RE - 17721 - Sessão: 19/07/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por MAURÍCIO BUTZEN, candidato eleito vereador no Município de Giruá, contra a sentença da 127ª Zona Eleitoral, que desaprovou a prestação de contas relativa às eleições de 2016 em face de irregularidade no recebimento de recursos estimáveis em dinheiro repassados pelo Partido Progressista (PP) (fls. 34-35v.).

Em suas razões (fls. 48-57), o recorrente argumenta pela viabilidade da doação de combustível na forma estimável em dinheiro. Sustenta que o doador adquiriu o combustível em estabelecimento em que possuía “verdadeira conta-corrente", procedimento usual em município do interior do Estado, e fez a doação ao partido, que repassou parte dela ao candidato, tudo devidamente documentado. Argumenta inexistir sonegação de qualquer informação à Justiça Eleitoral, não havendo prejuízo à transparência. Aduz ser mínimo o valor doado na modalidade tida como irregular – R$ 500,00 –, e requer a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Argumenta que os valores apontados sequer necessitariam ser declarados, considerando o disposto no art. 27 da Lei n. 9.504/97. Postula, ao final, o provimento do recurso para reformar a sentença e aprovar as contas, mesmo que com ressalvas.

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 64-68v.).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

Examina-se a prestação de contas de candidato eleito ao cargo de vereador em Giruá nas Eleições 2016. Verifica-se que as contas do recorrente foram desaprovadas em razão do recebimento de recursos repassados pelo Partido Progressista (PP), que consistiram em doação estimável em dinheiro, feita por pessoa física, a qual não atendeu ao disposto no art. 19 da Resolução TSE n. 23.463/15, visto não se tratar de produto do próprio serviço ou da atividade econômica do doador (combustível).

Inicialmente, anoto que as agremiações partidárias e os seus candidatos podem doar entre si bens próprios ou serviços estimáveis em dinheiro, ou ceder seu uso, inclusive quando não constituam produto de seus próprios serviços ou de suas atividades, conforme autoriza o art. 19, § 2º, da Resolução TSE n. 23.463/15, cumprindo, porém, o adequado registro dessas operações nas contas apresentadas à Justiça Eleitoral.

No caso examinado, registro que o eleitor LEANDRO KLEYN adquiriu R$ 2.000,00 (dois mil reais) em combustíveis e efetuou doação para o Partido Progressista (PP) de Giruá, que repassou parte do valor – R$ 500,00 (quinhentos reais) – para o recorrente (fls. 18-21), montante que representa 9,82% dos recursos arrecadados na campanha do vereador.

Tal doação não pode ser caracterizada como gasto realizado por eleitor e dispensado de contabilização, visto que ficou evidente o recebimento do produto pelo recorrente, diferentemente dos casos em que o simpatizante atua isoladamente em favor da campanha eleitoral, sem a participação do candidato de sua preferência. É certo que o candidato Maurício Butzen teve ciência da disponibilização do combustível, para que abastecesse o(s) veículo(s) utilizado(s) na campanha, no estabelecimento onde existia a “conta-corrente”, de forma que não se pode falar em atuação isolada do eleitor/doador.

Há que se distinguir os dois institutos: no caso do gasto realizado pelo eleitor a favor de seu candidato (art. 27 da Lei n. 9.504/97), o dispêndio é realizado pelo eleitor sem qualquer participação do candidato, não havendo necessidade de a despesa ser contabilizada, ao contrário da doação estimável em dinheiro, quando há a participação do candidato e a entrega deve ser sempre contabilizada.

Porém, a contribuição examinada nos autos também não caracteriza doação estimável em direito, conforme a abalizada doutrina. Transcrevo:

Os bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro doados por pessoas físicas devem constituir produto de seu próprio serviço, de suas atividades econômicas e, no caso dos bens, devem integrar seu patrimônio (art. 19, caput, da Res. nº 23.463/15). A regra exige uma relação de pertinência dos bens ou serviços doados com a pessoa do doador, seguindo a lógica de que somente é possível doar ou ceder algo que é da sua propriedade – e não de terceiros (ZILIO, Rodrigo López. Direito Eleitoral. 5. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico Editora, 2016, p. 455).

Quanto ao objeto, a doação pode abranger dinheiro (em espécie ou por título de crédito) ou bens estimáveis em dinheiro, tais como coisas (ex.: adesivos, combustível, material de escritório, instrumentos, faixas e cartazes), cessão de uso de móveis (ex.: veículos automotores, aeronaves e embarcações) ou imóveis (ex.: casa, sala, garagem), prestação de serviços (ex.: filmagem, criação e manutenção de página ou blog na Internet), entre outros.

Cuidando-se de bem estimável em dinheiro, excetuando-se as situações previstas no § 6o do art. 28 da LE (com a redação da Lei no 12.891/2013), o negócio deve ser demonstrado por documento idôneo emitido pelo doador ou cedente, tais como nota fiscal e termo de doação ou cessão.

Os bens e serviços doados devem ser próprios do doador, integrando sua atividade econômica (GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2016, p. 428).

Como não se demonstrou que o combustível constituía produto do próprio serviço ou da atividade econômica do doador (que não foi qualificado como sócio de posto de abastecimento ou distribuidora de lubrificantes), o procedimento adequado para o apoiamento do candidato seria o trânsito dos valores pela conta bancária de campanha, a fim de possibilitar a verificação e o controle, o que não ocorreu.

Assim, é de se concluir que a contribuição analisada é irregular, visto tratar-se de doação de recursos financeiros sem o regular trânsito pela conta-corrente de campanha, levando à incidência do disposto no art. 13 da Resolução TSE n. 23.463/15. Vejamos:

Art. 13. O uso de recursos financeiros para pagamentos de gastos eleitorais que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º implicará a desaprovação da prestação de contas do partido ou do candidato.

[…]

§ 2º O disposto no caput também se aplica à arrecadação de recursos para campanha eleitoral que não transitem pelas contas específicas previstas nesta resolução.

É de se considerar, porém, que a doação tida por irregular alcança o valor de R$ 500,00, o que representa 9,82% do total arrecadado na campanha eleitoral. Tal valor foi devidamente registrado e documentado na prestação de contas, não se cogitando das hipóteses de omissão de dados ou de má-fé do prestador.

A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, em se tratando de irregularidades que representem percentual ínfimo em relação aos recursos movimentados na campanha, tem admitido a aplicação do princípio da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas (Prestação de Contas n. 94884, Relator Min. Gilmar Ferreira Mendes, publicado em 28.5.2015). No mesmo sentido, os precedentes desta Corte toleram falhas cujo valor não represente elevado percentual diante da movimentação total, normalmente até o percentual de 10% dos recursos, desde que evidenciada a boa-fé do candidato (exemplificativamente, RE 80-91 – Relator Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, RE 74-84 – Relator Dr. Luciano André Losekann e RE 275-03 – Relator Des. Carlos Cini Marchionatti).

Como a irregularidade reconhecida na contabilidade do candidato representa 9,82% do total arrecadado na campanha eleitoral, entendo possível, mediante a aplicação do princípio da proporcionalidade, a aprovação com ressalvas da prestação de contas.

Nesses termos, VOTO pelo provimento do recurso, para, reformando a sentença, aprovar com ressalvas as contas de MAURÍCIO BUTZEN, relativas às eleições municipais de 2016.

Efetuem-se os registros necessários na autuação para exclusão do procurador que apresentou renúncia na fl. 70.