registro ou diploma do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico ou pelo desvio ou abuso do poder de autoridade ou dos meios de comunicação, determinando a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de processo disciplinar, se for o caso, e de ação penal, ordenando quaisquer outras providências que a espécie comportar;

[...]

XVI - para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam.

Art. 23

O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral.

A leitura atenta do inc. XVI do art. 22 da LC n. 64/90, acrescentado pela LC n. 135/10, revela que a configuração do abuso de poder e/ou do uso indevido dos meios de comunicação social requer a demonstração da gravidade das circunstâncias que o caracterizam, cabendo ao julgador analisar o caso sob a perspectiva da gravidade dos fatos.

In casu, o recorrente não obteve êxito em comprovar as graves alegações imputadas aos ora recorridos. Estes, ao contrário, acostaram prova documental suficientemente robusta para afastar as imputações.

Conforme se verifica dos documentos trazidos aos autos às fls. 208-211, o recorrido José Provenci afastou-se da direção da Rádio Princesa de Ibirapuitã em 02.01.2014.

Além disso, foi acostada, por cópia, prestação de contas retificadora, protocolizada nesta Justiça Especializada em 19.11.2016 (fl. 364), na qual foi declarada a doação estimada de prestação de serviços de gravação e produção de programa de propaganda eleitoral, no valor de R$ 800,00, feita por Eder Lodi à campanha da chapa majoritária, composta pelos recorridos Rosemar Hentges e José Nicolodi Provenci na eleição de 2016 (fls. 367-368).

Em ofício juntado à fl. 528, a Câmara de Vereadores de Ibirapuitã informou ao juízo da 54ª Zona que a) nunca firmou contrato com a Rádio Princesa FM e que b) os pagamentos efetuados à empresa Carisma Produções, no valor de R$ 700,00 mensais, decorreram do contrato de prestação de serviços de gravação e edição das sessões daquela Casa Legislativa, bem como das reuniões de suas comissões, celebrado em 2016, cuja cópia foi acostada às fls. 529-531.

Quanto à utilização do "Grupo Pró-Vida" em benefício da campanha, a postagem reproduzida à fl. 34, apresentada pela representante como prova do envolvimento do recorrido José nas atividades do referido grupo de doadores de sangue, diz respeito a evento ocorrido em 15 de maio de 2016, no município vizinho de Nicolau Vergueiro. A simples leitura do texto publicado revela ter se tratado de visita efetuada por alguns integrantes da referida entidade, com o objetivo de apresentar à comunidade vizinha o trabalho desenvolvido e, com isso, contribuir com a criação de órgão semelhante em Nicolau Vergueiro. Em nenhum momento, identifica-se referência, sequer velada, ao pleito que se aproximava. Além disso, o município em questão sequer pertence à 54ª Zona Eleitoral, não havendo, na postagem, elementos que permitam concluir que eleitores de Ibirapuitã tenham participado do evento, o que reforça o entendimento de que o encontro não teve finalidade eleitoreira.

A fotografia da fl. 36, a seu turno, revela-se absolutamente imprestável como prova da prática ilícita, pois apenas retrata o representado no interior de um veículo de transporte coletivo, sem que da cena se possa concluir a data e as circunstâncias nas quais realizada a foto.

Por outro lado, os recorridos trouxeram aos autos declarações firmadas, respectivamente, pela presidente da referida entidade, Sra. Rejane Teresinha Dorst, e pelo contador, Sr. José Valdir de Anunciação, (fls. 151-155), as quais informam que não só o recorrido José afastou-se das atividades junto à entidade, como o grupo de doadores de sangue de Ibirapuitã “Pró-Vida” suspendeu totalmente as atividades durante o período eleitoral de 2016.

No ponto, importante destacar que a alegação da recorrente de que os referidos documentos são inidôneos e que não foram corroborados pela prova testemunhal, uma vez que as pessoas que os firmaram não compareceram à audiência de instrução (fls. 536-537 e 578), não merece prosperar, pois não encontra respaldo no conjunto probatório carreado aos autos.

Já os documentos das fls. 214-427 atestam o desligamento de José Provenci dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento e de Saúde.

A prova oral colhida à instrução (mídia da fl. 463), em que pese se constituir exclusivamente de testemunhas trazidas pela parte autora, não forneceu elementos seguros para amparar as imputações.

Aline Tomazzini declarou que Éder Lodi é locutor da rádio comunitária e que se manifestou publicamente apoiando Rosemar e José Provenci. Informou ainda não ter ouvido, pela rádio comunitária, qualquer pedido de voto ou propaganda fora do horário da propaganda eleitoral gratuita, e que não ficou sabendo de nenhuma dificuldade para que a coligação representante veiculasse suas propagandas na rádio. Afirmou também que Éder utilizou perfil pessoal na rede social Facebook para apoiar os referidos candidatos, mas que se limitou a declarar-lhes apoio. Por fim, informou que a rádio tem perfil próprio em rede social, mas que não sabe se este foi utilizado para apoiar os recorridos.

A testemunha Leandro de Goés declarou que conhece Éder Lodi e que ele fazia as propagandas do candidato Rosemar. Não soube dizer de que modo eram as inserções em favor dos representados pelo locutor Éder.

A depoente Maríndia Padilha informou ter conhecimento de que Éder Lodi representa a rádio comunitária local e que o veículo foi utilizado na propaganda oficial. Afirmou também que Éder Lodi apoiava a candidatura dos representados, mas não soube precisar os horários em que o radialista tem programas na rádio comunitária, nem se as manifestações dele em favor da chapa composta pelos recorridos foram feitas em horário específico ou no meio dos programas.

Terezinha Portela declarou que tem conhecimento de que Éder Lodi representa a rádio comunitária da cidade e que ele apoiou o candidato Rosemar nas eleições, inclusive por meio do perfil do Facebook. Afirmou que, no perfil da rádio, também foi feito pedido de voto para Rosemar, mas não sabe quando.

Essa a prova oral colhida no que tange ao abuso de poder.

O Egrégio Tribunal Superior Eleitoral há muito consagrou entendimento acerca da necessidade imperativa de amparar as severas sanções do art. 22 da Lei das Inelegibilidades em robusta e irrefutável prova, não podendo estar ancorada em conjecturas e presunções:

ELEIÇÕES 2010. RECURSO ORDINÁRIO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CANDIDATOS A GOVERNADOR DE ESTADO, A VICE-GOVERNADOR, A SENADOR DA REPÚBLICA E A SUPLENTES DE SENADORES. ABUSO DO PODER POLÍTICO, ECONÔMICO E USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. UTILIZAÇÃO DE SERVIDORES PÚBLICOS EM CAMPANHA. COAÇÃO SOBRE EMPRESÁRIOS DO ESTADO PARA FAZEREM DOAÇÃO À CAMPANHA DOS RECORRIDOS. ARREGIMENTAÇÃO E TRANSPORTE DE FUNCIONÁRIOS DE EMPRESAS PRIVADAS E DE COOPERATIVAS PARA PARTICIPAREM DE ATO DE CAMPANHA. USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA DA IMPRENSA ESCRITA EM RELAÇÃO AO ESTADO DO ACRE. ALINHAMENTO POLÍTICO DE JORNAIS PARA BENEFICIAR DETERMINADA CAMPANHA.

1. Com base na compreensão da reserva legal proporcional, a cassação de diploma de detentor de mandato eletivo exige a comprovação, mediante provas robustas admitidas em direito, de abuso de poder grave o suficiente a ensejar essa severa sanção, sob pena de a Justiça Eleitoral substituir-se à vontade do eleitor. Compreensão jurídica que, com a edição da LC n. 135/10, merece maior atenção e reflexão por todos os órgãos da Justiça Eleitoral, pois o reconhecimento do abuso de poder, além de ensejar a grave sanção de cassação de diploma, afasta o político das disputas eleitorais pelo longo prazo de oito anos (art. 1º, inc. I, al. d, da LC n. 64/90), o que pode representar sua exclusão das disputas eleitorais.

[...]

4. Abuso do poder político e econômico na arregimentação e transporte de funcionários de empresas privadas e de cooperativas para participarem de ato de campanha dos recorridos: a configuração do abuso de poder, com a consequente imposição da grave sanção de cassação de diploma daquele que foi escolhido pelo povo afastamento, portanto, da soberania popular, necessita de prova robusta da prática do ilícito eleitoral, exigindo-se que a conduta ilícita, devidamente comprovada, seja grave o suficiente a ensejar a aplicação dessa severa sanção, nos termos do art. 22, inciso XVI, da LC n. 64/1990, segundo o qual, "para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam". Requisitos ausentes no caso concreto. [...]

7. Recurso ordinário desprovido.

(Grifei.)

(TSE – RO n. 191942 – Rel. Min. GILMAR FERREIRA MENDES – DJE de 8.10.2014.)

 

ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). PREFEITO E VICE-PREFEITO. ABUSO DOS PODERES POLÍTICO E ECONÔMICO. CONDUTA VEDADA DO ART. 73, VIII, DA LEI Nº 9.504/97. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. DESPROVIMENTO.

1. Não comporta êxito o agravo que se limita a retirar as alegações do recurso especial (Súmula n. 26/TSE).

2. In casu, a Corte Regional, instância exauriente na análise de fatos e provas, manteve sentença de improcedência da AIJE, por entender insuficiente o conjunto probatório dos autos para condenar os recorridos, ora agravados, pela prática das condutas vedadas previstas no art. 73, inc. V e VIII, da Lei n. 9.504/97 e pelo abuso dos poderes político e econômico.

3. A despeito de o recorrente alegar que pretende apenas o reenquadramento jurídico dos fatos, não há como adotar conclusão diversa e reconhecer as práticas descritas no acórdão regional (Súmula n. 24/TSE).

4. Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, a aplicação das sanções previstas no art. 22 da LC nº 64/90 impõe a existência ex ante de prova inconteste e contundente da ocorrência do abuso, não podendo estar ancorada em conjecturas e presunções.

5. Agravo regimental desprovido.

(REspe n. 85587, Relatora Min. LUCIANA LÓSSIO, DJE, Tomo 92, Data 12.5.2017, Página 32.)

Em resumo, considerando que as alegações da parte representante não encontram suporte na prova coletada, não se verifica a presença do abuso de poder econômico ou do uso indevido dos meios de comunicação social pretendidos pela recorrente, impondo-se a manutenção da sentença de improcedência da demanda.

2- Captação Ilícita de Sufrágio:

Aqui, a questão que se apresenta é a seguinte:

A representante sustentou que:

a) no dia 1º de outubro, véspera da eleição, os representados permaneceram em frente a uma farmácia local, distribuindo, para eleitores, cerveja, algodão-doce e, possivelmente, dinheiro sacado de um caixa eletrônico existente no interior do referido estabelecimento comercial;

b) em postagem realizada no dia 05.10.2016, a filha do vice-prefeito eleito – José Provenci –, Ana Cristina Provenci, teria declarado que “pior aqueles que estavam louco esperando a teta, mas não foi dessa vez! Ninguém mandou não saber comprar votos igual nós!” [sic]; e

c) em comício realizado durante a campanha, houve a participação de palestrante que distribuiu 11 (onze) rosas, o que teria configurado showmício e doação de brindes, em infração ao art. 41-A da Lei n. 9.504/97.

O aludido dispositivo da Lei das Eleições tem por objetivo proteger a liberdade de escolha do eleitor, vedando que seu voto seja definido ou influenciado pelo oferecimento de bens e vantagens.

Para sua configuração, é necessária a conjugação de elementos subjetivos e objetivos que envolvem uma situação concreta, a saber: 1- a prática de uma conduta (doar, oferecer, prometer, etc.); 2- a existência de uma pessoa física (eleitor); 3- o resultado a que se propõe o agente (o fim de obter o voto).

Consoante pacífica jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a ocorrência do ilícito do art. 41-A da Lei das Eleições não pode ser presumida. Ao contrário, exige-se prova segura e robusta a demonstrá-la:

RECURSO ESPECIAL. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. PROVA ROBUSTA. AUSÊNCIA. PROVIMENTO.

1.Considerando a contradição da prova analisada pela Corte Regional, não há como se entender pela configuração da captação ilícita de sufrágio, a qual demanda a presença de prova robusta e inconteste, o que não se verifica na hipótese dos autos.

2. Recurso especial provido.

(TSE – AC 79143 – Rel. Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA – DJE de 23.5.2014.)

 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2012. PREFEITO. VEREADOR. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO E ABUSO DO PODER ECONÔMICO. DESPROVIMENTO.

1. Consoante a atual jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a licitude da prova colhida mediante interceptação ou gravação ambiental pressupõe a existência de prévia autorização judicial e sua utilização como prova em processo penal.

2. A prova testemunhal também é inviável para a condenação no caso dos autos, tendo em vista que as testemunhas foram cooptadas pelos adversários políticos dos agravados para prestarem depoimentos desfavoráveis.

3. As fotografias de fachadas das residências colacionadas aos autos constituem documentos que, isoladamente, são somente indiciários e não possuem a robustez necessária para comprovar os ilícitos.

4. A condenação pela prática de captação ilícita de sufrágio ou de abuso do poder econômico requer provas robustas e incontestes, não podendo se fundar em meras presunções. Precedentes.

5. Agravo regimental desprovido.

(TSE – Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 92440 – Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA – DJE de 21.10.2014.)

 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ART. 41-A DA LEI 9.504/97. ELEIÇÕES 2012. AUSÊNCIA DE CONFIGURAÇÃO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. DESNECESSIDADE.

1. A configuração de captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei 9.504/97) demanda a existência de prova robusta de que a doação, o oferecimento, a promessa ou a entrega da vantagem tenha sido feita em troca de votos, o que não ficou comprovado nos autos.

2. Conforme a jurisprudência do TSE, o fornecimento de comida e bebida a serem consumidas durante evento de campanha, por si só, não configura captação ilícita de sufrágio.

3. A alteração das conclusões do aresto regional com fundamento nos fatos nele delineados não implica reexame de fatos e provas. Na espécie, a mudança do que decidido pela Corte Regional quanto à finalidade de angariar votos ilicitamente foi realizada nos limites da moldura fática do acórdão, sem a necessidade de reexame fático-probatório.

4. Agravo regimental não provido.

(TSE – Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 47845 – Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA – DJE de 21.5.2015.)

Ainda, em caráter exemplificativo, os seguintes precedentes deste Regional:

Recurso. Representação. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Improcedência. Eleições 2016.

Para a configuração da captação ilícita de sufrágio, necessária a conjugação de elementos subjetivos e objetivos que revistam uma situação concreta.

Incontroversa a entrega de material de construção para eleitor. Todavia, carece de prova o envolvimento dos representados e a intenção específica exigida pelo comando - a obtenção de votos. Recebimento do material precedido do regular processo administrativo perante a prefeitura, em razão de política municipal de habitação de interesse social e saneamento. Ausente prova da captação ilícita de sufrágio.

Provimento negado.

(TRE-RS – RE n. 19515 – Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz – J. Sessão de Julgamento de 29.11.2016.)

 

Recurso. Representação. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Eleições 2016.

1. Preliminar. Licitude da gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro. Hipótese em que desnecessária a autorização judicial. Por consequência, afastada a nulidade de testemunho por derivação.

2. Vedada pela legislação eleitoral a entrega ou oferta de vantagens para a obtenção do voto do eleitor. Não é exigido pedido expresso de voto, bastando apenas que a oferta ocorra com a finalidade de obter voto.

3. A ajuda financeira a familiar de eleitora, conhecida do candidato de longa data, bem como o fornecimento de gasolina para que pudesse comparecer às urnas, não evidencia suposta compra de votos. Reafirmado, em algumas passagens do diálogo, que a eleitora não estava obrigada a votar no candidato. Inexistente, na espécie, prova robusta a revelar a captação ilícita de sufrágio.

Provimento.

(TRE-RS – RE n. 57243 – Rel. Dr. Jamil Andraus Hanna Bannura – J. Sessão de 7.3.2017.)

Não se admite, portanto, decreto condenatório fundado em meras presunções.

E esse é o caso dos autos, pois não se evidenciam provas de que houve, efetivamente, a ocorrência do ilícito.

Com relação ao fato apontado no item “a” acima, a recorrente afirmou textualmente que:

[…] os investigados utilizaram-se da Farmácia Santa Rita, da lancheria do investigado Rosemar, do próprio Comitê eleitoral, e das ruas em frente à farmácia […] para arregimentarem eleitores, fazer boca de urna e, possivelmente, comprarem votos […] e que […] a captação ilícita de sufrágio pode ter acontecido na própria arregimentação antes comentada. (Grifei.)

No intuito de comprovar a conduta irregular, a recorrente acostou fotografias (fls. 13-16) e vídeo (fl. 73), os quais, no entanto, demonstram apenas uma aglomeração de pessoas, sem que se possa dali extrair qualquer elemento de convicção quanto à ocorrência dos ilícitos atribuídos aos ora recorridos.

Conforme muito bem analisado pelo órgão ministerial de primeiro grau (fl. 560v.): "[…] O fato de uma farmácia estar aberta nada demonstra de irregular, assim como a presença de vendedores ambulantes no local que, certamente, se aproveitaram da aglomeração para realizar a venda e obter algum lucro."

Além disso, impõe-se ressaltar que, em atendimento à diligência requerida pela coligação representante, o Banco do Estado do Rio Grande do Sul informou (fls. 497 e 534) que não foi verificada movimentação excepcional à média nos 5 (cinco) finais de semana que antecederam o dia da eleição, bem como nos dias 1º e 02 de outubro de 2016.

Já no que concerne à suposta declaração de Ana Cristina Provenci – item “b” supra – na rede social Facebook, bem como à distribuição de 11 (onze) rosas em comício – item “c” –, colho o seguinte trecho da minuciosa análise procedida pelo órgão ministerial de piso (fls. 559-565), o qual foi também incorporado à sentença ora guerreada e ao parecer da Procuradoria Regional Eleitoral (fls. 618-626), cujos fundamentos adoto como razões de decidir, verbis:

Acerca da captação ilícita de sufrágio, gize-se que a mera declaração isolada em rede social de suposta apoiadora da candidatura impugnada não representa prova idônea a demonstrar que houve compra de votos, à míngua de outras provas e maiores esclarecimentos.

[...]

Ainda, para a procedência da representação eleitoral em debate, igualmente, é imprescindível que se demonstre o efetivo condicionamento da entrega do benefício à obtenção do voto do eleitor.

A declaração supostamente firmada por Ana Cristina Provenci não serve como confissão e é estéril, por si só, a demonstrar captação irregular.

A prova testemunhal colhida não é segura em demonstrar qualquer irregularidade nesse sentido, sendo absolutamente compreensível o envolvimento visceral das pessoas em campanhas eleitorais realizadas em municípios pequenos, como é o caso de Ibirapuitã que conta com pouco mais de 3 mil eleitores.

Nesse passo, não houve a identificação de pessoas que teriam tido o seu voto comprado pelos representados, o que torna a afirmação de compra bastante discutível e controvertida, não servindo para caracterizar a prática.

Do mesmo modo, não parece razoável que as movimentações de um caixa eletrônico venham a demonstrar compra de votos, especialmente porque desse modo não é possível separar saques e transferências habituais realizadas no centro de uma cidade com um possível aumento de movimentações decorrentes de suposto ato eleitoral ilícito. É impossível avaliar por esse modo captação ilícita.

A prova trazida é ingênua nesse ponto, aliás como de resto parece ser toda a peça impugnativa.

Em relação à distribuição irregular de rosas em CTG da cidade, as provas produzidas são insuficientes para demonstrar irregularidades, especialmente as imagens veiculadas, uma vez que através delas não é possível demonstrar entrega ilegal de brindes, em decorrência de campanha política para compra de votos.

Do mesmo modo, a prova testemunhal não foi segura o suficiente a fim de demonstrar a prática, pois nenhuma testemunha ouvida presenciou qualquer doação, fundamentando sua palavra naquilo que outras pessoas referiram, com versões bastante controvertidas.

Ainda que admitíssemos a entrega de rosas, do ato não ficou caracterizado a obtenção de vantagem pelos representados a sustentar a alegação de abuso econômico.

Assim, de acordo com os depoimentos colacionados, não é possível afirmar, de forma inequívoca, se houve realmente captação ilícita de sufrágio.

No ponto, a prova testemunhal encontra-se consolidada pela sentença combatida no trecho que transcrevo a seguir (fls. 570v.-572):

Aline Tomazzini, filiada ao partido PSB, participava dos comícios apoiando o candidato Adair Barcelos. Disse que tinha muita aglomeração de pessoas do partido PP e PMDB na data da eleição. [...] A aglomeração era enquanto as urnas estavam abertas. As pessoas faziam festa, gritavam e bebiam. Não sabe se havia distribuição de brindes no dia da eleição. O comitê dos candidatos fica perto da farmácia. Ficou sabendo da distribuição de rosas em comícios dos candidatos. […] Sabe que a aglomeração de pessoas ficava próxima a um local de votação. Os candidatos não gritavam o número do partido, mas estavam juntos no local. Os candidatos estavam caracterizados com a roupa do partido. Viu na página da filha do vice-prefeito eleito referência rápida de que os “demais não teriam conseguido comprar votos como a gente”. Apenas soube por comentários que os candidatos eleitos compraram votos com dinheiro, sendo que não sabe apontar nenhuma pessoa que tivesse recebido valores vendendo seu voto. […] Não sabe dizer se houve registro junto à polícia ou mesmo à Justiça Eleitoral acerca da alegada boca de urna.

Leandro de Goés trabalhou para o PTB na eleição. Disse ter presenciado uma grande movimentação de pessoas no dia da eleição na quadra onde ocorria a votação. Farmácia e lancheria estavam abertas com muita movimentação. Os interlocutores esperavam na porta, as pessoas entravam e eles fechavam a cortina. Isso na lancheria. Ficou sabendo da distribuição de cerveja e remédios, além de rosas em comício. Não estava no comício. Era o próprio Rosemar que fechava as cortinas de seu estabelecimento. Não presenciou os representados pedindo voto no dia da eleição ou oferecendo alguma vantagem. […].

Maríndia Padilha, compromissada, informou em Juízo ter visto aglomeração de pessoas no dia que antecedeu a votação. Viu bebida. Isso após as 17h. As pessoas eram de uma única candidatura. Confirmou que pediam votos e se manifestavam. Ficavam na lancheria e na praça. Entende que a farmácia estava aberta fora de horário no sábado. (…). Sabe que Ana Provenci pediu votos para a coligação vencedora. Houve distribuição de rosas. Disse que todos que estavam no comício ganharam. Não estava no comício das rosas. Não tinha envolvimento partidário e nem trabalhou nas eleições. Foi convidada pela advogada dos representantes para testemunhar. […] Sabe que Ana Provenci se manifestou pedindo votos no seu perfil em rede social. Não presenciou Ana Provenci oferecer dinheiro para comprar votos. Não viu, apenas ficou sabendo por pessoas. Não ficou sabendo o valor que era dado para comprar votos. Não soube dizer que havia lhe contado acerca da distribuição de rosas em comício. Perguntada se houve distribuição de rosas em número alusivo a da inscrição do partido, disse que todos que foram ao comício receberam, segundo sabe. Reforçou não saber o nome da pessoa que é sua conhecida e que lhe informou acerca da distribuição de brindes.

A depoente Terezinha Portela referiu em Juízo ser filiada ao PDT. Compromissada, relatou saber o que aconteceu nas eleições em Ibirapuitã. Perguntada inicialmente pelo Juízo disse ter presenciado fatos na frente do bar e cervejas fora de horário. […]. Presenciou no sábado uma manifestação grande próximo ao comitê de campanha, lancheria e farmácia. Referiu que tinha muita gente na praça. Sabe que houve compra de votos. Não sabe se as pessoas estavam identificadas. Somente identificou as pessoas por ser a proprietária da farmácia filha de uma das candidatas. Sabe que Ana Provenci participou das eleições fazendo campanha. Ficou sabendo com uma amiga que houve distribuição de rosas. As rosas foram dadas em um comício. Foram distribuídas rosas para muitas mulheres, sabendo que foram mais de cem rosas. Não viu se os candidatos estavam no local no dia das eleições. Rosemar estava no local, mas não utilizava roupa característica da campanha. Tinha apenas um adesivo na roupa. […]. Sabe que foi negado acesso ao comício no CTG Seiva Pampeana.

A prova oral acima foi sopesada com muita propriedade pelo Parquet de origem às fls. 563-564v., razão pela qual, para evitar desnecessária tautologia, a exemplo do que fizeram o magistrado de origem (fls. 571v.-572v.) e o nobre Procurador Regional Eleitoral (fls. 623-624v.), agrego a este voto as considerações lá consignadas, como razões de decidir:

O que se pode perceber com clareza da prova testemunhal é que três depoentes possuem ligação com a coligação representante, sendo dois deles de forma direta. Por outro lado, Maríndia declinou ter sido convidada pela advogada da coligação representante para prestar depoimento.

Nesse sentido, Aline Tomazzini é filiada ao PSB, partido que integrou a coligação representante “Unidos por Ibirapuitã”, tendo trabalhado ativamente na campanha em prol de candidato a vereador pela coligação. Ainda assim, disse que soube apenas por comentários que os candidatos eleitos estavam comprando votos com dinheiro, sendo que não sabe apontar nenhuma pessoa que tivesse recebido valores vendendo seu voto.

[…].

Leandro de Goés, apesar de não ter filiação partidária, informou ter trabalhado ativamente na campanha do partido PTB, integrante da coligação representante, e partido do candidato derrotado a prefeito Jaime. Apesar do seu envolvimento na campanha, disse não ter presenciado os representados pedindo voto no dia da eleição ou oferecendo alguma vantagem para obtenção de votos.

[…].

Terezinha Padilha é filiada ao PDT, partido que integra a coligação representante, referindo em Juízo ter ficado sabendo da distribuição de rosas por uma amiga, informando que foram mais de cem rosas distribuídas, assim como Maríndia Padilha não presenciou ninguém comprar votos ou distribuir rosas, apenas tomou conhecimento com terceiros.

A prova oral colhida, pois, não oferece credibilidade suficiente a sustentar o pedido firmado na inicial. Note-se que nenhuma testemunha absolutamente isenta foi arrolada para prestar depoimento dando conta dos atos irregulares supostamente praticados pelos representados.

Logo, a representante não se desincumbiu de demonstrar o especial fim de agir, consubstanciado no condicionamento da entrega do benefício à obtenção do voto, bem como a ciência, ou ao menos a anuência, dos representados a fim de caracterizar a prática de captação ilícita de sufrágio, descrita no art. 41-A da Lei n. 9.504/1997.

[...]

Assim, ausentes tais elementos de prova no caderno processual, impossível a procedência do pedido também nesse ponto.

Nesse contexto, tenho que a livre manifestação de vontade do eleitor não foi maculada, visto que, das provas colhidas, não se pode concluir de forma inequívoca a prática ilícita.

No mesmo sentido, o posicionamento do Procurador Regional Eleitoral, segundo o qual o desprovimento do recurso é a solução que se impõe (fl. 626v.).

Desta feita, diante da fragilidade do caderno probatório, inexiste, a meu sentir, comprovação inconteste das condutas imputadas aos recorridos, não se admitindo, nesse caso, a imposição das severas sanções previstas nos arts. 41-A da Lei das Eleições e 22 da Lei Complementar n. 64/90.

Dispositivo

Diante do exposto, VOTO:

a- preliminarmente, pelo indeferimento dos pedidos de conversão do feito em diligências e de abertura de prazo;

b- ainda em preliminar, de ofício, pela extinção do feito sem resolução do mérito, exclusivamente quanto às imputações de arregimentação de eleitores ou boca de urna e de propaganda eleitoral extemporânea, fulcro nos arts. 330, inc. III, e 485, inc. VI, § 3º, ambos do CPC; e

c- no mérito, pelo desprovimento do recurso interposto pela coligação UNIDOS POR IBIRAPUITÃ (PDT - PSC -PTB - PSB) de Ibirapuitã.