RE - 30043 - Sessão: 05/07/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso (fls. 122-127) interposto pela Coligação PRA FRENTE GUAPORÉ (PMDB - PDT - PTB - PPS - PR) em face de sentença do Juízo da 22ª Zona Eleitoral (fls. 114-118) que, nos autos de Ação de Investigação Judicial Eleitoral por captação ilícita de sufrágio e abuso do poder econômico movida contra a Coligação UNIÃO, TRABALHO E FÉ (PP - PT), PAULO OLVINDO MAZUTTI, ANDREIA CARON e VALCIR ANTÔNIO FANTON, julgou improcedente o pedido em razão de insuficiência probatória.

Nas razões recursais, a recorrente aduziu que os autos contêm prova suficiente do cometimento das ilegalidades atribuídas aos recorridos, mormente a gravação ambiental realizada pela testemunha ouvida em juízo, dando conta da oferta a eleitores de vantagens em troca do voto nas eleições de 2016 em Guaporé. Requereu o provimento, para ser julgada procedente a ação e cassados os registros ou diplomas dos representados, além de ser aplicada multa nos termos legais.

Com contrarrazões, nas quais aduzida preliminar de ilicitude da prova (fls. 132-137), nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que se manifestou pela negativa de provimento ao recurso (fls. 141-147).

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade

O procurador da recorrente foi intimado via publicação de nota de expediente em 22.02.2017 (fl. 120) e o recurso interposto em 23.02.2017 (fl. 122), sendo o recurso, portanto, tempestivo. Presentes os demais pressupostos de admissibilidade, dele conheço.

Preliminar de ilicitude da prova

Em contrarrazões, a Coligação União, Trabalho e Fé reafirma o contido na sentença no aspecto, aduzindo preliminar de ilicitude da gravação ambiental, realizada por Jean Carlos Vicenzi da Cunha (única testemunha ouvida em juízo), de diálogo por ele travado com o então candidato a vereador pela coligação representada e ora recorrido Valcir Antônio Fanton. Arguiu que Jean Carlos agiu de má-fé, na condição de simpatizante da coligação autora, com o objetivo de incriminar e extorquir o candidato interlocutor numa espécie de flagrante preparado.

No entanto, a tese não prospera.

Inicialmente, porque as gravações juntadas aos autos não foram obtidas por intermédio de interceptação telefônica, meio de prova no qual terceiro, estranho aos interlocutores, capta a conversa, e que está efetivamente sujeito à reserva judicial, por força do art. 5º, inc. XII, da Constituição Federal.

Ao contrário, houve gravação clandestina sem o conhecimento de um dos interlocutores, em que não há se falar em necessidade de autorização judicial, podendo seu conteúdo estar submetido à tutela da intimidade quando a conversa tratar de temas afetos à defesa desses direitos fundamentais (art. 5º, inc. X, da Constituição Federal).

Nessas hipóteses, de tutela especial da intimidade, nem mesmo o interlocutor poderia testemunhar sobre a conversa, pois o direito fundamental em causa preserva o seu conteúdo propriamente dito, e não a gravação em si. Excepcionadas tais situações, é perfeitamente possível a captação de conversas por um dos interlocutores, conforme já definiu o Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral:

Ação penal. Prova. Gravação ambiental. Realização por um dos interlocutores sem conhecimento do outro. Validade. Jurisprudência reafirmada. Repercussão geral reconhecida. Aplicação do art. 543-B, § 3º, do CPC.

É lícita a prova consistente em gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro.

(RE 583.937-QO-RG, Relator Min. CEZAR PELUSO, julgamento em 19.11.2009, Plenário, DJE de 18.12.2009.) (Grifei.)

Com efeito, ao reconhecer a licitude de gravação ambiental como elemento probatório, por não se amoldar à cláusula constitucional de reserva de jurisdição (art. 5º, inc. XII, da Constituição Federal) e desde que inexistente o dever de sigilo ou a reserva de conversação, o STF parece não ter restringido a sua orientação aos expedientes investigativos e ações de caráter penal.

Nesse sentido, consolidou-se a jurisprudência deste Tribunal, que vem reconhecendo a validade da gravação ambiental em processos cíveis-eleitorais, conforme ilustram as ementas dos seguintes arestos:

Recurso. Representação. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Parcial procedência. Prefeito e vice. Cassação de diploma. Eleições 2016.

Matéria preliminar. 1. É lícita a gravação ambiental realizada por um dos interlocutores e sem o conhecimento do outro, conforme já assentado pelo Supremo Tribunal Federal em regime de repercussão geral. 2. Ilicitude da prova obtida por subterfúgio, em afronta às garantias e direitos fundamentais protegidos pela Constituição Federal. Utilização não autorizada de utensílio pessoal com realização de cópias às escondidas. Imprestabilidade da prova.

Para a configuração da captação ilícita de sufrágio exige-se a conjugação de elementos subjetivos e objetivos que envolvam uma situação concreta: a prática de uma conduta (doar, oferecer, prometer), a existência de uma pessoa física (eleitor) e o resultado a que se propõe o agente (a obtenção do voto). [...]

Provimento negado.

(TRE-RS – RE n. 399-41 – Rel. DR. EDUARDO AUGUSTO DIAS BAINY – J. em 6.6.2017.) (Grifei.)

 

Recurso. Ação de investigação judicial eleitoral. Representação. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Condenação. Vereador. Cassação do diploma. Eleições 2016.

Afastadas as prefaciais de nulidade de gravação ambiental realizada por um dos interlocutores e de prova testemunhal. Teor de conversa não protegido pela privacidade. Provas não sujeitas à cláusula de sigilo. Sendo lícita a gravação, não se caracteriza como ilícita por derivação a prova consistente em depoimento de testemunha. [...]

Provimento negado.

(TRE-RS – RE 573-28.2016.6.21.0020 – Rel. DR. JAMIL ANDRAUS HANNA BANNURA – J. Sessão de 17.02.2017.)

Na espécie, o representado não tratava de nenhum tema especialmente protegido pela privacidade. Ao contrário, a conversa poderia ser reproduzida em audiência, como de fato o foi, por qualquer um dos interlocutores, sem qualquer ofensa à Constituição Federal. O diálogo limitou-se a temas relacionados à campanha eleitoral, destituída, por completo, de conteúdo cuja utilização em processo judicial possa implicar violação à intimidade ou à privacidade de qualquer um dos participantes.

Ademais, a escuta das mídias, em conjunto com a prova testemunhal colhida em juízo, revela que o diálogo captado ocorreu na sede do partido ao qual vinculado o representado Valcir Antônio Fanton, por iniciativa e por ocasião da visita de Jean Carlos Vicenzi da Cunha, sem que nenhuma expectativa de privacidade do recorrido tenha sido frustrada.

Além disso, a suposta insistência do autor da gravação ambiental, por ocasião do diálogo e em detrimento do representado – fundamento da sentença para o reconhecimento da ilicitude da prova –, não é obstáculo para o reconhecimento da licitude da prova. Para além de se confundir com a necessária análise das circunstâncias do caso, como bem leciona Rodrigo López Zilio (Direito Eleitoral. 5. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2016, p. 574), “em determinados casos, porque se trata de ato bilateral, a iniciativa do negócio ilícito pode partir do próprio eleitor, situação em que somente haverá como configurada a vedação quando houver a aquiescência do candidato, através da promessa, entrega ou doação do bem ou vantagem em troca do voto”.

Logo, afasto a preliminar de ilicitude da gravação ambiental e adentro na questão de fundo, na qual, conforme se verá, a confirmação do juízo de improcedência do pedido é medida que se impõe.

 

Mérito

Cuida-se de apreciar Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), pela qual os representados Coligação União, Trabalho e Fé e os seus candidatos aos cargos de prefeito, vice e vereador no pleito de 2016 em Guaporé, respectivamente, Paulo Olvindo Mazutti, Andreia Caron (não eleitos) e Valcir Antônio Fanton (eleito), teriam cometido captação ilícita de sufrágio e abuso do poder econômico, em razão da oferta a eleitores de vantagens em troca do voto, a teor do disposto nos arts. 41-A da Lei n. 9.504/97 e 22 da LC n. 64/90, in verbis:

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinquenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar n. 64, de 18 de maio de 1990.

§ 1º Para a caracterização da conduta ilícita, é desnecessário o pedido explícito de votos, bastando a evidência do dolo, consistente no especial fim de agir.

§ 2º As sanções previstas no caput aplicam-se contra quem praticar atos de violência ou grave ameaça a pessoa, com o fim de obter-lhe o voto.

§ 3º A representação contra as condutas vedadas no caput poderá ser ajuizada até a data da diplomação.

§ 4º O prazo de recurso contra decisões proferidas com base neste artigo será de 3 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no Diário Oficial.

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito:

[...]

A causa de pedir dá conta de que Valcir Antônio Fanton, em seu proveito e dos demais candidatos representados, no período prévio ao último pleito municipal, teria ofertado e entregue a eleitores quantia em dinheiro (R$ 50,00) e vales-combustíveis em troca da adesivação de veículos automotores em prol da campanha da coligação representada, visando ao voto.

A prática ilícita estaria demonstrada em gravação ambiental feita por intermédio de telefone celular, de Jean Carlos Vicenzi da Cunha, o qual teria procurado Valcir Antônio Fanton e com ele entabulado conversas nas quais evidenciada a captação ilícita de sufrágio.

Prossigo.

O aludido art. 41-A da Lei das Eleições tem por objetivo proteger a liberdade de escolha do eleitor, vedando que seu voto seja definido ou influenciado pelo oferecimento de bens e vantagens.

Para sua configuração, é necessária a conjugação de elementos subjetivos e objetivos que envolvam uma situação concreta, a saber: 1) a prática de uma conduta (doar, oferecer, prometer, etc.); 2) a existência de uma pessoa física (eleitor); 3) o resultado a que se propõe o agente (o fim de obter o voto).

Do exame dos autos, de fato, não se evidenciam provas de que houve compra de votos.

O conjunto probatório se resume à referida gravação ambiental (mídias de fl. 15) e aos depoimentos em juízo do representado Valcir Antônio Fanton e da testemunha Jean Carlos Vicenzi da Cunha (Termo de Audiência e mídia de fls. 61-63).

Os áudios das mídias que foram encartadas são de péssima qualidade, prejudicando a fidedignidade do teor das gravações e da própria degravação acostada aos autos pela parte representante, não sendo desarrazoado admitir a possibilidade de montagem na sua confecção.

A prova oral produzida, a seu turno, não se prestou a demonstrar a ocorrência da ilegalidade. Antes, evidenciou a tentativa do interlocutor Jean Carlos Vicenzi da Cunha de, a qualquer custo, receber dinheiro em troca do seu apoio à campanha eleitoral dos representados, mesmo que fosse necessária a utilização das gravações como forma de chantagem à obtenção do benefício.

Além desta confissão, Jean Carlos Vicenzi da Cunha caiu em contradição quanto à afirmação de que não mantivera ligação com outro candidato a vereador e adversário político de Valcir Antônio Fanton (“Ademir Damo”), supostamente o mentor das gravações levadas a cabo.

Não por acaso, o órgão do Ministério Público Eleitoral, na própria audiência, ofereceu denúncia contra Jean Carlos Vicenzi da Cunha, nos seguintes termos (fl. 61 e verso):

O MPE, por meio de seu representante legal, oferece denúncia contra Jean Carlos Vincenzi da Cunha, pela prática dos seguintes fatos delituosos. 1) no mês em data não suficientemente esclarecida, mas no mês de setembro de 2016 o denunciado solicitou dinheiro em troca de voto. Na ocasião, o denunciado se dirigiu até a sede da Coligação União, Trabalho e Fé, e solicitou ao candidato a vereador Valcir Antônio Fanton o pagamento de quantia em dinheiro em troca de seu voto. Arrola como testemunha Valcir Antônio Fanton. 2) No dia 21 de novembro de 2016, por volta das 14 horas e 30 minutos, o denunciado, devidamente compromissado nos autos do processo AIJE 300-43.2016.6.21.0022, fez afirmação falsa. Na ocasião, o denunciado devidamente compromissado afirmou em audiência que não possuía perfil na rede facebook, bem como afirmou que não conhecia e nunca teve relação com o candidato Ademir Damo. Posteriormente, após ser apresentada documentação pela parte contrária admitiu que era ex funcionário do irmão do candidato Ademir Damo. Desa forma o MPE oferece a presente denúncia, requerendo que o réu seja citado para apresentar defesa e, após regular instrução seja condenado.

Nesse norte, peço vênia para me valer da análise procedida pela magistrada de primeiro grau, cujos fundamentos adoto como razões de decidir, verbis (fls. 114-119):

[…]

Em audiência de instrução, foi colhido o depoimento pessoal de Valcir Antonio Fanton e realizada a inquirição de Jean Carlos Vincenzi da Cunha.

A testemunha afirmou ter realizado a gravação constante nos autos, como forma de coação para que Valcir lhe desse o dinheiro. Disse que realizou a gravação com seu aparelho celular, o qual estaria estragado.

Insta salientar que na audiência de instrução (fl. 61) foi oferecida denúncia contra Jean Carlos, em razão de ter solicitado dinheiro em troca de votos, bem como de ter realizado afirmação falsa em juízo.

Por sua vez, o representado, em depoimento pessoal, aduziu que a gravação que embasa a representação foi editada, bem como que Jean insistiu para que o depoente realizasse a “compra” de seu voto, motivo pelo qual desconfiou que fosse uma armação da coligação contrária.

Assim, o depoimento da testemunha, notadamente simpatizante da coligação representante, conforme se vê dos documentos de fls. 74/78, também não pode embasar um édito condenatório, em razão do claro envolvimento do depoente com o representantes [sic], sendo possível, no mínimo, desconfiar da realização de uma espécie de flagrante preparado ao representado Valcir, o que não é admissível.

[...]

Também aqui merece destaque o minudente parecer do Procurador Regional Eleitoral (fls. 141-147), cujos fundamentos igualmente incorporo às razões de decidir:

Isso posto, descendo-se ao exame do caso concreto, embora a existência das gravações em questão, há, nos autos, contradições em relação à sua autenticidade e quanto aos depoimentos colhidos em juízo, mais precisamente o da testemunha JEAN CARLOS VINCENZI DA CUNHA – quem teria efetuado as gravações –, o que não conduz a um juízo de certeza da prática da conduta ilícita.

A fim de evitar tautologia, mister se faz a reprodução dos muito bem lançados argumentos Ministério Público Eleitoral quanto à análise da prova colhida nos autos (fls. 111-112v.):

[…] Ainda que seja afastada a ilicitude da prova, verifica-se que, quanto ao mérito, não há indícios suficientes que permitam concluir pela prática de captação ilícita do sufrágio, conforme se depreende da prova oral produzida em juízo.

O requerido VALCIR ANTÔNIO FANTON declarou em juízo que ouviu o áudio, que a fala é do depoente, porém afirma que percebe que o áudio foi cortado e editado. A conversa que teve com Jean, sabe que ele trabalha com o irmão de Ademir Damo. Disse que, três dias depois esteve na sede da coligação. Disse que chegou dizendo que está ganhando 120 reais por semana, se estiver pagando mais, tira os adesivos e coloca os dele. Disse que Jean insistia para que comprasse o voto dele e da família dele. Relatou que, depois que Jean começou a insistir muito, começou a desconfiar que se tratava de uma armadilha e que estava gravando e começou a enrolar e que disse que depois ligava para ele. Disse que Jean foi lá quatro ou cinco vezes procurá-lo. Relatou que o vereador Ademir Damo lhe disse: “te prepara que a tua está guardado”. E que, na segunda-feira, Jean veio procurá-lo para tentar comprar votos do requerido. Disse que sabe que Jean é cortador de empresa de pijamas do irmão de Ademir Damo.

A testemunha JEAN CARLOS VINCENZI DA CUNHA disse que fez a gravação porque precisava de dinheiro. Disse que gravou a conversa, como forma de coação, se o requerido não lhe desse dinheiro. Disse que adesivou o carro com o adesivo do Pita, porém não tem como comprovar, disse depois que vendeu o carro. Negou que tivesse adesivado o carro para outro candidato. Relatou que utilizou um celular para gravar, mas o celular está estragado.

Disse que não tinha página no facebook, porém se contradisse em seguida ao reconhecer como sendo seu o perfil na rede social que lhe fora apresentado pelo advogado dos representados, dizendo que não tem mais a senha. Indagado, negou que tivesse feito campanha em favor do candidato da oposição Ademir Demo. Confirma que trabalhava na Encantos Pijamas, porém diz que não trabalha mais. Disse que sabia que Alceo Damo é irmão de Ademir Demo.

Nessa esteira, verifica-se que JEAN CARLOS alegou que o celular onde fez a gravação estaria estragado, o que inviabilizaria a realização de perícia nas mídias originais para que fosse possível verificar eventual montagem ou edição nas conversas gravadas que comprometesse a sua integridade e autenticidade, porém se o celular tivesse estragado, não teria condições de fazer a gravação, o que gera suspeita fundada de que realmente houve alteração do seu conteúdo, já que a perícia poderia provar se ''cortes" ou ''edições" nestes áudios. Bem se vê que não faria o menor sentido fazer a gravação para extorquir dinheiro do candidato VALCIR se o réu não fornecesse a versão original e autêntica do áudio que estava gravado no seu celular, a fim de que afastasse a tese levantada pelos requeridos de que houve edição do conteúdo dos áudios, com modificação da conversa.

Ademais, conforme se extrai do depoimento pessoal de VALCIR ANTÔNIO FANTON, observa-se que JEAN CARLOS insistia para que o requerido comprasse o voto dele e da família dele. Relatou que, depois que Jean começou a insistir muito, começou a desconfiar que se tratava de uma armadilha e que estava gravando e começou a enrolar e disse que depois ligava para ele.

Embora Jean Carlos tenha dito que adesivou o seu carro com propaganda eleitoral em favor do candidato Pita, afirmou que "vendeu o carro" e não teria como comprovar. Por outro lado, VALCIR declarou que JEAN CARLOS já teria adesivado o seu carro com propaganda eleitoral de candidato da oposição, inclusive teria compartilhado na rede social propaganda em favor do candidato a vereador Ademir Damo, sendo que trabalhava para o irmão deste.

Portanto, não ficou comprovado que VALCIR tenha comprado voto de qualquer eleitor ou oferecido qualquer vantagem para este fim, pois o próprio JEAN CARLOS foi quem procurou o candidato, indo até a sede da coligação atrás dele, além disso, alegou em juízo que não tinha como fornecer a gravação original do seu celular, dizendo que este estava estragado, bem como não comprovou que tivesse adesivado o seu carro com propaganda em favor de VALCIR ou que tivesse recebido deste qualquer valor por parte deste. (Grifo no original.)

[…]

Portanto, não merece provimento o recurso, pois, no caso concreto, como acertadamente reconheceu a sentença, não há prova suficiente da prática do ilícito previsto no artigo 41-A da Lei nº 9.504/97 e nem quanto à possível abuso de poder. (Grifos no original.)

Consoante pacífica jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a ocorrência do ilícito do art. 41-A da Lei das Eleições não pode ser presumida. Ao contrário, exige-se prova segura e robusta a demonstrá-la:

RECURSO ESPECIAL. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. PROVA ROBUSTA. AUSÊNCIA. PROVIMENTO.

1. Considerando a contradição da prova analisada pela Corte Regional, não há como se entender pela configuração da captação ilícita de sufrágio, a qual demanda a presença de prova robusta e inconteste, o que não se verifica na hipótese dos autos.

2. Recurso especial provido.

(TSE – AC 79143 – Rel. Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA – DJE de 23.5.2014.)

 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2012. PREFEITO. VEREADOR. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO E ABUSO DO PODER ECONÔMICO. DESPROVIMENTO.

1. Consoante a atual jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a licitude da prova colhida mediante interceptação ou gravação ambiental pressupõe a existência de prévia autorização judicial e sua utilização como prova em processo penal.

2. A prova testemunhal também é inviável para a condenação no caso dos autos, tendo em vista que as testemunhas foram cooptadas pelos adversários políticos dos agravados para prestarem depoimentos desfavoráveis.

3. As fotografias de fachadas das residências colacionadas aos autos constituem documentos que, isoladamente, são somente indiciários e não possuem a robustez necessária para comprovar os ilícitos.

4. A condenação pela prática de captação ilícita de sufrágio ou de abuso do poder econômico requer provas robustas e incontestes, não podendo se fundar em meras presunções. Precedentes.

5. Agravo regimental desprovido.

(TSE – Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 92440 – Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA – DJE de 21.10.2014.)

 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ART. 41-A DA LEI 9.504/97. ELEIÇÕES 2012. AUSÊNCIA DE CONFIGURAÇÃO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. DESNECESSIDADE.

1. A configuração de captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei 9.504/97) demanda a existência de prova robusta de que a doação, o oferecimento, a promessa ou a entrega da vantagem tenha sido feita em troca de votos, o que não ficou comprovado nos autos.

2. Conforme a jurisprudência do TSE, o fornecimento de comida e bebida a serem consumidas durante evento de campanha, por si só, não configura captação ilícita de sufrágio.

3. A alteração das conclusões do aresto regional com fundamento nos fatos nele delineados não implica reexame de fatos e provas. Na espécie, a mudança do que decidido pela Corte Regional quanto à finalidade de angariar votos ilicitamente foi realizada nos limites da moldura fática do acórdão, sem a necessidade de reexame fático-probatório.

4. Agravo regimental não provido.

(TSE – Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 47845 – Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA – DJE de 21.5.2015.)

Na mesma toada, os seguintes precedentes deste Regional:

Recurso. Representação. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Improcedência. Eleições 2016.

Para a configuração da captação ilícita de sufrágio, necessária a conjugação de elementos subjetivos e objetivos que revistam uma situação concreta.

Incontroversa a entrega de material de construção para eleitor. Todavia, carece de prova o envolvimento dos representados e a intenção específica exigida pelo comando - a obtenção de votos. Recebimento do material precedido do regular processo administrativo perante a prefeitura, em razão de política municipal de habitação de interesse social e saneamento. Ausente prova da captação ilícita de sufrágio.

Provimento negado.

(TRE-RS – RE n. 19515 – Rel. DES. FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ – J. Sessão de Julgamento de 29.11.2016).

 

Recurso. Representação. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Eleições 2016.

1. Preliminar. Licitude da gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro. Hipótese em que desnecessária a autorização judicial. Por consequência, afastada a nulidade de testemunho por derivação.

2. Vedada pela legislação eleitoral a entrega ou oferta de vantagens para a obtenção do voto do eleitor. Não é exigido pedido expresso de voto, bastando apenas que a oferta ocorra com a finalidade de obter voto.

3. A ajuda financeira a familiar de eleitora, conhecida do candidato de longa data, bem como o fornecimento de gasolina para que pudesse comparecer às urnas, não evidencia suposta compra de votos. Reafirmado, em algumas passagens do diálogo, que a eleitora não estava obrigada a votar no candidato. Inexistente, na espécie, prova robusta a revelar a captação ilícita de sufrágio.

Provimento.

(TRE-RS – RE n. 57243 – Rel. DR. JAMIL ANDRAUS HANNA BANNURA – J. Sessão de 7.3.2017.)

 

Recurso. Representação. Propaganda eleitoral. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Abuso de poder. Art. 22 da Lei Complementar n. 64/90. Improcedência. Eleições 2016.

Suposta entrega de dinheiro a eleitor beneficiário de programa social da prefeitura, em troca de voto e de participação em gravação de áudio para veiculação na propaganda eleitoral em rádio dos candidatos majoritários representados. Alegada prática de coação, com ameaça de perda do aludido benefício no caso de recusa do voto e da cooperação com a publicidade.

Acervo probatório alicerçado em depoimentos de pessoas ligadas ao candidato adversário dos representados e em prova oral contraditória.

Elementos insuficientes a comprovar a captação ilícita de voto e o abuso de poder. Não demonstrado o potencial rompimento da normalidade das campanhas e da paridade de oportunidades entre os concorrentes nas eleições.

Sentença de improcedência confirmada.

Provimento negado.

(TRE-RS – RE n. 222-06 – Rel. Dr. SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES – J. Sessão de 26.01.2017.)

Portanto, diante da insuficiência do caderno probatório, inexiste comprovação da prática imputada aos recorridos, não se admitindo, in casu, a imposição das severas sanções previstas no art. 41-A da Lei das Eleições.

Importante referir, ainda, que, não restando claramente demonstrada a conduta espúria, não há que se falar em abuso de poder econômico, nos moldes descritos no art. 22 da Lei Complementar n. 64/90, pois sua caracterização, na presente hipótese, a partir da concepção que lhe é empregada, pressupõe a ocorrência de uma das ações necessárias à configuração da captação ilícita de voto, quais sejam, doar, oferecer, prometer ou entregar ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza.

 

Diante do exposto, afastada a matéria preliminar, VOTO pelo desprovimento do recurso interposto pela COLIGAÇÃO PRA FRENTE GUAPORÉ (PMDB - PDT - PTB - PPS - PR) de Guaporé.