RE - 18432 - Sessão: 05/07/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) de DOIS IRMÃOS contra decisão do Juízo da 153ª Zona Eleitoral (fls. 60-61v.), que julgou improcedente a representação ajuizada contra COLIGAÇÃO MAIS PELAS PESSOAS, MAIS POR DOIS IRMÃOS, TÂNIA TERESINHA DA SILVA e JERRI ADRIANI MENEGHETTI, considerando não caracterizada a captação ilícita de sufrágio, prevista no art. 41-A, da Lei n. 9.504/97.

Nas razões recursais (fls. 66-69), sustenta que há nos autos indícios da distribuição gratuita de bebida alcoólica por ocasião de comício, e doação irregular à campanha, pois houve cessão do espaço (clube) para a realização do comício, sem a devida declaração na prestação de contas, causando desequilíbrio no pleito, com a configuração do abuso de poder econômico. Sustenta, ainda, que o oferecimento de alimentação e bebidas, afora o entretenimento próprio de uma grande festa, seguido de apelo por votos, consubstancia o dolo específico exigido à caracterização da captação ilícita de sufrágio. Requer o provimento ao recurso, para julgar procedente a representação por captação ilícita de sufrágio.

Não houve contrarrazões.

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 81-84v.), pois não há prova suficiente da prática do ilícito previsto no art. 41-A da Lei n. 9.504/97.

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo. A intimação da sentença foi publicada no dia 12 de dezembro de 2016 e o recurso foi interposto no dia 14 do mesmo mês (fl. 66), dentro, portanto, do tríduo legal estabelecido no art. 41-A, § 4º, da Lei n. 9.504/97.

No mérito, aduz o recorrente que os recorridos praticaram captação ilícita de sufrágio, vedada pelo art. 41-A da Lei  das Eleições, mediante a realização de um comício, com distribuição de comidas e bebidas alcoólicas gratuitas, seguido de apelo por votos.

Reproduzo o texto do art. 41-A da Lei n. 9.504/97: 

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990.

O aludido artigo tem por objetivo proteger a liberdade de escolha do eleitor, vedando que seu voto seja definido ou influenciado pelo oferecimento de bens e vantagens.

No presente caso, não há elementos aptos a indicar que houve distribuição gratuita de bebidas e alimentação no comício. Ao contrário, as provas carreadas dão conta de que houve efetiva comercialização. E, ainda que se admitisse que houve a gratuidade, tal fato, por si só, não caracteriza o ilícito, consoante jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral: 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ART. 41-A DA LEI 9.504/97. ELEIÇÕES 2012. AUSÊNCIA DE CONFIGURAÇÃO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. DESNECESSIDADE.

1. A configuração de captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei 9.504/97) demanda a existência de prova robusta de que a doação, o oferecimento, a promessa ou a entrega da vantagem tenha sido feita em troca de votos, o que não ficou comprovado nos autos.

2. Conforme a jurisprudência do TSE, o fornecimento de comida e bebida a serem consumidas durante evento de campanha, por si só, não configura captação ilícita de sufrágio.

3. A alteração das conclusões do aresto regional com fundamento nos fatos nele delineados não implica reexame de fatos e provas. Na espécie, a mudança do que decidido pela Corte Regional quanto à finalidade de angariar votos ilicitamente foi realizada nos limites da moldura fática do acórdão, sem a necessidade de reexame fático-probatório.

4. Agravo regimental não provido.

(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 47845, Acórdão de 28.4.2015, Relator Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 95, Data 21.5.2015, Página 67.) (Grifei.)

Tendo presente o bem jurídico protegido pela norma, veda-se a entrega ou oferta de vantagens especificamente em troca do voto do eleitor. Assim, embora a jurisprudência não exija pedido expresso de voto, exige que a entrega de benefícios ocorra com a finalidade específica de obter o voto do eleitor, conforme expressamente prevê o § 1º do art. 41-A da Lei n. 9.504/97:

Art. 41-A.

§ 1º. Para a caracterização da conduta ilícita, é desnecessário o pedido explícito de votos, bastando a evidência do dolo, consistente no especial fim de agir.

Nessa linha, trago à colação julgado do Tribunal Superior Eleitoral, o qual exige, para a caracterização da captação ilícita de sufrágio, o especial fim de agir da conduta, consistente no condicionamento da entrega da vantagem pelo voto do eleitor: 

ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ORDINÁRIO. CARGO DE DEPUTADO FEDERAL. REPRESENTAÇÃO. ART. 41-A DA LEI 9.504/97. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. COMPARECIMENTO DE CANDIDATO EM EVENTO GRATUITO, COM DISTRIBUIÇÃO DE COMIDA E BEBIDA. FRAGILIDADE DO ACERVO PROBATÓRIO. DEPOIMENTOS TESTEMUNHAIS CONTRADITÓRIOS. DISCURSO. IRRELEVÂNCIA. DOLO ESPECÍFICO. NÃO COMPROVADO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. A configuração da captação ilícita de votos possui como consequência inexorável a cassação do diploma. Dada a gravidade da pena, faz-se mister a existência nos autos de conjunto probatório apto a demonstrar, indene de dúvidas, a ocorrência do ilícito.

2. O simples fato de o candidato se fazer presente em festividade não gera a presunção de que se trata de evento com fins eleitorais, mormente por não ser vedado, na legislação eleitoral aplicável, o comparecimento de candidato em evento festivo que não envolva a inauguração de obra pública nos 3 meses que antecedem o pleito ou a realização de showmício.

3. A realização de churrasco, com o fornecimento de comida e bebida de forma gratuita, acompanhada de discurso do candidato, não se amolda ao tipo do art. 41-A da Lei 9.504/97. Precedente: RCEd 766 [31791-37]/SP, Rel. Min. MARCELO RIBEIRO, DJe 10.5.2010.

4. Para que seja caracterizada a captação ilícita de sufrágio, é necessária a demonstração do especial fim de agir consistente no condicionamento da entrega da vantagem ao voto do eleitor.

5. Na espécie, depreende-se do acervo probatório que o recebimento da vantagem - materializada na distribuição gratuita de comida e bebida - não foi condicionado à obtenção do voto, o que afasta a incidência do art. 41-A da Lei das Eleições, porquanto não demonstrado o especial fim de agir da conduta.

6. Agravo Regimental a que se nega provimento.

(TSE, Agravo Regimental em Recurso Ordinário n. 796257, Acórdão de 20.10.2016, Relator Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 29, Data 09.02.2017, Páginas 49-50.) (Grifei.)

Portanto, não se sustenta o entendimento do recorrente, em desacordo com a jurisprudência, de que “o oferecimento de alimentação e bebidas, afora todo o entretenimento próprio de uma grande festa, seguido de apelo por votos, consubstancia o dolo específico exigido à caracterização da captação ilícita de sufrágio”.

No caso sob análise, não existem quaisquer indícios de que os lanches e bebidas servidos no comício estivessem sendo distribuídos aos eleitores em troca de voto, fato sequer alegado pelo representante.

Aduz o recorrente, ainda, que restou configurado abuso de poder econômico, pois o espaço do clube foi gratuitamente cedido para a realização do evento, não tendo sido declarado na prestação de contas como doação estimável em dinheiro.

Quanto a isso, transcrevo elucidativo trecho do parecer do douto Procurador Regional Eleitoral (fl. 84v.), o qual acolho como razão de decidir:

Por fim, eventual omissão ou irregularidade na arrecadação ou gasto de recursos referentes à campanha dos representados não é objeto do presente feito, mas matéria atinente à correspondente prestação de contas ou representação específica – art. 30-A, LE. Da mesma forma, não tendo sido objeto da presente representação a ocorrência de abuso de poder econômico, esse não merece ser ora analisado.

Dessa forma, deve ser mantido o juízo de improcedência da representação.

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo desprovimento do recurso.