RE - 37355 - Sessão: 18/04/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recursos interpostos em face da sentença de fls. 700-722, que julgou parcialmente procedente a ação de investigação eleitoral interposta pela COLIGAÇÃO CIRÍACO PARA TODOS (PP-PDT-PTB-DEM-PSB-PSD) contra ARLINDO ANTÔNIO LOPES, ODACIR BOAVENTURA MANHABOSCO DE MELLO e EUCLIDES JOSÉ MARCANTE.

Na sentença recorrida, o juízo de primeiro grau entendeu que a entrega de camisetas de uniforme escolar e chocolates configurou a prática da conduta vedada prevista no § 10 do art. 73 da Lei n. 9.504/97, impondo multa de 5.000 (cinco mil) UFIR para cada um dos representados, nos termos do § 4º do mesmo dispositivo legal.

Em suas razões recursais, a representante Coligação Ciríaco Para Todos requer a total procedência da AIJE, com a cassação do registro dos representados, elencando fatos que, em sua compreensão, caracterizariam condutas vedadas por estes praticadas, consistentes em (a) readaptação de vantagens dos servidores públicos, (b) pagamento de despesas de som a particular para realização do carnaval de rua, (c) aquisição e distribuição gratuita de bens e (d) atos de improbidade administrativa (fls. 724-743).

Por sua vez, nas razões de seu apelo, os representados Arlindo Antônio Lopes, Odacir Boaventura Manhabosco de Mello e Euclides José Marcante alegam que a entrega de camisetas de uniforme escolar e de chocolates, em fevereiro de 2016, não teve cunho eleitoreiro, mas de programa social aprovado por lei – Lei n. 1.768/15 – e em andamento desde o exercício anterior, motivo pelo qual requerem a improcedência da AIJE. Alternativamente, postulam a diminuição da pena pecuniária para o mínimo legal de 5 UFIR para cada representado (fls. 746-754).

Com vista dos autos, nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento dos recursos (fls. 778-788v).

É o relatório.

 

VOTO

Senhora Presidente, eminentes colegas:

1. Admissibilidade recursal

Os recursos são tempestivos e comportam conhecimento.

Ausentes demais preliminares a serem analisadas, passo ao exame do mérito.

2. Mérito

Conforme já consignei no relatório, dentre os fatos insurgidos pela representante, a Magistrada Mariana Machado Pacheco entendeu apenas pela configuração da conduta vedada prevista no art. 73, § 10, da Lei n. 9.504/97, consistente na distribuição gratuita de camisetas de uniforme escolar e chocolates pelos representados Arlindo Antônio Lopes, Odacir Boaventura de Mello e Euclides José Marcante, impondo a multa de 5.000 (cinco mil) UFIR para cada um dos representados, nos termos do previsto no § 4º do artigo supracitado.

Da decisão foram interpostos recursos de ambas as partes, representante e representados.

A representante, Coligação Ciríaco Para Todos aviou sua irresignação por entender que Arlindo Antônio Lopes, Odacir Boaventura Manhabosco de Mello e Euclides José Marcante praticaram abuso de poder e as condutas vedadas previstas no art. 73, inc. V e § 10, da Lei n. 9.504/97, consistentes em (a) readaptação de vantagens dos servidores públicos, (b) pagamento de despesas de som a particular para realização do carnaval de rua, (c) aquisição e distribuição gratuita de bens e (d) atos de improbidade administrativa, razão pela qual postulou a cassação do registro dos representados (fls. 724-743).

De outro lado, os representados Arlindo Antônio Lopes, Odacir Boaventura Manhabosco de Mello e Euclides José Marcante insurgem-se contra a sentença alegando que a entrega de camisetas de uniforme escolar e de chocolates, em fevereiro de 2016, não teve cunho eleitoreiro, mas de programa social aprovado por lei – Lei n. 1.768/15 – e em andamento desde o exercício anterior, motivo pelo qual requerem a improcedência da AIJE. Alternativamente, postulam a diminuição da pena pecuniária para o mínimo legal de 5 UFIR para cada representado (fls. 746-754).

Antes de adentrar no caso concreto, convém trazer breves apontamentos.

A Lei n. 9.504/97 traz capítulo específico sobre as condutas vedadas aos agentes públicos durante a campanha eleitoral, na formulação posta nos arts. 73 a 78, trazendo à inicial fatos que, em tese, enquadrariam-se no art. 73, inc. V e §§ 4º, 8º e 10, que a seguir transcrevo:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[...]

V - nomear, contratar ou de qualquer forma admitir, demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, na circunscrição do pleito, nos três meses que o antecedem e até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados:

[...]

§ 4º O descumprimento do disposto neste artigo acarretará a suspensão imediata da conduta vedada, quando for o caso, e sujeitará os responsáveis a multa no valor de cinco a cem mil UFIR.

[…]

§ 8º Aplicam-se as sanções do § 4º aos agentes públicos responsáveis pelas condutas vedadas e aos partidos, coligações e candidatos que delas se beneficiarem.

[...]

§ 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa. (Incluído pela Lei n. 11.300, de 2006.)

O doutrinador Rodrigo López Zilio (Direito Eleitoral. 5. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2016. p. 502-503.) assim leciona sobre as condutas vedadas:

As condutas vedadas – na esteira de entendimento da doutrina e jurisprudência – constituem-se como espécie do gênero abuso de poder e surgiram como um antídoto à reeleição, a qual foi instituída através da EC nº 16/97. Em verdade, pode-se conceituar os atos de conduta vedada como espécies de abuso de poder político que se manifestam através do desvirtuamento dos recursos materiais (incisos I, II, IV e §10º do art. 73 da LE), humanos (incisos III e V do art. 73 da LE), financeiros (inciso VI, a, VII e VIII do art. 73 da LE) e de comunicação (inciso VI, b e c do art. 73 da LE) da Administração Pública (lato sensu). [...]

O bem jurídico tutelado pelas condutas vedadas é o princípio da igualdade entre os candidatos. Assim, despiciendo qualquer cotejo com eventual malferimento à lisura, normalidade ou legitimidade do pleito. Basta, apenas, seja afetada a isonomia entre os candidatos; nada mais. Neste sentido, aliás, o próprio caput do art. 73 da LE prescreve que são condutas vedadas porque “tendentes” a afetar a igualdade entre os candidatos. Ou seja, o legislador presume que tais condutas, efetivamente, inclinam-se a desigualar os contendores.

Neste giro, exigir prova da potencialidade da conduta na lisura do pleito equivale a um amplo esvaziamento da norma preconizada, porquanto imporia, ao representante, duplo ônus: a prova da adequação do ilícito à norma (legalidade estrita ou taxatividade) e da potencialidade da conduta. O prevalecimento desta tese importa o esvaziamento da representação por conduta vedada, pois, caso necessária a prova da potencialidade, mais viável o ajuizamento da AIJE – na qual, ao menos, não é necessária a prova da tipicidade da conduta. Em suma, o bem jurídico tutelado pelas condutas vedadas é o princípio da isonomia entre os candidatos, não havendo que se exigir prova de potencialidade lesiva de o ato praticado afetar a lisura do pleito. Do exposto, a prática de um ato previsto como conduta vedada, de per si e em regra – salvo fato substancialmente irrelevante – é suficiente para a procedência da representação com base no art. 73 da LE, devendo o juízo de proporcionalidade ser aferido, no caso concreto, para a aplicação das sanções previstas pelo legislador (cassação do registro ou do diploma, multa, suspensão da conduta, supressão dos recursos do fundo partidário). (Grifei.)

Assim, os arts. 73, 74, 75 e 77 do aludido diploma legal regulam atos que seriam considerados vedados aos agentes públicos, servidores ou não, com vista a coibir que uma pessoa possa aproveitar-se da condição de agente público para favorecer uma campanha eleitoral.

Objetiva-se, portanto, garantir o respeito à igualdade de chances que deve nortear um processo eleitoral isonômico.

Logo, para caracterizar a transgressão da regra, a ação deve ter sido dirigida com o propósito de beneficiar candidatura, causando prejuízo aos demais concorrentes ao pleito.

Feitas essas considerações, passo ao exame individualizado dos inconformismos.

2.1. Da readaptação de vantagens a servidores públicos municipais: instituição de turno único com diminuição da carga horária sem redução proporcional de vencimentos

A coligação recorrente narra que Arlindo Antônio Lopes, na condição de prefeito do Município de Ciríaco, concedeu vantagem aos servidores públicos municipais, dentro de três meses antes do pleito, buscando obter votos para sua reeleição e angariar servidores públicos como cabos eleitorais, utilizando a Administração pública para fins eleitorais. Tal atitude teria sido efetivada por meio do Decreto Executivo n. 1.279, o qual instituiu turno único para o funcionamento da prefeitura daquela localidade, reduzindo a jornada de trabalho de oito para seis horas diárias, sem, contudo, reduzir proporcionalmente os vencimentos dos servidores municipais.

Tal fato, no entender da recorrente, estaria enquadrado na conduta vedada trazida no inc. V do art. 73 da Lei n. 9.504/97, in verbis:

Art. 73, Lei nº 9.504/97. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[…]

V - nomear, contratar ou de qualquer forma admitir, demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, na circunscrição do pleito, nos três meses que o antecedem e até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados. (Grifei.)

Contudo, tal como concluído na sentença, entendo que não assiste razão à coligação representante.

De fato, a prefeitura de Ciríaco instituiu o turno único de trabalho por meio do Decreto n. 1.279/16 (fls. 27-28), estabelecendo jornada de trabalho contínua de seis horas diárias durante o período de 11.7.2016 a 31.12.2016.

Todavia, tal decreto encontra-se em conformidade com a Lei Municipal n. 1.318/06, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos municipais e na qual encontra-se a previsão, em seu art. 53, de que “O Prefeito determinará, quando não estabelecido em lei ou regulamento, o horário de expediente das repartições”. A mesma legislação, precisamente no art. 55, parágrafo único, igualmente dispõe que “Poderá [...] ser estabelecido turno único de trabalho, caso em que não ultrapassará as seis horas contínuas, concedendo-se um intervalo de quinze minutos sem que seja computado na duração do trabalho”.

Ademais, cabe ressaltar que, conforme depreende-se das informações colacionadas aos autos (fls. 155-162 e 169-170), o turno único de trabalho constitui praxe adotada pela Administração municipal de Ciríaco, tendo sido instituído também em anos anteriores (2012 a 2015), sempre com o objetivo de reduzir despesas daquele município.

Não vislumbro, dessa forma, procedência na alegação da representante de que a implementação do turno único constituiria readaptação de vantagens aos servidores públicos daquela municipalidade.

E, por oportuno, cabe trazer os ensinamentos de Rodrigo López Zilio (Crimes Eleitorais. Salvador: Jus Podivm, 2014. p. 571.), litteris:

A norma proibitiva alcança, também, a vedação à supressão ou readaptação de vantagens, no prazo vedado. DIOGENES GASPARINI (pp. 205/206) classifica as vantagens pecuniárias em adicionais (por tempo de serviço e de função), gratificações (de serviço – v.g., risco de vida, serviços extraordinários – e pessoais – v.g., salário-família, salário-educação) e indenizações (ajudas de custo, diárias e transporte). Por conseguinte, ficam proibidas, nos três meses antes do pleito até a posse dos eleitos, a eliminação ou readaptação de todas estas vantagens – seja na espécie de adicionais, gratificações ou indenizações.

Consequentemente, não há como enquadrar o “turno único” como “vantagem”, pois sua instituição apenas altera a carga horária de trabalho dos servidores, não constituindo direito subjetivo a receber acréscimos em razão do desempenho da função pública.

E essa foi a conclusão da magistrada, cujo excerto da sentença a seguir transcrevo com grifos meus (fl. 706):

Veja-se, nos três meses que antecedem o pleito é vedado ao agente público a readaptação de vantagens de servidores públicos. Assim, a modificação do horário de trabalho, por meio da instituição de turno único, não configura a hipótese prevista em lei, pois não se está diante de readaptação de qualquer vantagem de servidores públicos (adicionais, gratificações ou indenizações).

[…]

Consoante a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a regra do art. 73 e seus incisos, da Lei n. 9.504/97, que enumera os casos de condutas vedadas aos agentes públicos, é norma restritiva de direitos, portanto não comporta interpretação extensiva, ampliativa ou analógica para abranger hipóteses não previstas expressamente, tendo em vista a necessidade de observância do princípio da estrita legalidade: […]

No mesmo sentido foi o parecer do ilustre procurador regional eleitoral, embasado em julgado do egrégio Tribunal Superior Eleitoral, de relatoria da Ministra Luciana Lóssio (fl. 782 e verso). Vejamos:

[…] não pode se entender a redução da carga horária como vantagem, ante o princípio da irredutibilidade de vencimentos, bem como pelo fato de as condutas vedadas, por serem restritivas de direitos, deverem ser interpretadas estritamente, não se podendo ampliar o conceito de “vantagem”, nos termos do entendimento do TSE:

'ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. ABUSO DO PODER POLÍTICO. GOVERNADOR. VICE-GOVERNADOR. CONDUTA VEDADA. SERVIDOR PÚBLICO. PODER LEGISLATIVO. CESSÃO. PREVISÃO LEGAL. AUSÊNCIA. RESTRIÇÃO DE DIREITOS. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. IMPOSSIBILIDADE. DESPROVIMENTO.

1. A vedação contida no art. 73, III, da Lei nº 9.504/97 é direcionada aos servidores do Poder Executivo, não se estendendo aos servidores dos demais poderes, em especial do Poder Legislativo, por se tratar de norma restritiva de direitos, a qual demanda, portanto, interpretação estrita.

2. Nas condutas vedadas previstas nos arts. 73 a 78 da Lei das Eleições imperam os princípios da tipicidade e da legalidade estrita, devendo a conduta corresponder exatamente ao tipo previsto na lei (REspe nº 626-30/DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 4.2.2016).

3. Agravo regimental desprovido.

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 119653, Acórdão de 23.8.2016, Relatora Min. LUCIANA CHRISTINA GUIMARÃES LÓSSIO, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 12.9.2016, Página 31.)' (Grifos do original.)

Portanto, afasto o enquadramento da conduta no art. 73, inc. V, da Lei n. 9.504/97.

De igual modo, entendo por desprover o recurso da representante relativamente à pretensa adequação da aludida conduta na vedação disposta no § 10 do art. 73 da Lei das Eleições, verbis:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[…]

§ 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa. (Incluído pela Lei n. 11.300, de 2006.)

Isso porque a referida norma dispõe que “no ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens ou benefícios por parte da Administração Pública”. Contudo, o fato sob análise refere-se à implementação de turno único na prefeitura de Ciríaco, tendo como reflexo a redução da jornada de trabalho, não constituindo tal circunstância benefício aos servidores, mas à própria Administração, como já consignado. Os valores pagos aos funcionários municipais referem-se à contrapartida pelos serviços prestados, não podendo ser confundidos com benesses concedidas pelo Poder Executivo daquela municipalidade, ainda que tenha havido redução da jornada de trabalho. Importante, ainda, ressaltar que tudo ocorreu por meio de decreto instituído de acordo com lei municipal, não cabendo analisar a legalidade (ou não) da implementação do turno único neste feito.

Por fim, não restou comprovado que os representados tenham se utilizado da efetivação do turno único como forma de autopromoção, assim como, do conjunto probatório reunido aos autos não foi possível concluir pela utilização de máquinas públicas para fins particulares em turno oposto ao instituído, tendo em vista que os testemunhos não foram convincentes, tornando a prova inconclusiva quanto a este fato.

Assim, deve ser mantida a sentença também quanto a este ponto.

2.2. Do pagamento de despesas para o custeio da sonorização do carnaval de rua de Ciríaco

A coligação representante alega que o uso de recursos públicos municipais para o pagamento da sonorização do carnaval de rua do município configurou a conduta vedada prevista no § 10 do art. 73 da Lei n. 9.504/97.

Sustenta que o referido evento não consta no calendário oficial do município, que não havia previsão de tal despesa em lei orçamentária, e que os equipamentos de som foram instalados em estabelecimento particular, motivo pelo qual requer a procedência da ação quanto a este fato.

Todavia, não vejo razão para reformar a sentença, que entendeu pela improcedência do pedido por ausência de enquadramento do fato como conduta vedada.

Tanto o Ministério Público Eleitoral de piso quanto a magistrada sentenciante concluíram corretamente que o pagamento para sonorizar o carnaval de rua pela prefeitura não teve aptidão de configurar a conduta vedada.

Isso porque, além de a referida festa integrar o calendário de eventos daquele município, como se pode comprovar do disposto na Lei Municipal n. 1.652/13 (fl. 219) e da Portaria n. 41/14 (fls. 222-223), tal comemoração também ocorreu em anos anteriores, conforme se pode constatar dos testemunhos colhidos em audiência (áudio à fl. 666).

Ademais, restou comprovada nos autos a existência de previsão orçamentária para despesas com a manutenção do calendário de eventos no exercício de 2015, pela Lei n. 1.733/14, e no exercício de 2016, pela Lei n. 1.768/15 (fls. 226-230).

De outra banda, igualmente foi possível concluir que, embora a sonorização, locada pelo valor de R$ 1.200,00, tenha sido instalada em estabelecimento particular (no bar do Mike Tyson), tal fato ocorreu em virtude da instabilidade do tempo naquela data, o que motivou a colocação dos aparelhos naquele local, por ser coberto. Contudo, os equipamentos foram instalados de modo a que o som se propagasse em direção à rua e aos outros estabelecimentos comerciais, mantendo-se o caráter público do evento. Assim, tal circunstância não resultou em benefício exclusivo ao proprietário daquele estabelecimento.

E por elucidativo, colho da sentença o minucioso exame da prova realizado pela Magistrada da 138ª Zona Eleitoral (fls. 711-712):

[…] os representados demonstraram que a realização do carnaval de rua é um acontecimento que integra o calendário de eventos do Município de Ciríaco há vários anos e está previsto na legislação (fls. 219-224); que o evento foi realizado em frente ao bar do Mike Tyson (fl. 666) e, quanto ao ponto, a única testemunha compromissada, Sr. Claudinei Chagas Zembruski, proprietário de um bar localizado em frente ao Bar do Mike Tyson, destacou que durante o carnaval de rua, no total, 5 (cinco) estabelecimentos estavam funcionando, todos vendiam bebidas para os foliões (em torno de 700 pessoas) e os aparelhos de som somente foram instalados na parte da frente do bar para protegê-los do tempo ruim. Ainda destacou que, em anos anteriores, os aparelhos de som ficavam na rua em frente ao Bar do Mike Tyson.

Por outro lado, não houve a demonstração de que o pagamento (fl. 38) de R$1.200,00 (mil e duzentos reais) pela sonorização do evento estava condicionada ao apoio eleitoral, o que se revela imprescindível para a presente demanda. Tampouco houve a demonstração de violação aos bens jurídicos tutelados. Em alegações finais, para finalizar, a representante conclui, diante da oitiva da testemunha e de informantes, que apenas os comerciantes do centro da cidade foram beneficiados pela conduta dos representados:

‘Outros comerciantes do centro da cidade foram beneficiados financeiramente com a concessão de valores para a realização do Carnaval de Rua em frente ao Bar do Mike Tyson por parte da Administração Pública. Embora, os representados tenham tentado demonstrar que se tratava de evento do município não lograram êxito, pois tal evento sequer fez parte do calendário de eventos do município para o ano de 2016 e sem sombra de dúvidas, restou demonstrado ter sido realizado em benefício tão somente de particulares - proprietários de bares e lancherias, e não em via pública, como por exemplo, na praça central, como em qualquer outro evento público’.

Veja-se, as ilações da representante, quanto ao fato, são genéricas e insuficientes para fundamentar a ação com a pretensão de afastar legalmente um candidato da concorrência ao pleito municipal. A AIJE deve estar amparada na ocorrência de fatos muito graves e as provas devem ser robustas de forma a demonstrar a existência de grave abuso de poder suficiente a ensejar a imposição da severa sanção prevista em Lei. Assim, meras conjecturas e a ausência de consistência probatória, não podem apoiar o pedido de cassação de registro de candidatura. […]

Além disso, tal como apontou o douto procurador regional eleitoral, “ante os depoimentos carreados aos autos (áudio à fl. 666), não houve a presença dos representados no evento, não havendo, assim, indícios de promoção pessoal dos mesmos”.

Desse modo, infere-se que o conjunto probatório reunido aos autos não teve aptidão para comprovar as alegações da coligação recorrente, não restando demonstrado que o pagamento da sonorização do evento realizado durante o Carnaval de 2016, no mês de fevereiro, tenha configurado a conduta vedada prevista no art. 73, § 10, da Lei n. 9.504/97.

 

2.3. Da distribuição de uniformes escolares e chocolates para estudantes da rede de ensino fundamental na Páscoa de 2016

Tal como já consignei no relatório, o juízo de primeiro grau entendeu que a entrega de camisetas de uniforme escolar e chocolates na rede de ensino fundamental do Município de Ciríaco, na Páscoa de 2016, configurou a prática da conduta vedada prevista no § 10 do art. 73 da Lei n. 9.504/97, impondo multa de 5.000 (cinco mil) UFIR para cada um dos representados, nos termos do § 4º do art. 73 da Lei das Eleições.

Em suas razões recursais, a coligação recorrente sustenta que o ato revestiu-se de gravidade suficiente a ensejar a cassação do registro dos representados, dado que a referida conduta teria sido amplamente divulgada nas redes sociais, com o intuito de promoção pessoal visando ao pleito municipal de 2016, o que teria tido capacidade de desequilibrar a disputa eleitoral.

Por sua vez, os representados alegam que a entrega de camisetas de uniforme escolar e de chocolates, em fevereiro de 2016, não teve cunho eleitoreiro, mas de programa social aprovado por lei – Lei n. 1.768/15 – e em andamento desde o exercício anterior. Salientam que o ato praticado encontra-se coberto pela exceção prevista no § 10 do art. 73 da Lei n. 9.504/97 (programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior). Aduzem, ainda, que a única finalidade do ato foi incentivar os alunos a frequentarem a rede municipal de ensino, motivo pelo qual requerem a improcedência da AIJE. Alternativamente, postulam a diminuição da sanção pecuniária para 5 UFIR para cada representado, pois consideram ser este o mínimo legal previsto no art. 73, § 4º, da Lei das Eleições.

Adianto que a sentença não merece reparo também quanto a este fato.

Inicialmente, cabe ressaltar que, conforme se depreende dos documentos de fls. 49-57, da defesa (fls. 143-146) e do recurso dos próprios representados (fls. 748-753), restou incontroversa a distribuição de uniformes escolares e chocolates por estes aos alunos e professores da rede municipal de ensino, em 22.3.2016, assim como a ampla divulgação dessa prática.

Quanto à proibição da distribuição de bens, valores ou benefícios no ano em que se realizar a eleição, o § 10 do art. 73 da Lei n. 9.504/97 traz como exceção os casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa.

E no que se refere aos requisitos caracterizadores da aludida exceção, especificamente em relação aos “programas sociais autorizados em lei”, Rodrigo López Zilio assim leciona (Direito Eleitoral. 5. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2016. p. 628.):

[…] O comando normativo exige que o programa social tenha sido autorizado por lei, dando ênfase à necessidade de estrita observância ao princípio da legalidade pelo administrador público. Então, para tornar a conduta lícita em ano eleitoral, revela-se indispensável que o programa social esteja fundamentado por norma jurídica específica, elaborada em conformidade com o procedimento administrativo legislativo, daí que o TSE assentou que “a instituição de programa social mediante decreto não atende à ressalva contida no art. 73, §10, da Lei nº 9.504/97” (Agravo Regimental em Agravo de Instrumento nº 1169-67 – Rel. Min. Nancy Andrighi).

Além de autorizado por lei específica, o programa social já deve estar em execução orçamentária no ano anterior ao da eleição. A execução orçamentária do programa social pressupõe que tenha havido previsão expressa na lei do orçamento no ano anterior ao do início da sua execução. Em síntese, o reconhecimento da legalidade na distribuição de benefícios por programa social em ano eleitoral requer: a) previsão orçamentária (dois anos antes da eleição); b) execução orçamentária (no ano anterior à eleição); c) distribuição gratuita de bens e serviços (no ano da eleição). A execução orçamentária pressupõe a efetivação dos recursos previstos no orçamento, não sendo suficiente a aprovação do orçamento ou a mera previsão orçamentária. (Grifei.)

No caso sob análise, os demandados alegaram a existência de previsão para a aquisição e distribuição de uniformes escolares nos orçamentos dos exercícios de 2014 e 2015, tendo novamente sido prevista para o exercício de 2016. Entretanto, não lograram êxito em comprovar a existência de programa social autorizado em lei e a execução orçamentária no exercício anterior ao pleito (fls. 241-242). Ou seja, em que pese tenha havido previsão orçamentária para a aquisição e distribuição de uniformes nos anos de 2014 e 2015, apenas em 2016, ano eleitoral, foi realizada a efetiva distribuição dos bens, pessoalmente, pelos demandados, o que foi amplamente divulgado pela Administração no próprio site do Município de Ciríaco, constando fotos dos representados entregando as camisetas e ovos de páscoa aos estudantes, acompanhadas do seguinte texto:

Administração distribui uniformes e chocolates para rede de Ensino Fundamental na Páscoa.

Visitas em colégios municipais leva alegria aos alunos com distribuição de chocolates e uniformes a toda à rede de ensino fundamental.

Distribuir carinho e doces e despertar sorrisos: foi com esses objetivos que a Administração Municipal juntamente com a Secretaria da Educação, organizaram na terça-feira (22), distribuição de presentes e uma camiseta do uniforme escolar para todos alunos e professores da rede de ensino fundamental do município de Ciríaco. Além de promover a alegria entre os pequenos, a administração foi acolhida com muita gratidão por todos nas escolas que passou.

Essa foi uma das ações desenvolvidas pela administração em 2016 com intuito de proporcionar um momento de alegria e contentamento para as nossas crianças, porque além de dar acesso à educação, também cabe ao Poder Público proporcionar esses momentos prazerosos aos estudantes.

Por essas razões, não vejo como afastar a conclusão da magistrada sentenciante caracterizando a conduta vedada. E, por elucidativo, volto novamente aos fundamentos da meticulosa decisão (fls. 716-717):

[…] A conduta praticada pelos representados não se enquadra nas exceções previstas no §10 do art. 73 da Lei 9.504/97. Assim, houve adequação típica do ato praticado. Veja-se, os representados distribuíram bens (camisetas) gratuitamente, no ano de realização das eleições municipais (22-03-2016 e 23-03-2016), sem execução orçamentária no exercício anterior à eleição (fls. 241-242). Além disso, não há programa social autorizado por lei e desenvolvido pela administração municipal. A entrega das camisetas revela prática de atividade de cunho assistencialista com repercussão na vida de pessoas necessitadas que passam a sentir gratidão pelos agentes públicos. Quanto ao ponto, é incontroverso que os próprios demandados realizaram pessoalmente a entrega dos bens, ocasião em que (fls. 49-57), consoante divulgado em redes sociais e no site do Município de Ciríaco “a administração foi acolhida com muita gratidão por todos nas escolas que passou”:

‘Administração distribui uniformes e chocolates para rede de Ensino Fundamental na Páscoa.

Visitas em colégios municipais leva alegria aos alunos com distribuição de chocolates e uniformes a toda à rede de ensino fundamental.

Distribuir carinho e doces e despertar sorrisos: foi com esses objetivos que a Administração Municipal juntamente com a Secretaria da Educação, organizaram na terça-feira (22), distribuição de presentes e uma camiseta do uniforme escolar para todos alunos e professores da rede de ensino fundamental do município de Ciríaco. Além de promover a alegria entre os pequenos, a administração foi acolhida com muita gratidão por todos nas escolas que passou.

Essa foi uma das ações desenvolvidas pela administração em 2016 com intuito de proporcionar um momento de alegria e contentamento para as nossas crianças, porque além de dar acesso à educação, também cabe ao Poder Público proporcionar esses momentos prazerosos aos estudantes.'

Dessa forma, a conduta praticada pelos demandados é vedada e, neste ponto, a ação de investigação judicial eleitoral é procedente. Assim, aplica-se a legislação eleitoral, consoante sinaliza o Tribunal Superior Eleitoral, “caracterizada a conduta vedada, a multa prevista no §4º do art. 73 da Lei das Eleições é de aplicação impositiva, não havendo falar em princípio da insignificância" (Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 11.488 – Rel. Arnaldo Versiani – j. 22.10.2009).

Desse modo, não há o que reparar na sentença, que entendeu pela configuração da conduta vedada prevista no art. 73, § 10, da Lei n. 9.504/97.

E nesse sentido vem decidindo este Tribunal, como se depreende do recente julgado de relatoria do Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz:

Recurso. Representação. Condutas vedadas. Art. 73, § 10, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2012. Distribuição de madeiras a pessoas carentes do município, durante o ano de eleições municipais. A licitude da conduta exige a perfectibilização do binômio, autorização legal e execução orçamentária no exercício anterior ao pleito. No caso, o programa social restou autorizado por lei, mas ausente prova nos autos de que a execução orçamentária tenha se realizado no exercício anterior ao das eleições, como exige o § 10 do art. 73 da Lei n. 9.504/97. Reforma da sentença para reconhecer a conduta vedada. Imposição de sanção pecuniária, aplicada individualmente, reprimenda suficiente no cotejo com o caso concreto, apresentando-se desproporcional a aplicação da penalidade de cassação dos diplomas aos vereadores representados. Provimento parcial.

(Recurso Eleitoral n. 29242, Acórdão de 25.02.2016, Relator Des. FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 34, Data 29.02.2016, Página 4.) (Grifei.)

De igual modo, descabe alterar a sentença quanto ao pleito dos demandados para que seja reduzida a sanção pecuniária para 5 UFIR para cada representado, pois consideram ser este o mínimo legal previsto no art. 73, § 4º, da Lei n. 9.504/97.

Quanto a este ponto, o art. 73, em seus §§ 4º, 5º e 8º, assim dispõe:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[…]

§ 4º O descumprimento do disposto neste artigo acarretará a suspensão imediata da conduta vedada, quando for o caso, e sujeitará os responsáveis a multa no valor de cinco a cem mil UFIR.

§ 5º Nos casos de descumprimento do disposto nos incisos do caput e no § 10, sem prejuízo do disposto no § 4º, o candidato beneficiado, agente público ou não, ficará sujeito à cassação do registro ou do diploma. (Redação dada pela Lei n. 12.034, de 2009)

[…]

§ 8º Aplicam-se as sanções do § 4º aos agentes públicos responsáveis pelas condutas vedadas e aos partidos, coligações e candidatos que delas se beneficiarem. (Grifei.)

A jurisprudência do egrégio Tribunal Superior Eleitoral é uníssona ao compreender que o valor mínimo do aludido § 4º é de cinco mil UFIR, e não cinco, como querem crer os representados. Vejamos:

AGRAVO REGIMENTAL. CONDUTA VEDADA. ELEIÇÕES 2006. AUSÊNCIA DO REQUISITO DE POTENCIALIDADE. ELEMENTO SUBJETIVO. NÃO INTERFERÊNCIA. INSIGNIFICÂNCIA. NÃO INCIDÊNCIA. PROPORCIONALIDADE. FIXAÇÃO DA PENA. RECURSO PROVIDO.

1. A configuração da prática de conduta vedada independe de potencialidade lesiva para influenciar o resultado do pleito, bastando a mera ocorrência dos atos proibidos para atrair as sanções da lei. Precedentes: Rel. Min. Arnaldo Versiani, AI 11.488, DJe 2.10.2009; Rel. Min. Marcelo Ribeiro, AgReg no REsp 27.197, DJe 19.6.2009; Rel. Min. Cármen Lúcia, REsp 26.838, DJe 16.9.2009.

2. O elemento subjetivo com que as partes praticam a infração não interfere na incidência das sanções previstas nos arts. 73 a 78 da Lei nº 9.504/97.

3. O juízo de proporcionalidade incide apenas no momento da fixação da pena. As circunstâncias fáticas devem servir para mostrar a relevância jurídica do ato praticado pelo candidato, interferindo no juízo de proporcionalidade utilizado na fixação da pena.

4. No caso, não cabe falar em insignificância, pois, utilizados o e-mail eletrônico da Câmara Municipal, computadores e servidor para promover candidaturas. Tratando-se de episódio isolado provocado por erro do assessor e havendo o reembolso do erário é proporcional a aplicação de multa no valor de 5.000 UFIRs, penalidade mínima prevista.

5. Agravo regimental provido para conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, reformando o acórdão proferido pelo e. TRE/SP para reconhecer a prática da conduta vedada prevista no art. 73, I, II e III, da Lei nº 9.504/97, aplicando multa no valor de 5.000 UFIRs.

(TSE - Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 27896. Relator Min. JOAQUIM BENEDITO BARBOSA GOMES. Relator designado Min. FELIX FISCHER. RJTSE - Revista de Jurisprudência do TSE, Volume 20, Tomo 4, Data 08.10.2009, Página 214, DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 18.11.2009, Página 43.) (Grifei.)

E no mesmo sentido é a recente jurisprudência trazida pelo douto procurador regional eleitoral, litteris:

RECURSO DE JOSÉ NELSON MARTINS DE SOUSA ELEIÇÕES 2014. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA INSTITUCIONAL. PERÍODO VEDADO. ART. 73, INCISO VI, ALÍNEA b, DA LEI Nº 9.504/97. SECRETARIA DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ. TITULAR DA PASTA. CONDENAÇÃO. MULTA. MÍNIMO LEGAL. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO. NÃO CONHECIMENTO.

[...]

5. A aplicação da sanção de multa no patamar mínimo atende aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, visto que não há nos autos elementos que denotem gravidade da conduta de modo a possibilitar a majoração do valor da multa pretendida pela Coligação recorrente.

6. PROVIMENTO PARCIAL do recurso ordinário para, reconhecendo-se a legitimidade passiva do representado CID FERREIRA GOMES, aplicar-lhe sanção de multa no valor de cinco mil UFIRs, com base no art. 73, § 4º, da Lei nº 9.504/97.

(Recurso Especial Eleitoral n. 119473, Acórdão de 01.8.2016, Relatora Min. MARIA THEREZA ROCHA DE ASSIS MOURA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 05.9.2016.) (Grifei.)

 

AGRAVO REGIMENTAL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2014. GOVERNADOR. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). CONDUTAS VEDADAS A AGENTES PÚBLICOS EM CAMPANHA. ART. 73, IV, VI, B, E § 10, DA LEI 9.504/97. CONFIGURAÇÃO. MULTA. PROPORCIONALIDADE. DESPROVIMENTO. AGRAVO DA COLIGAÇÃO TODOS PELO PARÁ.

[...]

11. Embargos declaratórios opostos contra decisum monocrático e com pretensão infringente são recebidos como agravo regimental. Precedentes.

12. As sanções de multa e de cassação de diplomas - art. 73, §§ 4º e 5º, da Lei 9.504/97 - devem observar os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Precedentes.

13. Na espécie, afigura-se suficiente multa no mínimo legal (R$ 5.320,50), por cada conduta, a Simão Jatene (responsável), a José Marinho (beneficiário) e à Coligação Juntos com o Povo (também beneficiária), visto que os fatos ocorreram em município pequeno, de menos de 50.000 habitantes, em Estado da Federação com mais de oito milhões de pessoas, sem notícia de exploração ostensiva desse ato em outras etapas da campanha.

14. O áudio e as imagens do evento focam em cerca de 20 pessoas e não permitem sequer estimar público presente.

CONCLUSÃO

15. Agravos regimentais desprovidos, mantendo-se três multas individuais, no mínimo legal, de R$ 5.320,50 cada, a Simão Jatene, José Marinho e à Coligação Juntos com o Povo, com base nas condutas vedadas do art. 73, IV, VI, b e § 10, da Lei 9.504/97.

(Agravo Regimental em Recurso Ordinário n. 278378, Acórdão de 20.10.2016, Relator Min. ANTONIO HERMAN DE VASCONCELLOS E BENJAMIN, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 237, Data 15.12.2016, Páginas 23/24.) (Grifei.)

Consequentemente, deve ser mantida a multa no valor mínimo de 5.000 (cinco mil) UFIR para cada um dos representados, consoante o disposto no art. 73, § 4º, da Lei n. 9.504/97.

Por fim, e pautado pela jurisprudência acima transcrita, entendo por afastar a irresignação da coligação representante, no sentido de que fosse imposta a cassação do registro dos representados e não apenas aplicada a multa pelo reconhecimento da prática da conduta vedada pelos demandados.

Registro que o juízo de primeiro grau, em consonância com o princípio da proporcionalidade, corretamente entendeu por suficiente a aplicação da multa aos representados, em seu patamar mínimo, tendo em vista o baixo grau de lesividade da conduta por estes praticada, compreendendo que a cassação do registro ou do diploma seria desarrazoada. Recorro à sentença (fls. 717-8):

[…] na hipótese dos autos, necessária é a realização de juízo de proporcionalidade, pois é desarrazoada a decretação de inelegibilidade ou cassação do registro ou diploma dos demandados, diante da ausência de gravidade pela prática da conduta vedada, revelando-se suficiente a aplicação de multa aos representados, consoante previsto no §4º do art. 73 da Lei das Eleições. No mesmo sentido é a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral:

'[...] Representação. Conduta vedada. Publicidade institucional. Período vedado. Decadência. Inocorrência. Gravidade. Ausência. Princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Incidência. Desprovimento. (...) 3. O Tribunal a quo  concluiu que, embora seja inconteste a existência da publicidade institucional no sítio do Município de Vieiras/MG, os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade deveriam ser aplicados ao caso, haja vista ser desarrazoada a decretação de inelegibilidade ou cassação do diploma dos recorrentes, bem como a aplicação de multa acima do mínimo legal, ante a ausência de gravidade. 4. Tal entendimento encontra-se em harmonia com o posicionamento fixado nesta Corte, segundo o qual 'o dispositivo do art. 73, § 5º, da Lei nº 9.504/97, não determina que o infrator perca, automaticamente, o registro ou o diploma. Na aplicação desse dispositivo reserva-se ao magistrado o juízo de proporcionalidade. Vale dizer: se a multa cominada no § 4º é proporcional à gravidade do ilícito eleitoral, não se aplica a pena de cassação' (AI nº 5.343/RJ, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 4.3.2005)

Analisando o caso em questão, considero que não houve a demonstração da violação aos bens jurídicos tutelados pela legislação eleitoral (normalidade e legitimidade do pleito), por conta da entrega das camisetas aos alunos da rede municipal de ensino. Ademais, a distribuição de camisetas ocorreu no final do mês de março de 2016 (fls. 49-57), data consideravelmente distante das eleições municipais; não há demonstração de atos praticados que revelassem possível antecipação de campanha eleitoral; as camisetas foram entregues diretamente aos professores e alunos das escolas municipais, sem a presença dos pais e/ou responsáveis pelos alunos, consoante referiram os informantes, em audiência de instrução e julgamento (fls. 664-665) e em anos anteriores, a administração municipal, em datas comemorativas, realizou a distribuição de chocolates aos alunos da rede municipal de ensino (fls. 234-240).

Assim, diante do grau de lesividade mínimo ocasionado pela prática da conduta vedada pelos demandados, julgo a demanda procedente, quanto ao ponto, condenando cada um dos representados (Arlindo Antônio Lopes, Odacir Boaventura Manhabosco de Mello e Euclides José Marcante) ao pagamento de multa, no valor mínimo previsto em lei, correspondente a 5 (cinco) mil UFIRS, consoante previsto no §4º do art. 73 da Lei das Eleições.

Dessa forma, deve ser desprovido o apelo da coligação representante também em relação a este ponto.

2.4. Dos atos de improbidade administrativa supostamente praticados em período eleitoral

Por fim, a coligação representante insurge-se alegando a prática de atos de improbidade administrativa pelos representados, os quais configurariam abuso de poder. Elenca as seguintes condutas: (a) contas julgadas irregulares pelo Tribunal de Contas do Estado (Processo n. 1987-02.00/14-4); (b) investigação do Ministério Público e Tribunal de Contas do Estado acerca do concurso público realizado pelo município no ano de 2015; e (c) ausência de repasse de recursos mensais ao Fundo Previdenciário dos Servidores Públicos de Ciríaco.

Sem razão.

A ação de impugnação de mandato eletivo tem o objetivo de coibir o abuso do poder econômico, do poder político e do uso dos meios de comunicação durante as eleições como forma de resguardar a normalidade e a legitimidade das eleições.

Todavia, tal como apontado pelo douto procurador regional eleitoral (fl. 788v):

[…] os fatos narrados pela coligação recorrente tratam-se de questões adstritas à esfera administrativa, portanto, alheias a esta Justiça Especializada, não tendo sido produzida nenhuma prova de que as situações descritas nos fatos teriam ocorrido em troca de apoio político ou de voto, não restando, assim, comprovada qualquer finalidade eleitoral, devendo tais fato serem apurados pela Justiça Comum.

Em virtude disso, o representante do Parquet requereu o encaminhamento de cópia dos autos ao Ministério Público de Casca/RS, a fim de que se averiguem possíveis atos de improbidade administrativa.

Portanto, acolho a fundamentação ministerial como razões de decidir, entendendo pelo desprovimento do recurso igualmente quanto a esse fato, visto que o presente feito não se presta para o exame de supostos atos de improbidade administrativa eventualmente cometidos pelos representados.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento dos recursos, mantendo íntegra a bem-lançada sentença de primeiro grau; e por autorizar a extração de cópias dos presentes autos pela Procuradoria Regional Eleitoral, a fim de que esta possa encaminhá-las ao Ministério Público de Casca/RS para averiguação de supostos atos de improbidade administrativa.

É como voto, Senhora Presidente.