RE - 56745 - Sessão: 04/07/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso eleitoral interposto pela COLIGAÇÃO A HORA DA MUDANÇA (PT - PSB - PCdoB) contra sentença (fls. 53-5) que indeferiu a inicial de Ação de Investigação Judicial Eleitoral proposta em face da COLIGAÇÃO AVANÇA CAMAQUÃ (PSDB – PSC), de IVO DE LIMA FERREIRA e JAIR MARTINS.

A exordial (fls. 2-24) imputava aos recorridos abuso de poder econômico e o uso irregular da comunicação social, diante da manutenção de uma “radioweb" hospedada no sítio eletrônico vwvw.radio45.net, com ampla divulgação em informativo de campanha e rede social. Disse que a “radioweb” veiculava centenas de inserções de propaganda entre músicas de diversos tipos e ritmos, com o que angariava atenção do eleitor e atingia milhares de pessoas. Afirmou similitude com uma emissora de radiodifusão, restando violado o disposto no art. 44 da Lei das Eleições. Sustentou ser propaganda paga, e que, por meio do “sistema de rádio express”, transformou a campanha eleitoral em verdadeiro evento de entretenimento, tratando os comícios como “showmícios", o que configuraria abuso. Acrescentou que a propaganda era irregular, pois não constava o nome do candidato a vice-prefeito. Concluiu afirmando que a propaganda via internet viola diversos dispositivos da Lei n. 9.504/97.

O magistrado a quo indeferiu, de plano, a inicial, sob o fundamento de que dos fatos nela narrados não decorre a conclusão de que houve a prática de abuso de poder econômico ou dos meios de comunicação e tampouco propaganda eleitoral ilícita.

A recorrente sustenta (fls. 57-66) que a decisão proferida pelo Juízo da 12ª Zona violou o seu direito de acesso à prestação jurisdicional, traduzindo-se, em verdade, em um julgamento sumário e descomprometido com as regras processuais. Argumenta que a inicial não é inepta e que o magistrado teria antecipado juízo de mérito para indeferi-la.

Com contrarrazões (fls. 82-4), nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo provimento parcial do recurso, apenas para que seja aplicada aos recorridos a multa por propaganda irregular (fls. 89-96v).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo.

No mérito, a douta sentença deve ser mantida.

A fim de evitar desnecessária tautologia, transcrevo o que constou na r. decisão (fls. 53v-5):

Analisando a petição inicial, verifica-se que a pretensão da coligação autora é ver reconhecida a prática de abuso de poder econômico e dos meios de comunicação, bem como de propaganda eleitoral ilícita.

Não lhe assiste razão.

Não, pelo menos, com o que foi trazido na peça vestibular.

Em última análise, a coligação representante está inconformada com a realização de propaganda eleitoral veiculada numa radioweb criada pela coligação representada.

A primeira questão digna de nota é que a plataforma dessa propaganda é a internet e não a rádio.

Esse é o primeiro ponto a ser destacado porque, realmente, a propaganda transmitida via rádio é regulada pela Lei n.º 9.504/97 em seus arts. 44 e seguintes. Na suma, restringe-se ao horário gratuito, vedada a veiculação de propaganda paga. Numa breve e leiga definição, o rádio é um sistema de comunicações através de ondas eletromagnéticas propagadas no espaço, emitidas por uma estação transmissora e captados por um receptor com antena e amplificador de som.

Já a internet é um sistema global de redes de computadores interligadas que utilizam um conjunto próprio de protocolos (Internet Protocol Suite ou TCP/IP) com o propósito de servir progressivamente usuários no mundo inteiro. É uma rede de várias outras redes, que consiste de milhões de empresas privadas, públicas, acadêmicas e de governo, com alcance local e global e que está ligada por uma ampla variedade de tecnologias de rede eletrônica, sem fio e ópticas. A internet traz uma extensa gama de recursos de informação e serviços, tais como os documentos inter-relacionados de hipertextos da World Wide Web (WWW), redes ponto-a-ponto (peer-to-peer) e infraestrutura de apoio a correio eletrônico (e-mails). As origens da internet remontam a uma pesquisa encomendada pelo governo dos Estados Unidos na década de 1960 para construir uma forma de comunicação robusta e sem falhas através de redes de computadores.

Num conceito mais simplista, é um mecanismo que permite que computadores e outros dispositivos assemelhados possam se comunicar.

Diferentemente da rádio ou da televisão, a propaganda eleitoral na internet depende sempre da iniciativa do próprio internauta de digitar o endereço eletrônico de determinada página ou, pelo menos, clicar em link que remeta a determinada página. Portanto, ainda que o sítio da internet contenha conteúdo em formato de rádio - intercalação de músicas com propaganda eleitoral, entrevistas, comentários, críticas, etc. - não se tornará propaganda de rádio propriamente dita, para fins eleitorais.

Na verdade, é possível afirmar que a regulamentação da propaganda eleitoral na internet é recente, já que a legislação brasileira começou a contemplá-la pela Lei n. 12.034/09, que introduziu dispositivos na Lei das Eleições (arts. 36-A; 57-A a 57-I; 58, § 3º, IV 58-A).

A Lei n.º 9.504/97 ainda sofreu outras alterações a respeito da propaganda pela internet pelas Leis n.º 12.891/13 e 13.165/15. De um modo geral, pode-se dizer que uma das diretrizes da propaganda na internet é a liberdade para sua utilização. É claro que possui limitações tais como a comunicação à Justiça Eleitoral do sítio utilizado, que deve ser hospedado em serviço de internet estabelecido no país; a proibição de propaganda paga; em sítios de pessoas jurídicas, com ou sem fins lucrativos. Evidentemente, está sujeita às limitações de conteúdo como qualquer outro meio de propaganda, tal como utilização de informação ofensiva ou sabidamente inverídica.

Não há, contudo - e esse é um ponto fundamental na presente demanda -, proibição de utilização de determinada forma de mídia.

A rigor, a internet possibilita o desenvolvimento de diversas ferramentas, com o uso de textos, vídeos, áudios, gráficos, jogos, inclusive com a interação do internauta. Como a lei não veda, é lícita a utilização de todos esses tipos de arquivos eletrônicos.

E não há motivo algum para tolher a criatividade do candidato. Pelo contrário.

Sobre o tema, colaciono a doutrina de José Jairo Gomes (Direito Eleitoral, 12ª ed., Editora Atlas, 2016, p. 541):

Entre as ferramentas virtuais, incluem-se aparelhos móveis (como tablets) e smartphones. De sorte que imagens, mensagens, notícias, alertas, esclarecimentos e avisos de caráter eleitoral podem ser enviados por essa mídia; também podem ser disponibilizados aplicativos, programas e materiais para download, facultando-se aos destinatários baixar e reenviar conteúdos como textos, jogos, vídeos, áudio e jingles de campanha. Têm-se destacado as vantagens da campanha eleitoral por tais aparelhos - a chamada campanha digital-, pois neles: (i) é alto o índice de absorção de mensagens devido à segmentação do público; (ii) as mensagens enviadas são mais lidas que as remetidas por e-mail; (iii) mesmo quando em deslocamento, os eleitores recebem e podem acessar, visualizar as imagens e ler as mensagens; (iv) é imenso o número de pessoas que têm aparelhos móveis e smartphones. Por isso, a campanha digital tornou-se uma estratégia eleitoral obrigatória, de primordial importância em qualquer certame político. Importante observar que a coligação representada informou à Justiça Eleitoral a criação e uso do sítio vwvw.radio45.net. A petição está arquivada em cartório.

Com relação à ausência do nome do candidato a Vice-Prefeito, da mesma forma, não vislumbro irregularidade, pois o uso do prenome lvo está atrelado à denominação dada: "Rádio lvo 45" ou "TV lvo 45”.

A coligação autora sustenta, de outra banda, a impossibilidade de a propaganda na internet ser paga.

Realmente, é vedada, nos termos do art. 57-C, caput, da Lei das Eleições.

Contudo, o que é proibido pela legislação é o pagamento pela utilização de espaço em determinada página, como por exemplo, para publicar uma mensagem ou para inserir um link.

Não há vedação, contudo, que o candidato pague pela disponibilização do serviço a determinado servidor. Tanto que os custos com a criação e inclusão de páginas na internet é previsto em lei como gastos eleitorais, que sujeitos a registro e limites (LE, art. 26, inc. XV).

Por fim, pelo que foi narrado na petição inicial, não há indicativos de que a utilização da indigitada radioweb sugira abuso de poder econômico ou dos meios de comunicação.

Com efeito, a criação da plataforma vergastada, por si só, não autoriza a dedução de que houve uso de poder financeiro, em quantidade excessiva ou de forma indevida, e tampouco dos meios de comunicação social de forma abusiva.

No que diz respeito à utilização da expressão showmícios pelos representados não implica violação à legislação eleitoral, na medida em que o que é vedado é a apresentação, remunerada ou não, de artistas com a finalidade de animar comício e reunião eleitoral (LE, art. 39, §7º).

Dito em outras palavras, o "rótulo" não altera a essência do evento.

Resumindo tudo, pelo que se extrai da petição inicial, não merece trânsito o processamento de uma Ação de Investigação Judicial Eleitoral, pois dos fatos nela narrados não decorre a conclusão de que houve a prática de abuso de poder econômico ou dos meios de comunicação e tampouco de propaganda eleitoral ilícita.

 

Como se percebe, os recorridos utilizaram na campanha, como meio de propaganda eleitoral, uma radioweb, cuja plataforma é a internet, por isso a inviabilidade da incidência das restrições legais impostas aos meios de comunicação em geral, como a televisão, rádio ou jornal.

Além disso, os recorridos informaram à Justiça Eleitoral o uso do sítio www.radio45.net, bem como declararam a despesa correspondente em sua prestação de contas.

Em relação aos "showmícios", não há, nos autos, indício de apresentação de artistas durante os comícios ou qualquer desvirtuamento dos atos de campanha. Em verdade, observa-se que os recorridos apenas utilizaram a expressão "showmício" com o intuito de valorizar e chamar atenção para seus eventos de campanha, o que, como referido em sentença, não altera a essência dos eventos.

No que se refere à imputação de ocorrência de propaganda paga na internet, em razão da manutenção da radioweb, tal gasto é lícito, conforme previsto no art. 26, inc. XV, da Lei n. 9.504/97, não se confundindo com o pagamento de taxa para publicar mensagem ou inserir link, o que realmente é vedado pela legislação.

Por fim, quanto à irregularidade da propaganda por não constar o nome do vice-prefeito, como muito bem observado pelo magistrado, o uso do prenome lvo está atrelado à denominação dada à radioweb: "Rádio lvo 45" ou "TV lvo 45”.

Dessarte, não merece reforma a decisão que indeferiu a inicial, pois os fatos narrados não se amoldam às hipóteses de ilícitos eleitorais, agindo de forma correta o juízo a quo ao abortar prematuramente a demanda.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.