RE - 2003 - Sessão: 13/12/2017 às 18:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT) de Candiota, bem como por ANDERSON TEIXEIRA DE MORAES, PABLO DE ANDRADE LIMA e GUILHERME VINÍSSIMO FARIAS BARÃO contra sentença (fls. 126-128) que desaprovou suas contas referentes à movimentação financeira do exercício de 2015, em virtude do recebimento de recursos no importe de R$ 4.883,60 oriundos de fonte vedada, determinando o recolhimento do valor ao Tesouro Nacional e a suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário pelo prazo de doze meses.

Em sua irresignação (fls. 144-156), o recorrente sustenta a inconstitucionalidade do art. 5º, inc. II, da Resolução TSE n. 21.841/04 e a sua revogação pela Resolução TSE n. 23.432/15. Aduz afronta ao art. 105 da Lei n. 9.504/97. Argumenta a falibilidade da prova material, uma vez que a relação dos agentes não descreve as funções desempenhadas nos cargos. Requer a reforma da decisão recorrida, para o fim de aprovar as contas, ainda que com ressalvas, e excluir a condenação de recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 4.883,60. Postula, subsidiariamente, a redução da sanção de suspensão do recebimento de recursos do Fundo Partidário.

Nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou, preliminarmente, pela regularização da representação processual do órgão partidário e, no mérito, pelo desprovimento do recurso (fls. 159-164).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo. A decisão foi publicada no Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral, no dia 15 de dezembro de 2016 (fl. 130), quinta-feira, e os embargos de declaração foram opostos no dia seguinte, 16 de dezembro de 2016. Da decisão que não acolheu os aclaratórios (fls. 138-139), publicada em 23 de janeiro de 2017, segunda-feira, foi interposto recurso no dia 24 do mesmo mês (fls. 143-156), em observância ao prazo de 3 dias previsto pelo art. 258 do Código Eleitoral.

Ainda em sede de preliminar, a agremiação não conferiu instrumento de mandato ao firmatário do recurso, motivo pelo qual foi intimada para regularizar sua representação processual (fl. 166), transcorrendo in albis o prazo para que adotasse providências (fl. 171).

Dessa forma, não deve ser conhecido o recurso quanto ao PDT, nos termos do art. 76, § 2º, inc. I, do CPC, o que não impede a análise de mérito, em razão do recurso de Anderson Teixeira de Moraes, Pablo de Andrade Lima e Guilherme Farias Barão.

No mérito, as contas da agremiação recorrente foram desaprovadas em virtude do recebimento de recursos oriundos de fontes vedadas, que totalizaram o importe de R$ 4.883,60.

A princípio, o recorrente argumenta que a irregularidade apontada na sentença não encontra amparo normativo, uma vez que o art. 5º, inc. II, da Resolução TSE n. 21.841/04, além de inconstitucional, foi revogado pela Resolução TSE n. 23.432/15. Outrossim, sustenta a inconstitucionalidade do art. 12, inc. XII, §2º, da Resolução TSE n. 23.432/15 e a afronta ao art. 105 da Lei n. 9054/97.

Sem razão o recorrente.

O art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95 veda o recebimento de doações procedentes de autoridades públicas, como se verifica por seu expresso teor:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38;

No conceito de autoridade pública prevista no artigo referido, inserem-se os detentores de cargos em comissão que desempenham função de chefia e direção, conforme assentou o egrégio Tribunal Superior Eleitoral, com a Resolução n. 22.585/07, editada em razão da resposta à Consulta n. 1428, cuja ementa segue:

Partido político. Contribuições pecuniárias. Prestação por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta. Impossibilidade, desde que se trate de autoridade.

Resposta à consulta, nesses termos. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades.

(CONSULTA n. 1428, Resolução n. 22585 de 06.9.2007, Relator Min. JOSÉ AUGUSTO DELGADO, Relator designado Min. ANTONIO CESAR PELUSO, Publicação: DJ – Diário de Justiça, Data 16.10.2007, Página 172.)

(Grifei.)

Reproduzo trechos extraídos do referido acórdão, que bem explicitam a decisão:

[…] podemos concluir que os detentores de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta da União, e por via reflexa os dos Estados e dos Municípios, são considerados autoridade pública, ante a natureza jurídica dos cargos em comissão, bem como das atividades dele decorrentes.

O recebimento de contribuições de servidores exoneráveis ad nutum pelos partidos políticos poderia resultar na partidarização da administração pública. Importaria no incremento considerável de nomeação de filiados a determinada agremiação partidária para ocuparem esses cargos, tornando-os uma força econômica considerável direcionada aos cofres desse partido.

Esse recebimento poderia quebrar o equilíbrio entre as agremiações partidárias. Contraria o princípio da impessoalidade, ao favorecer o indicado de determinado partido, interferindo no modo de atuar da administração pública. Fere o princípio da eficiência, ao não privilegiar a mão-de-obra vocacionada para as atividades públicas, em detrimento dos indicados políticos, desprestigiando o servidor público. Afronta o princípio da igualdade, pela prevalência do critério político sobre os parâmetros da capacitação profissional.

[…]

Estamos dando interpretação dilatada. Estamos dizendo que autoridade não é somente quem chefia órgão público, quem dirige entidade, o hierarca maior de um órgão ou entidade. Estamos indo além: a autoridade é também o ocupante de cargo em comissão que desempenha função de chefia e direção.

[…]

Está claro. A autoridade não pode contribuir. Que é a autoridade? É evidente que o hierarca maior de um órgão ou entidade já não pode contribuir, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista, e, além disso, os ocupantes de cargo em comissão.

[…]

As autoridades não podem contribuir. E, no conceito de autoridade, incluímos, de logo, nos termos da Constituição, os servidores que desempenham função de chefia e direção. É o artigo 37, inciso V.

[…]

O Tribunal responde à consulta apontando que não pode haver a doação por detentor de cargo de chefia e direção.

A vedação, decorrente do entendimento firmado pela Corte Superior na aludida consulta, vem sendo confirmada pelos Tribunais, como se verifica pelas seguintes ementas:

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Doação de fonte vedada. Art. 31, II, da Lei n. 9.096/95. Exercício financeiro de 2013.

Desaprovam-se as contas quando constatado o recebimento de doações de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, que detenham condição de autoridade, vale dizer, desempenhem função de direção ou chefia.

Redução, de ofício, do período de suspensão do recebimento de cotas do Fundo Partidário, conforme os parâmetros da razoabilidade. Manutenção da sanção de recolhimento de quantia idêntica ao valor recebido irregularmente ao Fundo Partidário.

Provimento negado.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 2346, Acórdão de 12.3.2015, Relator DR. INGO WOLFGANG SARLET, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 45, Data 16.3.2015, Página 02.)

 

Recurso. Prestação de contas de partido político. Doação de fonte vedada. Exercício financeiro de 2008.

Doações de autoridades titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, prática vedada pela Resolução TSE n. 22.585/2007 e pelo inc. II do art. 31 da Lei n. 9.096/95.

Desaprovação das contas pelo julgador originário.

Configuram recursos de fonte vedada as doações a partidos políticos advindas de titulares de cargos demissíveis "ad nutum" da administração direta ou indireta que tenham a condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. Razoável e proporcional a aplicação, de ofício, de 6 meses de suspensão das quotas do Fundo Partidário, a fim de colmatar lacuna da sentença do julgador monocrático.

Provimento negado.

(TRE-RS, RE 100000525, Relatora Desa. Federal Elaine Harzheim Macedo, 25.4.2013.)

Dessa forma, as cominações impostas pelas resoluções referidas nas razões recursais encontram guarida no art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, não havendo afronta a qualquer dispositivo constitucional, tampouco ao texto inserto no art. 105 da Lei 9.504/97, que estabelece normas para as eleições. Ademais, diversamente do que referiu o recorrente, o regramento não viola o princípio democrático, o republicano e o da legalidade, mas é medida necessária para obstar o abuso econômico e assegurar o equilíbrio entre os órgãos partidários.

Ainda, melhor sorte não assiste ao recorrente quanto à impugnação da prova material que serviu de supedâneo para a manifestação da unidade técnica. Conforme relatório de exame às fls. 66-70, as informações coligidas foram obtidas pela administração municipal em resposta ao Ofício Circular 142 ZE n. 01/16, e a tabela inserida no exame menciona expressamente os cargos ocupados, concernentes à função de direção e de chefia, restando clarividente que os contribuintes ali referidos amoldam-se no conceito de autoridade pública.

Com efeito, conforme se depreende do parecer conclusivo (fl. 76-78), a agremiação recebeu um total de R$ 4.883,60 dos seguintes ocupantes de cargos de chefia e de direção na administração municipal e estadual: Cristiane Cardoso Cechini – chefe – R$ 730,12; Fabiano Camargo Mussoline – diretor – R$ 1.011,10; Gesiel Lopes Borges dos Santos – diretor – R$ 1.000,89; Marcio Rinaldo Oliveira Moreira – chefe – R$ 688,12; Marcio Vieira Farias – chefe – R$ 590,90; Oneide Benites da Silva – chefe – R$ 800,26 e Sandra Regina Muller – Diretora – R$ 62,21, os quais se enquadram no conceito de autoridade pública, nos termos em que definido pela jurisprudência.

Nesse ponto, convém referir que o escopo da vedação é obstar a ingerência econômica e a manipulação da máquina pública em benefício de partido político, do que se deflui que restam abrangidas pela regra proibitiva as autoridades de todos os poderes e entes da federação. Assim, na hipótese em análise, é escorreito o enquadramento da contribuição recebida de Sandra Regina Muller como sendo proveniente de fonte vedada, ainda que relativa à administração estadual.

Por fim, insta salientar que a jurisprudência desta Corte e do TSE reputam como de extrema gravidade o recebimento de recursos provenientes de fontes vedadas, de modo que a irregularidade verificada é insanável, e a reprovação das contas é medida que se impõe.

Entrementes, no tocante à suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário, fixado pelo prazo de um ano na sentença, este Tribunal tem entendido pela aplicação dos parâmetros fixados no § 3º do art. 37 da Lei dos Partidos Políticos, que prevê suspensão pelo prazo de 1 a 12 meses, aplicando-se os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

No mesmo sentido, o Tribunal Superior Eleitoral utiliza tais parâmetros, a fim de verificar a adequação da sanção. Destaco o seguinte precedente:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE PARTIDO. DOAÇÃO DE FONTE VEDADA. ART. 31, II, DA LEI 9.096/95. SUSPENSÃO DE COTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. ART. 36, II, DA LEI 9.504/97. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. INCIDÊNCIA.

1. Na espécie, o TRE/SC, com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, concluiu que o recebimento de recursos no valor de R$ 940,00 oriundos de fonte vedada de que trata o art. 31, II, da Lei 9.096/95 – doação realizada por servidor público ocupante de cargo público exonerável ad nutum – comporta a adequação da pena de suspensão de cotas do Fundo Partidário de 1 (um) ano para 6 (seis) meses.

2. De acordo com a jurisprudência do TSE, a irregularidade prevista no art. 36, II, da Lei 9.096/95 -consistente no recebimento de doação, por partido político, proveniente de fonte vedada – admite a incidência dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade na dosimetria da sanção.

3. Agravo regimental não provido

(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 4879, Acórdão de 29.8.2013, Relator Min. JOSÉ DE CASTRO MEIRA, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 180, Data 19.9.2013, Página 71.)

No caso dos autos, o partido arrecadou o total de R$ 19.164,95, dos quais R$ 4.883,60 – valor equivalente a 25,48%, da receita – originam-se de fonte vedada. Embora corresponda a parcela expressiva dos recursos arrecadados, o montante irregular é reduzido. Ademais, não se verifica má-fé do ente partidário, de forma que a suspensão do repasse do Fundo Partidário por elevado período de tempo restaria desproporcional, podendo a sanção de suspensão do recebimento de quotas ser reduzida para o período de quatro meses.

Ante todo o exposto, VOTO, preliminarmente, pelo não conhecimento do recurso  apenas em relação ao PDT, e, no mérito, pelo parcial provimento do recurso, apenas para reduzir a pena de suspensão de novas quotas do Fundo Partidário para 04 meses, determinando o recolhimento dos recursos oriundos de fonte vedada ao Tesouro Nacional.