RE - 26322 - Sessão: 14/08/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por PAULO LOPES GODOI contra sentença proferida pelo Juízo da 117ª Zona Eleitoral, sediada em Não-Me-Toque, a qual julgou improcedente a Ação de Investigação Judicial Eleitoral proposta contra CLÁUDIO AFONSO ALFLEN, prefeito reeleito, e GILMAR FRANCISCO APPELT, vice-prefeito, fundamentalmente por entender não haver provas suficientes para amparar a pretensão veiculada (fls. 165-169).

Traz razões que entende cabíveis para a reforma (fls. 178-199). Sustenta, preliminarmente, ter havido cerceamento de manifestação. No relativo ao mérito, aduz que a revisão geral de remuneração aos servidores municipais devia ter ocorrido até a data de 05.4.2016, sendo que, após tal dia, somente poderiam ter sido repostas as perdas do poder aquisitivo ao longo do ano em que ocorrida a eleição, 2016. Entende que houve aumento acima dos índices inflacionários e, portanto, ilegal, pois desobediente ao art. 73, inc. VIII, da Lei n. 9.504/97. Entende ocorrentes abusos do poder econômico e de autoridade, praticados mediante condutas vedadas aos agentes públicos. Requer o provimento do apelo, para julgar procedente a representação.

Com as contrarrazões (fls. 205-207), os autos vieram ao grau recursal, no qual a Procuradoria Regional Eleitoral exarou parecer pelo desprovimento do recurso (fls. 213-216v.).

É o relatório.

 

VOTO

Com a devida vênia do d. Procurador Regional Eleitoral, entendo que o recurso é tempestivo. Na esteira de precedentes desta Corte (por todos, o RE n. 91-38, de relatoria do Des. Jamil Andraus Hanna Bannura), há de ser aplicado o art. 219 do Código de Processo Civil, de maneira que, uma vez publicada no DEJERS na data de 16.3.2017, uma quinta-feira, o prazo de três dias úteis se esgotaria na terça-feira subsequente, dia 21.3.2017.

Exatamente no dia 21.3.2017 é que foi interposto o apelo, conforme constante à fl. 178 dos autos.

O recurso é, portanto, regular e tempestivo e, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, dele conheço.

 

Preliminar de cerceamento de defesa

O recorrente alega a ocorrência de cerceamento de manifestação. Conforme narrado, teria sido negada, às partes, a oportunidade de oferecer alegações finais, nos termos do art. 22, inc. X, da Lei Complementar n. 64/90.

Não procede.

A jurisprudência do e. Tribunal Superior Eleitoral indica que, para que seja decretada a nulidade de ato processual ao argumento de cerceamento de defesa, há que ser demonstrada a efetiva demonstração de prejuízo, conforme a dicção do art. 219 do Código Eleitoral.

Nessa linha, a seguinte ementa de julgado, em recurso de representação de conduta vedada, feito no qual foi adotado o rito do art. 96 da Lei n. 9.504/97, em detrimento de todo o rito do art. 22 da Lei Complementar n. 64/90:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2014. GOVERNADOR. REPRESENTAÇÃO. CONDUTA VEDADA AOS AGENTES PÚBLICOS. PUBLICIDADE INSTITUCIONAL. ART. 73, VI, B, DA LEI Nº 9.504/97. CONFIGURAÇÃO. MULTA. DESPROVIMENTO.

1. O recurso cabível no caso é o especial, pois na inicial pugnou-se apenas pela imposição de multa aos agravantes.

2. A decretação de nulidade de ato processual sob a alegação de cerceamento de defesa pressupõe a efetiva demonstração de prejuízo (art. 219 do Código Eleitoral). No caso, a despeito da adoção do rito do art. 96 da Lei nº 9.504/97 em detrimento do previsto no art. 22 da LC nº 64/90, a matéria versada é exclusiva de direito, sendo irrelevante para o deslinde da controvérsia a produção de outras provas.

3. A conduta vedada do art. 73, VI, b, da Lei nº 9.504/97 - proibição de publicidade institucional nos três meses que antecedem a eleição - possui natureza objetiva e configura-se independentemente do momento em que autorizada a publicidade, bastando a sua manutenção no período vedado. Precedentes.

4. O fato de a publicidade ter sido veiculada na página oficial do Governo do Paraná no facebook, rede social de cadastro e acesso gratuito, não afasta a ilicitude da conduta.

5. Manutenção da multa imposta no mínimo legal a cada um dos agravantes.

6. Agravo regimental desprovido.

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, desproveu o agravo regimental, nos termos do voto do Relator. (Grifei.)

(Acórdão de 26.02.2015. Relator Min. João Otávio De Noronha. Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 55, Data 20.3.2015, Páginas 60-61.)

E aqui, tal qual o aresto acima indicado, a questão tem contornos absolutamente objetivos, pois se está a analisar a legalidade, ou ilegalidade, de um fato incontroverso, qual seja, um ascenso remuneratório concedido aos servidores municipais de Victor Graeff, delimitando-se a discussão relativamente a uma circunstância: se tal aumento excedeu, ou não excedeu, a mera recomposição remuneratória, nos termos do disciplinado pelo art. 73, inc. XIII, da Lei n. 9.504/97.

Ou seja, não estampado o prejuízo, mas sim meramente alegado (fl. 185: “talvez se isso tivesse ocorrido o entendimento sobre o mérito teria sido diferente [...]”), a vindicada decretação de nulidade se torna inviável.

Afasto a preliminar.

 

Mérito

Como já indicado, a controvérsia paira sobre aumento remuneratório concedido pela prefeitura de Victor Graeff, mediante a aprovação da Lei n. 1.670, de 26.4.2016, em percentual de 9,9% (nove vírgula nove por cento), referente ao INPC aferido no período compreendido entre 1º.4.2015 e 31.3.2016. O recorrente entende ter havido conduta vedada, mediante abuso de poder econômico e político, com a prática do ato administrativo.

O comando normativo atinente ao tema é o seguinte:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[...]

VIII - fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remuneração dos servidores públicos que exceda a recomposição da perda de seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição, a partir do início do prazo estabelecido no art. 7º desta Lei e até a posse dos eleitos.

Regulamentando o tema relativamente às eleições de 2016, o art. 62, inc. VIII, da Resolução TSE n. 23.457/15, determina que a vedação se iniciou em 5.4.2016, permanecendo até a posse dos eleitos:

Art. 62.  São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais (Lei nº 9.504/1997, art. 73, incisos I a VIII):

VIII - fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remuneração dos servidores públicos que exceda a recomposição da perda de seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição, a partir de 5 de abril de 2016 até a posse dos eleitos.

A sentença entendeu não ter sido desobedecida a norma de regência, fundamentalmente nos seguintes termos (fls. 167-168):

[...]

Conforme bem destacado pelos requeridos e pelo Ministério Público Eleitoral, o alcance da proibição da norma é a concessão de aumento salarial real, não sendo vedado, em absoluto, a concessão de revisão geral que recomponha as perdas do poder aquisitivo em função da inflação. A interpretação buscada pela parte autora é forçada e não perquire a verdadeira finalidade da norma, que procura coibir o uso do poder político para angariar eleitores com a concessão de reajustes às vésperas do pleito. Não equivale dizer que o agente público deve deixar de cumprir o seu dever constitucional de revisar anualmente o salário dos servidores, repondo as perdas inflacionárias, nos termos do artigo 37, X, da Constituição Federal.

Note-se que, no caso, houve integral observância da Lei Municipal n.º 624/2003 (Regime Jurídico Único), que estabeleceu, em seu artigo 114, que a revisão geral anual se daria pelo índice INPC, até o dia 01/05 de cada ano. Trata-se de lei municipal geral, editada há quase quinze anos, que foi regiamente observada pela gestão dos requeridos, que também procedeu à mesma revisão geral, nos mesmos moldes, nos anos de 2013 (fls. 124/125), 2014 (fls. 126/127) e 2015 (fl. 128), o que evidencia que a conduta não pode ser rotulada de eleitoreira apenas em função do período. Trata-se de direito dos servidores públicos municipais, ao qual a Administração está vinculada, inclusive no que se refere à data-base, não se tratando de ato discricionário que pudesse observar a conveniência e oportunidade, escolhendo-se deliberadamente o período eleitoral para concessão.

De fato.

Os acontecimentos indicados como irregulares não têm adequação à acusação de prática de conduta vedada, pois conforme asseverado pelo d. Procurador Regional Eleitoral, a Lei Municipal n. 1.670, de Victor Graeff, “não excedeu a recomposição da perda do poder aquisitivo dos servidores municipais, havida entre 1º.4.2015 e 31.3.2016, limitando-se o percentual concedido, de 9,9%, ao INPC do período” (fl. 215).

Daí, em que pese as aguerridas linhas do recurso interposto, não se vislumbra o “objetivo exclusivamente eleitoreiro” lá indicado (fl. 187), pois embora reste nítido que o aumento desbordou do ano de 2016 e abrangeu meses do ano de 2015, também é certo que o reajuste apenas repôs as perdas do funcionalismo, não ferindo, portanto, o aspecto que a norma pretende proteger, qual seja, o equilíbrio na disputa ou, em outros termos, a paridade de armas na competição eleitoral.

Nessa linha, precedente desta Corte, o RE 436-72, de relatoria do Dr. Jamil Andraus Hanna Bannura:

Recurso. Representação. Conduta vedada. Art. 73, inc. VIII, da Lei n. 9.504/97. Improcedência. Eleições 2016.

Pretensão de reajuste da remuneração de servidores municipais em período vedado pela legislação eleitoral. Ato limitado à recomposição inflacionária, nos termos da legislação municipal. Inexistência de aumento real, visto que os índices concedidos foram menores do que os referentes à inflação.

Desequilíbrio à igualdade entre os candidatos não configurado. Conduta vedada não caracterizada. Provimento negado.

(RE n. 436-72. Julgado em 24.11.2016. Unânime).

Em resumo, o ato não teve o condão de causar desequilíbrio ao pleito do ano de 2016 no Município de Victor Graeff, circunstância fundamental para que a conduta vedada restasse reconhecida.

 

Diante do exposto, e na linha do parecer ministerial, afasto a matéria preliminar e VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo a sentença pelos próprios fundamentos.