RE - 17881 - Sessão: 15/02/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por JOSÉ EURICO SANTOS DOS SANTOS contra a sentença do Juízo da 5ª Zona Eleitoral – Alegrete – proferida nos autos da representação por conduta vedada, capitulada no art. 73, inc. V, da Lei n. 9.504/97, em desfavor de Erasmo Guterres da Silva, a qual indeferiu ao argumento central de que modificações de lotação de servidores daquela municipalidade ocorreram em obediência aos parâmetros legais (fls. 121-123v.).

O recorrente (fls. 131-133) entende, preliminarmente, que falta habilitação profissional ao procurador do representado/recorrido ERASMO. Na sequência, postula a legitimidade passiva dos representados MARIA DE FÁTIMA e JEFERSON, bem como dos partidos coligados, para figurarem no polo passivo da presente demanda. Entende ter sido provado que as transferências de servidores municipais, ocorridas em período eleitoral, consubstanciaram conduta vedada, eis que de “legalidade duvidosa”. Indica que mais de 50 (cinquenta) professores teriam duplicidade de matrícula, e estariam nas mesmas escolas, quer no interior, quer na zona urbana do município. Pugna pela reforma da sentença, via provimento do apelo, para condenar os representados a multa.

Com as contrarrazões (fls. 151-159), foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 162-165v.).

É o relatório.

 

 

 

VOTO

O recurso é tempestivo. Presentes os demais requisitos de admissibilidade, deve ser conhecido.

 

Da preliminar de ausência de capacidade de representação

O recorrente alega que o procurador de ERASMO GUTERRES SILVA estaria impedido do exercício da advocacia, tendo em vista ocupar o cargo de secretário municipal.

Contudo, apenas apontou a circunstância, não fazendo prova do alegado. Não faz prova nem das circunstâncias fáticas, nem do impedimento em si.

Afasto, portanto, a preliminar.

No que se refere à arguição de legitimidade dos representados Maria de Fátima Mulazzani, Jeferson Bruning e Coligação Alegrete Quero Mais, verifico que nos termos do despacho de fl. 14 a magistrada excluiu-os, de plano, do polo passivo da demanda, de modo que preclusa a matéria.

 

Ao mérito

De acordo com os fatos relatados, o recorrente entende que o então gestor, chefe do Poder Executivo de Alegrete, teria praticado conduta vedada consistente na transferência de lotação de servidores públicos – docentes, no decorrer do período eleitoral do ano de 2016. Mais especificamente, duas professoras teriam sido objeto de modificação de lotação, e número superior (“mais de cinquenta”) teriam lotação dúplice, tanto na zona rural quanto na área urbana.

ERASMO GUTERRES teria, assim, praticado conduta apta a atrair a incidência do art. 73, inc. V, da Lei n. 9.504/97, mais especificamente a alínea “e” do dispositivo:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[...]

V - nomear, contratar ou de qualquer forma admitir, demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, na circunscrição do pleito, nos três meses que o antecedem e até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados:

a) a nomeação ou exoneração de cargos em comissão e designação ou dispensa de funções de confiança;

b) a nomeação para cargos do Poder Judiciário, do Ministério Público, dos Tribunais ou Conselhos de Contas e dos órgãos da Presidência da República;

c) a nomeação dos aprovados em concursos públicos homologados até o início daquele prazo;

d) a nomeação ou contratação necessária à instalação ou ao funcionamento inadiável de serviços públicos essenciais, com prévia e expressa autorização do Chefe do Poder Executivo;

e) a transferência ou remoção ex officio de militares, policiais civis e de agentes penitenciários;

Diante do preceito legal, deve-se examinar a existência da irregularidade apontada na inicial.

E o recurso não merece provimento.

Note-se que, como muito bem apontado pelo d. Procurador Regional Eleitoral em seu parecer, a norma tem como objetivo evitar a utilização indevida do quadro de pessoal da Administração Pública, causando interferência na paridade de armas, na igualdade de chances dos competidores eleitorais.

No caso, a rigor, muito embora chegue a alegar mais de 50 (cinquenta) irregularidades, a representação se insurge contra a nomeação de 2 (duas) professoras: Mariele Moura Brandolt e Rita Valeria Figueira Morais, na data de 11.8.2016, e suas modificações de lotação – de uma escola localizada na zona rural de Alegrete, para outra, situada na zona urbana, dentro daquele período de três meses anteriores ao pleito. Todos os outros casos, cuja documentação veio juntada à peça recursal, não têm uma circunstância fundamental para o presente processo: as datas de admissões remontam a anos bastante anteriores (1985 a 2012) e, portanto, não dizem respeito aos três meses que antecederam o pleito de 2016.

Ademais, tratando-se especificamente das transferências das professoras Mariele e Rita, ocorre que a nomeação das servidoras, nos cargos sob análise, decorreu de homologação havida anteriormente a tal período, de modo que não resultou em irregularidade.

No caso, a sentença assim analisou a questão (fl. 123):

Assim, do conjunto probatório verifica-se que não restou demonstrada que a transferência dos servidores nos três meses que antecedem as eleições até a posse dos eleitos seja conduta vedada, uma vez que o remanejamento das professoras foi feito por necessidade da administração em remanejar as educadoras à área urbana, posto que, com duas matrículas de 20h cada, não poderiam permanecer no polo, zona rural, e trabalhar em escola na zona urbana ao mesmo tempo, sobretudo em razão da distância e pelo fato de que nos polos educacionais o horário de trabalho é das 9h às 16h, salientando-se que a nomeação das professoras foi para educação infantil e séries iniciais, cujas as aulas ocorrem nos turnos da manhã e da tarde.
Ainda, em momento algum restou demonstrado que tal remanejamento foi motivado por perseguições por parte do poder público. Na verdade, as transferências se deram em razão da nova aprovação em concurso público, aprovações e homologações que ocorreram antes do período eleitoral, demonstrando-se necessários os remanejamentos para a área urbana uma vez que passarão a exercer as suas novas funções de educadoras em turmas diversas localizadas na área urbana.

E a sentença é irretocável – como aliás já observado pelo d. Procurador Regional Eleitoral, em seu parecer. Os fatos não se amoldam às restrições previstas em lei.

Nessa linha, a previsão sancionatória vindicada pelo recorrente padece de respaldo legal. Trata-se de demanda na qual não se discute a ocorrência dos fatos, eis que incontroversos. Todavia, ele não são irregulares.

As restrições aos agentes públicos, constantes nos arts. 73 e seguintes da Lei n. 9.504/97, devem ser lidas estritamente, sob o prisma de que se tratam de normas de cunho sancionador, penalizante – o alargamento interpretativo, no caso, é de ser rechaçado. A prova colhida no decorrer da instrução, inclusive de origem testemunhal, foi muito bem analisada pelo juízo de origem, cuja decisão deve ser mantida em seus exatos fundamentos.

Note-se, nessa linha, trecho do parecer ministerial, o qual expressamente adoto como razões de decidir:

Sobre a transferência de escola em razão da nomeação em debate, cumpre tecer as seguintes considerações. De acordo com a Secretária de Educação e Cultura, Elza Alves, ouvida em juízo, conforme mídia de fl. 85, a professora Mariele ao assumir o concurso de mais 20 horas não pode permanecer convocada por mais 15 horas, como o era na escola rural em que lecionava o período integral das 09h às 16h. Por essa razão a professora Mariele Moura Brandolt teria sido transferida para escola da zona urbana do município, para atender a duas turmas de 20 horas, ao assumir a nomeação de mais 20 horas semanais. Em relação à professora Rita Valeria Figueira Moraes, igualmente já era professora, estatutária, em regime de 20 horas semanais, e sua nomeação a mais 20 horas, a impossibilitou de permanecer na escola de zona rural, tendo de ser transferida para escola de zona urbana, em que deveria lecionar em duas turmas, cada uma de 20 horas. Para comprovação da nomeação das professoras Mariele e Rita Valeria foram juntadas as Portarias de fls. 23-38. Também foi juntada a relação de portarias de lotação dos professores transferidos durante o período eleitoral, dentre as quais, as professoras Mariele e Rita Valeria (fls. 89-99). De fato, no caso em apreço, restou incontroversa a transferência das professoras Mariele e Rita Valeria durante o período eleitoral. No entanto, a transferência decorreu da nomeação em concurso público, homologado anteriormente ao período eleitoral, fazendo incidir, portanto, a hipótese da alínea “c”, do art. 73, V, da Lei n. 9.504/97. 

Nessa linha, precedente desta Corte, bastante elucidativo:

Recurso. Ação de investigação judicial eleitoral. Alegada prática de conduta vedada c/c abuso do poder político ou de autoridade. Eleições 2012. Juízo de improcedência da representação. Afastada a prefacial de nulidade da sentença proferida.

Representação manifestamente improcedente, razão pela qual despicienda a citação do vice-prefeito para integrar o polo passivo da demanda. Irresignação lastreada exclusivamente na realização de concurso público às vésperas do certame.

A abertura de certame público em ano eleitoral não transgride a legislação eleitoral. O art. 73 da Lei n. 9.504/97 veda tão somente a homologação do certame nos três meses que antecedem o pleito até a posse dos eleitos, assim como a nomeação de candidato aprovado em concurso público nesse período.

O bem jurídico tutelado é a igualdade de oportunidades entre os concorrentes ao pleito, sendo as hipóteses relativas às condutas vedadas taxativas e de legalidade restrita. Provimento negado.

(TRE-RS - RE 29933 RS, Relator Desa. ELAINE HARZHEIM MACEDO, Data de Julgamento 12.12.2012, Data de Publicação DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 244, Data 19.12.2012, Página 3.)

 

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo-se a sentença pelos próprios fundamentos.