RE - 1026 - Sessão: 05/07/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso interposto pelo PARTIDO PROGRESSISTA (PP) de Barão contra sentença (fls. 192-195-v.), que desaprovou suas contas referentes à movimentação financeira do exercício de 2015, em virtude da arrecadação de recursos de fontes vedadas, determinando o recolhimento da importância de R$ 10.352,54 ao Tesouro Nacional, bem como a suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário por um ano.

Em sua irresignação (fls. 200-204), o recorrente pleiteia seja declarada a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, pois não lhe teria sido oportunizado prazo para manifestação, e não constaria nos autos demonstrativo de cálculo do valor a ser devolvido ao Tesouro Nacional. No mérito, alega que não basta a nomenclatura dos cargos em comissão para se concluir sejam autoridades. Requer a aprovação das contas ou, pelo menos, seja afastada a condenação de restituição ao Tesouro Nacional, bem como redução do prazo de suspensão do Fundo Partidário.

O Ministério Público Eleitoral opina pelo afastamento das preliminares e, no mérito, pelo desprovimento do recurso (fls. 206-208).

Nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que se pronunciou pela rejeição das prefaciais e, no mérito, pela manutenção da sentença (fl. 212-v.).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo.

Preliminares

1. Da nulidade por cerceamento de defesa

Inicialmente, consigno que estes autos já aportaram nesta Corte em outras oportunidades.

Na sessão de 16.8.2016, foi reconhecida nulidade da sentença por infringência ao art. 38 da Resolução TSE n. 23.464/15, determinando-se a citação do partido e dos responsáveis (fls. 111-113).

Nova sentença prolatada, interposto recurso, verificou-se, neste Tribunal, que os responsáveis não haviam sido citados, o que motivou o despacho deste relator à fl. 182.

Citados, presidente e tesoureiro manifestaram-se (fls. 189 e 190).

Terceira sentença exarada, recorre o partido e suscita cerceamento de defesa.

Com efeito, consoante se observa do mandado da fl. 120, o partido foi devidamente citado para os fins do art. 38 da Resolução TSE n. 23.464/15, apresentando defesa às fls. 123-A e 124.

Aliás, nessa oportunidade, postulou a expedição de ofício ao Município de Barão, diligência deferida e constante dos autos às fls. 126-131.

De outra banda, o presidente e o tesoureiro da agremiação foram citados, conforme mandado da fl. 189, vindo a apresentar defesa à fl. 190, reportando-se aos argumentos defensivos apresentados pelo Partido Progressista.

Nessa medida, nova arguição de cerceamento de defesa é totalmente descabida e beira a má-fé.

2. Ausência de demonstrativo do cálculo do valor a ser recolhido

Alega o partido que, embora o relatório conclusivo do exame das contas (fls. 62-63) opine pela devolução aos cofres públicos da importância de R$ 10.352,34, inexistiria nos autos "qualquer demonstrativo de como chegou a unidade técnica a este valor".

Basta mero cálculo aritmético para se aferir que tal quantia é a soma dos valores doados indevidamente pelos servidores e que constou no relatório conclusivo do exame das contas.

Rejeito a prefacial.

 

Mérito

O art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95 proíbe o recebimento de doações procedentes de autoridades públicas, como se verifica por seu expresso teor:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38;

O conceito de autoridade pública abrange os detentores de cargos em comissão que desempenham função de chefia e direção, conforme assentou o TSE na Resolução n. 22.585/07, editada em razão da resposta à Consulta n. 1428, cuja ementa está assim vazada:

Partido político. Contribuições pecuniárias. Prestação por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta. Impossibilidade, desde que se trate de autoridade.

Resposta à consulta, nesses termos. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades.

Reproduzo, por oportuno, trechos da referida consulta:

O recebimento de contribuições de servidores exoneráveis ad nutum pelos partidos políticos poderia resultar na partidarização da administração pública. Importaria no incremento considerável de nomeação de filiados a determinada agremiação partidária para ocuparem esses cargos, tornando-os uma força econômica considerável direcionada aos cofres desse partido.

[...]

As autoridades não podem contribuir. E, no conceito de autoridade, incluímos, de logo, nos termos da Constituição, os servidores que desempenham função de chefia e direção. É o artigo 37, inciso V.

[…]

O Tribunal responde à consulta apontando que não pode haver a doação por detentor de cargo de chefia e direção.

Busca-se, assim, manter o equilíbrio entre as siglas partidárias, haja vista o elevado número de cargos em comissão preenchidos por critérios políticos, resultando em fonte extra de recursos, com aptidão de desigualar os partidos que não contam com tal privilégio.

O Ministro Cezar Peluso, redator da consulta, ao examinar o elemento finalístico da norma, que veda as doações de autoridades, assim se posiciona:

A racionalidade da norma para mim é outra: desestimular a nomeação, para postos de autoridade, de pessoas que tenham tais ligações com o partido político e que dele sejam contribuintes.

[…]

Quem tem ligação tão íntima e profunda com o partido político, que é contribuinte do partido, pela proibição, evidentemente, não impede, mas, enfim, desestimula de certo modo.

Nesse sentido, sobreveio a Resolução TSE n. 23.432/14, que, em seu art. 12, inc. XII e § 2º, disciplinou o assunto:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de: […]

XII – autoridades públicas; […]

§2º Consideram-se como autoridades públicas, para os fins do inciso XII do caput deste artigo, aqueles, filiados ou não a partidos políticos, que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta. (Grifado.)

Dessarte, a vedação imposta pela referida Resolução do TSE não tem outro objetivo senão obstar a partidarização da administração pública, principalmente diante dos princípios da moralidade, da dignidade do servidor e da necessidade de preservação contra abuso de autoridade e do poder econômico.

E a jurisprudência desta Corte segue o mesmo entendimento, consoante colaciono julgado de minha relatoria:

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2012. [...]

Caracterizado o ingresso de recurso de fonte vedada, em face do recebimento de doações de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis ad nutum, da administração direta e indireta, que detém a condição de autoridade, em contrariedade ao art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95. Determinação de transferência do montante recebido de fonte vedada ao Fundo partidário. Recebimento de recursos do Fundo Partidário durante o período em que a distribuição de quotas se encontrava suspensa por decisão judicial transitada em julgado. Determinação de restituição do valor ao Erário. As alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/15, que deram nova redação ao art. 37 da Lei 9.096/95, suprimindo a sanção de suspensão de novas contas do Fundo Partidário, não têm aplicação retroativa aos fatos ocorridos antes de sua vigência.

[...] Desaprovação.

(Prestação de Contas n. 7412, Acórdão de 17.12.15, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS,

Tomo 232, Data 18.12.2015, Página 3-4.)

Na espécie, constatou-se o recebimento de doações procedentes dos seguintes detentores de cargo de chefia ou direção na administração pública, no montante de R$ 10.352,34 (dez mil, trezentos e cinquenta e dois reais e trinta e quatro centavos):

a) Aline Neumeister (Chefe de Núcleo): R$ 318,88;

b) Daniela Bissoloti (Diretora de Departamento de Assistência Social): R$ 1.237,80;

c) Deise Raquel Burnier da Rosa Weide (Coordenadora de Saúde): R$ 636,68;

d) Eroni Inácio Wener (Secretário Municipal): R$ 1.046,94;

e) Franciele Becker (Supervisor do Departamento de Saúde Bucal): R$ 1.237,68;

f) Francine Neumann (Chefe de Núcleo): R$ 434,88;

g) Janice Thereza Hastenteufel (Supervisora de Manutenção da Saúde):R$ 828,96;

h) Liziane Artus (Coordenadora de Projetos): R$ 993,48;

i) Lourdes Irena Becker Schmidt (Coordenadora da Terceira Idade): R$ 694,68 ;

j) Rafael Kaefer (Coordenador de Cultura e Esporte): no total de R$828,84;

l) Silene Cornelius Auler (Secretária Municipal): R$ 2.093,52.

Dessa forma, o valor total recebido pelo PARTIDO PROGRESSITA (PP) de Barão, em 2015, oriundo de fontes vedadas, foi de R$ 10.352,34 (dez mil, trezentos e cinquenta e dois reais e trinta e quatro centavos), violando o disposto no art. 31, da Lei n. 9.096/95, na Resolução TSE n. 22.585/07 e no art. 12, inc. XII, da Resolução TSE n. 23.432/14.

Assim, deve ser mantida a desaprovação das contas apresentadas pelo PARTIDO PROGRESSITA (PP) de Barão, relativas à arrecadação e à aplicação de recursos financeiros no exercício de 2015.

Quanto ao recebimento de recursos oriundos de fontes vedadas, tem-se que, nos termos do art. 14, caput e § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15, o valor deve ser recolhido ao Tesouro Nacional.

Entretanto, quanto ao prazo de suspensão do Fundo Partidário a jurisprudência firmou-se no sentido da fixação proporcional da sanção:

Prestação de contas de campanha. Partido político. Exercício financeiro de 2008.

1. A ausência de comprovação de verbas originárias do Fundo Partidário e a existência de recurso de origem não identificada configuram irregularidades capazes de ensejar a desaprovação das contas.

2. O agravante recebeu do Fundo Partidário o montante de R$ 222.808,17 e as irregularidades das receitas oriundas deste totalizaram R$ 29.885,94, o que equivale a 13,41% do montante total dos recursos arrecadados, além de ter sido registrada a existência de falha, no valor de R$ 15.240,39, referente a recursos de origem não identificada, o que revela que a suspensão do repasse das quotas do Fundo pelo período de seis meses é razoável e não contraria o art. 30, § 2º, da Lei 9.096/95.

Agravo regimental a que se nega provimento.

(TSE, Agravo Regimental em Agravo de Instrumento n. 378116, Acórdão de 07.11.2013, Relator Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 228, Data 29.11.2013, Página 15.)

 

Recurso. Prestação de contas de partido. Diretório Municipal. Artigos 10 e 11 da Res. TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2012. Desaprovam-se as contas quando verificada a utilização de recursos com origem não identificada e não apresentados os livros contábeis obrigatórios, impedindo a fiscalização da escrituração pela Justiça Eleitoral.

Redução da fixação da suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário. Provimento parcial.

(Recurso Eleitoral n. 3489, Acórdão de 10. 2014, Relator DR. LUIS FELIPE PAIM FERNANDES, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 123, Data 16.7.2014, Página 2.)

No caso, considerando o valor recebido a título de fonte vedada (R$ 10.352,54), que representa cerca de 1/3 do total de contribuições (R$ 32.217,86 – fl. 29), o período de suspensão deve ser fixado pelo prazo de 05 meses.

Por fim, anoto que o presidente e o tesoureiro da agremiação manifestaram-se sem a intervenção de procurador habilitado.

Entretanto, a responsabilidade de ambos é subsidiária e, conforme decorre do texto do § 13 do art. 37 da Lei  n. 9.096/95, somente ocorreria caso a irregularidade fosse grave e insanável, resultante de conduta dolosa que importasse enriquecimento ilícito e lesão ao patrimônio do partido.

Como não há sequer indícios de que tenham agido nessa condição e não há malversação de recursos públicos, muito menos seria o presente feito competente para apurar tal responsabilização, por manifesta ausência de prejuízo, deixo de determinar a regularização da representação dos responsáveis, pois apenas deverá recair sobre a agremiação a obrigação de ressarcimento ao Tesouro Nacional, exatamente como decidido pela magistrada a quo.

Ante o exposto, VOTO pela rejeição das preliminares e, no mérito, pelo parcial provimento do recurso do PP de Barão, apenas para reduzir a suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário para o montante de 05 meses, mantendo os demais termos da sentença.