RE - 16857 - Sessão: 17/05/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso eleitoral interposto por FREDERICO ARCARI BECKER em face da sentença que desaprovou as contas relativas à candidatura de chapa majoritária no Município de Bom Jesus, nos termos do art. 68, inc. III, da Resolução TSE n. 23.463/2015, por violação ao disposto no art. 18, § 1º, da mencionada resolução (fls. 42-43).

Em seu apelo (fls. 54-61), o candidato aduz, em síntese, que Frederico utilizou-se de recursos próprios, conforme o autoriza a legislação, e que “não há possibilidade jurídica de o candidato fazer doação a ele próprio”. Alega a ocorrência de erro técnico, formal, que não poderia dar azo à desaprovação das contas, em razão de: os valores não serem oriundos de fonte vedada; constar o CPF do depositante no extrato; os depósitos serem compatíveis com a declaração de renda do candidato; terem sido juntados comprovantes de recebimento judicial de valores. O recorrente ainda colaciona documentos e defende que contas com ocorrência idêntica àquela detectada nestes autos foram aprovadas pela Justiça Eleitoral.

Sem contrarrazões, nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 71-74v.).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, o recorrente se insurge quanto à desaprovação de sua prestação de contas e à determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da importância de R$ 24.000,00 (vinte e quatro mil reais), pois algumas das doações financeiras aos prestadores das contas foram realizadas sem a observância do que preceitua o parágrafo 1º do artigo 18 da Resolução TSE n. 23.463/15, que assim dispõe:

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação.

Com efeito, é incontroverso nos autos que FREDERICO ARCARI BECKER realizou depósitos bancários (não observando a exigência de transferência eletrônica) na conta de campanha, nos valores de R$ 5.000,00 (1º.9.16), R$ 3.000,00 (1º.9.16), R$ 8.000,00 (10.10.16) e R$ 8.000,00 (14.10.16), que totalizaram R$ 24.000,00 – fl. 40 e verso -, violando o disposto no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15.

O exame do extrato da fl. 30 permite concluir que o recorrente fez outros depósitos em dinheiro na mesma conta, mas esses, individualmente e considerando a data do depósito, não superaram o valor indicado no dispositivo legal.

Inicialmente, anoto que, na sistemática da prestação de contas eleitoral, todo ingresso ou arrecadação é considerado doação.

Veja-se que o parágrafo 2º do artigo 6º da resolução que disciplina a situação que aqui se analisa determina a emissão de recibo para toda doação, ao passo que o caput do dispositivo prevê a necessidade de emissão de recibo para “toda e qualquer arrecadação de recursos para a campanha eleitoral, financeiros ou estimáveis em dinheiro, inclusive os recursos próprios e aqueles arrecadados por meio da Internet”.

Logo, nesse contexto, é possível deduzir que doação é “toda e qualquer arrecadação de recursos para a campanha eleitoral, financeiros ou estimáveis em dinheiro, inclusive os recursos próprios e aqueles arrecadados por meio da Internet”.

Conclui-se, daí, pela possibilidade jurídica de o candidato fazer doação para si próprio, de forma que deve ser afastado o argumento do recorrente em sentido diverso.

Do mesmo modo, a pessoa do candidato e a pessoa do eleitor não são juridicamente o mesmo sujeito, tanto que o candidato, a partir do registro da candidatura, passa a movimentar recursos vinculados ao número de registro no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica - CNPJ, enquanto o eleitor continua identificado pelo número de inscrição no CPF/MF.

Prosseguindo, anoto que o número do CPF de FREDERICO ARCARI BECKER (666.117.680-68) constou no registro de cada um dos depósitos efetuados na conta de campanha (fls. 30-31).

A exigência de transferência eletrônica para realização de doação acima de R$ 1.064,10 visa coibir a possibilidade de manipulações e transações transversas que ocultem ou dissimulem eventuais ilicitudes, como a utilização de fontes vedadas de recursos e a desobediência aos limites de doação.

Contudo, ainda que não tenha sido observado o disposto no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15, houve a possibilidade de identificação do doador, ou seja, o próprio candidato.

Nessa medida, restou atendida a finalidade da regra, qual seja, verificar as reais fontes de financiamento da campanha.

Esta Corte apreciou recentemente questão bastante semelhante à dos autos, sendo que ficou consignado naquele precedente:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Chapa majoritária. Doação financeira. Resolução TSE n. 23.463/15. Eleições 2016.

Doação financeira realizada por meio de depósito bancário, contrariando o disposto no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15, que exige transferência eletrônica. Irregularidade que não impediu a identificação do doador originário – o próprio candidato.

Tendo sido identificada a fonte de financiamento da campanha eleitoral, resta atendida a finalidade da norma. Afastada a incidência do § 3º do art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15 para o fim de isentar os candidatos do recolhimento do valor recebido ao Tesouro Nacional.

Provimento.

(RE 209-03, Relator: Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, julgado em 28.3.2017.)

 

Além do forte argumento persuasivo contido em tal precedente, as disposições do Código de Processo Civil de 2015, em especial aquela que recomenda a uniformização da jurisprudência dos tribunais para mantê-la estável, íntegra e coerente, recomendam o prestígio da mencionada decisão, sobretudo porque não se evidencia, nesta avaliação, nenhum elemento que diferencie o caso dos autos daquele anteriormente apreciado.

E, na esteira da tese fixada no RE 209-03, deve ser afastada a incidência do § 3º do art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15, na medida em que o doador estaria identificado, o que isenta os candidatos do recolhimento do valor recebido ao Tesouro Nacional.

Assim sendo, a inobservância da regra que determina a realização de doação mediante transferência eletrônica, no caso dos autos, e considerando a perfeita identificação do doador, deve ser considerada mera falha formal, permitindo a aprovação com ressalvas da contabilidade.

 

Nesses termos, VOTO pelo provimento do recurso para aprovar com ressalvas as contas da candidatura de FREDERICO ARCARI BECKER e SÉRGIO FRANCISCO VARELA, com fundamento no art. 68, inc. II, da Resolução TSE n. 23.463/15.