RE - 30035 - Sessão: 02/05/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (PMDB) de Arroio do Tigre em face da sentença exarada pelo Juízo da 154ª Zona Eleitoral, que julgou aprovadas as contas referentes às eleições municipais de 2016, apresentadas por MARCIANO RAVANELLO e VANDERLEI HERMES, candidatos eleitos para os cargos de prefeito e vice, respectivamente, daquele município.

Em suas razões, o recorrente sustenta omissão de gastos com locação de imóveis em que foram realizados comícios de campanha, revelando falhas que comprometem a regularidade das contas apresentadas. Juntou cópia das páginas da rede social Facebook do candidato Marciano Ravanello, nas quais constam convite de comparecimento aos referidos comícios. Requer, ao final, a reforma da sentença para desaprovar as contas (fls. 161-171).

Em contrarrazões, os recorridos alegam que a falta de registro na prestação de contas se deu por conta da gratuidade da cessão dos locais onde se realizaram os eventos. Acostaram aos autos documentos referentes à solicitação dos espaços.

Com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo não conhecimento do recurso (fls. 195-198).

É o relatório.

 

VOTO

Senhora Presidente, eminentes colegas.

O recurso é tempestivo.

Entretanto, a matéria preliminar de não conhecimento do recurso por falta de interesse e por ilegitimidade do recorrente, suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral, merece ser acolhida.

Conforme relatado, cinge-se a irresignação do partido contra sentença monocrática que aprovou as contas dos candidatos a prefeito e vice, sob o argumento de existência de falhas prejudiciais à sua regularidade.

De início, cumpre assinalar o trâmite regular do processo no juízo de origem, iniciado com a tempestiva apresentação das contas, seguido pela publicação do respectivo edital para efeito de publicidade, emissão do parecer do Ministério Público Eleitoral e pela sentença de aprovação.

Em relação à publicação da contabilidade, é consabido que objetiva garantir a qualquer partido político, candidato ou coligação, assim como ao Ministério Público Eleitoral, o direito de oferecer impugnação no prazo de três dias a contar da afixação do edital de divulgação das contas ofertadas, como dispõe o art. 51 da Resolução TSE n. 23.463/15. Vejamos:

Art. 51. Com a apresentação das contas finais, a Justiça Eleitoral disponibilizará as informações a que se refere o inciso I do caput do art. 48, bem como os extratos eletrônicos encaminhados à Justiça Eleitoral, na página do TSE, na Internet, e determinará a imediata publicação de edital para que qualquer partido político, candidato ou coligação, o Ministério Público, bem como qualquer outro interessado, possa impugná-las no prazo de três dias (grifo nosso).

Contudo, no caso sob análise o partido político ora recorrente deixou de oferecer impugnação às contas na oportunidade em que lhe cabia, precluindo, dessa forma, o seu direito de questionar supostas irregularidades.

A falta de intervenção na primeira instância denuncia a ilegitimidade da agremiação para recorrer, vez que não é parte no presente processo.

E, agora, em sede de recurso, a agremiação vem aos autos defender a existência de falhas comprometedoras à análise das contas. E como bem salientado pelo Parquet, a condição de participante do pleito não confere legitimidade para interposição do apelo com o objetivo de desaprová-las.

Inexistente, ainda, o requisito do interesse de agir do partido, consubstanciado na ausência de relação jurídica com os recorridos. A decisão atacada não influencia a esfera jurídica da grei partidária recorrente, visto que não lhe causa prejuízo ou benefício.

Assim, carece ao apelante o requisito intrínseco do interesse em recorrer, nos termos do art. 17 do Código de Processo Civil, o qual dispõe que para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade. Por esse dispositivo, impõe o CPC que o autor da ação demonstre interesse processual, que se traduz no binômio necessidade/utilidade do provimento jurisdicional solicitado, sob pena de extinção da ação sem julgamento do mérito.

Pelo mesmo motivo, é indispensável que o recorrente demonstre interesse em recorrer para efeito de admissibilidade do recurso, nos termos do art. 996 do CPC:

Art. 996 - O recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público, como parte ou como fiscal da ordem jurídica.

Parágrafo único. Cumpre ao terceiro demonstrar a possibilidade de a decisão sobre a relação jurídica submetida à apreciação judicial atingir direito de que se afirme titular ou que possa discutir em juízo como substituto processual.

De acordo com o ilustre doutrinador Nelson Nery Júnior (Teoria geral dos recursos. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 315):

Da mesma forma com que se exige o interesse processual para que a ação seja julgada pelo mérito, há necessidade de estar presente o interesse recursal para que o recurso possa ser examinado em seus fundamentos. Assim, poder-se-ia dizer que incide no procedimento recursal o binômio necessidade + utilidade como integrantes do interesse em recorrer.

Por fim, importante ressaltar que para a configuração da irregularidade prevista no art. 30-A e a consequente aplicação da pena de cassação do registro ou diploma, devem estar evidenciadas a comprovação da arrecadação ou gasto ilícito e a relevância da conduta praticada, considerando-se o contexto da campanha do candidato ou o próprio valor em si. Situação a ser investigada em procedimento próprio, dado que o resultado da análise das contas não acarreta necessariamente a condenação com base no art. 30-A da Lei das Eleições, diante da sua independência e autonomia relativamente às demais ações que visam a apurar eventual abuso de poder econômico.

Ante o exposto, VOTO pelo não conhecimento do recurso, nos termos da fundamentação.

É como voto, Senhora Presidente.