RE - 20211 - Sessão: 06/09/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso interposto por RUDINEI ROMONO GNIECH, candidato ao cargo de vereador no Município de Ronda Alta, em face da sentença que desaprovou as contas referentes às eleições municipais de 2016 em razão da constatação de realização de despesas com combustíveis sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos ou publicidade com carro de som; ausência de contabilização de serviços do advogado que atuou na prestação de contas; ausência de extratos bancários em relação a todo o período da campanha, e realização de despesas após a data da eleição (fl. 30 e v.).

Em suas razões recursais (fl. 33-35), o candidato afirma possuir todos os documentos necessários à aprovação das contas e que, por equívoco, deixou de juntá-los aos autos anteriormente. Junta documentos que buscam comprovar a regularidade da contabilidade (fls. 36-41) e requer o provimento do recurso.

Nesta instância, o Procurador Regional Eleitoral opinou pelo não conhecimento dos documentos que acompanharam a irresignação e pelo desprovimento do recurso (fls. 48-52).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo. A sentença foi publicada na edição do Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral de 23.01.2017, (fl. 32) e a interposição da peça recursal ocorreu no dia seguinte, 24.01.2017, (fl. 33) dentro dos três dias mencionados no art. 77 da Resolução TSE n. 23.463/15.

Presentes os demais pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Ainda em sede preliminar, destaco a questão do conhecimento dos documentos juntados em grau recursal.

Como já destacado em julgamento anterior desta Corte (RE PC n. 282-92.2016.6.21.0128, relator o Dr. Jamil Andraus Hanna Bannura, julgado em 16.5.17), a apresentação de novos documentos com o recurso, nesta classe processual especialmente, não apresenta prejuízo à tramitação do processo, mormente quando se trata de documentos simples, capazes de esclarecer as irregularidades apontadas, sem a necessidade de nova análise técnica ou diligências complementares. Transcrevo a ementa do referido julgado:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Arrecadação e gastos de recursos em campanha eleitoral. Eleições 2016.

Matéria preliminar. 1. Embora a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral não admita a juntada de documentação nova ao processo quando já transcorrida oportunidade prévia de saneamento das irregularidades, a previsão do art. 266 do Código Eleitoral autoriza a sua apresentação com a interposição do recurso, quando se tratar de documentos simples, capazes de esclarecer os apontamentos sem a necessidade de nova análise técnica ou diligência complementar. 2. A ausência de manifestação sobre eventual irregularidade nas contas não se confunde com a invalidade da sentença. Observado o regular procedimento na análise das contas ofertadas pelo candidato. Nulidade afastada.

Mérito. Falta de registro de despesa com serviços contábeis e gastos lançados com combustível sem consignar o aluguel ou cessão de veículo. Inconsistências sanadas com a juntada de novos documentos quando da interposição do recurso, que comprovam receita estimável em dinheiro referente ao serviço de contabilidade e juntada de termo de cessão de veículo para uso na campanha.

Desacolhido o pedido ministerial, nesta instância, de arrecadação de valores ao Tesouro Nacional em razão de recebimento de quantia não identificada, a fim de evitar a reformatio in pejus.

Aprovação das contas. Provimento. 

 

Nessa linha, visa-se sobretudo salvaguardar o “interesse público na transparência da contabilidade de campanha, aliada à ausência de prejuízo à célere tramitação das contas”, de forma que caracteriza formalismo excessivo a vedação de novos documentos em segundo grau, como salientado no corpo do voto do acórdão paradigma.

Dessa forma, entendo possível a juntada dos novos documentos com o recurso, ainda que a parte tenha sido, na origem, intimada a se manifestar, e não tenha esclarecido totalmente os apontamentos.

No mérito, a contabilidade foi desaprovada em razão de irregularidades que passo a analisar separadamente.

Inicialmente, foi constatada a realização de despesas com combustíveis sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos ou publicidade com carro de som.

Apesar da omissão da juntada de comprovantes quando da apresentação da prestação de contas, a falha foi suprida com o documento apresentado na fase recursal. O recorrente colacionou termo de cessão de veículo devidamente identificado, comprovando também a propriedade pela cedente (fls. 37-38).

Ainda que não tenha sido apresentado recibo eleitoral, essa irregularidade representa aspecto meramente formal, que deve ser cotejado com as circunstâncias do caso concreto, não autorizando, por si só, o grave juízo de desaprovação das contas.

Nesse sentido, menciono precedente do Tribunal Superior Eleitoral:

Recurso especial. Agravo regimental. Prestação de contas de campanha. Eleições 2010. Aprovação com ressalvas.

1. A contabilização, em um único recibo, da doação em valor estimado referente à cessão de veículo e dos serviços prestados como motorista, em princípio, é irregular.

2. Tal irregularidade, contudo, quando verificada uma única vez, além de ser meramente formal, não tem o condão de levar à rejeição das contas.

3. A valoração do serviço de motorista com base no salário mínimo mensal não se mostra desarrazoada.

4. Aprovação das contas com ressalvas.

Agravo regimental a que se nega provimento.

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 139305, Acórdão de 07.11.2013, Relator Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 228, Data 29.11.2013, Página 16.) (Grifei.)

Portanto, tenho que a comprovação da cessão e propriedade do veículo automotor, mesmo que após a apresentação das contas de campanha, possibilita que seja desconsiderada a falha inicial em seu registro.

O juízo a quo também apontou a ausência de contabilização de serviços do advogado que atuou na prestação de contas.

Em relação ao uso de serviços advocatícios e de contabilidade para elaboração e apresentação das contas, a Resolução 23.463/15, em seu art. 29, § 1º-A, estabelece que tais gastos não são despesas de campanha:

Art. 29. [...]

§ 1º-A Os honorários referentes à contratação de serviços de advocacia e de contabilidade relacionados à defesa de interesses de candidato ou de partido político em processo judicial não poderão ser pagos com recursos da campanha e não caracterizam gastos eleitorais, cabendo o seu registro nas declarações fiscais das pessoas envolvidas e, no caso dos partidos políticos, na respectiva prestação de contas anual.

Assim sendo, a normativa estabelece distinção entre assessoria jurídica no decorrer da campanha e contencioso judicial, e determina que a contratação unicamente para atuação em processos judiciais não caracteriza gasto de campanha.

Trago julgado dessa corte sobre a questão:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Contabilização de serviços advocatícios. Art. 29, §§ 1º e 1º-A, da Resolução TSE n. 23.463/15. Eleições 2016.

Parecer conclusivo e manifestação ministerial de piso pela rejeição das contas. Proferida sentença de desaprovação sem que tenha sido oportunizada prévia manifestação à candidata acerca das irregularidades apontadas, conforme previsão do art. 64, § 4º, da Resolução TSE n. 23.463/15. Decisão consubstanciada na ausência de registro de gastos e dos respectivos recibos, referentes à contratação de serviços advocatícios durante a prestação de contas. Ainda que, nesta instância, tenha sido verificado o vício procedimental, deixa-se de reconhecer de ofício a nulidade, em virtude da possibilidade de decisão favorável quanto ao mérito, sem representar qualquer prejuízo à interessada.

Diferenciação conceitual entre o serviço advocatício prestado em processo judicial contencioso e o serviço de consultoria jurídica realizado em favor das campanhas eleitorais. Entendimento do Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que os honorários relativos aos serviços advocatícios e de contabilidade referentes a processo jurisdicional contencioso não são considerados gastos eleitorais de campanha. Situação distinta do serviço de consultoria, atividade-meio prestada durante a campanha eleitoral, paga com recursos provenientes da conta de campanha, constituindo gasto eleitoral que deve ser declarado de acordo com os valores efetivamente pagos. Inteligência do disposto no art. 29, §§ 1º e 1º-A, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Demonstrada a outorga da procuração no mês de outubro de 2016, excluindo a obrigação contraída do rol de despesas de campanha. Não identificada impropriedade ou irregularidade na prestação, devem ser aprovadas as contas.

Provimento.

(TRE-RS Recurso Eleitoral n. 24846, Acórdão de 07.3.2017, Relator DES. CARLOS CINI MARCHIONATTI, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 39, Data 09.3.2017, Página 5.)

No caso dos autos, ainda que o recorrente tenha diligenciado na juntada contrato particular de honorários firmado com um dos causídicos e recibo da doação (fls. 40-41), como é indevido o registro como despesa de campanha do serviço advocatício em prestação de contas, a irregularidade apontada na sentença deve ser afastada.

Em prosseguimento, foi detectada a ausência de extratos bancários em relação a todo o período da campanha.

A mácula foi afastada pela juntada dos comprovantes da fl. 36. Ademais, é possível constatar a integridade da movimentação bancária da conta de campanha do candidato na consulta pública ao sistema de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais, disponibilizada ao público pelo Tribunal Superior Eleitoral em http://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2016/2/88250/210000023810/extratos.

Assim, deve ser considerada sanada tal falha.

Por fim, verificou-se a realização de despesas após a data da eleição.

No ponto, a Resolução TSE n. 23.463/15 estabelece, acerca da data limite para arrecadação e despesas, que

Art. 27. Partidos políticos e candidatos podem arrecadar recursos e contrair obrigações até o dia da eleição.

§ 1º Após o prazo fixado no caput, é permitida a arrecadação de recursos exclusivamente para a quitação de despesas já contraídas e não pagas até o dia da eleição, as quais deverão estar integralmente quitadas até o prazo de entrega da prestação de contas à Justiça Eleitoral.

[...]

§ 6º As despesas já contraídas e não pagas até a data a que se refere o caput devem ser comprovadas por documento fiscal hábil, idôneo ou por outro meio de prova permitido, emitido na data da realização da despesa.

[…]

No caso que se examina, despesa com combustível foi realizada em 26.10.2016 (fl. 14), e a data da eleição foi 02.10.2016. Não houve qualquer alegação ou comprovação de que a despesa tenha sido contraída antes do pleito e quitada posteriormente, de modo que não há como afastar a falha.

O gasto irregular totaliza R$ 39,00 (trinta e nove reais) e corresponde a 3,40% (três vírgula quarenta por cento) do total despendido na campanha eleitoral.

Considerando a monta da irregularidade, anoto que tanto o eg. Tribunal Superior Eleitoral quanto esta Corte admitem a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade quando não há relevante expressão econômica na falha, bem como quando o percentual que envolve a irregularidade, em face da movimentação, não supera 10% dos recursos totais.

Para que tal aplicação ocorra, exige-se também que esteja evidenciada a boa-fé do candidato.

O Tribunal Regional Eleitoral vem decidindo nessa linha, conforme revela a ementa que colaciono:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Bens ou serviços estimáveis em dinheiro. Art. 19 da Resolução TSE n. 23.463/15. Eleições 2016.

Os bens ou serviços estimáveis em dinheiro doados por pessoas físicas e jurídicas devem constituir produto de seu próprio serviço ou de sua atividade econômica. Doação em desconformidade com o citado regramento. Considerando o valor doado de pequena monta, e a possibilidade de identificação do doador, plausível fazer uso dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas.

Provimento parcial.

(RE n. 151-23.2016.6.21.0127. Rel. Desembargador Paulo Afonso Brum Vaz. Julgado em 11.05.2017, unânime.)

Daí que, no caso, sendo o valor absoluto de R$ 39,00, e não constituindo percentual expressivo da movimentação total (3,40%), tenho que a falha não teve capacidade de macular a transparência das contas ou prejudicar a fiscalização e a confiabilidade da análise.

Aliás, e apenas a título argumentativo, indico que o valor doado é inferior à importância de R$ 1.064,10, que o próprio legislador elegeu como baliza para dispensa de contabilização, nos termos do art. 27 da Lei n. 9.504/97.

Dessa forma, consideradas a pequena monta do valor irregular e as fortes evidências de boa-fé ao agir – de parte do candidato –, as contas devem ser aprovadas com ressalvas.

Assim, a decisão combatida deve ser reparada para aprovar com ressalvas a prestação de contas do candidato.

 

Ante o exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso interposto, para aprovar com ressalvas as contas apresentadas por RUDINEI ROMONO GNIECH, relativas às eleições municipais de 2016.