RE - 28279 - Sessão: 03/05/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso interposto por CELSO FERNANDES DE OLIVEIRA contra sentença do Juízo da 100ª Zona Eleitoral que desaprovou suas contas referentes às eleições municipais de 2016, quando concorreu ao cargo de vereador, tendo em vista o recebimento e utilização de doação no valor de R$ 1.500,00 em desacordo com o preceituado no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Em suas razões recursais, sustenta que não foram adotadas as diligências necessárias para a identificação da origem do recurso e que a doação foi feita pelo próprio prestador, não havendo má-fé, tratando-se de falha meramente formal.

Foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso.

É o breve relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo.

Aduz o recorrente que não houve diligência para tentar apurar a origem do valor de R$ 1.500,00 e que o processo de prestação de contas tem natureza administrativa.

Sem razão.

Inicialmente, verifico que o recorrente teve oportunidade de se manifestar e demonstrar a origem do valor depositado em sua conta, consoante se observa da intimação à fl. 64 e da petição da fl. 66.

Quanto à natureza do processo eleitoral de prestação de contas, desde a edição da Lei n. 12.034/09, os feitos que analisam as contas passaram a ter natureza jurisdicional.

Nesse sentido:

ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DEPUTADO ESTADUAL. DOCUMENTOS APRESENTADOS APÓS O JULGAMENTO DAS CONTAS. IMPOSSIBILIDADE. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA.

1. A jurisprudência do TSE é firme em que, julgadas as contas, com oportunidade prévia para saneamento das irregularidades, não se admite, em regra, a juntada de novos documentos.

2. A partir da edição da Lei nº 12.034/2009, o processo de prestação de contas passou a ter caráter jurisdicional. Não praticado o ato no momento processual próprio, ocorre a preclusão, em respeito à segurança das relações jurídicas.

3. Não há exigência de notificação pessoal nos processos de prestação de contas. Precedentes.

4. Agravo regimental desprovido.

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 188432, Acórdão de 03.5.2016, Relator Min. GILMAR FERREIRA MENDES, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 105, Data 02.6.2016, Página 64.) (Grifei.)

Rejeito, portanto, a matéria prefacial.

No mérito, a contabilidade foi desaprovada em razão do depósito de R$ 1.500,00 diretamente na conta de campanha eleitoral do candidato, em desconformidade com o art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15.

O prestador de contas alega que a doação em tela ocorreu por meio de recursos próprios e que por erro bancário houve o depósito em espécie.

Entretanto, a alegação veio destituída de prova, sendo que o recorrente sequer trouxe aos autos comprovante de saque de sua conta-corrente pessoal, circunstância que poderia ensejar alteração no juízo de mérito de sua contabilidade.

Assim, sendo incontroverso nos autos que o candidato realizou o depósito em dinheiro em sua conta bancária eleitoral no valor de R$ 1.500,00, violando o art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15, o qual exige que as doações financeiras desse importe sejam efetuadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação, é de ser mantida a desaprovação.

A exigência normativa de que as doações pelo próprio candidato, acima de R$ 1.064,10, sejam feitas por meio de transferência eletrônica visa, justamente, coibir a possibilidade de manipulações e transações transversas que ocultem ou dissimulem eventuais ilicitudes, como a utilização de fontes vedadas de recursos e a desobediência aos limites de doação.

O defeito em questão envolve a cifra de R$ 1.500,00, que representa o elevado percentual de 21,07% do total de recursos arrecadados (fl. 08).

Assim, não só o valor absoluto da irregularidade é significativo, mas também o percentual não pode ser considerado irrelevante, pois apenas tem essa característica aquele que se amolda dentro de 10% do total da movimentação da campanha, consoante jurisprudência sedimentada desta Corte e do TSE.

Desse modo, sobressai não ser possível a aplicação dos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade que reclamam uma dupla análise, de forma cumulativa: 1) exiguidade, em termos nominais e absolutos, dos valores que ensejaram a irregularidade e 2) exiguidade, em termos percentuais, dos valores cotejados com o montante arrecadado e despendido nas campanhas, nos termos da jurisprudência do TSE:

ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. DESAPROVAÇÃO. FALHAS QUE COMPROMETERAM A REGULARIDADE DAS CONTAS. NECESSIDADE DO REVOLVIMENTO DO ARCABOUÇO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 24 DO TSE. ART. 26, § 3º, DA RESOLUÇÃO-TSE Nº 23.406/2014. DOADORES ORIGINÁRIOS NÃO IDENTIFICADOS. IRREGULARIDADE GRAVE. PRECEDENTES. APLICABILIDADE DO ART. 29 DA MENCIONADA RESOLUÇÃO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. NÃO INCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO.

1. A aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade reclama uma dupla análise: (i) exiguidade, em termos nominais e absolutos, dos valores que ensejaram a irregularidade e (ii) exiguidade, em termos percentuais, dos valores cotejados com o montante arrecadado e despendido nas campanhas.

2. Os postulados da proporcionalidade e da razoabilidade, nos casos de exame de prestação de contas, são aplicáveis restritivamente, condicionados à presença dos seguintes requisitos: (i) falhas que não comprometam a lisura do balanço contábil; (ii) irrelevância dos valores envolvidos em relação ao total arrecadado; e (iii) ausência de comprovada má-fé do prestador de contas.

3. O art. 26, § 3º, da Resolução-TSE n° 23.406/2014 preconiza que as doações entre partidos políticos, comitês financeiros e candidatos devem identificar o CPF ou CNPJ do doador mediato, devendo ser emitido o respectivo recibo eleitoral para cada doação, de modo que é necessária a identificação de todos os doadores de campanha eleitoral, inclusive das doações indiretamente recebidas pelos candidatos, com vistas a possibilitar a fiscalização por essa Justiça Especializada e a coibir a arrecadação de recursos oriundos de fontes vedadas.

4. In casu,

a) Extrai-se das premissas fáticas do aresto regional que inexiste comprovação da origem do valor de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), sendo inviável, portanto, mensurar a percentagem do valor de origem desconhecida em relação à quantia final arrecadada pelo candidato.

b) Como consectário, a inversão do julgado - quanto à análise da relevância da irregularidade apontada e se ela seria irrisória ou não - demandaria nova incursão no conjunto fático-probatório, providência que se revela incabível na via estreita do apelo nobre eleitoral, a teor dos verbetes das Súmulas nos 7 do STJ e 279 do STF.

c) Destarte, ante as premissas fáticas delineadas no aresto fustigado revelam que não houve a devida identificação dos doadores originários de recursos recebidos pelo candidato, no valor de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), motivo por que a aplicação do art. 29 da Resolução-TSE n° 23.406/2014 é medida que se impõe.

5. Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade revelam-se inaplicáveis quando "as falhas são graves e inviabilizam a atividade de fiscalização da Justiça Eleitoral, bem como quando não constam do acórdão recorrido elementos que permitam mensurar se os valores relativos às falhas identificadas são ínfimos em comparação com o montante dos recursos arrecadados em campanha" (AgR-AI n° 590-15/SP, Rel. Min. Henrique Neves, DJe de 5.6.2015; ED-Pet nº 1.458/DF, Rel. Min. Marcelo Ribeiro, DJe de 8.8.2011; e AgR-REspe nº 3794-73/PI, Rel. Min. Gilson Dipp, DJe de 8.8.2012).

6. Agravo regimental desprovido.

(Recurso Especial Eleitoral n. 183369, Acórdão, Relator Min. Luiz Fux, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 239, Data 19.12.2016, Página 32/33.) (Grifei.)

De outra banda, ao contrário do aventado pela Procuradoria Regional Eleitoral em seu parecer, entendo pela não incidência do § 3º do art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15 na espécie.

Assim dispõe o aludido dispositivo:

Art. 18. (…).

§ 3º. As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, na impossibilidade, recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 26.

Os elementos trazidos aos autos autorizam a inferência de que os recursos em questão são provenientes de doação do próprio candidato, pessoa física, em favor da sua campanha eleitoral.

Veja-se que a própria declaração de bens do candidato (fls. 3 e 4) indica que, por ocasião de seu registro de candidatura, detinha saldo em conta-corrente de R$ 10.079,68.

Destarte, não vislumbro impossibilidade de identificação do doador, única situação que, na dicção legal, implicaria recolhimento do numerário ao Tesouro Nacional.

Da mesma forma, descabe falar em restituição de valores, eis que se confundiriam as figuras do doador e do beneficiário, restando inócua e sem eficácia prática a regra jurídica.

Assim, deve ser integralmente confirmada a sentença, para desaprovar as contas do candidato, afastada, no entanto, a aplicação do § 3º do art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15 na hipótese.

 

Ante o exposto, afastada a matéria preliminar, VOTO pelo parcial provimento do recurso interposto, ao efeito de afastar a obrigação de restituição ao Tesouro Nacional da importância de R$ 1.500,00, mantendo, entretanto, a desaprovação das contas de CELSO FERNANDES DE OLIVEIRA, relativas às eleições municipais de 2016.