RE - 44988 - Sessão: 14/06/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por ALCIDES EMÍLIO PAGANOTTO contra a sentença (fls. 259-279) do Juízo da 38ª Zona Eleitoral – sediada em Rio Pardo, a qual julgou improcedente a representação formulada em desfavor de CÁSSIO NUNES SOARES e IVAN RAFAEL TREVISAN, respectivamente prefeito e vice, eleitos no ano de 2016, ao entendimento de não haver conjunto probatório suficiente para a configuração da prática de captação ilícita de sufrágio – art. 41-A da Lei n. 9.504/97, mais especificamente, promessa de oferecimento de vantagem a eleitores em troca de votos, em duas ocasiões relatadas na peça inicial.

Resumidamente, em suas razões recursais, sustenta haver prova da prática de captação ilícita de sufrágio pelos representados. Aduz que as circunstâncias de uma eleição em pequenas localidades são diferentes dos municípios de maior porte. Refere que o juízo a quo analisou imprecisamente o contexto probatório apresentado, e sustenta que não deve haver dúvidas acerca da ocorrência de compra de votos em benefício dos recorridos, mormente se considerados os fortes vínculos pessoais entre os envolvidos – interpostas pessoas ligadas aos candidatos - que teriam abordado eleitores. Aponta para uma necessidade de interpretação extensiva da prova carreada aos autos, com suporte no comando previsto pelo art. 23 da Lei Complementar n. 64/90. Indica jurisprudência que entende pertinente ao tema e, ao final, requer a reforma da sentença, mediante o provimento do recurso, para que a representação seja julgada procedente (fls. 292-301).

Com contrarrazões, que suscitam matéria preliminar (fls. 306-319), foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, a qual opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 323-333).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo. A sentença foi publicada em 05.12.2016 no DEJERS, conforme certidão constante à fl. 281. Houve oposição de embargos de declaração na data de 08.12.2016 (fl. 283). A decisão acerca dos aclaratórios foi publicada em 12.12.2016 (fl. 289) e, na mesma data, foi interposto o recurso (fl. 292).

Preliminares

Nas contrarrazões, os recorridos Cássio e Ivan suscitam preliminares, fazendo-o, contudo, de forma genérica. Limitam-se a requerer que “todas as preliminares da contestação sejam apreciadas em sede de análise colegiada, pelas razões já expostas, evitando-se tautologia quanto ao julgamento da demanda”. A rigor, manifestam-se tão somente no que diz respeito à preliminar de alegada ilicitude da prova.

Não é possível, como requerido, a análise ampla de “todas as preliminares da contestação”, quando não foram elas devidamente apontadas na peça de contrarrazões, evidenciando-se a preclusão no tocante àquelas que não receberam argumentação minudenciada. É de lembrar que, se de fato o recurso devolve o enfrentamento de toda matéria ao Tribunal ad quem, vale ressalvar, por outro lado, que a regra é válida para as matérias de ordem pública, cujo conhecimento se dá de ofício e, afora essas, serão observados somente aqueles pontos em que as partes esgrimiram razões.

 Trata-se, acima de tudo, de uma regra de comportamento processual, a qual se encontra na base da própria natureza dialética do processo judicial – se ao magistrado incumbe fundamentar todo e qualquer item de decisão, o ônus congênere das partes reside na exposição minudente e específica daqueles pontos que, conforme a respectiva ótica, estariam a merecer a análise jurisdicional. Mais do que um proceder necessário perante o juízo, é circunstância correlata ao dever de lealdade e boa-fé entre as partes, evitando-se, assim, a disparidade de armas no decorrer da lide. Trata-se de uma cláusula geral processual, inserta no art. 5º do Código de Processo Civil.

Dessa forma, restam preclusas todas as preliminares arguidas genericamente pelos recorridos, restando apenas a preliminar de ilicitude da prova como digna de análise.

E ela não merece guarida.

Em resumo, os recorridos Cássio e Ivan entendem ter havido colheita de prova ilícita relativamente aos dois fatos narrados na peça inicial, correspondendo a dois vídeos realizados envolvendo os eleitores Juliana e Celso.

A questão da licitude da gravação ambiental como prova é, de fato, um tanto tormentosa na seara eleitoral. Não se olvida que há decisões do e. Tribunal Superior Eleitoral que restringem a utilização de tal espécie probatória para efeitos de condenação, ainda que tenha sido realizada por um dos interlocutores – e nessa linha são os precedentes trazidos nas contrarrazões, datados do ano de 2014.

Registro apenas que, antes disso, mormente nos anos de 2009 a 2012, o e. Tribunal Superior Eleitoral, de forma majoritária, construía precedentes pela licitude da gravação ambiental.

Mais importante: recentemente, há um novo movimento daquela Corte Superior, no sentido de analisar determinadas circunstâncias do caso concreto e, tendo elas presentes, admitir como prova a gravação ambiental realizada, por exemplo, em lugares públicos, o que teve início no REspe 637-61/MG, Rel. Ministro Henrique Neves, DJE de 21.5.2015, quando se decidiu, conforme ementa que segue: 

RECURSOS ESPECIAIS. AÇÃO CAUTELAR. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DO PODER ECONÔMICO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO.

Recurso especial da Coligação Cuidando de Nossa Cidade para Você.

1. Na linha do entendimento majoritário, a eventual rejeição de um fundamento suscitado no recurso eleitoral não torna o recorrente parte vencida. O interesse recursal, que pressupõe o binômio necessidade/utilidade, deve ser verificado a partir do dispositivo do julgado. Precedentes: REspe nº 185-26, rel. Min. Dias Toffoli, DJE de 14.8.2013; REspe nº 35.395, rel. Min. Arnaldo Versiani, DJE de 2.6.2009.

2. Se a Corte de origem concluiu que as provas documentais e testemunhais seriam inservíveis e pouco esclarecedoras em relação à segunda conduta imputada na AIJE, a revisão de tal entendimento demandaria o reexame de fatos e provas, providência vedada em sede de recurso especial, a teor das Súmulas 279 do Supremo Tribunal Federal e 7 do Superior Tribunal de Justiça.

Recurso especial não conhecido.

Recurso especial e ação cautelar de Francisco Lourenço de Carvalho.

1. "A contradição que autoriza a oposição dos declaratórios é a existência no acórdão embargado de proposições inconciliáveis entre si, jamais com a lei nem com o entendimento da parte" (ED-RHC nº 127-81, rel. Min. Laurita Vaz, DJE de 2.8.2013).

2. Nos termos da atual jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a gravação ambiental realizada por um dos interlocutores, sem o conhecimento de um deles e sem prévia autorização judicial, é prova ilícita e não se presta à comprovação do ilícito eleitoral, porquanto é violadora da intimidade. Precedentes: REspe nº 344-26, rel. Min. Marco Aurélio, DJE de 28.11.2012; AgRRO nº 2614-70, rel. Min. Luciana Lóssio, DJE de 7.4.2014; REspe nº 577-90, rel. Min. Henrique Neves, DJE de 5.5.2014; AgRRespe nº 924-40, rel. Min. João Otávio de Noronha, DJE de 21.10.2014.

3. As circunstâncias registradas pela Corte de origem indicam que o discurso objeto da gravação se deu em espaço aberto dependências comuns de hotel, sem o resguardo do sigilo por parte do próprio candidato, organizador da reunião. Ausência de ofensa ao direito de privacidade na espécie, sendo lícita, portanto, a prova colhida.

4. O quadro fático delineado no acórdão regional não revela a mera tentativa de obtenção de apoio político, pois, em diversas passagens, o que se vê são os pedidos expressos de voto e o oferecimento de vantagem aos estudantes. Incidência, na espécie, das Súmulas 279 do Supremo Tribunal Federal e 7 do Superior Tribunal de Justiça.

5. Ação cautelar proposta com o objetivo de conferir efeito suspensivo ao recurso especial julgada improcedente.

Recurso especial conhecido e desprovido. Ação cautelar julgada improcedente.

O Tribunal, por maioria, desproveu o recurso de Francisco Lourenço de Carvalho, nos termos do voto do Relator. Vencida a Ministra Luciana Lóssio.

Ao caso dos autos: as gravações foram realizadas pelos próprios eleitores, como segue:

(a) Juliana de Souza Ribeiro, destinatária da ligação, via a utilização de um aplicativo de seu telefone celular, durante ligação efetuada por Éwerton Luís Correa dos Santos, Secretário-Geral da agremiação dos então candidatos Cássio e Ivan; e

(b) Celso Jaques Barbosa, o qual se encaminhou a estabelecimento comercial para a retirada de suposto benefício (cesta de alimentos, “rancho”) que teria sido prometido por Luís Ricardo Pinho de Moura, vulgo “Chiquinho”, vereador licenciado e correligionário dos então candidatos Cássio e Ivan. A situação foi, também, filmada pelo lado de fora do supermercado, com a aquiescência do eleitor Celso.

Nessas circunstâncias, e na esteira da posição defendida pelo d. Procurador Regional Eleitoral, penso que a prova, na espécie, é lícita. Em primeiro lugar, não houve malferimento à intimidade de Éwerton, pois a ligação partiu dele para a eleitora Juliana – ou seja, a iniciativa de contato não foi da eleitora, sendo permitido a esta realizar a gravação com o fito de salvaguardar-se, proteger-se de eventual proposta ilícita.

E, no caso do fato relativo a Celso, também o eleitor foi o realizador da gravação, somando-se o local da gravação – supermercado –, que não pode ser considerado como pertencente à esfera da vida privada de qualquer dos envolvidos.

Em termos similares, note-se julgado do TSE do ano de 2016, no qual restou assentado, ainda que em apertada maioria (quatro votos a três), que a prova devia ser considerada ilícita contra o prefeito, mas não contra os eleitores que venderam os votos, uma vez que a gravação ocorrera na residência do ocupante do cargo eletivo, violando-se a sua intimidade (HC 44.405, relator designado Ministro Gilmar Mendes, julgado em 01.3.2016). Naquela ocasião, os eleitores se dirigiram à casa do então candidato à reeleição, tomando a iniciativa da prática do ilícito. O caso era ainda mais extremo, e o TSE decidiu que, ainda que em ambiente privado, a prova há de ser considerada lícita relativamente àquele que teve a iniciativa da gravação:

ELEIÇÕES 2012. HABEAS CORPUS. CRIME DE CORRUPÇÃO ELEITORAL. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL. GRAVAÇÃO AMBIENTAL REALIZADA PELOS ELEITORES QUE VENDERAM O VOTO. LICITUDE DA PROVA.

1. A gravação ambiental que registra o crime de corrupção, quando realizada pelos próprios eleitores que venderam o voto, pode ser utilizada contra eles no processo penal. Do contrário, a eles seria permitido aproveitar-se da ilicitude a que deram causa.

2. A gravação ambiental não viola a privacidade e intimidade de quem teve a iniciativa da diligência.

3. É irrelevante que a gravação ambiental tenha sido considerada ilícita em relação ao prefeito em ações eleitorais julgadas por esta Corte.

4. Ordem denegada.

O Tribunal, por maioria, denegou a ordem, nos termos do voto do Ministro Gilmar Mendes, que redigirá o acórdão. Vencida a Ministra Maria Thereza de Assis Moura e os Ministros Herman Benjamin e Henrique Neves da Silva.

(HC - Habeas Corpus n. 444-05/PI. Ac. de 01.3.2016, Rel. Min. Maria Thereza Rocha de Assis Moura, Relator designado Min. Gilmar Ferreira Mendes, DJE de 05.5.2016.)

O mesmo raciocínio é de ser aplicado ao caso dos autos. Não vejo como, na situação posta, a intimidade de Éwerton possa ter sido devassada – ao contrário, apenas a esfera privada da eleitora Juliana é que foi adentrada. Veja-se, ainda que hipoteticamente, que quem deu causa ao telefonema foi Éwerton, não podendo daí resultar ilícita a prova colhida, pois a gravação ambiental não viola a privacidade de quem teve a iniciativa da diligência.

E, no caso do eleitor Celso, o ambiente da gravação é público, como já ressaltado.

Afasto, nesses termos, a preliminar suscitada.

 

Mérito

Na questão de fundo, cinge-se a controvérsia à questão da caracterização de captação ilícita de sufrágio, mediante oferecimento de vantagem a eleitores em troca de votos, em dois fatos.

E, adianto, a questão diz com a valoração da prova dos autos.

O juízo monocrático entendeu não haver prova segura acerca dos fatos imputados aos representados na inicial, posição compartilhada pelo Ministério Público Eleitoral, naquela origem, e pela Procuradoria Regional Eleitoral, nesta instância.

Em resumo, os fatos são os seguintes:

1) Juliana de Souza Ribeiro teria recebido telefonema de Éwerton Luís Correa dos Santos, Secretário-Geral do Partido Progressista de Pantano Grande, em seu telefone celular. Éwerton teria oferecido uma ajuda para a eleitora “não jogar o voto fora”: R$ 100,00 em vale em um supermercado, mais R$ 100,00 em dinheiro, uma vez que ela havia, precedentemente, declarado em uma rede social que votaria em branco.

2) Celso Jaques Barbosa teria “ficado sabendo”, por terceiro, que estava a ocorrer a distribuição de cestas básicas pelo partido político dos recorridos, identificados pelo n. 11. Reuniu-se, então, com Luís Ricardo Pinho de Moura, “Chiquinho”, vereador licenciado e aliado político de Cássio e Ivan, em uma sala reservada, oportunidade na qual teria recebido um botton e sido orientado a se dirigir ao Supermercado Kroth, para receber o já referido “rancho”.

À análise, iniciando-se pela caracterização hipotética dos fatos narrados, sob o prisma do ordenamento normativo posto.

A caracterização legal das condutas apontadas como irregulares versa acerca da infração eleitoral prevista no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, que assim dispõe: 

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinquenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar nº 64 de 18 de maio de 1990.

Já na doutrina, a obra especializada de Francisco de Assis Vieira Sanseverino (Compra de votos – Análise à luz dos princípios democráticos. Porto Alegre: Ed. Verbo Jurídico, 2007, p. 274) traz a lição de que o art. 41-A da Lei n. 9.504/97 busca proteger, forma ampla, a normalidade e a legitimidade das eleições e, modo estrito, (1) o direito do eleitor de votar livremente, e (2) a igualdade de oportunidades entre os competidores eleitorais.

Além, a ocorrência de captação ilícita de sufrágio há de ser antecedida por, ao menos, três elementos, segundo pacífica posição do Tribunal Superior Eleitoral: (1) a prática de uma conduta (doar, oferecer, prometer); (2) a existência de uma pessoa física (eleitor); (3) o resultado a que se propõe o agente (o fim de obter o voto).

Assim, para a configuração da hipótese do art. 41-A da Lei n. 9.504/97, necessária a conjugação dos elementos subjetivos e objetivos que envolvem uma situação concreta.

Delineados os parâmetros legais, teóricos e jurisprudenciais concernentes à caracterização da captação ilícita de sufrágio, passa-se aos elementos fáticos do caso sob análise.

E, examinados os autos, entendo não haver comprovação das imputadas captações ilícitas de sufrágio, colhendo da fundamentação da sentença a análise da prova produzida, a qual evidencia ampla e claramente a inconsistência probatória para a condenação dos representados (fls. 267-278). Saliento a necessidade em realizar a longa transcrição, por elucidativa e absolutamente irretocável, consignando, desde já, que adoto o trecho como razões de decidir: 

[...]

Dito isso, passo ao exame da prova dos autos.

São dois os fatos imputados aos Representados, que devem, então, ser examinados de forma separada.

2.1. Captação Ilícita de Sufrágio - fato envolvendo a eleitora JULIANA DE SOUZA RIBEIRO

O primeiro fato imputado envolveria JULIANA DE SOUZA RIBEIRO, que é eleitora de PANTANO GRANDE (fls. 21/22 e 183).

De acordo com a petição inicial, a captação ilícita de sufrágio ocorreu por interposta pessoa, no caso, EWERTON LUIS CORREA DOS SANTOS, que seria o Secretário-Geral do PARTIDO PROGRESSISTA.

EWERTON LUIS CORREA DOS SANTOS é filiado ao PARTIDO PROGRESSISTA - partido ao qual pertence o Representado CÁSSIO NUNES SOARES (fl. 51).

A atuação efetiva de EWERTON LUIS CORREA DOS SANTOS na campanha dos Representados está comprovada por páginas retiradas da Rede Social Facebook (fls. 54/60), tendo este se denominado Secretário-Geral do Partido Progressista.

Pois bem.

A degravação da conversa mantida entre EWERTON LUIS CORREA DOS SANTOS e JULIANA SOUZA RIBEIRO está feita às fls. 206/207.

Desta degravação, percebe-se que a eleitora JULIANA teria feito uma postagem dizendo que não tem voto para vereador, e que EWERTON entra em contato dizendo que fazia parte do partido, e que não queriam deixar ninguém na mão. Nisso, afirma para JULIANA dizer o que precisa que “a gente dá -... - eu, eu dou um jeito. Eu falo com eles e... e, mas não bota fora teu voto” (fl. 206). JULIANA então reclama que são 04 votos em sua casa, e procurou várias pessoas para ver se conseguia ajuda e nada, dizendo, então, que votaria em branco (fl. 206). Nisso, EWERTON diz que faz parte do partido, assim como CARLÃO. JULIANA, então, diz que pode ser oferecido um rancho, não precisando ser dinheiro. EWERTON então pede para ninguém ficar sabendo, porque o pessoal acharia que seria compra de voto, no que JULIANA diz que não é compra de voto (fl. 206).

Após, na segunda ligação, EWERTON diz que quem iria lhe ajudar seria FABIANO NAPAR. Afirmou que lhe seria entregue R$ 100,00 de vale para comprar no KROTH, mas R$ 100,00 em dinheiro, para fazer o que quiser (fl. 207).

Há referência nestas duas conversas a três pessoas, a saber, (i.) CARLÃO da UNICAL, (ii.) FABIANO NAPAR e (iii.) KROTH.

CARLÃO DA UNICAL seria CARLOS ALBERTO TREVISAN, que também é filiado ao Partido Progressista (fl. 81), e casado com a candidata a vereadora EVANIA TREVISAN (fl. 82).

Já FABIANO NAPAR também é filiado ao Partido Progressista, tendo se candidatado como Vereador neste pleito (fl. 72).

E KROTH seria ERENEU WILLIBALDO KROTH, que também é filiado ao Partido Progressista (fl. 84), dedicando-se à atividade empresarial no Supermercado Kroth, situado no Município de Pantano Grande (fls. 85/86).

Lendo a degravação, percebe-se que há, sim, nítido oferecimento de vantagens por EWERTON LUIS CORREA DOS SANTOS à eleitora JULIANA SOUZA RIBEIRO para captar-lhe o voto.

Porém, da conversa degravada, não há referência aos Representados.

Pelo contrário: a menção foi feita em relação a um candidato a vereador “FABIANO NAPAR - que, de acordo com EWERTON, seria a pessoa que entregaria as vantagens que a eleitora receberia (fl.207).

Cumpre, então, expor a prova oral produzida em Juízo.

JULIANA RIBEIRO MARQUES esclareceu que este é seu nome de casada, sendo o nome de solteira JULIANA DE SOUZA RIBEIRO. Relatou ter feito uma postagem no Facebook. Depois da postagem, recebeu uma ligação de EWERTON, que perguntou o que estava precisando, pois era do Partido 11 (tempo de gravação 2:00). Era para dizer o que estava precisando, pois ia conseguir (tempo de gravação 2:14). Depois, ficou de ligar para dizer se ia conseguir algo com o CARLÃO. Não sabe dizer se CARLÃO tem filiação partidária. Após, EWERTON retornou, dizendo que quem iria lhe ajudar era FABIANO NAPAR, que iria lhe procurar e que o cara liberou R$ 100,00 em vale no mercado Kroth e R$ 100,00 em dinheiro. EWERTON que iria lhe procurar (tempo de gravação  3:50). Isso efetivamente aconteceu. No sábado antes da eleição, EWERTON lhe procurou com R$ 100,00 e um papel, que tinha a foto do Prefeito e do Vice-Prefeito, além de alguma coisa escrita que não prestou atenção (tempo de gravação 4:40). Ao entregar o dinheiro, EWERTON disse que era para votar no 11. FABIANO não entrou em contato com a testemunha (tempo de gravação 5:00). Na outra eleição, FABIANO lhe deu R$ 250,00 para fazer uma tomografia (tempo de gravação 6:30). EWERTON não fez pedido de votos para vereador, só pediu votos para o Partido (tempo de gravação 7:10). Negou ter relação com EWERTON antes do fato, mas depois disse que já formatou o seu computador duas vezes (tempo de gravação 7:40). Uma amiga sua que votou no 14 ouviu os áudios e SAUL foi até sua casa e resolveu fazer justiça (tempo de gravação 8:20). Confirmou que ofereceu seu marido para fiscalizar a movimentação do 14 na Vila, pois o 11 estava pagando para isso. Não denunciou até SAUL lhe procurar (tempo de gravação 9:33). CÁSSIO e IVAN não lhe ligaram (tempo de gravação 9:40). Sua filha viu receber o dinheiro, inclusive EWERTON queria comprar o voto dela também (tempo de gravação 11:00). Não tinha nada escrito no vale, bastava chegar no Supermercado e dizer que estava liberado, não recebeu nada por escrito (tempo de gravação 12:15). Tinha que chegar no Supermercado e falar com a dona (tempo de gravação 12:58). Tem um aplicativo no celular porque sua filha foi ameaçada (tempo de gravação 14:15). EWERTON não falou por ordem do candidato, mas pelo partido (tempo de gravação 15:08).

Exposta a prova, passo a analisá-la.

Como já dito, houve comprovação efetiva de tentativa de captação ilícita por parte de EWERTON LUIS CORREA DOS SANTOS em face de JULIANA DE SOUZA RIBEIRO.

Contudo, prova alguma aportou de que esta captação contou com a anuência ou ciência dos Representados.

Pelo contrário: a menção feita na degravação juntada aos autos é a FABIANO NAPAR, que era candidato a vereador (fls. 72 e 207).

Assim, apenas em Juízo há referência, pela eleitora, de que EWERTON LUIS CORREA DOS SANTOS lhe pediu votos para o cargo de Prefeito em troca das vantagens que lhe foram entregues.

Quando questionada se EWERTON LUIS CORREA DOS SANTOS estaria agindo por ordem dos candidatos a Prefeito e Vice-Prefeito, a eleitora respondeu negativamente.

Assim, o que existe nos autos é (i.) uma escuta telefônica na qual não há menção, nem direta, nem indireta, aos candidatos a Prefeito e Vice-Prefeito, e (ii.) o testemunho de JULIANA DE SOUZA RIBEIRO em Juízo, no qual a eleitora confirma que o pedido feito por EWERTON LUIS CORREA DOS SANTOS foi de voto ao Prefeito, mas não por ordem deste ou em nome deste.

Dito isso, há de se fazer as seguintes ponderações.

Segundo o art. 368-A do Código Eleitoral, “Art. 368-A. A prova testemunhal singular, quando exclusiva, não será aceita nos processos que possam levar à perda do mandato”.

Assim, de acordo com a Lei, a prova testemunhal não pode fundamentar o julgamento de processo que pode levar à perda do mandato.

Este é exatamente o caso dos autos, já que a escuta telefônica não demonstra, nem de forma indiciária, (i.) a ciência ou anuência dos Representados à conduta desenvolvida por EWERTON LUIS CORREA DOS SANTOS, e (ii.) o efetivo pedido de voto, mesmo que implícito, em favor destes candidatos.

Não se pode, tal como quer fazer crer o Representante, que a mera ligação politica entre EWERTON LUIS CORREA DOS SANTOS e os Representados seja prova efetiva de participação destes no ato ilícito praticado por este.

Isso porque, tal como dito anteriormente, deve haver prova robusta de ciência e anuência do candidato que comete a captação ilícita de sufrágio por interposta pessoa.

Sem esta prova - e para tanto não basta mera afinidade política entre a interposta pessoa e os candidatos - não há como afirmar provada a conduta imputada aos Representados, sob pena de consagração da responsabilidade objetiva (o que vai de encontro à previsão legal).

Nesse sentido, em situação muito similar à dos autos, cito a decisão do RESpe nº 144/MS, Tribunal Superior Eleitoral, Relator o Min. Henrique Neves da Silva, DJ de 15.08.2014, de seguinte ementa:

'ELEIÇÕES 2012. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. TESTEMUNHA. ÍNDIGENA. INTEGRAÇÃO. REGIME TUTELAR. CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO. PROVA. RELEVÂNCIA. ESCRITURA DECLARATÓRIA. VALOR PROBANTE. PROVA. INSUFICIÊNCIA. CASSAÇÃO. REFORMA.

1. Não há nulidade na oitiva de testemunha indígena sem o representante da FUNAI, quando o índio está integrado à comunhão nacional e possui, inclusive, título de eleitor. Não incide, nesta hipótese, o caput do art. 8º da Lei nº 6.001/73, pois caracterizada a exceção prevista no parágrafo único do referido dispositivo.

2. O indeferimento da produção de provas consideradas irrelevantes não caracteriza cerceamento de defesa, especialmente quando a relevância não é demonstrada nas razões recursais.

3. Escrituras declaratórias subscritas por eleitores que afirmam a captação ilícita de votos, além de serem produzidas de forma unilateral e sem observância do contraditório, podem servir, no máximo, para justificar a propositura de ação eleitoral, mas não são, em si, prova suficiente para embasar uma condenação.

4. Depoimentos colhidos sem a observância do contraditório, escrituras unilaterais e quatro depoimentos prestados em juízo sem a tomada de compromisso em razão da parcialidade dos informantes não são provas incontestes e suficientes para se chegar à cassação do mandato. Precedentes.

5. A desnecessidade de comprovação da ação direta do candidato para a caracterização da hipótese prevista no art. 41-A da Lei nº 9.504/97 não significa dizer que a sua participação mediata não tenha que ser provada. Por se tratar de situação em que a ação ou anuência se dá pela via reflexa, é essencial que a prova demonstre claramente a participação indireta, ou, ao menos, a anuência do candidato em relação aos fatos apurados.

6. A afinidade política ou a simples condição de correligionária não podem acarretar automaticamente a corresponsabilidade do candidato pela prática da captação ilícita de sufrágio, sob pena de se transmudar a responsabilidade subjetiva em objetiva.

Recursos especiais providos para reformar o acórdão regional.'

Apenas reforço que, ao contrário do afirmado pela eleitora JULIANA SOUZA RIBEIRO, ERENEU WILLIBALDO KROTH negou ter entregue um rancho a esta em troca de votos, o que inclusive põe em dúvida a efetiva comercialização de voto tendo por troca um vale no referido mercado.

Por todo o exposto, o julgamento de improcedência da representação em relação a este fato é medida que se impõe.

2.2. Captação Ilícita de Sufrágio - fato envolvendo o eleitor CELSO JAQUES BARBOSA

O segundo fato envolveria CELSO JAQUES BARBOSA, que é eleitor de PANTANO GRANDE (fls. 43 e 181).

De acordo com a petição inicial, a captação ilícita de sufrágio ocorreu por interposta pessoa, no caso, LUIS RICARDO PINHO DE MOURA.

LUIS RICARDO PINHO DE MOURA exerceu, desde 2013, o cargo de Secretário Municipal de Educação e Cultura em Pantano Grande (fl. 105), tendo firmado ata como representante da COLIGAÇÃO MAIS POR PANTANO GRANDE em 28.09.2016 (fl. 106).

Foram juntados quatro arquivos de vídeo à fl. 153.

No primeiro vídeo, exibe-se o adesivo que a coligação teria entregue ao eleitor - o qual está juntado à fl. 204. Após, indaga-se CELSO JAQUES BARBOSA quem lhe deu o rancho, no que respondeu que teria sido dado por – CHIQUINHO - para retirar no ERENEU.

No segundo vídeo, está-se em via pública. Após, uma pessoa está trafegando com um carro. Dois indivíduos conversam entre si. Visualiza-se, ao tempo 2:13, uma pessoa anunciando que uma pessoa estava retirando um rancho que a Coligação 11 ofertou por compra de votos.

No terceiro vídeo, o anúncio de retirada de rancho que a Coligação 11 teria ofertado é reproduzido sob outro ângulo, visualizando-se duas sacolas amarelas no chão (tempo de gravação 0:07). A pessoa que grava disse que um táxi pegaria o eleitor.

No quarto vídeo, filma-se o rancho que o eleitor teria recebido (tempo de gravação 0:11).

Há, ainda, dois arquivos de áudio.

A degravação deste primeiro áudio está à fl. 208, identificado como item 3.

Nesta conversa, ouve-se CELSO dizendo que ia pegar um rancho, pois ontem teria se atrasado.

O segundo áudio tem degravação feita à fl. 208, identificado como item 4.

Nesta conversa, CELSO pede um número de táxi e sugere JIBOIA (fl. 208). Nisso, CELSO fala que veio pegar o rancho, pois ontem não teria dado tempo, já que o CHIQUINHO liberou (fl. 208).

Há referência, nesta conversa, a JIBOIA.

Este apelido pertenceria a ALEXANDRE TEIXEIRA DE FREITAS (fl. 08), o qual também é filiado ao Partido Progressista (fl. 94).

Ademais, o adesivo que aparece no primeiro vídeo tem dois nomes anotados no seu verso, a saber, LUIS RICARDO PINHO DE MOURA e LUCAS BARBOSA DA SILVA.

Este LUCAS BARBOSA DA SILVA, de acordo com a petição inicial, seria filho de CELSO JAQUES BARBOSA (fl. 08).

Porém, o documento que apontou para comprovar a filiação aponta nome ligeiramente diverso - LUCAS WILLIAN DA SILVA BARBOSA (fl. 48).

Cumpre, então, expor a prova oral produzida em Juízo.

CELSO JAQUES BARBOSA disse que recebeu um sacolão de CHIQUINHO, que era presidente do Comitê (tempo de gravação 1:50). Um amigo seu lhe falou que eles não davam dinheiro, mas liberavam sacolão. Foi se encontrar com CHIQUINHO no Comitê. Tinha um pessoal que ia fazer passeata. Após, mandou entrar em uma sala. Nisso, CHIQUINHO disse que não precisava votar em vereador, mas precisava votar no Cássio. CHIQUINHO entregou um santinho com o nome dele para retirar o sacolão no mercado. Não tinha mais o nome de ninguém. Foi CHIQUINHO quem botou o nome (tempo de gravação 3:14). Foi, então, para o mercado de ERENEU. Chegou no mercado e tinha dois na sua frente. Tinha outros dois pegando sacolão (tempo de gravação 3:50). Indagado sobre quem seria LUCAS BARBOSA DA SILVA, disse que não é seu filho, mas uma pessoa da vila (tempo de gravação 6:35). Esteve no comitê do 11 uma única vez (tempo de gravação 7:20). Quando foi falar com CHIQUINHO, o pessoal estava pegando bandeira para ir ao centro, fazer carreata (tempo de gravação 7:50). Negou ter pedido para chamar JIBOIA, disse que foi ERENEU quem chamou (tempo de gravação 8:55). Foi pegar no mesmo dia o sacolão que foi liberado por CHIQUINHO (tempo de gravação 9:40). Disse que sempre votou no 14. Pediram para colocar um celular no bolso para fazer a filmagem (tempo de gravação 11:20). LUCAS era seu vizinho. Como estava desempregado e recebeu um sacolão, deu um para ele (tempo de gravação 12:10). Quem botou o nome de LUCAS foi CHIQUINHO (tempo de gravação 13:00). Não fez gravação da conversa com LUIS RICARDO (tempo de gravação 14:27). Pegou o adesivo e foi ter contato com o pessoal do Partido de PAGANOTTO. Depois, todos foram ao Supermercado (tempo de gravação 14:54). Negou ter um filho chamado LUCAS (tempo de gravação 16:55). CHIQUINHO lhe pediu para votar no CÁSSIO, não importava se votasse em vereador. Negou, porém, que CHIQUINHO tenha dito que estava agindo em nome do Prefeito (tempo de gravação 20:35).

ÊNIO JOSÉ PAGANOTTO JÚNIOR foi ouvido como informante, por ser irmão do Representante. Disse que na sexta-feira antes da eleição, foi procurado por militantes da campanha, que tinha um senhor, de apelido SABUJA, que informou que teria um bóton para retirar rancho no KROTH. Indagou ao eleitor, sendo que ele disse ter recebido do Professor CHIQUINHO, pegando no Comitê da Eleição, para retirar um rancho no mercado do ERENEU, e que deveria votar no CÁSSIO para Prefeito (tempo de gravação 2:20). Perguntou a CELSO se poderia acompanhar a retirada, e os vídeos comprovam o resto. Pegou um amigo e ficou gravando de fora. O celular colocou no bolso de CELSO para gravar o áudio (tempo de gravação ¿ 3:00). Confirmou que o apelido de CELSO é SABUJA. Não fez promessa de benefício em seu nome ou de ou trem para CELSO (tempo de gravação 5:00).

THOMAS RAABE MEGLIN foi ouvido como informante por ser filiado ao PTB, partido do Representante. Disse que chegou no Comitê e ÊNIO lhe pediu ajuda, pois um eleitor tinha um vale para retirar no mercado, que seria CHICO que teria repassado. ÊNIO lhe pediu para pegar um carro diferente, pois seus carros são conhecidos. Foi lá e filmou (tempo de gravação 1:55). Conversou muito pouco com SABUJA, quem conversou mesmo com ele é ÊNIO (tempo de gravação 2:10). Filmaram a entrada de CELSO no mercado. Na volta, parou em outro ângulo e filmaram CELSO saindo do mercado com o rancho recebido (tempo de gravação 3:10). Sabe que FABIANO NAPAR foi candidato na outra campanha, já teve processo de compra de votos (tempo de gravação 4:10). FABIANO era chefe de gabinete do Prefeito (tempo de gravação 4:37). EWERTON fez campanha na eleição, intitulando-se secretário-geral do PP (tempo de gravação 6:30). Confirmou que fez arrecadação para custear as despesas do processo (tempo de gravação 8:39).

ERENEU WILLIBALDO KROTH foi ouvido como informante, por ser filiado ao PP, partido dos Representados. Disse que CÁSSIO é seu cliente, e que ALCIDES já frequentou seu estabelecimento, por ser Pantano uma cidade pequena (tempo de gravação 1:20). Disse que CELSO fez as compras na sexta e pegou no sábado. CELSO pediu para chamar o taxista JIBOIA, mas disse que ia chamar o táxi de JOÃO, que trabalha na Rodoviária. Aí, abriram a sacola no chão na frente de seu estabelecimento (tempo de gravação 2:40). LUIS RICARDO PINHO DE MOURA não foi pagar o rancho. CELSO comprou o rancho, pagando em dinheiro, na sexta-feira. Deixou a sacola na sexta-feira, dizendo que ia dar uma volta (tempo de gravação 4:00). Disse que todo mundo entrava com bóton (tempo de gravação 5:00). Negou que CHICO ou CÁSSIO tenha autorizado outras pessoas a pegar rancho. Negou ter entregue rancho para JULIANA em troca de votos (tempo de gravação 5:30). Não tem circuito interno no estabelecimento (tempo de gravação 7:10). Sabe que não tinha produto perecível pois não havia nada guardado na câmara (tempo de gravação 8:20). Não fez campanha, nem tem carro adesivado, pois depende de todos (tempo de gravação 10:00). Confirmou que LUIS RICARDO foi Secretário de Educação (tempo de gravação 11:20).

Exposta a prova, passo a analisá-la.

A prova produzida não demonstra, nem de forma indiciária, a vinculação entre os Representados e a conduta que lhes foi imputada.

A um, porque não houve gravação da conversa que teria sido mantida entre CELSO JAQUES BARBOSA e LUIS RICARDO PINHO DE MOURA, havendo, neste ponto, apenas o relato, em Juízo, de CELSO, que afirmou que LUIS RICARDO (de alcunha “Chiquinho”) lhe ofertou a troca de voto por rancho (sacolão) que seria entregue no Supermercado Kroth, situação que levaria à incidência do art. 368-A do Código Eleitoral ao caso, que impede a prova testemunhal como o elemento de prova exclusivo a levar à cassação do mandato.

A dois, porque tal como referido anteriormente, o testemunho de CELSO JAQUES BARBOSA apenas implicaria a participação de correligionário dos Representados (LUIS RICARDO PINHO DE MOURA), sem demonstrar, nem de forma indiciária, a anuência ou a ciência destes com a conduta supostamente praticada por este.

A três, porque o que constituiria prova material do fato - um bóton do Partido 11 que estaria grifado com o nome de LUIS RICARDO PINHO DE MOURA e LUCAS BARBOSA DA SILVA - não comprova a troca do voto.

Pelo contrário: note-se que, como comprovou a prova oral produzida em Juízo, LUCAS BARBOSA DA SILVA, ao contrário do afirmado na petição inicial, não é filho de CELSO JAQUES BARBOSA, mas sim um conhecido seu da vila.

Além disso, há, neste ponto, uma suposta divergência no que seria o suposto modus operandi dos Representados.

Ao passo que JULIANA SOUZA RIBEIRO disse que não recebeu vale físico para trocar por rancho, bastando conversar com a dona do Supermercado Kroth, CELSO JAQUES BARBOSA teria recebido este bóton identificador do partido.

Ora, é absolutamente improvável que o suposto partícipe deste esquema ¿ no caso, ERENEU WILLIBALDO KROTH - não iria reter o comprovante de troca da mercadoria por voto, pois, do contrário, como iria cobrar o valor que receberia de quem prometeu pagar no lugar do eleitor?

Trata-se, assim, o documento de fl. 204 de prova absolutamente imprestável a comprovar a captação ilícita de sufrágio, inclusive porque se trata de material de campanha que poderia ser facilmente adulterado por qualquer campanha adversária.

A quatro, porque ERENEU WILLIBALDO KROTH negou ter entregue o rancho em troca de votos, referindo que a compra de CELSO JAQUES BARBOSA fora efetivada um dia antes da entrega do rancho (fato que guarda verossimilhança, diante da degravação feita à fl. 208.

A cinco, porque os vídeos juntados aos autos apenas comprovam a ida de CELSO JAQUES BARBOSA ao mercado com a retirada de duas sacolas, mas não demonstram, nem de forma indiciária, que estas sacolas foram entregues em troca de votos, e muito menos que os Representados tivessem ciência ou anuência à conduta de captação ilícita de sufrágio.

A seis, porque o próprio CELSO JAQUES BARBOSA referiu sua preferência eleitoral com o Partido do Representante, o que, no mínimo, põe em dúvida a credibilidade de seu relato.

Logo, por todas estas razões, resta evidente que a prova produzida também em relação a este fato é absolutamente frágil para pretender a responsabilização dos Representados.

O julgamento de improcedência da representação também em relação a este fato é medida que se impõe.

2.3. Conclusão

Pelo exposto, não se desincumbiu o Representante de comprovar que os Representados tenham incorrido, direta ou indiretamente, nas condutas de captação ilícita de sufrágio com relação aos dois fatos que imputou ao Prefeito e Vice-Prefeito eleitos em Pantano Grande na presente representação.

O julgamento de improcedência da representação, então, é medida que se impõe.

Apenas ressalvo, porém, que não é caso de imposição de litigância de má-fé ao Representante, tal como postulado pelos Representados (fl. 180, item 12.3.)

Isso porque o exercício do direito de ação não pode ser enquadrado como conduta processualmente ímproba, ao efeito de sancionar a parte com as cominações da litigância de má-fé.

Assim, ressalvadas as hipóteses do art. 80 do CPC, que devem ser interpretadas de forma restritiva, não há falar em imposição da sanção por improbidade processual.

E não estão presentes quaisquer das hipóteses do art. 80 do CPC no caso dos autos.

3. Dispositivo

Ante o exposto, (i.) mantenho a decisão de fls. 183/188, que rejeitou as preliminares (a) de falta de pressuposto processual, (b) de inadequação da via eleita, (c) de prova ilícita, (d) de ilegitimidade passiva e (e) de cerceamento de defesa, e, no mérito, (ii.) JULGO IMPROCEDENTE A REPRESENTAÇÃO por captação ilícita de sufrágio proposta por ALCIDES EMILIO PAGANOTTO contra CÁSSIO NUNES SOARES e IVAN RAFAEL TREVISAN.

Como base no acima transcrito, e em opinião que compartilho com o d. Procurador Regional Eleitoral, a análise da prova realizada pelo juízo de origem é impecável, esmiuçada e atenta, não sendo possível extrair dos autos outra conclusão que não seja a de insuficiência de provas para a condenação de Cássio Nunes Soares e Ivan Rafael Trevisan.

Nesse passo é a pacífica jurisprudência do TSE acerca da necessidade da existência da demonstração cabal do ilícito visando a fundamentar juízo condenatório, conforme retratado em acórdão do TSE, assim ementado:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2006. DEPUTADO ESTADUAL.

REPRESENTAÇÃO. ART. 41-A DA LEI Nº 9.504/97. PROCEDÊNCIA. CASSAÇÃO. MANDATO.

AUSÊNCIA DE PROVA CABAL. CONDENAÇÃO AFASTADA. AGRAVO DESPROVIDO.

1. Para a configuração da captação de sufrágio, malgrado não se exija a comprovação da potencialidade lesiva, é necessário que exista prova cabal da conduta ilícita, o que, no caso em exame, não ocorre.

2. Na linha dos precedentes desta Corte Superior, não são admitidos como prova depoimentos colhidos em inquérito policial sem observância do contraditório e da ampla defesa.

3. O conteúdo probatório dos autos é insuficiente para comprovar a captação ilícita de sufrágio.

4. Recurso ordinário provido para afastar a condenação imposta ao recorrente.

Agravo Regimental desprovido.

(Agravo Regimental no Recurso Ordinário n. 3293827.94.2006.6.06.0000/CE, Rel. Ministro Marcelo Ribeiro, Ac. de 24.4.12, Agravante: MPE, Agravado: Francisco Leite Guimarães Nunes.) (Grifei.)

Ademais, como bem referiu o douto Procurador Regional Eleitoral, não há nos autos prova segura de que tenha havido, efetivamente, a participação ou anuência dos candidatos no que diz respeito a eventuais oferecimentos de vantagens a eleitores em troca dos votos, o que não permite a condenação do representado ao ilícito eleitoral previsto no art. 41-A da Lei das Eleições, de forma que, para evitar tautologia, adoto os seguintes trechos, expressamente, como razões de decidir (fls. 327, 332v. e 333): 

Do compulsar dos autos, em que pese o inconformismo do representante, tem-se que a sentença não está sujeita a sofrer reparos nesta instância recursal. Primeiramente, cumpre salientar que a legislação que disciplina a matéria eleitoral tende a ponderar e conciliar os princípios da liberdade e da legalidade, tendo em vista o interesse público e social acerca do pleito eleitoral. E, por isso, vigora o princípio da isonomia, o qual pressupõe igualdade – pelo menos, no seu aspecto formal – de oportunidade entre os candidatos.

[…]

Entretanto, na situação do caso concreto, a prova produzida não é capaz de fornecer a certeza jurídica acerca da participação ou mesmo anuência dos candidatos acerca dos fatos.

[…]

Efetivamente, não resta provado nos autos que os candidatos representados tenham participado ou mesmo anuído com eventual conduta ilícita apontada pelo representante. Com efeito, a jurisprudência é uníssona no sentido de que a configuração da captação ilícita de sufrágio exige prova robusta da participação ou anuência do candidato.

[…]

Portanto, não merece provimento o recurso, pois, no caso concreto, como acertadamente reconheceu a sentença, não há prova suficiente da participação ou anuência dos candidatos com a prática do ilícito previsto no artigo 41-A da Lei nº 9.504/97.

Em resumo, há uma nebulosa área cinzenta no que diz respeito à prova, de maneira que não é possível exarar um juízo condenatório. Nas razões recursais, há a indicação de que o juízo não teria apreendido corretamente as diferenças entre as campanhas eleitorais ocorridas em Pantano Grande daqueles municípios maiores – “quanto menor é a localidade, menor é a estrutura de campanha e, portanto, mais centralizadas nos candidatos são as ações e tomadas de decisões” (fl. 295).

O que não percebe o recorrente, contudo, é que tal circunstância não tem relação direta com o sopesamento da prova dos autos e, ainda que tivesse influência, ela viria a agravar a ausência de provas, no processo, da participação, envolvimento, ou mesmo anuência dos recorridos nos fatos tidos como irregulares – pois quanto menor o município (Pantano Grande conta atualmente com 7.749 eleitores), mais facilitada deveria, ao menos em tese, ser a tarefa de comprovar o envolvimento dos alegados beneficiários nas supostas práticas irregulares.

Resta, ainda, a análise de algumas das razões recursais, sobremodo aquelas relacionadas aos vínculos entre os envolvidos e os recorridos, bem como a amplitude do termo “livre convencimento”, constante no art. 23 da Lei Complementar n. 64/90.

Isso porque todas as circunstâncias elencadas (tamanho do município de Pantano Grande, os vínculos pessoais, etc.) têm, no máximo, a característica de presunções, sendo que alguns beiram a mera conjectura. Basta exercer o raciocínio de que seria razoável que Cássio e Ivan soubessem das práticas de Chiquinho, Éwerton ou qualquer outro correligionário (Carlos Alberto Trevisan, Fabiano de Ávila Napar e Ereneu Willibaldo Kroth).

Mas, por outro lado, também seria razoável que não soubessem.

E, repete-se, não há prova nos autos do envolvimento dos recorridos. Há que se realizar, aqui, o devido corte conceitual entre provas e presunções – as últimas exigem um exercício imaginativo para que se complete o raciocínio pelo envolvimento dos representados, raciocínio esse executado nas razões de recurso, e que de forma alguma podem redundar, no caso dos autos, em condenação dos recorridos.

É cediço que a prova indireta compreende duas espécies: os indícios e as presunções. Mais afeita ao caso dos autos, a presunção é uma precedente da convicção, e é gerada porque um fato ou uma circunstância desconhecidos podem, por sua natureza, serem relacionados com um ou mais fatos conhecidos, comprovados.

Os fato conhecidos, aqui, são as propostas a eleitores, por pessoas próximas aos recorridos. Todavia, carecem os autos de liame pujante o suficiente para que se chegue à conclusão do envolvimento de Cássio e Ivan – basta igualmente presumir, conjecturar – e aqui o exercício vai a mero título argumentativo – que os demais envolvidos (Chiquinho, Éwerton, etc.) podem ter agido espontânea e autonomamente com o fito de, vencidas as eleições, virem a ocupar algum cargo bem posicionado na administração do município, por exemplo.

Nesse contexto, ante a prova judicial produzida e a jurisprudência acerca da matéria, entendo não restar comprovada a prática da infração eleitoral tipificada no art. 41-A da Lei n. 9.504/97.

Note-se que este Tribunal já se deparou com circunstâncias bastante assemelhadas em diversos casos – diálogos de sentido ambíguo e ausência de prova robusta, dos quais aponto o RE n. 432-17 (cidade de Sananduva, atualmente com 12.794 eleitores), de relatoria da Desa. Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère, julgado em 24.10.2013, caso no qual houve até mesmo o registro de declarações em tabelionato: 

Recurso. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Prefeito e vice. Eleições 2012.

Improcedência da representação no juízo originário.

Não comprovado o alegado oferecimento de tintas e dinheiro a eleitores em troca de votos por parte dos representados. Fatos narrados na peça vestibular, estribados em declarações contraditórias, colhidas vários dias após o pleito, em datas próximas umas das outras, causando estranheza as testemunhas terem buscado o Tabelionato da comarca, e não a autoridade policial, para prestarem aludidas declarações.

Diante da ausência da prova robusta, impõe-se a confirmação da sentença prolatada.

Provimento negado.

Mais recentemente, em 07.3.2017, esta Corte tomou idêntica posição no julgamento do RE n. 337-47 (Marau, atualmente com 30.048 eleitores):

Recurso. Representação. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Improcedência. Eleições 2016.

Suposto oferecimento de vantagem a eleitores em troca de votos. O art. 41-A da Lei n. 9.504/97 busca proteger, de forma ampla, a normalidade e a legitimidade das eleições e pressupõe, para sua caracterização, a conjugação de três elementos: a prática de uma conduta (doar, oferecer, prometer, etc.), a existência de uma pessoa física (eleitor) e o resultado a que se propõe o agente (o fim de obter o voto).

Inexistência nos autos de prova segura e robusta da prática da infração eleitoral, impossibilitando o juízo condenatório.

Provimento negado.

(RE n. 337-47, Rel. Dra. Maria de Lourdes Galvão Braccini de Gonzalez, Unânime, julgado em 07.3.2016.)

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso interposto, mantendo a sentença de 1º grau, pelos próprios fundamentos.