RE - 3384 - Sessão: 16/08/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA DE GRAVATAÍ e por CLÁUDIO ROBERTO PEREIRA ÁVILA contra decisão do juízo eleitoral da 71ª Zona que julgou procedente a representação ajuizada pela COLIGAÇÃO GRAVATAÍ NÃO PODE PARAR, determinando a remoção do conteúdo ofensivo, assegurando direito de resposta, bem como condenando cada um dos recorrentes ao pagamento de multa no valor de R$ 15.000,00 (fls. 61-63).

Em suas razões recursais (fls. 113-122), sustentam, em resumo, que a publicação veiculava manifestação de solidariedade a fato ocorrido com outra agremiação adversária, o PSB de Gravataí, sem intenções de interferência no pleito eleitoral. Aduzem que, frequentemente, o debate político é impregnado de emoção, e que tal circunstância é inerente ao regime democrático. Entendem terem agido nos limites do exercício do direito constitucional de liberdade de expressão. Requerem a reforma da decisão para indeferir o direito de resposta e afastar a multa aplicada.

Sem contrarrazões (certidão à fl. 132), nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo provimento parcial do recurso (fls. 135-137).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do prazo de 24 horas, previsto no art. 96, § 8º, da Lei n. 9.504/97, e disciplinado no art. 35 da Resolução TSE n. 23.462/15.

Os recorrentes insurgem-se contra a sentença que determinou a exclusão de conteúdo considerado ofensivo, bem como concedeu direito de resposta e cominou pena de multa, no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), a cada um dos condenados.

À análise.

1. Do caráter ofensivo das manifestações e do direito de resposta.

Conforme o contexto probatório produzido, afigura-se claro que se trata de veiculação indevida, a qual desbordou dos limites razoáveis de manifestação. O regime democrático é, antes de tudo, o ambiente da manifestação respeitosa, na espécie não ocorrida.

Ademais, ainda que as eleições se tratem de evento cujo clima é, sabidamente, de aguerrimento, a competição eleitoral deve ser pautada por padrões mínimos de responsabilidade por parte de seus protagonistas – até mesmo para que tal estado de ânimo não se agrave. É de frisar: Gravataí teve, de fato, eleições municipais bastante turbulentas no ano de 2016, resultantes em eleições suplementares já no ano de 2017, aos 12 de março.

No caso, o signatário da nota digital – Cláudio Roberto Pereira Ávila – inicia manifestando-se acerca de um suposto atentado ocorrido no comitê eleitoral do PSB de Gravataí, na noite anterior.

Transcrevo o teor das postagens, na íntegra e com os destaques originais:

“Nossa solidariedade ao PSB.

Acabei de ligar para o Presidente do PSB, Luiz Stumpf, manifestando o nosso total repúdio e solidariedade aos Socialistas, que tiveram o Comitê alvejado por tiros nessa madrugada.

Coloquei a nossa equipe de seguranças à disposição e reafirmei que O GRANDE INIMIGO DO POVO DE GRAVATAÍ CHAMA-SE MARCO ALBA. Aliás, ao meu ver, a campanha do PMDB é a principal suspeita, tendo em vista o elevado número de armamento bélico utilizado para nos intimidar.

O Alba está desesperado, apelando para tudo que é possível e impossível. Está despejando dinheiro, como jamais se viu em uma campanha eleitoral, tentando comprar a cidadania e a dignidade de Gravataí.

Não nos intimidaremos, vamos para o enfrentamento contra esse sujeito que DESTRUIU GRAVATAÍ.

Muita força a todos que queremos o melhor para a nossa cidade. AVANTE!”

Cláudio Ávila

Presidente Municipal do PDT”

Nítido perceber que a “nota de solidariedade” restou como pano de fundo para ataques pessoais, com vistas a prejudicar a imagem de outra agremiação adversária, o PMDB de Gravataí, e do candidato da Coligação Gravataí Não Pode Parar. O direito fundamental de livre expressão não vai tão longe: aqui, os adjetivos empregados e os atos atribuídos desvirtuaram a manifestação, a qual, alegadamente, seria de solidariedade ao PSB (embora, a rigor, tal solidariedade esteja presente apenas no primeiro e no último dos cinco parágrafos do texto).

O núcleo da mensagem, em resumo, é composto por ataques e permeado de veiculação de propaganda negativa.

Nessa linha, portanto, andou bem a sentença do juízo de origem, ao identificar o conteúdo desobediente à norma de regência e conceder o direito de resposta. Ao contrário do afirmado pelos recorrentes, a incidência do art. 58 da Lei n. 9.504/97 é de clareza inequívoca. Difundiram-se conceito, imagem e afirmação altamente difamatórios, acarretando o direito de resposta da parte adversária:

Art. 58. A partir da escolha de candidatos em convenção, é assegurado o direito de resposta a candidato, partido ou coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social.

2. Da multa aplicada.

Contudo, ainda que caracterizada a desobediência ao art. 58 da Lei n. 9.504/97, e na esteira do manifestado pelo d. Procurador Regional Eleitoral, há que se afastar as multas impostas ao PDT de Gravataí e, também, a Cláudio Roberto Pereira Ávila.

Vejamos o teor da sanção prevista no art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97, suporte legal utilizado para a cominação da pena pecuniária:

Art. 57-D. É livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato durante a campanha eleitoral, por meio da rede mundial de computadores - internet, assegurado o direito de resposta, nos termos das alíneas a, b e c do inciso IV do § 3o do art. 58 e do 58-A, e por outros meios de comunicação interpessoal mediante mensagem eletrônica.

§ 2o A violação do disposto neste artigo sujeitará o responsável pela divulgação da propaganda e, quando comprovado seu prévio conhecimento, o beneficiário à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

Note-se que a sanção pecuniária do dispositivo é prevista para as hipóteses de anonimato, não se aplicando às ofensas realizadas na internet por candidato identificado, como é o caso dos autos.

Na doutrina de Olivar Coneglian (Eleições – Radiografia da Lei 9.504/97, Curitiba: Juruá, 2016, p. 409), há a seguinte lição:

“O texto legal assim se expressa: “A violação do disposto neste artigo sujeitará o responsável pela divulgação da propaganda e, quando comprovado seu prévio conhecimento, o beneficiário à multa...”.

Qual seria a violação possível no caso deste artigo? Haverá violação quando ocorrer propaganda eleitoral anônima, positiva ou negativa. Nesse caso, embora a peça de propaganda não tenha autor definido, exige-se alguma prova de sua autoria da divulgação, sob pena de não haver réu na demanda.

Se a propaganda for anônima, a presença no pólo passivo do beneficiário, candidato, só será possível se houver prova de que ele tenha conhecimento da mesma propaganda. Quando o texto legal inclui o adjetivo “prévio” para qualificar o conhecimento que o beneficiário teve da propaganda, é porque um conhecimento posterior à divulgação não leva necessariamente à condenação. O beneficiário pode ter tido conhecimento dele depois da divulgação e pode não ter concordado com ela e realizado gestões para eliminá-la. [...].” (Grifo meu.)

Este Tribunal firmou entendimento nesse sentido, como se verifica pelas ementas que seguem:

Recurso. Representação. Direito de resposta. Propaganda eleitoral. Internet. Multa. Art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2016.

Sentença que julgou parcialmente procedente representação por propaganda irregular, determinando a retirada da publicação ofensiva e deferiu pedido de direito de resposta.

Irresignação postulando a fixação de multa.

Inaplicável a pretendida aplicação da multa prevista no § 2º do art. 57-D da Lei das Eleições, penalidade restrita aos casos de anonimato, situação não evidenciada nos autos.

Provimento negado.

(TRE-RS, RE 378-79, Relator Dr. Sílvio Ronaldo Santos de Moraes, Publicação: 28.09.2016.) (Grifei.)

 

Recursos. Representação. Propaganda irregular. Vídeo. Facebook. Ofensa. Procedência. Multa. Eleições 2016.

Condenação, com aplicação de multa, em razão da divulgação de vídeo ofensivo à honra do representante. Sanção pecuniária limitada às hipóteses de anonimato. Identificada a autoria, não há que se falar em fixação da multa prevista no art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97. Afastada a sanção pecuniária aplicada.

Provimento negado ao apelo do representante.

(TRE-RS, RE 368-98, Rel. Dr. Luciano André Losekan, julgado: 12.12.2016.)

 

Recurso. Representação. Propaganda eleitoral. Internet. Art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2016.

Procedência de representação, determinando a suspensão de manifestações ofensivas na internet, sem aplicar multa.

Postagem na rede social Facebook consistente na imagem de diversas notas de R$ 50,00 com o dizer “desaparecido”, e, sobreposta, a imagem do candidato recorrente acompanhada dos dizeres “não contavam com a minha astúcia”. A sanção pecuniária é prevista apenas para as hipóteses de anonimato, não se aplicando às ofensas realizadas na internet por eleitor ou candidato identificado. Inviável a pretendida multa.

Provimento negado. (TRE-RS, RE 415-09, Rel. Dr. Jamil Andraus Hanna Bannura, julgado em 16.12.2016.)

Dessa forma, sendo a multa prevista no art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97 apenas para as hipóteses de anonimato, e estando, na espécie, identificada a autoria da manifestação, incabível o sancionamento.

O recurso merece parcial provimento, neste específico ponto.

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo provimento parcial do recurso, para afastar a pena de multa imposta ao PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA DE GRAVATAÍ e a CLÁUDIO ROBERTO PEREIRA ÁVILA.