PC - 6630 - Sessão: 06/03/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de prestação de contas anual do DIRETÓRIO ESTADUAL do PARTIDO DA REPÚBLICA (PR), referente ao exercício de 2015 (fls. 02-31), cuja autuação é integrada pelo órgão partidário e pelos respectivos dirigentes partidários do período.

Após a elaboração do Exame Preliminar técnico (fl. 52-v.), o partido político apresentou manifestação e documentos (fls. 59-67 e 77-79).

Sobreveio Exame da Prestação de Contas, pelo órgão técnico (fls. 82-85v.), advindo manifestações das partes às fls. 121-124.

Confeccionado Parecer Técnico Conclusivo (fls. 133-136v.), com apontamento de irregularidades, os autos foram com vista à Procuradoria Regional, a qual lançou parecer às fls. 145-151v. pela desaprovação.

Procedeu-se à citação da agremiação partidária (fls. 161-162), a qual, no entanto, não se manifestou (certidão da fl. 180).

Igualmente, citou-se o presidente e o tesoureiro atuantes no exercício financeiro em análise, os quais apresentaram defesa (fls. 166-176), requerendo preliminarmente a declaração de inconstitucionalidade do art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95 e, no mérito, a aprovação das contas, ainda que com ressalvas.

Encerrada a dilação probatória e intimadas as partes para apresentarem alegações finais (fl. 203), o órgão partidário novamente silenciou, mesmo após os autos terem sido retirados em carga por seu procurador em duas oportunidades (certidões de fls. 204 e 205).

Já os responsáveis partidários ofertaram alegações finais (fl. 207-v.), repisando os termos da peça defensiva.

Foram os autos com vista à Procuradoria Regional, a qual reiterou o posicionamento pela desaprovação das contas e determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, assim como pela suspensão de quotas do Fundo Partidário (fl. 211).

É o relatório.

 

VOTO

Preliminar

De plano, afasto a preliminar defensiva de inconstitucionalidade do art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, lançada sob o argumento de que não se pode proibir os cidadãos, mesmo os filiados às greis partidárias, de contribuírem financeiramente para estas, haja vista a autonomia inerente aos partidos políticos no condizente com sua organização e funcionamento.

É que a redação do inc. II do art. 31 da Lei n. 9.096/95, vigente à época do exercício em questão e aplicável ao caso, veda o recebimento de doações procedentes de autoridades públicas, como se verifica:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38;

[...]

Ao contrário do que defende a grei partidária, a limitação encontra perfeito abrigo no inc. II do art. 5º da Constituição Federal, o qual dispõe, a contrario sensu, que somente a lei pode obrigar a fazer ou deixar de fazer alguma coisa.

É certo que os filiados a partidos políticos podem dispor de seus rendimentos, mas, na medida em que a lei define como de fonte vedada as contribuições provenientes de autoridades, a vedação não constitui infringência ao texto constitucional.

Já o art. 17 da Constituição Federal consagra a liberdade para a criação dos partidos políticos. O seu § 1º assegura-lhes autonomia para definirem sua estrutura interna, organização e funcionamento, entre outras atribuições.

Isso equivale a dizer que, em nenhum momento, a norma tida por inconstitucional, sequer de leve, aborda essas matérias.

A autonomia partidária garantida constitucionalmente não é um cheque em branco para os partidos políticos. A estrutura interna, a organização e o funcionamento dos partidos podem ser, sim, por eles regulados, desde que respeitados os limites impostos pelo ordenamento jurídico, como ocorre a qualquer outra pessoa jurídica de direito privado.

Nesse contexto, conforme se verá, embora não mais subsista a vedação às doações por ocupantes de cargos demissíveis ad nutum, desde que filiados a partido político, antecipo que este Regional já decidiu pela não retroatividade dessa norma aos casos pretéritos, como no caso vertente, em homenagem ao entendimento do TSE de prestigiar a legislação vigente à época em que apresentada a contabilidade.

Igualmente, não calha a alusão ao Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5.494, na qual há pedido de medida cautelar, ajuizada pelo Partido da República (PR), em face da expressão “autoridade” contida na parte inicial do inc. II do art. 31 da Lei Federal n. 9.096/95.

Primeiro, porque os dispositivos constantes em leis ordinárias possuem presunção de constitucionalidade, até manifestação do Poder Judiciário em sentido contrário, seja em sede de controle difuso, seja em controle concentrado.

Segundo, porque, no caso específico, o Ministro Relator, Luiz Fux, aplicou o art. 12 da Lei n. 9.868/99 para submeter ao Plenário do STF a manifestação sobre a ação como um todo, abstendo-se de manifestar-se acerca de medida liminar pleiteada:

Art. 12. Havendo pedido de medida cautelar, o relator, em face da relevância da matéria e de seu especial significado para a ordem social e a segurança jurídica, poderá, após a prestação das informações, no prazo de dez dias, e a manifestação do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República, sucessivamente, no prazo de cinco dias, submeter o processo diretamente ao Tribunal, que terá a faculdade de julgar definitivamente a ação.

E, ainda, há que se considerar que, em sede de controle concentrado, vigora a prerrogativa do STF de modular os efeitos da decisão, circunstância que afasta, por completo, qualquer alegação de prejuízo ou dano irreparável – a Suprema Corte pode, inclusive, determinar eventuais compensações financeiras que entenda pertinentes às agremiações partidárias.

Logo, por essas ponderações, afasto a preliminar.

Mérito

Trata-se das contas anuais do PARTIDO DA REPÚBLICA (PR) referentes ao exercício financeiro de 2015.

O parecer técnico elaborado pela Secretaria de Controle Interno deste TRE, a partir da análise dos documentos apresentados pela defesa (fls. 145-151v.), apontou as seguintes irregularidades:

CONCLUSÃO

Os itens 1 a 3 deste Parecer Conclusivo tratam-se de impropriedades que não comprometem a identificação da origem das receitas e a destinação das despesas na presente prestação de contas.

Observam-se irregularidades nos itens 4 a 6 deste Parecer Conclusivo, as quais, examinadas em conjunto, comprometem a confiabilidade e consistência das contas.

O item 4 aponta a existência de conta bancária não declarada pela agremiação, bem como a ausência de extratos bancários da referida conta, no entanto, com base nos demonstrativos apresentados, foi possível apurar o saldo final dessa conta bancária bem como a transferência desse saldo para a conta bancária da Caixa Econômica Federal, no montante de R$ 6.395,00. Porém, por se tratar de transferência sem a identificação dos doadores originários, essa irregularidade foi tratada no item 6.b desse Parecer.

O item 5 trata de falha referente ao recebimento de recursos de fontes vedadas previsto no art. 12, inciso XII da Resolução TSE n. 23.432/2014. Tal falha enseja o recolhimento ao erário do valor de R$ 4.715,00, o qual representa 6,7% do total de outros recursos recebidos (R$ 70.601,06).

Quanto ao item 6, que trata do recebimento de recursos de origem não identificada (item 6.a: recursos sem identificação do CPF/CNPJ do depositante; e item 6.b: recursos com a identificação do CNPJ do próprio diretório estadual do PR), no montante de R$ 36.818,66, o qual representa 52,1% do total de outros recursos recebidos (R$ 70.601,06).

O valor apontado deverá ser recolhido ao erário.

Diante do exposto e com fundamento no resultado do exame ora relatado, conclui-se pela desaprovação das contas, com base no inciso IV, alínea “a” do art. 45 da Resolução TSE n. 23.432/2014.

(Grifos no original.)

a) Recebimento de recursos de origem não identificada

Analisada a prestação de contas, foram detectadas receitas de origem não identificadas na conta corrente 1.581-2, agência 0453, junto à Caixa Econômica Federal, decorrente de depósitos sem a identificação do CPF/CNPJ do doador, bem como de depósitos com a identificação do CNPJ da própria direção estadual do PR.

Considerados a tabela e os extratos integrantes do parecer técnico conclusivo da fl. 135, as receitas sem identificação do CPF/CNPJ totalizam R$ 28.321,16.

Já as receitas com a identificação do CNPJ do próprio partido, nos extratos correspondentes, somam a quantia de R$ 8.497,50.

A defesa dos dirigentes partidários restringiu-se à afirmação de que não dispunham dos documentos necessários para esclarecer o apontamento desfavorável. Sustentaram que essa responsabilidade seria da comissão executiva do partido político, que, todavia, como visto, deixou transcorrer em branco os prazos concedidos para manifestação.

Assim sendo, faz-se impositivo o acolhimento do parecer técnico quanto a esse ponto.

O art. 30 da Lei n. 9.096/95 dispõe que “o partido político, através de seus órgãos nacionais, regionais e municipais, deve manter escrituração contábil, de forma a permitir o conhecimento da origem de suas receitas e a destinação de suas despesas".

Por esse motivo, fora solicitado ao partido esclarecimentos, de modo a cumprir a exigência e permitir a correta identificação dos doadores e, assim, possibilitar a análise quanto ao eventual recebimento de valores de origem vedada.

Todavia, não foi apresentada qualquer documentação, não tendo sido possível identificar a origem das receitas, em descumprimento ao supramencionado art. 30 da Lei n. 9.096/95.

Ora, a Resolução TSE n. 23.432/14 (art. 7º) exige que todos os créditos bancários contenham a identificação do CPF/CNPJ do contribuinte ou doador, a fim de serem consideradas receitas com origem identificada.

A própria identificação do partido, em grau regional, como doador ou contribuinte no extrato bancário, não é informação válida, porquanto inviabiliza a identificação da real origem do recurso (doador originário).

Nesse sentido, a omissão quanto aos doadores – no valor final de R$ 36.818,66, correspondente a 52,1% do total de recursos recebidos (R$ 70.601,06) – compromete a análise da prestação e a identificação do recebimento de eventuais recursos de origem vedada, revelando irregularidade grave e ensejadora, por si só, de reprovação das contas.

b) Recebimento de recursos oriundos de fonte vedada

A outra irregularidade apontada – art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95 – diz respeito ao recebimento de recursos oriundos de fonte vedada, ou seja, contribuições ao PR, durante o exercício financeiro de 2015, advindas de titulares de cargos demissíveis ad nutum que tinham a condição de autoridade.

Passo a demonstrar as razões pelas quais deve ser mantido o apontamento lançado, em contraposição ao expendido pela defesa.

Segundo o detalhamento do parecer técnico conclusivo, a agremiação recebeu doações do Coordenador Regional da Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento Regional; do Chefe de Gabinete da Assembleia Legislativa Estadual; do Chefe da Fundação Estadual de Produção e Pesquisa em Saúde; e do Diretor Administrativo da Fundação para o Desenvolvimento de RH, num total de R$ 4.715,00, vedadas nos termos do art. 12, inc. XII e § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14.

A irregularidade das doações em foco é patente, pois todos os doadores eram exercentes de cargos de direção ou chefia junto à administração pública direta ou indireta, os quais, a toda evidência, encerravam poder decisório e de gerenciamento de pessoas e recursos, inserindo-se, assim, no conceito de “autoridade” para fins de incidência da vedação legal.

De acordo com a jurisprudência consolidada no âmbito deste Tribunal, as contribuições ou doações efetuadas por detentores de cargo demissível ad nutum da administração pública direta ou indireta, que exerçam função de direção ou chefia, vale dizer, com poder de autoridade, caracterizam recursos de fonte vedada (TRE-RS, PC n. 76-79, Relator Dr. Leonardo Tricot Saldanha, julgado em 31.5.2016 e RE n. 18-62, Relatora Dra. GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA, julgado em 02.8.2016).

Nesse passo, afasto a alegação de que as doações perpetradas pelo Coordenador Regional da Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento Regional, no montante final de R$ 900,00, devem ser vistas como regulares.

Isso porque a Lei Estadual que supostamente legitimaria a doação realizada, sob n. 13.601/11, foi revogada pela Lei Estadual n. 14.733/15 – valendo pontuar que as contribuições efetuadas pelo doador em questão ocorreram entre setembro e outubro de 2015 (fl. 134v. do parecer técnico conclusivo).

Ademais, de acordo com a citada Lei n. 14.733/15, às coordenadorias “compete executar as atividades compreendidas na área de competência da Secretaria, excetuadas aquelas realizadas por meio das entidades da Administração Indireta (art. 11, § 5º)”, a demonstrar que não há ressalva ao caráter de coordenação, propriamente dito, do cargo em referência.

De qualquer sorte, resta sedimentado, no âmbito jurisprudencial, tanto neste TRE quanto no TSE, o entendimento de que os detentores de função comissionada com poder de autoridade não podem contribuir aos partidos.

Após a consolidação do entendimento sobre a interpretação dada pelo TSE ao art. 31, caput, inc. II, da Lei n. 9.096/95, os tribunais eleitorais de todo o país, inclusive este TRE, passaram a julgar as contas partidárias com observância à vedação de contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum, da administração direta ou indireta, com poder de autoridade:

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Doação de fonte vedada. Art. 31, II, da Lei n. 9.096/95. Exercício financeiro de 2013.

Desaprovam-se as contas quando constatado o recebimento de doações de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis ad nutum, da administração direta ou indireta, que detenham condição de autoridade, vale dizer, desempenhem função de direção ou chefia.

Redução, de ofício, do período de suspensão do recebimento de cotas do Fundo Partidário, conforme os parâmetros da razoabilidade. Manutenção da sanção de recolhimento de quantia idêntica ao valor recebido irregularmente ao Fundo Partidário.

Provimento negado.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 2346, Acórdão de 12.3.2015, Relator DR. INGO WOLFGANG SARLET, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 45, Data 16.3.2015.)

Recurso Eleitoral. Prestação de Contas Anual. Exercício 2012. Partido Democrático Trabalhista (PDT) de Taquara. Contas desaprovadas. Preliminar de impugnação de documentos como prova válida. Exame remetido à análise da questão de fundo. Preliminar de cerceamento de defesa afastada, em face de haver, nos autos, comprovação de que o partido teve oportunidade de se manifestar sobre documentos acostados. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades. Configuradas doações de fonte vedada. Servidores ocupantes de cargos demissíveis ad nutum.

Afastadas do cálculo do valor a ser recolhido ao Fundo Partidário as doações de assessores e procuradores jurídicos, os quais não são considerados autoridades. Deram parcial provimento ao recurso, apenas ao efeito de reduzir o valor recolhido ao Fundo Partidário.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 8303, Acórdão de 12.11.2014, Relator DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 207, Data 14.11.2014, Página 02.)

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Exercício de 2010.

Desaprovação pelo julgador originário. Aplicação da pena de suspensão das cotas do Fundo Partidário pelo período de doze meses, bem como o recolhimento de valores, ao mesmo fundo, relativos a recursos recebidos de fonte vedada e de fonte não identificada.

A documentação acostada em grau recursal milita em prejuízo do recorrente, uma vez que comprova o recebimento de valores de autoridade pública e de detentores de cargos em comissão junto ao Executivo Municipal. A maior parte da receita do partido provém de doações de pessoas físicas em condição de autoridade, prática vedada nos termos do art. 31, inc. II e III, da Lei n. 9.096/95.

Provimento negado.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 4550, Acórdão de 19.11.2013, Relator DR. JORGE ALBERTO ZUGNO, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Data 22.11.2013.)

Dessarte, merece ser desconsiderada qualquer argumentação no sentido de que as doações efetuadas pelos filiados que ocupam cargo em comissão de direção ou de chefia são regulares, uma vez manifesta a contrariedade a normas que, em rol taxativo, impossibilitam o recebimento de recursos por fonte vedada.

A regra foi criada com intuito moralizador, na expectativa de que os partidos políticos não vislumbrassem contrapartida financeira ou manipulação de órgão da administração pública quando da indicação de ocupantes de cargo em comissão. O servidor indicado deve contribuir com seu trabalho e está impedido de retornar ao partido o valor público recebido a título de remuneração. Tendo influência política representada pelo seu poder de autoridade no âmbito do cargo que exerce, o detentor de cargo em comissão não poderá alcançar valores ao partido ao qual é filiado ou de que é apoiador.

O entendimento consolidado no âmbito do TSE é no sentido de que a vedação prevista na Resolução TSE n. 22.585/07, no art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95 e na resolução de regência, dirige-se a servidores públicos.

Assim, deve prevalecer o entendimento de que os recursos oriundos de contribuições procedentes de autoridades, ou seja, daqueles ocupantes de cargos demissíveis ad nutum, que exercem atividade de chefia, de direção ou de coordenação, são vedados.

Nessa linha, embora não mais subsista a vedação às doações realizadas por ocupantes de cargos demissíveis ad nutum, desde que sejam filiados a partido político, por força da nova redação conferida ao art. 31 da Lei n. 9.096/95 pela Lei n. 13.488/17, essa inovação não tem aplicação retroativa, conforme firmado por este Tribunal no julgamento do RE n. 14-97, de relatoria do Dr. Luciano André Losekann, cuja ementa transcrevo a seguir:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. PRELIMINAR. MANUTENÇÃO DOS DIRIGENTES PARTIDÁRIOS NO POLO PASSIVO. ILEGITIMIDADE NÃO CONFIGURADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PERMITIDA A CONTRIBUIÇÃO DE FILIADOS. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE IRREGULARIDADE DA DOAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar rejeitada. O art. 38 da Resolução TSE n. 23.432/14 prevê que deverá ser determinada a citação do órgão partidário e dos responsáveis para que ofereçam defesa sempre que houver impugnação ou constatação de irregularidade no parecer conclusivo. A integração dos dirigentes na lide é consectário da responsabilização prevista na Lei dos Partidos Políticos. Manutenção dos dirigentes partidários para integrarem o polo passivo. Ilegitimidade passiva afastada.

2. Constituem recursos oriundos de fontes vedadas as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia.

3. A Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.17, alterou a redação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 - Lei dos Partidos Políticos -, excluindo a vedação de doação de pessoa física que exerça função ou cargo público demissível ad nutum, desde que filiada ao partido beneficiário.

4. Inaplicabilidade ao caso concreto. Incidência da legislação vigente à época dos fatos. Prevalência do princípio da segurança jurídica e da paridade de armas no processo eleitoral, em detrimento da aplicação pontual da retroatividade in bonam partem. Manutenção do juízo de irregularidade das contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

5. Incontroverso o recebimento de recursos de fontes vedadas, em valor correspondente a 65,79% das receitas do partido, impõe-se a desaprovação das contas. Redução, entretanto, do prazo de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário para quatro meses.

6. Provimento parcial.

(TRE-RS, RE n. 14-97, relator Dr. Luciano André Losekann, julgado em 04.12.2017.) (Grifei.)

Dessa forma, como, no caso concreto, as doações foram todas realizadas em período anterior à edição da Lei n. 13.488/17, restou caracterizado o recebimento de recursos de fontes vedadas pela agremiação, irregularidade correspondente a 6,7% do total arrecadado (R$ 70.601,06) e que enseja, pela sua natureza, a reprovação das contas.

c) Sancionamento

As falhas, em conjunto, representam 58,8% do total arrecadado pelo partido.

Em relação à penalidade prevista, este Tribunal tem entendimento consolidado no sentido da aplicação da redação original da Lei n. 9.096/95 aos processos que já tramitavam na Justiça Eleitoral antes da publicação da Lei n. 13.165/15, que alterou diversas disposições até então previstas na Lei dos Partidos Políticos.

O inc. II do art. 36 da Lei n. 9.096/95 dispõe acerca da sanção de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário, prevendo o prazo de um ano de suspensão de repasse de novas quotas.

Todavia, este Tribunal, em reiterados julgados, tem entendido pela aplicação dos parâmetros fixados no § 3º do art. 37 da Lei dos Partidos Políticos, que, em sua redação original, prevê suspensão pelo prazo de 1 a 12 meses, quando o caso concreto revelar situações de menor gravidade, uma vez que há hipóteses em que a suspensão de repasse de quotas do Fundo Partidário pelo prazo de um ano não atende ao princípio da proporcionalidade.

No presente caso, não se mostra razoável que a agremiação sofra a grave penalização de suspensão de repasse de quotas por um ano.

O entendimento esposado por este Tribunal é idêntico ao adotado pelo Tribunal Superior Eleitoral, que utiliza os parâmetros da razoabilidade em cada caso concreto, para verificar a adequação da sanção, merecendo transcrição os seguintes precedentes:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE PARTIDO. DOAÇÃO DE FONTE VEDADA. ART. 31, II, DA LEI 9.096/95. SUSPENSÃO DE COTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. ART. 36, II, DA LEI 9.504/97. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. INCIDÊNCIA.

1. Na espécie, o TRE-SC, com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, concluiu que o recebimento de recursos no valor de R$ 940,00 oriundos de fonte vedada de que trata o art. 31, II, da Lei 9.096/95 – doação realizada por servidor público ocupante de cargo público exonerável ad nutum – comporta a adequação da pena de suspensão de cotas do Fundo Partidário de 1 (um) ano para 6 (seis) meses.

2. De acordo com a jurisprudência do TSE, a irregularidade prevista no art. 36, II, da Lei 9.096/95 – consistente no recebimento de doação, por partido político, proveniente de fonte vedada – admite a incidência dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade na dosimetria da sanção.

3. Agravo regimental não provido

(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 4879, Acórdão de 29.8.2013, Relator Min. JOSÉ DE CASTRO MEIRA, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Data 19.9.2013.)

Prestação de contas. Campanha eleitoral. Candidato a deputado. Fonte vedada.

1. Este Tribunal, no julgamento do AgR-AI n. 9580-39/MG, rel. Min. Arnaldo Versiani, DJE de 25.9.2012, reafirmou, por maioria, seu entendimento no sentido de que "empresa produtora independente de energia elétrica, mediante contrato de concessão de uso de bem público, não se enquadra na vedação do inc. III do art. 24 da Lei n. 9.504/97". Precedentes: AgR-REspe n. 134-38/MG, relª. Minª. Nancy Andrighi, DJE de 21.10.2011; AgR-REspe n. 10107-88/MG, rel. Min. Arnaldo Versiani, de 9.10.2012. Ressalva do relator.

2. Ainda que se entenda que a doação seja oriunda de fonte vedada, a jurisprudência desta Corte Superior tem assentado que, se o montante do recurso arrecadado não se afigura expressivo diante do total da prestação de contas, deve ser mantida a aprovação das contas, com ressalvas, por aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Agravo regimental a que se nega provimento.

(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 963587, Acórdão de 30.4.2013, Relator Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Data 18.6.2013, Página 68-69.)

Da leitura dos julgados transcritos, observa-se que a jurisprudência do TSE tem assentado que é possível a redução do prazo de suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário, fixando-se período entre 1 a 12 meses.

Na hipótese em tela, o período de suspensão pode ser mitigado conforme os parâmetros da razoabilidade, comportando adequação da pena de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário de um ano para 5 (cinco) meses, considerado o percentual final de 58,8% sobre o total arrecadado pela grei partidária e os atuais parâmetros adotados pelo TSE para sancionar as irregularidades cometidas pelas agremiações.

De outro lado, por força do art. 14 da Resolução TSE n. 23.432/14, é de rigor a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional dos montantes recebidos de origem não identificada e daqueles oriundos de fonte vedada, na esteira da jurisprudência sobre a matéria.

Ademais, a par das irregularidades, não há notícia de malversação ou aplicação irregular de recursos públicos do Fundo Partidário e tampouco existem indícios de que a conduta do partido tenha sido orientada pela má-fé ou pelo propósito deliberado de prejudicar as atividades de fiscalização da Justiça Eleitoral.

Assim, a penalidade a ser aplicada mostra-se consentânea com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, os quais, segundo este Regional e o TSE, devem nortear o julgamento das prestações de contas.

Dispositivo

Diante do exposto, afastada a matéria preliminar, VOTO pela desaprovação das contas do DIRETÓRIO ESTADUAL do PARTIDO DA REPÚBLICA (PR), referentes ao exercício financeiro de 2015, determinando o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 36.818,66 (trinta e seis mil oitocentos e dezoito reais e sessenta e seis centavos) e R$ 4.715,00 (quatro mil setecentos e quinze reais), bem como a suspensão, com perda, do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário, pelo período de 5 (cinco) meses, a partir do trânsito em julgado da decisão, nos termos da fundamentação.