RE - 51948 - Sessão: 21/09/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso eleitoral interposto por SUZANA CARDOSO ALVES (fls. 44-55) contra sentença da 57ª Zona Eleitoral (fls. 40-41v.) que desaprovou sua prestação de contas relativa à campanha eleitoral de 2016 como candidata a vereadora do Município de Uruguaiana, conforme o art. 68, inc. III, da Resolução do TSE n. 23.463/15.

Em sua irresignação, a recorrente requer, em preliminar, que o recurso seja recebido no duplo efeito. No mérito, alega que a falha que ensejou a desaprovação das contas resume-se à ausência de emissão de recibo referente à doação estimada, devidamente declarada, recebida do Diretório Estadual do PRB. Sustenta tratar-se de equívoco resultante de má interpretação do texto legal, que não compromete, contudo, a regularidade das contas. Requer a reforma da r. sentença para que a prestação de contas seja aprovada, ou, alternativamente, para sua aprovação com ressalvas.

Nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que se manifestou pelo desprovimento do recurso (fls. 58-61v.).

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade

A sentença foi publicada no Mural Eletrônico em 12.12.2016 (fl. 42), e a peça recursal, protocolizada em cartório no dia 15.12.2016 (fl. 44), sendo, portanto, tempestivo o recurso.

Presentes os demais requisitos de admissibilidade, dele conheço.

Pedido de efeito suspensivo

A recorrente postulou a concessão de efeito suspensivo ao recurso.

Entretanto, por disposição expressa do art. 257 do Código Eleitoral, “Os recursos eleitorais não terão efeito suspensivo”. A regra é excepcionada apenas pelo teor da previsão contida no § 2º da mesma norma, ou seja, a atribuição de efeito suspensivo quando a decisão implique “cassação de registro, afastamento do titular ou perda de mandato eletivo”, efeitos que não se extraem da sentença que julga as contas eleitorais em sua sede processual própria.

Transcrevo os aludidos dispositivos legais:

Art. 257. Os recursos eleitorais não terão efeito suspensivo.

[...]

§ 2º O recurso ordinário interposto contra decisão proferida por juiz eleitoral ou por Tribunal Regional Eleitoral que resulte em cassação de registro, afastamento do titular ou perda de mandato eletivo será recebido pelo Tribunal competente com efeito suspensivo.

O entendimento encontra-se sedimentado por iterativa jurisprudência deste Tribunal, conforme se depreende da ementa abaixo transcrita:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PREFEITO E VICE. EFEITO SUSPENSIVO. INCABÍVEL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E CONTÁBEIS. DOADOR ORIGINÁRIO. IDENTIFICAÇÃO. DOAÇÃO ESTIMÁVEL EM DINHEIRO. SANTINHOS. RECIBO. FALHAS FORMAIS. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO. ELEIÇÕES 2016.

1. Preliminar. Admissível a concessão de efeito suspensivo somente quando a decisão atacada resultar na cassação de registro, no afastamento do titular ou na perda de mandato eletivo, consoante os termos do art. 257, § 2º, do Código Eleitoral. Efeitos não vislumbrados na sentença que julga as contas eleitorais.

2. Ausente registro de despesas com prestação de serviços advocatícios e contábeis. Atuação circunscrita à confecção e à apresentação das contas eleitorais, não sendo considerados como gastos de campanha, conforme dispõe o art. 29, § 1º-A, da Resolução TSE n. 23.463/15.

3. Recebimento de doação estimável em dinheiro, por meio de publicação de santinhos na imprensa local, sem registro na contabilidade da agremiação e identificação do doador originário. Demonstrado que a contratação foi realizada pela grei partidária a partir de recursos obtidos de pessoa física à campanha eleitoral do partido. Evidenciado, ainda, pelo Sistema de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais da Justiça Eleitoral, a fonte originária de recursos.

4. Falhas meramente formais, incapazes de comprometer a transparência e a confiabilidade das contas. Aprovação com ressalvas.

Provimento.

(Grifei.)

(TRE-RS - RE n. 45489 - Relator Dr. Luciano André Losekann – P. Sessão de 11.7.2017.)

Portanto, rejeito a prefacial.

Mérito

Passo à análise de mérito e adianto que o apelo merece provimento.

O juiz sentenciante assim fundamentou a decisão que desaprovou as contas (fls. 40v.-41v.):

[…]

O parecer técnico conclusivo apontou a omissão de receitas e gastos eleitorais, em virtude da ausência de registro de doação estimada em dinheiro realizada pela Direção Estadual/Distrital, no valor de R$ 378,00. Alegou a prestadora de contas que "conforme inc. II do §3º do artigo 54 da Resolução 23.464/2015 do TSE" (sic), estava dispensada de comprovar a doação estimável em dinheiro entre candidatos ou partidos decorrentes do uso comum de sedes e materiais de propaganda.

A Resolução que rege a Prestação de Contas de Campanha é a TSE 23.463/15. Em seu art. 55, §3º, inc. II, está previsto que:

Art. 55. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser realizada por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

[…]

§ 3º Ficam dispensadas de comprovação na prestação de contas:

[…]

II - doações estimáveis em dinheiro entre candidatos ou partidos decorrentes do uso comum tanto de sedes quanto de materiais de propaganda eleitoral, cujo gasto deverá ser registrado na prestação de contas do responsável pelo pagamento da despesa.

Assim, observa-se que a citada normativa apenas informa as situações em que não é necessária a comprovação do gasto (e também da emissão do Recibo, conforme previsto no art. 6º, §3º, II da mesma Resolução).

A própria prestadora de contas alega que seria apenas necessário o registro de tal operação na prestação de contas, conforme determina, em seguida, o §4º: “A dispensa de comprovação prevista no § 3º não afasta a obrigatoriedade de serem registrados na prestação de contas os valores das operações constantes dos incisos I e II do referido parágrafo”.

Entretanto, a prestadora de contas não registrou tal operação em sua movimentação financeira. Ainda, a citada normativa refere-se apenas a casos de material de propaganda de uso comum. A Resolução define o que são materiais de propaganda de uso comum:

§ 5º Para fins do disposto no inc. II do § 3º, considera-se uso comum:

[…]

II - de materiais de propaganda eleitoral: a produção de materiais publicitários que beneficiem duas ou mais campanhas eleitorais.

Conforme Nota Fiscal apresentada (fls. 32), o partido pagou pela confecção de materiais de propaganda para cada candidato, em quantidades que variam de 15 mil a 50 mil impressos. No caso da candidata em análise, foram confeccionados 20 mil impressos. Não restou comprovado tratar de material de uso comum de duas ou mais campanhas eleitorais, uma vez que discriminado de forma singularizada no nome de cada candidato a confecção.

Assim, entendeu a unidade técnica tratar de inconsistência grave, que denota a ausência de consistência e confiabilidade nas contas prestadas, uma vez que submetidas a outros elementos de controle, hábeis a validar/confirmar as informações prestadas, resultaram na impossibilidade de atestar sua fidedignidade e a real origem dos recursos declarados, bem como ao atendimento do disposto na legislação vigente, podendo implicar na conclusão pela eventual omissão de receitas.

[…]

(Grifos no original).

A recorrente, por sua vez, afirmou que a doação estimada foi efetivamente declarada em sua prestação de contas, mas que, por equívoco de interpretação da norma reguladora, deixou de emitir o correspondente recibo eleitoral.

Aduziu que a falha é destituída de má-fé, de pequena monta e não compromete a regularidade das contas. Pugnou pela aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Com efeito, tanto nos extratos da prestação de contas originária (fl. 10) quanto da prestação de contas retificadora (fl. 24), a candidata informou ter recebido o valor de R$ 662,00 (seiscentos e sessenta e dois reais) oriundo de partido político.

Ainda, em consulta ao “Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais” do TSE na internet, verifica-se que a candidata registrou duas doações estimadas efetuadas por partidos políticos, vinculadas ao seu CNPJ de campanha, perfazendo um total de R$ 662,00 (seiscentos e sessenta e dois reais), conforme constou nos extratos físicos apresentados a esta justiça especializada (fls. 10 e 24), a saber:

a) R$ 378,00 (trezentos e setenta e oito reais) oriundos da Direção Estadual do Partido Republicano Brasileiro (PRB-RS), e

b) R$ 284,00 (duzentos e oitenta a quatro reais) doados pelo Partido Progressista (PP).

Além disso, ao prestar esclarecimentos após intimação do relatório preliminar das fls. 17-18, a candidata juntou nota fiscal (fl. 32) comprovando que o órgão estadual do PRB contratou a empresa Print Press Formulários Ltda. para o fornecimento de material publicitário alusivo à campanha de diversos candidatos, entre as quais a da ora recorrente, para quem consta a confecção de 20.000 “santinhos”, no valor de R$ 378,00.

Depreende-se, assim, que, ao contrário do afirmado pela sentença recorrida, a doação encontra-se adequadamente registrada e comprovada, autorizando concluir-se pela inexistência de má-fé por parte da prestadora.

No entanto, a transação não observou a necessária emissão de recibo eleitoral, conforme estabelece textualmente o artigo art. 3º, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.463/15, in verbis:

Art. 3º.

A arrecadação de recursos para campanha eleitoral de qualquer natureza por partidos políticos e candidatos deverá observar os seguintes pré-requisitos:

(...)

IV - emissão de recibos eleitorais.

Ainda, o art. 6º da citada resolução dispõe que “deverá ser emitido recibo eleitoral de toda e qualquer arrecadação de recursos para a campanha eleitoral, financeiros ou estimáveis em dinheiro”, excetuadas apenas i) a cessão de bens móveis, limitada ao valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) por cedente e ii) as doações estimáveis em dinheiro entre candidatos e partidos decorrentes do uso comum tanto de sedes quanto de materiais de propaganda eleitoral.

Eis o dispositivo em comento:

Art. 6º Deverá ser emitido recibo eleitoral de toda e qualquer arrecadação de recursos para a campanha eleitoral, financeiros ou estimáveis em dinheiro, inclusive os recursos próprios e aqueles arrecadados por meio da Internet.

§ 1º Os candidatos e os partidos políticos deverão imprimir recibos eleitorais diretamente do Sistema de Prestação de Contas Eleitorais (SPCE).

§ 2º Os recibos eleitorais deverão ser emitidos em ordem cronológica concomitantemente ao recebimento da doação e informados à Justiça Eleitoral na forma do § 2º do art. 43 desta resolução.

§ 3º Não se submetem à emissão do recibo eleitoral previsto no caput:

I - a cessão de bens móveis, limitada ao valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) por cedente;

II - doações estimáveis em dinheiro entre candidatos e partidos decorrentes do uso comum tanto de sedes quanto de materiais de propaganda eleitoral, cujo gasto deverá ser registrado na prestação de contas do responsável pelo pagamento da despesa.

§ 4º Para os fins do disposto no inciso II do § 3º, considera-se uso comum:

I - de sede: o compartilhamento de idêntico espaço físico para atividades de campanha eleitoral, compreendidas a doação estimável referente à locação e manutenção do espaço físico, excetuada a doação estimável referente às despesas com pessoal, regulamentada no art. 37 desta norma;

II - de materiais de propaganda eleitoral: a produção conjunta de materiais publicitários impressos.

Embora a hipótese dos autos não encontre abrigo na excepcionalidade dos incs. I e II do § 3º do art. 6º, acima transcritos, há que se considerar que o recibo em questão diz respeito a uma doação estimada em R$ 378,00, recebida da Direção Estadual do PRB, declarada tanto na presente prestação de contas (fls. 10 e 24) quanto na contabilidade da agremiação doadora, conforme consta nos relatórios técnicos de exame (fls. 17-18 e 33-35), de modo que a sua ausência não implica prejuízo à confiabilidade e à transparência das contas.

Além disso, a cifra envolvida representa apenas 9,67% do total de recursos arrecadados (R$ 3.907,47), atraindo, assim, na esteira da jurisprudência desta Corte, a incidência dos princípios constitucionais da proporcionalidade e da razoabilidade.

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Doação estimável em dinheiro. Resolução TSE n. 23.463/15. Eleições 2016.

Doação financeira realizada pelo próprio candidato por meio de depósito bancário, contrariando o disposto na Resolução TSE n. 23.463/15, que exige transferência eletrônica. Irregularidade que não impediu a identificação da fonte de financiamento da campanha eleitoral, restando atendida a finalidade da norma.

Ausência de registro de doação ou cessão de veículo automotor, pertencente ao próprio candidato. Irregularidade formal que não prejudica a fiscalização da contabilidade.

Recebimento de recurso estimável em dinheiro – adesivos – sem comprovação de que constitui produto do próprio serviço do doador. Falha que representa percentual insignificante, não comprometendo a confiabilidade das contas.

Aplicação do princípio da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas.

Provimento.

(Grifei.)

(TRE-RS - RE – 7484 – Relator: Dr. Luciano André Losekann – P. Sessão de 05.4.2017.)

A falta de emissão do recibo eleitoral, portanto, constitui falha meramente formal, a qual, por si só, não é suficiente para fundamentar a desaprovação da contabilidade.

Nessa senda, cito o seguinte precedente:

Prestação de contas. Candidato. Arrecadação e dispêndio de recursos de campanha. Resolução TSE n. 23.406/14. Eleições 2014.

Aplicação de recursos próprios em valor superior ao patrimônio declarado por ocasião do registro de candidatura, porém em montante inferior ao salário mensal do candidato. Realização de despesa de valor irrisório após a eleição. Falta de entrega de recibo eleitoral, correspondente à doação estimada, a qual foi declarada tanto na presente prestação de contas quanto na contabilidade do doador.

Ausência de prejuízo substancial à identificação da origem das receitas de campanha.

Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS – PC n. 240190 – Relator: Dr. Leonardo Tricot Saldanha – P. Sessão de 06.10.2015.)

(Grifei.)

Diante disso, apresentando as contas uma única impropriedade formal, a qual não obstou a verificação de sua regularidade, a aprovação com ressalvas é medida que se impõe.

Dispositivo

Ante o exposto, VOTO pelo provimento do recurso interposto, para aprovar com ressalvas as contas de SUZANA CARDOSO ALVES, relativas às eleições municipais de 2016.