RE - 24506 - Sessão: 08/11/2017 às 16:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso eleitoral interposto por ALEX ANTÔNIO RODRIGUES, candidato a vereador no Município de Sarandi, em face da sentença (fls. 47-48v.) que desaprovou as contas relativas às eleições de 2016, nos termos do art. 30, inc. III, da Lei n. 9.504/97, em virtude da utilização de recursos de origem não identificada, e determinou o recolhimento da importância de R$ 1.500,00 ao Tesouro Nacional.

Nas razões do apelo (fls. 60-66), o recorrente alega que demonstrou a propriedade do veículo cedido para campanha. Afirma que juntou documentação capaz de comprovar a origem da doação de R$ 1.500,00. Aduz que a presunção de utilização de valores desviados do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação não é suficiente para caracterizar fraude eleitoral, não havendo indício de uso de qualquer quantia que não fosse do próprio candidato. Requer, por fim, a aprovação das contas.

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral, preliminarmente, opinou pelo não conhecimento da documentação acostada, e, no mérito, pelo desprovimento do recurso (fls. 79-83v.).

É o relatório.

 

VOTO

Preliminares

Tempestividade e Representação Processual

O recurso é tempestivo. A decisão foi publicada no mural eletrônico em 16.12.2016 (fl. 49); contudo, em 14.12.2016, foi revogada a procuração outorgada a Dione Maria Gregianin (fl. 51). Intimado, em 27.01.2017, via mural eletrônico (fl. 54) e, em 03.03.2017, via A.R. (fl. 57), o recorrente juntou documento constituindo novo advogado e, na mesma data, 08.3.2017, interpôs recurso (fl. 60), de forma que foi obedecido o prazo de três dias indicado no art. 77 da Resolução TSE n. 23.463/15.

Presentes os demais pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Da juntada de documentos em sede recursal

O recorrente juntou documentos em grau de recurso, os quais, na opinião do Ministério Público Eleitoral, preliminarmente, não devem ser conhecidos.

Como já destacado em julgamento anterior desta Corte (RE PC n. 282-92.2016.6.21.0128, relator o Dr. Jamil Andraus Hanna Bannura, julgado em 16.5.17), a apresentação de novos documentos com o recurso, nesta classe processual especialmente, não apresenta prejuízo à tramitação do processo, mormente quando se trata de documentos capazes de esclarecer as irregularidades apontadas. Transcrevo a ementa do referido julgado:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Arrecadação e gastos de recursos em campanha eleitoral. Eleições 2016. Matéria preliminar. 1. Embora a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral não admita a juntada de documentação nova ao processo quando já transcorrida oportunidade prévia de saneamento das irregularidades, a previsão do art. 266 do Código Eleitoral autoriza a sua apresentação com a interposição do recurso, quando se tratar de documentos simples, capazes de esclarecer os apontamentos sem a necessidade de nova análise técnica ou diligência complementar. 2. A ausência de manifestação sobre eventual irregularidade nas contas não se confunde com a invalidade da sentença. Observado o regular procedimento na análise das contas ofertadas pelo candidato. Nulidade afastada. Mérito. Falta de registro de despesa com serviços contábeis e gastos lançados com combustível sem consignar o aluguel ou cessão de veículo. Inconsistências sanadas com a juntada de novos documentos quando da interposição do recurso, que comprovam receita estimável em dinheiro referente ao serviço de contabilidade e juntada de termo de cessão de veículo para uso na campanha. Desacolhido o pedido ministerial, nesta instância, de arrecadação de valores ao Tesouro Nacional em razão de recebimento de quantia não identificada, a fim de evitar a “reformatio in pejus”. Aprovação das contas. Provimento. 

Nessa linha, visa-se sobretudo salvaguardar o “interesse público na transparência da contabilidade de campanha, aliado à ausência de prejuízo à célere tramitação das contas”, de forma que caracteriza formalismo excessivo a vedação de novos documentos em segundo grau.

Dessa forma, entendo possível a juntada dos novos documentos com o recurso, ainda que a parte tenha sido, na origem, intimada a manifestar-se.

Mérito

As contas foram desaprovadas ao argumento central de recebimento de recursos de origem não identificada.

Com espeque no parecer técnico conclusivo (fl. 31), a magistrada a quo enfrentou os seguintes itens a corroborar sua decisão: i) doação estimável de R$ 1.650,00 e ii) recebimento em espécie de R$ 1.500,00 sem comprovação da origem. Esta última, agravada pela informação da Procuradoria do Trabalho do Ministério Público indicando que o candidato teve movimentações financeiras incompatíveis com sua declaração de imposto de renda e ainda patrimônio não declarado (fls. 9-30v.), mesmo quando do registro de candidatura.

A justificar a doação estimável, o candidato juntou certidão de registro do DETRAN-RS (fl. 40) datada de 30.11.2016, em que comprova a propriedade do veículo utilizado na campanha desde 05.6.2013, e termo de cessão do automóvel a contar de 09.9.2016 (fl. 39). Assim, em que pese a ausência de declaração do bem à época do registro de candidatura, no âmbito do processo de prestação de contas, a documentação acostada legitima o lançamento do valor de R$ 1.650,00 como estimado para cedência de veículo, nos termos do art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15, verbis:

Art. 18. As pessoas físicas somente poderão fazer doações, inclusive pela Internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços.

Do montante em espécie recebido de pessoas físicas – R$ 1.500,00 –, o recorrente, após relatório técnico, limitou-se a carrear 2 recibos (R$ 1.000,00 e R$ 500,00) com comprovantes de depósitos bancários, sem dar cabo da origem dos valores.

Contudo, em sua irresignação, visando comprovar a origem dos valores recebidos, o prestador juntou Declaração de Imposto de Renda Retificadora – 2015 e, novamente, recibos, intentando provar que possuía condições para arcar com a doação em dinheiro (R$ 1.500,00) tida por de origem não identificada.

Os depósitos deram-se em espécie e com a indicação do CPF do doador (fls. 41-42), conforme dicção do já citado art. 18:

Art. 18. As pessoas físicas somente poderão fazer doações, inclusive pela Internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços. (grifei)

As datas de doação foram distintas – 08 e 30.9.2017 –, não cabendo falar na limitação dos §§ 1º e 2º, do multicitado art. 18:

Art.18.

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se na hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia. (Grifei.)

Acolhida a juntada de documentos, a declaração que retificou seus lançamentos junto à Receita Federal (fl. 70) apresenta um valor total de rendimentos tributáveis de R$ 110.370,75, restando, em termos percentuais, utilizado apenas 1,35% de sua capacidade de doação ao repassar para sua conta campanha R$ 1.500,00.

Aqui, considerando a manifestação ministerial quanto a juntada tardia de documentos, calha citar a inteligência do art. 21 e seu § 8º da Resolução TSE n. 23.463/15, o qual reconhece a retificação de valores e limita o valor das doações a 10% do apresentado na Declaração de Imposto de Renda Anual, evitando discrepâncias entre os valores utilizados em campanha e os declarados à Fazenda Pública:

Art. 21. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a dez por cento dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição.

§ 8º Eventual declaração anual retificadora apresentada à Secretaria da Receita Federal do Brasil deve ser considerada na aferição do limite de doação do contribuinte.

Por elucidativo, trago ementas de arestos nesse sentido:

Embargos de Declaração em Prestação de Contas. 1. Alegação de omissão em virtude de não terem sido consideradas as manifestações da embargante acerca do relatório conclusivo. Utilização de recursos próprios compatíveis com o patrimônio declarado no imposto de renda à Receita Federal. Precedentes de outros Tribunais Regionais Eleitorais admitindo a comprovação do patrimônio através da declaração de imposto de renda. (RE 677-69 TRE/MS, Rel. Geraldo de Almeida Santiago, DJE de 16.7.2014; PC 3433-55 TRE/MG, Rel. designado Wladimir Rodrigues Dias, DJE de 20.8.2015; RPREST 53607 TRE/SC, Rel. Ivorí Luis da Silva Scheffer, DJE de 14.4.2014)2. Requerimento de intimação do partido para integrar a lide que não tinha por objetivo a defesa de interesses da candidata, mas sim de viabilizar a aplicação da penalidade de suspensão do repasse de cotas à agremiação partidária a que era filiada a candidata.3. Embargos conhecidos e providos em parte para julgar aprovadas as contas com ressalvas, na forma do artigo 54, inciso II, da Resolução TSE 23.406/2014.

(EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM PRESTAÇÃO DE CONTAS n. 543967, ACÓRDÃO de 16.9.2015, Relator FLAVIO DE ARAUJO WILLEMAN, Publicação: DJERJ - Diário da Justiça Eletrônico do TRE-RJ, Tomo 189, Data 22.9.2015, p. 06-09.)

 

Prestação de contas. Eleições 2014. Candidato. Deputado Estadual. Parecer da Secretaria de Controle Interno pela desaprovação das contas. Apresentação, pelo candidato, de declaração de Imposto de Renda do ano calendário de 2014 com rendimentos que demonstram a origem dos recursos próprios doados a sua campanha eleitoral. Comprovação da procedência dos gastos. Não recolhimento da RONI. Contas julgadas aprovadas, com ressalvas. 

(PRESTAÇÃO DE CONTAS n. 343355, ACÓRDÃO de 30.7.2015, Relator MAURÍCIO PINTO FERREIRA, Relator designado WLADIMIR RODRIGUES DIAS, Publicação: DJEMG - Diário de Justiça Eletrônico TREMG, Data 20.8.2015.)

No que toca a alegação de desvio de recursos do Sindicado dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação, correta a manifestação do prestador ao alegar que, até o momento, trata-se de mera presunção a ser investigada, respeitando o contraditório e a ampla defesa, incapaz de demonstrar a utilizações dos valores em campanha e caracterizar fraude eleitoral. Tese que encontra esteio na própria sentença quando decide não haver, nos autos, prova suficiente a indicar que as doações – no montante de R$ 1.500,00 – tiveram como doadora originária a entidade sindical (fl. 48).

Registro, ao cabo, que esta Corte vem, com frequência, sendo bastante tolerante quando o prestador de contas, malgrado não tenha seguido à risca os ditames legais e regulamentares, consegue, ao menos, demonstrar a origem imediata dos valores, circunstância que tem eximido os jurisdicionados dos recolhimentos dos valores.

Nessa linha, colaciono o seguinte julgado:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Doação financeira. Resolução TSE n. 23.463/15. Eleições 2016. Recurso financeiro recebido por meio de depósito bancário, contrariando o disposto no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15, que exige transferência eletrônica. Quantia que representa elevado percentual em relação ao total de recursos arrecadados, fato que prejudica a confiabilidade das contas e leva à sua desaprovação. Inaplicabilidade do disposto no § 3º do art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15 – restituição do recurso ou recolhimento ao erário –pois os elementos dos autos autorizam a conclusão de que os recursos são provenientes de doação do próprio candidato para sua campanha eleitoral. Provimento negado.

(RE n. 423-11, Rel. Dr. Jamil Bannura. Julgado em 23.5.17, unânime.)

 

Dessarte, a despeito da não apresentação de documentos quando do parecer técnico e da ação civil n. 0020460-79.2016.5.04.04561 ainda em trâmite, o recorrente logrou, em sede recursal, comprovar minimamente a origem dos valores recebidos, restando a revisão da sentença medida que se impõe.

Ante o exposto, VOTO, preliminarmente, pelo conhecimento dos documentos acostados, e, no mérito, pelo provimento parcial do recurso, para aprovar as contas com ressalvas e determinar a suspensão do recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 1.500,00.