RE - 45328 - Sessão: 19/07/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso interposto pelo PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (PMDB) de Rio Pardo contra a sentença prolatada nos autos de ação de impugnação de mandato eletivo (AIME), ajuizada em face de RAFAEL REIS BARROS E ROSANE LUIZA VAZ ROCHA, eleitos prefeito e vice-prefeito de Rio Pardo nas eleições 2016, a qual extinguiu, sem resolução do mérito, o pedido relativo à captação ilícita de recursos movimentados na conta de campanha (art. 30-A da Lei n. 9.504/97), em face da perda do objeto operada pelo julgamento da RP 451-58, e julgou improcedente a ação no tocante à prática de abuso de poder econômico mediante despesas não contabilizadas nas contas de campanha (fls. 414-435).

Em suas razões, sustenta que merece reforma a decisão pela extinção do feito no tocante à infração ao art. 30-A da Lei das Eleições, pois comprovada a ausência de prova da origem dos recursos movimentados na conta de campanha dos candidatos, no valor de R$ 24.000,00. Afirma que os fatos alegados nos autos foram também objeto de impugnação à prestação de contas dos candidatos, pois estes realizaram despesas não contabilizadas e abuso de poder econômico na forma de “caixa dois”. Alega que as seguintes despesas não tiveram registro na prestação de contas de campanha: a) militantes remunerados realizando bandeiraço em número maior do que o informado nas contas; b) contratação de seis carros de som para sonorização de campanha e uso de um automóvel adesivado equipado com som; c) serviços de colocação de palco, iluminação e sonorização de comícios, bem como material para queima de fogos de artifício. Defende que as diversas explicações fornecidas pelos candidatos para justificar as despesas sejam caracterizadas como ato atentatório à dignidade da justiça. Colaciona doutrina e jurisprudência a favor de sua tese. Postula a reforma da decisão para o fim de serem cassados os diplomas dos recorrentes (fls. 482-525).

Apresentadas as contrarrazões (fls. 531-553), foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou, preliminarmente, pelo julgamento conjunto do feito com o RE 451-58 e pelo não conhecimento do apelo relativamente à alegada captação ilícita de recursos (art. 30-A da Lei das Eleições), e, no mérito, pelo desprovimento do recurso em relação à prática de abuso de poder (fls. 561-575).

É o relatório.

 

VOTO

Preliminar de não conhecimento do recurso em parte

Inicialmente, observo que o magistrado a quo extinguiu, sem resolução do mérito, o pedido de procedência da presente AIME com base na alegada captação ilícita de recursos (art. 30-A da Lei n. 9.504/97), relativa à origem da quantia em espécie no valor de R$ 24.000,00, depositada na conta de campanha dos candidatos, tendo em vista o pronunciamento sobre o mesmo fato realizado na representação RP 451-58, submetida a julgamento simultâneo nesta sessão.

Confiram-se os fundamentos da decisão:

Todavia, tendo em vista que, em relação à representação por captação de recursos ilícitos, já houve pronunciamento por sentença pela Justiça Eleitoral, cumpre adotar o comando processual do art. 57 do Código de Processo Civil, a fim de determinar a extinção do presente processo, sem resolução de mérito, quanto a esta causa de pedir, com base no art. 485, VI, do Código de Processo Civil, diante da perda de objeto, o que também evita eventual julgamento conflitante em grau recursal sobre a mesma matéria, preservando, assim, a segurança jurídica.

Nas razões de apelo, o recorrente não ataca a conclusão pela perda do objeto do pedido, limitando-se a reiterar as alegações expostas na petição inicial para a condenação dos candidatos por prática de captação ilícita de recursos, a fim de atacar a sentença de improcedência prolatada no processo RE 451-58, que efetivamente analisou essa causa de pedir, e não neste feito.

Dessa forma, quanto a esse ponto, o recurso não merece conhecimento, pois a matéria não foi analisada pela sentença recorrida nestes autos, dado que, quanto a essa causa de pedir, o processo foi extinto.

Assim, não conheço do recurso no tocante à arrecadação ilícita de recursos, e passo a analisar as razões de reforma da decisão na parte em que o apelo aproveita.

No mérito, o recorrente postula o reconhecimento de prática de abuso de poder econômico, mediante realização de gastos não contabilizados na conta de campanha dos candidatos, relativos ao pagamento de cabos eleitorais (militância política), e aos gastos com carros de som, sonorização e queima de fogos de artifício em eventos eleitorais.

De acordo com a sentença recorrida, tais alegações não foram devidamente comprovadas na inicial, sendo a prova por demais frágil e contraditória para caracterizar qualquer prática abusiva. Transcrevo o seguinte excerto da decisão:

Na realidade, conforme o extrato de prestação de contas final de RAFAEL REIS BARROS, os gastos com atividades de militância e mobilização de rua equivaleram a zero (item 2.33 , fl. 98).

Há identificação, porém, de gastos com serviços prestados por terceiros (item 2.12), no valor de R$ 6.120,00 (fl. 98). Dentro destas despesas foram identificados 18 recibos de cabos eleitorais (fls. 114/131).

[...]

A prova oral produzida em Juízo é bastante frágil para comprovar a imputação de abuso de poder econômico.

Com efeito, das testemunhas ouvidas, apenas JOSETE MARIA SOARES DE OLIVEIRA e RENILDA TEREZINHA MACHADO SILVA confirmaram ter recebido dinheiro para fazer militância para o PTB, partido do candidato RAFAEL REIS BARROS.

Todavia, prova material desta afirmação não foi juntada aos autos para confirmar esta afirmação. Aliás, não se prestam, para provar esta afirmação, as declarações de fls. 24-35, pois as pessoas signatárias, ELISETE BARROS D'ÁVILA (fl. 24), TAINÁ DA SILVA SILVA (fl. 26), ROSANGELA MACHADO DE SOUZA (fl. 28), TANIA REGINA LINHARES DE BARROS (fl. 30), CARMEN ALVES ARAÚJO (fl. 32), CRISTIANE FERREIRA (fl. 34) e JOSIANE LINHARES DE BARROS (fl. 35) , não foram ouvidas em Juízo, de modo que o teor de suas declarações não pôde ser confrontado pelo contraditório, o que fragiliza o seu valor probatório.

Ainda, há de se ponderar que uma das supostas beneficiárias de pagamento de militância é analfabeta (fl. 28), de modo que não há como atribuir a ela a autoria intelectual da declaração.

De outra parte, a testemunha DORVALINA DE SOUZA LINHARES retirou qualquer credibilidade de tais declarações ao afirmar que papel semelhante lhe foi entregue para assinar, não tendo, porém, concordado com o seu teor, o que demonstra, no mínimo, que a documentação foi elaborada com a finalidade de instruir a pretensão do Autor sem a preocupação de que correspondesse ao que fosse efetivamente declarado pelos signatários.

Registro, ainda, que, tal como fizeram JOSETE MARIA SOARES DE OLIVEIRA e RENILDA TEREZINHA MACHADO SILVA, ao afirmarem que receberam dinheiro para trabalhar na campanha de RAFAEL REIS BARROS, é certo que há testemunhas ouvidas em Juízo que disseram o contrário, isto é, que não receberam remuneração do PTB, mas, sim, do PMDB, como se depreende da leitura dos testemunhos de FABIANA PORTO, DANIELE MACHADO ASSIS e DANIA ANDREIA RODRIGUES ASSIS.

Assim, o quadro probatório é contraditório e muito insuficiente para que se afirme ter ocorrido abuso de poder econômico por parte dos Réus RAFAEL REIS BARROS e ROSANE LUIZA VAZ ROCHA, diante da falta de comprovação mínima de que houve, na sua campanha, militância paga não contabilizada na prestação de contas.

Conforme se observa, no tocante às despesas com militância política, consta, do extrato de prestação de contas final de RAFAEL REIS BARROS, registro de gastos com atividades de militância e mobilização de rua na forma de serviços prestados por terceiros, no valor de R$ 6.120,00 (fl. 98), não tendo sido demonstrado pela prova produzida no curso da instrução que esse valor é falso ou que os candidatos praticaram abuso de poder econômico.

Quanto à omissão de despesas com carro de som, sonorização e queima de fogos de artifício, também concluiu o julgador monocrático pela total ausência de provas de prática de abuso de poder econômico, merecendo reprodução os fundamentos da sentença:

Segundo o Autor, houve omissão de RAFAEL REIS BARROS ao deixar de contabilizar gastos com carros de som, pois mencionada apenas a empresa INTER LOC BRASIL SOLUÇÕES EM TRANSPORTE LTDA., sem, no entanto, referir a existência de outros 05 veículos locados pelo candidato (Kia Topic, placas ICQ 9329; Parati, placas HOQ 7638; Kombi, placas IEN 0878; Kombi, placas ITN 0232 e Celta, placas IUK 4831), Conforme o extrato de prestação de contas final, o gasto com cessão ou locação de veículos foi igual a zero (item 2.32. - fl. 98).

Na prestação de contas, o candidato RAFAEL REIS BARROS comprovou o pagamento de INTER LOC BRASIL, no valor de R$ 2.900,00, como prestador de serviços, para a locação do automóvel Kombi, placas IUK 4831 (fl. 89).

O só fato de ter havido solicitação de vistoria para licença (i.) do automóvel Kia Topic, placas ICQ 9329 (fl. 42), (ii.) do automóvel Parati, placas HOQ 7638 (fls. 43 e 45), (iii.) da Kombi, placas IEN 0878 (fls. 46), (iv.) da Kombi, placas ITN 0232 (fls. 48 e 51), e (v.) do automóvel Celta, placas IVK 6987 (fls. 52 e 55), bem como o pagamento das respectivas taxas (fls. 40 e 53), não é prova de que houve, de fato, utilização dos referidos veículos na campanha eleitoral de RAFAEL REIS BARROS.

E a prova oral, como visto, foi muito precária para comprovar o uso de mais de um automóvel para realização de propaganda em favor do candidato RAFAEL REIS BARROS. Aliás, a única testemunha que esclareceu algo a esse respeito foi LUIZ EDUARDO SILVA TRINDADE, o qual relatou que os vereadores da coligação que usavam seus próprios carros para auxiliar a campanha de RAFAEL REIS BARROS.

Diante da absoluta insuficiência de provas, não há falar, assim, em abuso de poder econômico por esta causa de pedir.

[…]

Imputou o Autor a omissão de recurso, o qual não teria sido contabilizado, diante da ausência de identificação do automóvel Celta, placas IVK 6987, que seria equipado com som e propaganda do candidato RAFAEL REIS BARROS.

Não há, porém, prova alguma de que este automóvel, de fato, tenha sido contratado para fins de publicidade remunerada do candidato, ao efeito de que tivesse de ser contabilizado como gasto eleitoral, nos termos do art. 26 da Lei nº 9.504/97, de seguinte redação:

[…]

Por isso, não há como cogitar de abuso de poder econômico sob esta alegação.

2.4. Imputação de despesa não contabilizada: falta de pagamento de sonorização e queima de fogos de artifício Por fim, houve imputação de abuso de poder econômico diante da falta de contabilização do pagamento de sonorização em comícios, bem como de queima de fogos de artifício.

Quanto a esta causa de pedir, a prova documental consistiria tanto nos arquivos de mídia (CDs de fls. 22 e 23), com gravações de imagens e captações de sons dos comícios de RAFAEL REIS BARROS.

Tais documentos, contudo, não são provas seguras de que referidas despesas foram contratadas, efetivamente, pelo candidato e, desta forma, que deveriam ser contabilizadas e registradas na prestação de contas.

Outrossim, igualmente a prova oral foi frágil a esse respeito, sendo que o único depoimento mais esclarecedor sobre o tema beneficia a tese dos Réus, já que LUIZ EDUARDO DA SILVA TRINDADE confirmou que, no comício, a sonorização utilizada era a que lhe fora cedida por ALEX FORRATI, estando devidamente contabilizada na sua prestação de contas. Por isso, também com relação a esta causa de pedir, impõe-se o julgamento de improcedência da ação.

2.5. Conclusão Como visto, os fatos elencados como causas de pedir para amparar a imputação de abuso do poder econômico invocadas pelo Autor Réus não restaram provadas de forma satisfatória.

Aliás, vale ressaltar que esta conclusão foi a mesma a que se chegou (i.) na prestação de contas (fls. 210-219), e, (ii.) no presente processo, pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, que, em relação a tais causas de pedir, opinou pela improcedência da ação (fls. 409v.-412).

Logo, o julgamento de improcedência da ação de impugnação ao mandato eletivo, com base na alegação de abuso de poder econômico, é medida que se impõe.

Merece ser observado que a questão foi considerada no exame da prestação de contas do candidato, a qual foi objeto de impugnação pelo partido recorrente, tendo o exame técnico concluído que o candidato não negou o credenciamento de veículos junto à prefeitura, arcando, inclusive, com o pagamento da taxas, mas que, ao final, não os teria utilizado (fls. 163-166).

Além disso, o candidato reconheceu que compareceu a comícios custeados por outros candidatos, fazendo uso do equipamento que era disponibilizado, e que muitos simpatizantes e filiados realizam militância sem pedir, aos candidatos que apoiam, dinheiro em troca da realização de campanha.

Dessa forma, o recorrente não trouxe elementos suficientes para infirmar a conclusão sentencial, deixando de demonstrar prática de abuso de poder econômico e suficiente gravidade das circunstâncias, que pudessem macular a necessária lisura do pleito.

Por fim, acompanho o entendimento da Procuradoria Regional Eleitoral, no sentido de que não há se falar em ato atentatório à dignidade da justiça no referente à atuação dos candidatos recorridos no feito, pois, durante toda a tramitação, as partes produziram prova para refutar as alegações da acusação e prestaram os esclarecimentos solicitados, ausente qualquer prova de retardamento ou conduta processual por má-fé.

 

Diante do exposto, VOTO pelo não conhecimento do recurso no tocante à prática de arrecadação ilícita de recursos (art. 30-A da Lei das Eleições) e, na parte conhecida, pelo seu DESPROVIMENTO.