RE - 25354 - Sessão: 03/05/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso no qual LUCAS MICHELON insurge-se contra a decisão do Juízo da 27ª ZE, o qual entendeu parcialmente procedente (fls. 79-83) a representação oferecida pela COLIGAÇÃO UM NOVO PINHAL GRANDE PARA TODOS (PSD-PDT-PMDB), em 27.10.2016, contra o então eleito vereador Lucas (à época, ainda não diplomado), aduzindo, em resumo, que o representado incidiu em hipótese de inelegibilidade superveniente, prevista no art. 14, § 7º, da Constituição Federal, de maneira que a diplomação deveria ser negada ao eleito. O fato seria que o irmão de Lucas, Fábio Michelon, teria assumido o cargo de Prefeito de Pinhal Grande em período inserido nos 6 (seis) meses anteriores ao pleito.

A sentença foi parcialmente favorável à coligação representante, e Lucas Michelon apresentou recurso da decisão em 09.12.2016. Nas razões, aduziu que a via processual eleita (representação) é inadequada. No mérito, entende que o juízo de origem interpretou o dispositivo constitucional de forma demasiado restritiva, não observando as circunstâncias do caso concreto. Requer o conhecimento e provimento do apelo, para reformar a sentença proferida (fls. 86-99).

Após as contrarrazões (fls. 109-113), o parecer apresentado pelo d. Procurador Regional Eleitoral é pelo julgamento conjunto da presente demanda com o RCED n. 257-91.2016.6.21.0027 e, em segundo momento, pela extinção do feito sem resolução do mérito, ante a inadequação da via eleita.

Após a manifestação da PRE, a relatora originária do processo, considerando a concessão de efeito suspensivo ao recurso obtida por Lucas Michelon na Ação Cautelar n. 0600092-76.2016.6.21.0000, exarou despacho (fl. 121) para que a inserção de pauta para julgamento do presente processo aguardasse o trâmite do já citado RCED n. 257-91.2016.6.21.0027.

Vieram conclusos e, na sequência, proferi despacho pela cisão de julgamento dos feitos, considerando o novo momento processual das demandas – ambas tramitando neste grau de Jurisdição –bem como a diferença de rito entre as classes processuais do recurso eleitoral e do recurso contra a expedição de diploma, conforme fundamentação constante à fl. 126. Ainda, determinei a inclusão em pauta de julgamento desta ação, de forma autônoma, submetendo o RCED n. 257-91.2016.6.21.0027 ao rito legalmente previsto.

É o relatório.

 

VOTO

Tempestividade

O recurso é tempestivo, motivo pelo qual dele conheço.

O recorrente, Lucas Michelon, apresentou a irresignação em 09.12.2016 (fl. 86), mesmo dia em que publicada a decisão no Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral do Rio Grande do Sul, DEJERS (fl. 84), obedecendo, assim, o tríduo legal previsto no art. 258 do Código Eleitoral.

 

Preliminarmente: do julgamento conjunto e da extinção do feito sem resolução do mérito

Sra. Presidente: o d. Procurador Regional Eleitoral se manifesta preliminarmente pela conveniência de julgamento conjunto da presente demanda com o RCED n. 257-91.2016.6.21.0027, também de minha relatoria.

Em momento anterior, foi essa a decisão tomada pela então relatora, a Dra. Maria de Lourdes Galvão Braccini de Gonzalez, conforme constante à fl. 121 dos autos.

A providência foi, de todo, salutar, evitando-se decisões conflitantes entre si, o que traria insegurança jurídica a uma situação já delicada.

Daí, considerei manter o julgamento conjunto das demandas. Todavia optei, recentemente, via despacho, pela cisão dos julgamentos devido a dois motivos principais:

O primeiro, a superação daquele momento de risco. Ambos os processos já se encontram submetidos a esta Corte, mitigando-se, assim, o risco de decisões contraditórias.

E a segunda razão, de ordem instrumental: há diferença substancial entre os ritos dos processos. Por exemplo, aqui foram veiculadas razões de recurso em concretização ao duplo grau de jurisdição; no RCED, bem se sabe, há características de legítima ação de competência originária do Tribunal, com previsão, inclusive, de manifestação prévia do magistrado revisor – o que não ocorre nestes autos. Dessa forma, trago à mesa primeiramente esta demanda, e submeterei o voto a ser proferido no RCED n. 257-91.2016.6.21.0027 à douta revisão.

Sigo, para antecipar que o mérito da questão deverá ser, acaso cumpridos os demais pressupostos, visitado somente por ocasião da análise do RCED n. 257-91.2016.6.21.0027, pois o presente processo deve ser extinto sem resolução de mérito.

Nessa linha, acompanho a manifestação do d. Procurador Regional Eleitoral e, também, dou razão à prefacial levantada pelo recorrente Lucas, pois é inadequada a via processual escolhida neste RE n. 253-54, pela Coligação Um Novo Pinhal Grande Para Todos.

A coligação, repito, representou ao argumento central de que Lucas não deveria ser diplomado devido à ocorrência de inelegibilidade superveniente e de cunho constitucional.

E, perante tal fato, inviável a representação. Friso a data de ajuizamento: 27.10.2016. Ou seja, Lucas havia sido eleito nas urnas, mas ainda não havia sido diplomado. A ocorrência da alegada inelegibilidade se deu no mês de setembro de 2016. Cabia aguardar o prazo de abertura para a apresentação de RCED, conforme pacífica jurisprudência.

Trago precedente do TSE:

“[...]

Na linha da jurisprudência desta Corte Superior, reafirmada em julgados recentes, a inelegibilidade superveniente, para fins de ajuizamento do recurso contra expedição de diploma, deve ser aquela que surge após o registro e antes da eleição. (Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 37849 - Pilar/AL. Rel. Min. Henrique Neves, DJE de 14.11.2014, p. 53.) (Grifei.)

Portanto, a pretensão foi deduzida também em período equivocado. Note-se, repito, que a situação alegada, a qual acarretaria a inelegibilidade superveniente, ocorreu entre 01.9.2016 e 30.9.2016, após prazo de impugnação aos registros de candidatura, amoldando-se à perfeição ao precedente citado.

Vale, ainda, transcrever a redação do art. 262 do Código Eleitoral:

Art. 262. O recurso contra expedição de diploma caberá somente nos casos de inelegibilidade superveniente ou de natureza constitucional e de falta de condição de elegibilidade. (Redação dada pela Lei n. 12.891, de 2013.)

Ou seja: havendo previsão estrita de uma ação eleitoral, cujo elenco contempla numerus clausus, não é viável, à parte, lançar mão de outra espécie para vindicar a pretensão, até mesmo porque a matéria não sofrerá os efeitos da preclusão até ocorrer a diplomação, seja porque a causa é superveniente ao registro de candidatura, seja porque possua origem constitucional, até mesmo porque, no que se refere ao RCED, o tempo integra o suporte fático da decadência do ajuizamento a partir da diplomação, conforme uma série de julgados do e. Tribunal Superior Eleitoral, aqui representada pela seguinte ementa:

Agravo regimental. Recurso contra expedição de diploma. Prazo decadencial. - O termo inicial do prazo para a propositura do recurso contra expedição de diploma é o dia seguinte à diplomação, ainda que não haja expediente normal no tribunal, haja vista se tratar de prazo de natureza decadencial. [...]”

(Ac. de 7.10.2014 no AgR-REspe n. 912, rel. Min. Henrique Neves.)

Friso: a escolha legislativa, de permitir a arguição das inelegibilidades em apenas duas ações específicas – AIRC e RCED – se deu por uma série de razões, e não “mero formalismo”. Entre a divulgação dos eleitos e a diplomação de tais vencedores, é sabido que reviravoltas acerca dos nomes que assumirão os cargos eletivos acarretam instabilidades nas comunidades.

Com a delimitação, estreitam-se as possibilidades de insegurança.

Ademais, a observância estrita das ações eleitorais expressamente previstas segue uma premissa de evitar verdadeiras batalhas jurídicas mediante a apresentação de diversas demandas e, portanto, surgimento de decisões conflitantes entre si. Trata-se de lógica a preservar a estabilidade das relações jurídicas, sobretudo permitir o aclaramento de fatos, sempre dotados de efeitos graves.

O presente caso é exemplo claro: houvesse a extinção sem resolução do mérito, na origem, não haveria o risco de decisões conflitantes, como ocorreu.

Nessa linha, a percuciente análise da doutrina de ZILIO:

A inelegibilidade, no Direito Eleitoral Brasileiro, analisada sob o aspecto de infração à lei, pode apresentar natureza jurídica de sanção ou de efeito de uma condenação. Em verdade, considerada a atual arquitetura das ações eleitorais, vislumbra-se uma única hipótese na qual a inelegibilidade assume nitidamente o caráter de sanção propriamente dita.

[...]

Assim, eventual reconhecimento de inelegibilidade – dado o seu caráter temporário e eventual – deverá ser efetuado nas ações de arguição respectivas (AIRC ou RCED). Deste modo, v.g., ajuizada a respectiva AIRC, haverá a possibilidade de discussão probatória sobre a incidência da inelegibilidade, sendo facultado ao impugnado – em caso de uma representação por conduta vedada (p. ex.) – alegar que é mero beneficiário do ato, não tendo vínculo subjetivo com o ilícito. Por consequência, não se reconhece a inelegibilidade como efeito condenatório ope legis, justamente porque o momento adequado para a aferição dos requisitos de elegibilidade é o registro da candidatura. Desta feita, ressalvada expressamente a hipótese do art. 22, XIV, da LC nº 64/90, a inelegibilidade, em caso de provimento condenatório que tenha previsão em abstrato de restrição à elegibilidade, deve ter seu reconhecimento efetuado em ação de arguição de inelegibilidade. Daí que é certo afirmar que determinados provimentos condenatórios defluem, potencialmente, o efeito anexo da inelegibilidade, cuja irradiação de efeitos concretos somente será reconhecida através da cognição judicial exarada por ocasião da arguição da inelegibilidade, a ser efetuada em processo específico, na época do registro da candidatura.

[…]

De outra banda, eventual causa de inelegibilidade superveniente ao registro deve ser atacada através de RCED (art. 262 do CE), cujo âmbito de abrangência da expressão “inelegibilidade” deve ser o mais amplo possível (abarcando condição de elegibilidade e inelegibilidade, exatamente como determina a nova redação do dispositivo, na forma da Lei nº 12.891/13).”

(ZILIO, Rodrigo López. Direito Eleitoral. 5ª Edição, 2016. Porto Alegre, Verbo Jurídico editora, páginas 535-536.)

Por tudo isso é que a posição do e. TSE se dá, há muito tempo, no sentido de inexistir uma ação de arguição de inelegibilidade específica a ser apresentada no período que medeia o término do período passível de ajuizamento da AIRC e a posterior abertura do prazo para interposição do RCED, de modo que as situações de inelegibilidade superveniente devem ser analisadas, todas, via RCED:

Eleitoral. Inelegibilidade. Vice-prefeito que sucede o prefeito. Ação de arguição de inelegibilidade. 1. O vice-prefeito que sucede o Prefeito nos seis meses anteriores ao pleito não se torna inelegível para o cargo de prefeito. (Recurso Especial nº 17.568.) 2. No direito eleitoral não existe a figura da ação de argüição de inelegibilidade, ajuizada após o término do prazo de impugnação ao pedido de registro. Eventual inelegibilidade superveniente ao registro deve ser alegada e apreciada em recurso contra diplomação.

(AG n. 2770/SP. Rel. Ministro Fernando Neves da Silva. Julgado em 20.3.2001, unânime.)

Além, saliento que a extinção do presente feito não acarretará prejuízo às partes, pois mantido ou cassado o diploma de Lucas Michelon, a parte que se considerar prejudicada poderá (também) combater as razões de decidir conforme a fundamentação exarada no RCED n. 257-91.2016.6.21.0027.

E, portanto, penso que aqui a Corte deve apenas assentar a inadequada proposição da representação n. 253-54.2016.6.21.0027 para impedir que Lucas seja diplomado, pois a alegada inelegibilidade é superveniente e de cunho constitucional, situações nas quais a lei eleitoral determina a utilização exclusiva da via do RCED.

 

Diante do exposto, VOTO para extinguir o RE n. 253-54.2016.6.21.0027 sem resolução do mérito, por inadequação da via processual eleita, conforme o art. 485 do Código de Processo Civil, combinado com o art. 282 do Código Eleitoral, e, considerada a Ação Cautelar n. 0600092-76.2016.6.21.0000, determinar a manutenção de LUCAS MICHELON no cargo de vereador de Pinhal Grande até o julgamento do RCED n. 257-91.2016.6.21.0027.