RE - 2358 - Sessão: 27/01/2017 às 11:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA – PSDB contra a sentença que desaprovou sua prestação de contas relativa ao exercício financeiro de 2011, em razão do recebimento de contribuições oriundas de fontes vedadas no valor de R$ 11.780,24 (onze mil, setecentos e oitenta reais e vinte e quatro centavos), efetuadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum com poder de autoridade, determinando o recolhimento da quantia considerada irregular ao Fundo Partidário e a suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário pelo período de um ano.

Em suas razões, afirma que a Resolução TSE n. 22.585/07 teve o objetivo de evitar a coercibilidade das contribuições partidárias e aponta que os secretários municipais que fizeram os repasses de recursos considerados como provenientes de fonte vedada são filiados ao partido. Alega que as contribuições são realizadas desde longa data, mesmo antes de os filiados serem investidos em cargos públicos, e apenas representaram continuidade de prática há muito tempo adotada. Invoca o voto prolatado pelo Min. Cezar Peluso na Resolução TSE n. 22.585/07 e assevera que as contribuições foram espontâneas, não podendo ser consideradas irregulares tão somente pelo fato de terem partido de detentores de cargos demissíveis ad nutum com poder de autoridade. Pondera que, ao assumir a presidência da legenda, a nova nominata constatou a falta de bens partidários e documentos contábeis, registrando ocorrência policial. Defende que a irregularidade representa 9% do total de recursos arrecadados pelo partido, quantia que se mostra insignificante, e solicita a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade a fim de que as contas sejam aprovadas, pois ausente comprovação de má-fé. Sustenta que a sentença ignorou o art. 30, §§ 2º e 2º-A, da Lei n. 9.504/97, deixando de esclarecer a sua aplicação, uma vez que erros irrelevantes não comprometem o resultado das contas. Alega ofensa ao princípio da legalidade, da instrumentalidade e da finalidade da norma, porque a inconsistência não representa abuso de poder econômico, desequilíbrio do pleito ou qualquer violação aos bens jurídicos tutelados pelas normas legais. Assinala a ausência de previsão legal para a determinação de recolhimento de valores ao Fundo Partidário, uma vez que o § 4º do art. 24 da Lei das Eleições foi incluído apenas em 2015 pela Lei n. 13.165/15. Acrescenta que o art. 36 da Lei n. 9.096/95 não traz a previsão de devolução de valores e que a Resolução TSE n. 21.841/04 inova ao tratar dessa previsão sem amparo legal. Colaciona precedente jurisprudencial e prequestiona os arts. 17, 30, incs. I a IV e § 2º-A, e 30-A da Lei n. 9.504/97, arts. 1º, inc. III, 5º, incs. XXXIX, XLV, LIV, LV, LVI, LVII, e 16 da Constituição Federal. Postula a reforma da sentença para a aprovação das contas, ainda que com ressalvas.

Com vista dos autos, a Procuradoria Regional opinou, preliminarmente, pela anulação da sentença a fim de que sejam citados os dirigentes partidários e, no mérito, pelo desprovimento do recurso com readequação do destino do recolhimento dos valores considerados provenientes de fontes vedadas para o Tesouro Nacional.

É o relatório.

 

VOTOS

Dr. Silvio Ronaldo Santos de Moraes (relator):

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

Passo ao enfrentamento da preliminar de nulidade do feito por falta de citação de dirigentes partidários arguida pela Procuradoria Regional Eleitoral.

A matéria tem sido discutida pela Corte em reiteradas sessões de julgamento, havendo divergência de entendimento quanto à caracterização do fato como nulidade absoluta ou relativa, principalmente devido a decisões monocráticas do TSE que, em sede de recurso especial, reformaram acórdãos do TRE-RS para que fossem citados os responsáveis partidários nos processos de prestação de contas.

Com muito respeito à posição contrária, reitero minha convicção no sentido de que a preliminar não deve ser acolhida.

Observo que os processos em que o TSE determinou a inclusão dos dirigentes como partes tratavam de prestação de contas dos diretórios regionais, de competência originária desta Corte.

Naqueles feitos, a matéria foi invocada pela Procuradoria Regional Eleitoral durante a tramitação, antes do julgamento das contas, inclusive mediante interposição de recurso especial contra as decisões interlocutórias que determinavam a exclusão dos responsáveis das contas.

Com base nesses julgados do TSE, este Tribunal, de ofício, passou a incluir os responsáveis dos partidos como partes nas contas dos diretórios regionais atualmente em tramitação.

Entretanto, o presente processo está sendo analisado em grau de recurso, pois se trata de prestação de contas de diretório municipal já sentenciada, e o apelo é exclusivo do partido.

Não há interposição de recurso invocando a nulidade pelo órgão ministerial com atribuição na origem, a quem compete atuar durante a tramitação das contas como fiscal da ordem jurídica, devendo prevalecer o disposto no § 2º do art. 65 da Resolução n. 23.464/15 do TSE, que prevê ficar a cargo do juiz que julga as contas a decisão sobre a adequação do rito dos processos de prestações de contas, sem que sejam anulados ou prejudicados os atos já realizados.

Também considero que não há prejuízo ou nulidade absoluta na falta de citação dos dirigentes, pois o feito seguiu a legislação vigente na data do exercício de 2011, a qual não impunha a participação do presidente e do tesoureiro durante a tramitação das contas, devendo ser mantido o procedimento adotado na origem, em prol da segurança jurídica.

Ademais, decorre da Lei dos Partidos Políticos a conclusão de que a obrigação dos dirigentes partidários é subsidiária no tocante à agremiação, e não solidária, conforme consta no § 13 do art. 37 da Lei n. 9.096/95:

§ 13. A responsabilização pessoal civil e criminal dos dirigentes partidários decorrente da desaprovação das contas partidárias e de atos ilícitos atribuídos ao partido político somente ocorrerá se verificada irregularidade grave e insanável resultante de conduta dolosa que importe enriquecimento ilícito e lesão ao patrimônio do partido.

Assim, considerando que o processo subiu a esta Corte com estabilização da relação jurídico-processual e que não é caso de nulidade absoluta, VOTO pelo afastamento da preliminar.

 

 

Analisada a matéria preliminar, mostra-se importante tecer algumas considerações antes do enfrentamento do mérito, uma vez que, pelas normas legais invocadas na peça recursal, há aparente confusão entre o regramento previsto para as contas de exercício financeiro e as normas que regem as contas de campanha.

O presente processo trata da prestação de contas anual do exercício financeiro de 2011 do partido PSDB de Uruguaiana. Ao feito, são aplicáveis, estritamente, as normas previstas na Lei dos Partidos Político (Lei n. 9.096/95), na Resolução TSE n. 21.814/04, que disciplina o mérito das contas e regulou o seu processamento até dezembro de 2014, ocasião em que foi revogada pela Resolução TSE n. 23.432/14, a qual passou a reger seu processamento a partir de janeiro de 2015 e foi posteriormente revogada pela Resolução TSE n. 23.464/15, que permanece em vigor e regula o processamento das contas desde janeiro de 2016.

Assim, por expressa previsão legal, são inaplicáveis ao processo as normas previstas na Lei das Eleições (Lei n. 9.504/97), que tratam especificamente da prestação de contas de eleição dos partidos políticos e candidatos, expediente que constitui uma fase do processo eleitoral e tem o condão de repercutir no seu desiderato, dado que o julgamento das contas de campanha deve ser publicado até três dias antes da diplomação dos candidatos eleitos.

Além disso, cabe consignar que a jurisprudência deste Tribunal Regional está consolidada no sentido da não aplicação da Lei n. 13.165/15 (Reforma Eleitoral) aos processos que já tramitavam antes da sua publicação, motivo pelo qual o mérito deste processo será julgado exclusivamente com base nas normas vigentes ao tempo do exercício financeiro em questão, 2011.

Estabelecidas essas premissas, tem-se que a presente prestação de contas foi desaprovada em razão do recebimento de contribuições oriundas de fontes vedadas no valor de R$ 11.780,24 (onze mil, setecentos e oitenta reais e vinte e quatro centavos), efetuadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum com poder de autoridade, a saber: procurador-geral e secretários municipais.

As verbas efetivamente enquadram-se como fontes vedadas de contribuições, nos termos da Resolução TSE n. 22.585/07, a qual trata de doações advindas de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que tenham a condição de autoridades, ou seja, desempenham função de direção ou chefia.

O partido argumenta que os ocupantes dos cargos em questão não se caracterizam como fonte vedada, porque realizaram as contribuições de forma espontânea e não coercitiva, prática que adotavam desde antes da assunção ao cargo público.

No entanto, o argumento não tem o condão de afastar a irregularidade.

De fato, antes de editada a Resolução TSE n. 22.585/07, o egrégio Tribunal Superior Eleitoral (TSE) havia firmado entendimento admitindo a contribuição de filiados ocupantes de cargos exoneráveis ad nutum, conforme se depreende da ementa do julgamento da Petição n. 310 (Resolução TSE n. 20.844, de 14.8.2001), de relatoria do Ministro Nelson Jobim:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO DOS TRABALHADORES – PT.

EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 1996.

Contribuição de filiados ocupantes de cargos exoneráveis ad nutum.

Inexistência de violação ao art. 31, II, da Lei n. 9.096/95. Contas aprovadas.

(PETIÇÃO n. 310, Resolução n. 20844 de 14.8.2001, Relator Min. NELSON AZEVEDO JOBIM, Publicação: DJ - Diário de Justiça, volume 1, data 09.11.2001, página 154 RJTSE - Revista de Jurisprudência do TSE, volume 13, tomo 1, página 302.)

Todavia, no ano 2007, a partir do julgamento da Consulta n. 1428 (Resolução TSE n. 22.585/07), formulada pelo Presidente Nacional dos Democratas, a orientação da Corte Superior Eleitoral foi alterada, pois o TSE assentou nova interpretação ao art. 31, caput, inc. II da Lei n. 9.096/95:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

II – autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38;

(sem grifos no original)

A consulta indagou: “É permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de detentores de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta da União, dos Estados e Municípios?”, e o TSE respondeu apontando que não pode haver a doação por detentor de cargo de chefia e direção:

Partido político. Contribuições pecuniárias. Prestação por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta. Impossibilidade, desde que se trate de autoridade. Resposta à consulta, nesses termos. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades.

 

(CONSULTA n. 1428, Resolução n. 22585 de 06.9.2007, Relator Min. JOSÉ AUGUSTO DELGADO, Relator designado Min. ANTONIO CEZAR PELUSO, Publicação: DJ – Diário de justiça, Data 16.10.2007, Página 172.)

A questão, que até então estava abrangida pela ressalva prevista no § 1º do art. 5º da Resolução TSE n. 21.841/04, passou a ser regulada não apenas pela Resolução TSE n. 22.585/07, mas também pela Resolução TSE n. 23.077, de 04.6.2009.

A Resolução TSE n. 23.077/09 foi publicada a partir dessa orientação jurisprudencial e determinou que, durante as arrecadações dos exercícios financeiros seguintes, os partidos políticos observassem o entendimento firmado pelo TSE na Consulta n. 1428 (Resolução TSE n. 22.585/07) no que concerne à contribuição de filiados, tendo em conta a interpretação dada ao inc. II do art. 31 da Lei n. 9.096/95, que concluiu pela impossibilidade de doação de titulares de cargos de direção e chefia:

PETIÇÃO. PARTIDO DA MOBILIZAÇÃO NACIONAL (PMN). ALTERAÇÕES ESTATUTÁRIAS. REGISTRO. DEFERIMENTO PARCIAL.

1. O partido político é obrigado a observar, na elaboração de seu programa e estatuto, as disposições constitucionais e as da Lei dos Partidos Políticos.

2. O estatuto do partido, ao dispor que todos os cargos em comissão na esfera de sua atuação pertencem ao partido e serão preenchidos por filiados da agremiação, subordina os interesses estatais a conveniências político-partidárias.

3. É vedado ao partido determinar a seus parlamentares a desobediência ao disposto nos regimentos das respectivas Casas Legislativas, uma vez que a autonomia partidária não coloca em plano secundário as disposições regimentais dessas Casas.

4. É vedado ao partido impor a seus parlamentares a declaração de voto, porque, em alguns casos, o voto secreto tem índole constitucional, especialmente na hipótese de cassação de mandato de parlamentar.

5. A fixação de critérios de contribuição de filiados do partido deve observar a interpretação dada ao inciso II do art. 31 da Lei nº 9.096/95 na Resolução-TSE nº 22.585/2007.

6. Pedido deferido parcialmente.

(Petição n. 100, Resolução n. 23077 de 04.6.2009, Relator Min. MARCELO HENRIQUES RIBEIRO DE OLIVEIRA, Publicação: DJE – Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 147, Data 4.8.2009, Página 105 RJTSE - Revista de jurisprudência do TSE, Volume 20, Tomo 3, Data 4.6.2009, Página 301.)

(Sem grifos no original.)

Conforme se observa do precedente acima, é dever do partido político manter o estatuto partidário alinhado às disposições legais, não merecendo acolhida o argumento de que a contribuição deve ser considerada legítima por ter sido realizada com liberalidade e por representar a continuidade de uma prática que já vinha sendo adotada.

De salientar que, segundo o entendimento consolidado do TSE, é ilegal a previsão estatutária que disponha sobre o dever de contribuição financeira de filiados detentores de cargos em comissão com poder de autoridade.

Após consolidada a interpretação dada pelo TSE ao art. 31, caput, inc. II, da Lei n. 9.096/95 os tribunais eleitorais de todo o país, inclusive este TRE, passaram a julgar as contas partidárias com observância à vedação de contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta com poder de autoridade:

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Doação de fonte vedada. Art. 31, II, da Lei n. 9.096/95. Exercício financeiro de 2013.

Desaprovam-se as contas quando constatado o recebimento de doações de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, que detenham condição de autoridade, vale dizer, desempenhem função de direção ou chefia.

Redução, de ofício, do período de suspensão do recebimento de cotas do Fundo Partidário, conforme os parâmetros da razoabilidade. Manutenção da sanção de recolhimento de quantia idêntica ao valor recebido irregularmente ao Fundo Partidário.

Provimento negado.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 2346, Acórdão de 12.3.2015, Relator DR. INGO WOLFGANG SARLET, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 45, Data 16.3.2015, Página 02.)

 

Recurso Eleitoral. Prestação de Contas Anual. Exercício 2012. Partido Democrático Trabalhista – PDT de Taquara. Contas desaprovadas. Preliminar de impugnação de documentos como prova válida. Exame remetido à análise da questão de fundo. Preliminar de cerceamento de defesa afastada, em face de haver, nos autos, comprovação de que o partido teve oportunidade de se manifestar sobre documentos acostados. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades. Configuradas doações de fonte vedada. Servidores ocupantes de cargos demissíveis ad nutum.

Afastadas do cálculo do valor a ser recolhido ao Fundo Partidário as doações de assessores e procuradores jurídicos, os quais não são considerados autoridades. Deram parcial provimento ao recurso, apenas ao efeito de reduzir o valor recolhido ao Fundo Partidário.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 8303, Acórdão de 12.11.2014, Relator DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 207, Data 14.11.2014, Página 02.)

 

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Exercício de 2010.

Desaprovação pelo julgador originário. Aplicação da pena de suspensão das cotas do Fundo Partidário pelo período de doze meses, bem como o recolhimento de valores, ao mesmo fundo, relativos a recursos recebidos de fonte vedada e de fonte não identificada.

A documentação acostada em grau recursal milita em prejuízo do recorrente, uma vez que comprova o recebimento de valores de autoridade pública e de detentores de cargos em comissão junto ao Executivo Municipal. A maior parte da receita do partido provém de doações de pessoas físicas em condição de autoridade, prática vedada nos termos do artigo 31, incisos II e III, da Lei n. 9.096/95.

Provimento negado. (TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 4550, Acórdão de 19.11.2013, Relator DR. JORGE ALBERTO ZUGNO, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 216, Data 22.11.2013, Página 2.)

A previsão de fontes vedadas tem por finalidade impedir a influência econômica daqueles que tenham alguma vinculação com órgãos públicos e, também, evitar possíveis manipulações da máquina pública em benefício de determinadas campanhas, conforme a lição de Carlos Velloso e Walber Agra (AGRA, Walber de Moura. VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Elementos de Direito Eleitoral. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 317):

Tentou a lei eleitoral, ao excluir esses órgãos ou entidades, preservar o pleito eleitoral de sua influência, que, pelo vulto dos interesses que personificam, podem desequilibrar a campanha em favor daqueles aquinhoados com sua preferência. Outrossim, busca-se impedir que entidades públicas, de caráter público ou que possuam vínculos estreitos com órgãos governamentais, possam exercer suas funções com desvio de finalidade para sustentar as preferências partidárias escolhidas (Elementos de Direito Eleitoral, 2ª ed., 2010, fl. 317).

A matéria já foi suficientemente enfrentada e encontra-se consolidada no âmbito deste TRE em diversos precedentes, merecendo transcrição a seguinte ementa, relativa à PC 6958, acórdão da relatoria do Dr. Leonardo Tricot Saldanha, julgado em 1.10.2014:

Prestação de contas anual. Partido político. Diretório Estadual.

Exercício 2010. Desaprovam-se as contas do partido político quando presentes irregularidades que maculam a prestação como um todo.

1. Recebimento pelo partido de recurso de fonte vedada. Doação advinda de titular de cargo em comissão que desempenha função de direção ou chefia – chefe de gabinete de deputado estadual - caracterizando, pois, afronta ao art. 31, II, da Lei n. 9.096/95.

2. Utilização irregular de recursos provenientes do Fundo Partidário para pagamento de multas eleitorais, infringência ao art. 8º da Resolução TSE n. 21.841/04.

3. Entrega parcial de peças e documentos obrigatórios à prestação de contas anual. Ausentes demonstrativos eleitorais referentes às doações recebidas pelo partido.

Suspensão das cotas do Fundo Partidário, recolhimento de valores ao erário e ao Fundo Partidário.

Desaprovação.

Ressalto que, na hipótese dos autos, é indubitável a natureza de autoridade dos cargos relacionados na sentença, os quais representam fonte vedada para fins de contribuição partidária pela complexidade e responsabilidade do trabalho, restando enquadrados na proibição elencada no art. 31, inc. II, da Lei 9.096/95.

De acordo com a jurisprudência do TSE, o recebimento de recursos de fonte vedada, em regra, é falha capaz de ensejar, por si só, a desaprovação das contas, devendo a quantia irregular ser recolhida aos cofres públicos (TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 14022, Acórdão de 11.11.2014, Relator Min. GILMAR FERREIRA MENDES, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 230, Data 05.12.2014, Página 86).

A propósito, confira-se:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. DIRETÓRIO MUNICIPAL. DECISÕES. INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO. DOAÇÕES. OCUPANTES CARGO DE DIREÇÃO OU CHEFIA. AUTORIDADE. VEDAÇÃO. ART. 31, II, DA LEI Nº 9.096/95.

1. Para fins da vedação prevista no art. 31, II, da Lei nº 9.096/95, o conceito de autoridade pública deve abranger aqueles que, filiados ou não a partidos políticos, exerçam cargo de direção ou chefia na Administração Pública direta ou indireta, não sendo admissível, por outro lado, que a contribuição seja cobrada mediante desconto automático na folha de pagamento. Precedentes.

2. Constatado o recebimento de valores provenientes de fonte vedada, a agremiação deve proceder à devolução da quantia recebida aos cofres públicos, consoante previsto no art. 28 da Res.-TSE nº 21.841/2004.

Recurso especial desprovido.

(TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 4930, Acórdão de 11.11.2014, Relator Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 219, Data 20.11.2014, Página 27.)

Colhe-se, do referido acórdão, que “Constatado o recebimento de valores provenientes de fonte vedada, a agremiação deve proceder à devolução da quantia recebida aos cofres públicos, consoante previsto no art. 28 da Res.-TSE nº 21.841/2004”.

No ponto, observa-se que, por aplicação da Resolução TSE n. 21.814/04, o juízo a quo determinou o recolhimento da quantia irregularmente recebida ao Fundo Partidário.

O recorrente afirma que não há previsão legal para amparar a determinação de recolhimento de valores.

A alegação não prospera.

O dever de recolhimento de valores é reflexo do recebimento de contribuições advindas de fontes vedadas. Além disso, o art. 61 da Lei dos Partidos Políticos expressamente determina que o Tribunal Superior Eleitoral expedirá instruções para a fiel execução desta Lei.

Ao regulamentar o tema, o TSE editou a Resolução n. 21.841/04, que dispôs, no seu art. 28, inc. II, sobre o dever de o partido recolher valores recebidos em contrariedade à Lei n. 9.096/95:

Art. 28 - Constatada a inobservância às normas estabelecidas na Lei nº 9.096/95, nesta Resolução e nas normas estatutárias, ficará sujeito o partido às seguintes sanções ( Lei nº 9.096/95, art. 36):

I – no caso de utilização de recursos de origem não mencionada ou esclarecida, fica suspenso, com perda, o recebimento de novas cotas do Fundo Partidário até que o esclarecimento seja aceito pela Justiça Eleitoral;

II – no caso de recebimento de recursos de fontes vedadas, previstas no art. 5º desta Resolução, com a ressalva do parágrafo único, fica suspensa, com perda, das cotas, a participação do partido no Fundo Partidário por um ano, sujeitando-se, ainda, ao recolhimento dos recursos recebidos indevidamente ao Fundo Partidário;

III – no caso de falta de prestação de contas, ficam suspensas automaticamente, com perda, as novas cotas do Fundo Partidário, pelo tempo em que o partido permanecer omisso – caracterizada a inadimplência a partir da data fixada pela lei para a prestação de contas –, sujeitos os responsáveis às penas da lei ( Lei nº 9.096/95, art. 37); e

IV – no caso de desaprovação das contas, a suspensão, com perda, das cotas do Fundo Partidário perdura pelo prazo de um ano, a partir da data de publicação da decisão ( Lei nº 9.096/95, art. 37).

Quanto a essa questão, a Procuradoria Regional Eleitoral postula a readequação do seu destino ao Tesouro Nacional, conforme normatização atualmente vigente na Resolução TSE n. 23.464/15, art. 14, caput e §1º:

Art. 14 - O recebimento direto ou indireto dos recursos previstos no art. 13 desta resolução sujeita o órgão partidário a recolher o montante ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito em qualquer das contas bancárias de que trata o art. 6º desta resolução, sendo vedada a devolução ao doador originário.

§ 1º O disposto no caput deste artigo também se aplica aos recursos provenientes de fontes vedadas que não tenham sido estornados no prazo previsto no § 5º do art. 11, os quais devem, nesta hipótese, ser recolhidos ao Tesouro Nacional.

§ 2º No caso das doações estimáveis em dinheiro por meio de doação ou cessão temporária de bem que não seja do patrimônio do doador identificado, ou do recebimento de serviços que não sejam produto da atividade do doador, as consequências são apuradas e decididas no momento do julgamento da prestação de contas.

§ 3º O não recolhimento dos recursos no prazo estabelecido neste artigo ou a sua utilização constitui irregularidade grave a ser apreciada no julgamento das contas.

§ 4º Para o recolhimento previsto no § 1º deste artigo, não podem ser utilizados recursos do Fundo Partidário.

§ 5º Independentemente das disposições previstas nesta resolução, a Justiça Eleitoral deve dar imediata ciência ao Ministério Público Eleitoral sempre que for identificado que o partido político recebeu ou está recebendo recursos financeiros de procedência estrangeira, para os fins previstos no art. 28 da Lei n. 9.096, de 1995.

§ 6º A autoridade judicial, à vista de denúncia fundamentada de filiado ou delegado de partido, de representação do Procurador-Geral ou Regional ou de iniciativa do Corregedor, diante de indícios de irregularidades na gestão financeira e econômica da campanha, pode determinar as diligências e providências que julgar necessárias para obstar a utilização de recursos de origem não identificada ou de fonte vedada e, se julgada procedente a denúncia, propor a aplicação das providências previstas no art. 35 da Lei n. 9.096/95.

O requerimento ministerial merece ser acolhido, uma vez que se trata da destinação de recursos ao erário, devendo ser observado o regramento previstos nas Resoluções ns. 23.432/14 e 23.464/15 do TSE, que expressamente determinam o recolhimento de valores irregulares ao Tesouro Nacional nos termos dos precedentes desta Casa colacionados pelo Parquet:

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Fonte vedada. Exercício financeiro de 2014.  

Prefacial afastada. Manutenção apenas da agremiação como parte no processo. A aplicabilidade imediata das disposições processuais da Resolução TSE n. 23.432/14, e mais recentemente da Resolução TSE 23.464/15, não alcança a responsabilização dos dirigentes partidários, por se tratar de matéria afeta a direito material.

Configuram recursos de fonte vedada as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis "ad nutum" da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. Recursos oriundos de dois vereadores e de um secretário municipal, enquadrados no conceito de agentes políticos, detentores de funções com poder de autoridade. Excluído desse conceito o cargo de assessor jurídico, por exercer função exclusiva de assessoramento.

Nova orientação do TSE no sentido de que verbas de origem não identificada e de fontes vedadas devem ser recolhidas ao Tesouro Nacional, nos termos do disposto na Resolução TSE n. 23.464/15. Adequação do quantum a ser recolhido. Redução do prazo de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário para um mês.

Provimento parcial.

(Recurso Eleitoral n. 2361, Acórdão de 07.7.2016, Relator DES. FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 123, Data 11.7.2016, Página 2-3.) (Grifei.)

 

Prestação de contas anual. Partido político. Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2012. Verificada a existência de recursos de origem não identificada, bem como de arrecadações oriundas de fontes vedadas, realizadas por titulares de cargos demissíveis "ad nutum" da administração direta ou indireta, na condição de autoridades e desempenhando funções de direção ou chefia. No caso, Chefe de Gabinete, Coordenador-Geral e Diretor. Nova orientação do TSE no sentido de que tais verbas - de origem não identificada e de fontes vedadas - devem ser recolhidas ao Tesouro Nacional, nos termos do disposto na Resolução TSE n. 23.464/15. Aplicação dos parâmetros da razoabilidade para fixar a sanção do prazo de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário em um mês. Desaprovação.

(Prestação de Contas n. 7242, Acórdão de 04.5.2016, Relatora DRA. MARIA DE LOURDES GALVÃO BRACCINI DE GONZALEZ, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 79, Data 06.5.2016, Página 3.)

Portanto deve ser readequado o destino da quantia indevidamente recebida pelo partido, no montante de R$ 11.780,24, a qual deverá ser recolhida ao Tesouro Nacional.

Nesses termos, nenhum dos argumentos recursais apresentados têm força suficiente para infirmar a conclusão pela desaprovação das contas e dever de recolhimento do valor considerado irregular.

Quanto à suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo prazo de um ano, observa-se que a sentença fundamentou a fixação do período de suspensão com base no inc. II do art. 36 da Lei n. 9.096/95.

Porém, é preciso considerar que este Tribunal, em reiterados julgados, firmou jurisprudência pela aplicação dos parâmetros fixados no § 3º do art. 37 da Lei dos Partidos Políticos, que prevê suspensão pelo prazo de 1 a 12 meses, conforme precedentes jurisprudenciais acima colacionados: PC n. 7242, da relatoria da Dra. Maria de Lourdes Galvão Braccini de Gonzalez, e RE n. 2361, da relatoria do Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, e os seguintes, que agrego às razões de decidir:

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Art. 4º, caput, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2014. Falta de abertura de conta bancária para o registro da movimentação financeira e da apresentação dos extratos bancários correspondentes. Providências imprescindíveis, seja para demonstrar a origem e a destinação dada aos recursos, seja para comprovar a alegada ausência de movimentação financeira à Justiça Eleitoral. Inaplicabilidade da norma que desobriga a apresentação das contas por órgãos partidários que não tenham movimentação financeira e que exclui a sanção de suspensão de quotas do Fundo Partidário, haja vista a irretroatividade dos efeitos das alterações decorrentes da Lei n. 13.165/15, conforme entendimento firmado por este Tribunal. Readequação, de ofício, do prazo de suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário para 1 (um) mês. Provimento negado.

(Recurso Eleitoral n. 3350, Acórdão de 25.01.2016, Relator DES. FEDERAL LUÍS ALBERTO D`AZEVEDO AURVALLE, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 16, Data 29.01.2016, Página 4.)

 

Prestação de contas anual. Partido político. Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2013. Configuram recursos de fonte vedada as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. Inarredável a natureza de autoridade dos cargos ocupados pelos doadores. Reconhecida a fonte como vedada, a quantia indevidamente recebida deve ser recolhida ao Fundo Partidário. Adequação da pena de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário para o período de 1 (um) mês. Desaprovação.

(Prestação de Contas n. 8082, Acórdão de 21.01.2016, Relator DR. LEONARDO TRICOT SALDANHA, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 12, Data 25.01.2016, Página 7.)

Tal raciocínio tem sido adotado quando o caso concreto revela situação de menor gravidade, e a suspensão de repasse de quotas do Fundo Partidário pelo prazo de um ano viola o princípio da proporcionalidade, em relação ao seu subprincípio ou máxima parcial da necessidade ou exigibilidade.

Na hipótese dos autos, observa-se que, no parecer conclusivo das fls. 183-184, o cartório eleitoral aponta que o valor de R$ 11.780,24 percebido pela agremiação, oriundo de fontes vedadas, representa 7,25 % do total das doações recebidas pelo partido.

Além disso, de acordo com o documento da fl. 03, que traz a demonstração do resultado do exercício e assinala a quantia de R$ 166.245,88 como receita operacional, tem-se que a verba recebida de fonte veda representa 7,08 % do total de recursos auferidos.

Com base nesse cenário, entendo que o período de suspensão pode ser reduzido de ofício para 1 (um) mês, uma vez que a quantia irregular constatada não representa valor nominal significativo e equivale a baixo percentual, inferior a 10% do total de recursos arrecadados durante o exercício financeiro, fato que não tem o condão de causar grande impacto às contas.

ANTE O EXPOSTO, afasto a matéria preliminar e VOTO pelo desprovimento do recurso, porém acolho a promoção ministerial de readequação do destino da quantia irregular, conforme Resolução TSE n. 23.464/15, art. 14, § 1º, para o fim de determinar que o montante recebido de fonte vedada, no total de R$ 11.780,24, seja recolhido pela agremiação ao Tesouro Nacional, e, de ofício, reduzo o período de suspensão de repasses de quotas do Fundo Partidário para o prazo de um mês.