RE - 1932 - Sessão: 15/02/2017 às 17:00

RELATÓRIO

O PARTIDO PROGRESSISTA (PP) de Pinto Bandeira interpõe recurso contra a sentença de fls. 87-88v., que desaprovou suas contas relativas ao exercício de 2015, nos termos do art. 45, inc. IV, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.432/14, e determinou a suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 6 (seis) meses, fulcro no art. 37, § 3º, da Lei n. 9.096/95, tendo em conta a percepção de recursos de origem não devidamente esclarecida no total de R$ 1.623,00.

Em suas razões, o recorrente sustenta que está situado em município com pouco mais de 2.000 eleitores e que possui receita proveniente de contribuições de filiados suficiente apenas para manter o partido em funcionamento. Refere que informou na prestação de contas a forma pela qual buscou regularizar o equívoco de não identificação da origem das doações. Pugna, ao final, pela reforma da sentença, julgando-se, por fim, aprovadas as contas prestadas (fls. 91-92).

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se, preliminarmente, pela nulidade da decisão de primeiro grau, ante a não aplicação das sanções previstas em lei. No mérito, opinou pela desaprovação das contas, diante do recebimento de recursos de origem não identificada (fls. 97-103).

É o relatório.

 

 

 

 

 

VOTOS

Dr. Luciano André Losekann (relator):

Senhora Presidente, eminentes colegas:

O apelo é tempestivo e atende aos demais pressupostos recursais, razão pela qual dele conheço.

Inicialmente, examino a prefacial arguida pela Procuradoria Regional Eleitoral, que sustenta a nulidade da sentença diante do silêncio do decisum quanto à aplicação da sanção de recolhimento ao Tesouro Nacional dos valores considerados de origem não identificada, nos termos do art. 14 da Resolução TSE n. 23.432/14, bem como pela equivocada determinação da suspensão de quotas do Fundo Partidário pelo período de 6 (seis) meses, com esteio no art. 37, § 3º, da Lei n. 9.096/95, e não como estipulado no art. 36, inc. I, do mesmo diploma, que impõe a duração da penalidade até que os esclarecimentos sobre a origem dos valores sejam aceitos pela Justiça Eleitoral.

No caso dos autos, cuida-se de prestação de contas relativa ao exercício financeiro de 2015, a qual foi desaprovada com fundamento na existência de receitas de origem não identificada.

No tocante ao prazo de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário aplicado na decisão, evidencia-se que a sentença expressamente considerou “o contexto das contas e as inconsistências identificadas”, concluindo razoável a incidência do sancionamento pelo período de 6 (seis) meses. Ainda, colacionou ementa de precedente aplicando o princípio da proporcionalidade na dosimetria da pena.

Desse modo, não há insuficiência de fundamentação no ponto, pois, ainda que de maneira sucinta, são expostas as razões jurídicas, com lastro no postulado da proporcionalidade, que, na convicção do juízo, conferem suporte à relativização do prazo de suspensão do recebimento do Fundo Partidário.

Sem adentrar no acerto ou desacerto da decisão, a referida tese jurídica que enuncia a fixação proporcional da sanção diante das circunstâncias concretas, a despeito da existência de recursos de origem não identificada, nos moldes do art. 37, § 3º, da Lei n. 9.096/95, inclusive já foi agasalhada por esta Corte Regional, conforme ilustram as seguintes ementas:

Prestação de contas de campanha. Partido político. Exercício financeiro de 2008.

1. A ausência de comprovação de verbas originárias do Fundo Partidário e a existência de recurso de origem não identificada configuram irregularidades capazes de ensejar a desaprovação das contas.

2. O agravante recebeu do Fundo Partidário o montante de R$ 222.808,17 e as irregularidades das receitas oriundas deste totalizaram R$ 29.885,94, o que equivale a 13,41% do montante total dos recursos arrecadados, além de ter sido registrada a existência de falha, no valor de R$ 15.240,39, referente a recursos de origem não identificada, o que revela que a suspensão do repasse das quotas do fundo pelo período de seis meses é razoável e não contraria o art. 30, § 2º, da Lei 9.096/95.

Agravo regimental a que se nega provimento.

(TSE, Agravo Regimental em Agravo de Instrumento n. 378116, Acórdão de 07.11.2013, Relator Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 228, Data 29.11.2013, Página 15.)

 

Recurso. Prestação de contas de partido. Diretório Municipal. Artigos 10 e 11 da Res. TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2012. Desaprovam-se as contas quando verificada a utilização de recursos com origem não identificada e não apresentados os livros contábeis obrigatórios, impedindo a fiscalização da escrituração pela Justiça Eleitoral.

Redução da fixação da suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário. Provimento parcial.

(Recurso Eleitoral n. 3489, Acórdão de 10.7.2014, Relator Dr. LUIS FELIPE PAIM FERNANDES, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 123, Data 16.7.2014, Página 2.)

Portanto, inviável decretar a nulidade da sentença sob tal argumento, uma vez que consignada no decisum fundamentação jurídica expressa para amparar o regime sancionatório aplicado.

Por outro lado, conforme se depreende do art. 14, caput, da Resolução TSE n. 23.432/14, reconhecido o auferimento de valores sem origem esclarecida, caberia o recolhimento do montante irregular ao Tesouro Nacional, verbis:

Art. 14. O recebimento direto ou indireto dos recursos previstos no art. 13 desta Resolução sujeitará o órgão partidário a recolher o montante ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito em qualquer das contas bancárias de que trata o art. 6º desta Resolução, sendo vedada a devolução ao doador originário.

Nesse aspecto, entendo que a prefacial deve ser acolhida.

O tema encontra-se pacificado na jurisprudência desde o julgamento da Consulta n. 116-75.2015.6.00.0000/MG, respondida em 16.02.2016, na qual o egrégio Tribunal Superior Eleitoral posicionou-se no sentido de que o recebimento direto ou indireto de recursos provenientes de fontes vedadas ou de origem não identificada impõe ao órgão partidário o recolhimento do montante irregular ao Tesouro Nacional.

Transcrevo a ementa do referido julgado:

CONSULTA RECEBIDA COMO PROCESSO ADMINISTRATIVO. RECUPERAÇÃO DE CRÉDITOS DA UNIÃO DECORRENTES DE DESAPROVAÇÃO DE CONTAS PARTIDÁRIAS. ILEGITIMIDADE DA PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL. CARÁTER JURISDICIONAL DO PROCESSO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. PROCEDIMENTO. ART. 61 DA RESOLUÇÃO-TSE N° 23.464/2015. COMPETÊNCIA DA ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO. MATÉRIA DEVIDAMENTE REGULAMENTADA.

1. Consulta feita pelo TRE, recebida como processo administrativo devido à relevância da matéria.

2. À época dos fatos, as regras que regiam os procedimentos atinentes ao recolhimento de recursos oriundos de fonte vedada ou de origem não identificada, decorrentes da desaprovação de contas partidárias, encontravam-se dispostas na Res.-TSE n° 23.432/2014 - editada por esta Corte Superior para regulamentar a matéria após a alteração promovida pela Lei n° 12.034/2009, a qual acrescentou o § 60 ao art. 37 da Lei n° 9.096/95, conferindo caráter jurisdicional aos procedimentos de prestação de contas.

3. Atualmente, tais regras encontram-se dispostas na Res.-TSE n. 23.464, de 17 de dezembro de 2015.

4. O entendimento insculpido na Res.-TSE n. 23.126/2009, que dava aos referidos recursos o tratamento destinado a multas eleitorais, cuja competência para cobrança mediante execução fiscal é da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, foi superado pela nova regulamentação em comento.

5. O recebimento direto ou indireto de recursos nas condições acima delineadas implicará ao órgão partidário o recolhimento do montante irregular ao Tesouro Nacional, mediante Guia de Recolhimento da União (CRU), e, não havendo o devido recolhimento, a execução do julgado será da competência da Advocacia-Geral da União.

(Consulta n. 11675, Acórdão de 16.02.2016, Relatora Min. MARIA THEREZA ROCHA DE ASSIS MOURA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 45, Data 07.3.2016, Página 52.) (Grifei.)

 

Destarte, percebe-se que a imposição de recolhimento dos valores irregulares constitui consectário legal veiculado por norma de caráter sancionatório, cogente e de ordem pública, inerente à desaprovação das contas em razão do reconhecimento da existência de recursos de origem não esclarecida.

Diante da rejeição contábil com base em tais razões, cumpre ao julgador tecer argumentos jurídicos adequados e suficientes para confirmar, afastar ou relativizar a sua incidência, sob pena de nulidade da decisão por insuficiência de fundamentação.

O enfrentamento completo do regime sancionatório posto em lei sobre a desaprovação das contas representa requisito inafastável da decisão que as rejeita com base no embolso de recursos de origem não identificada, qualificando-se como error in procedendo, culminando na nulidade do decisório.

Na hipótese, a decisão guerreada omitiu qualquer enfrentamento explícito sobre a determinação de recolhimento de valores irregulares ao Tesouro Nacional, seja no sentido de aplicar ou, eventualmente, afastar a sanção diante das peculiaridades do caso concreto, sendo, portanto, nula por carência de análise de todas as consequências impositivas de direito implicadas na solução da causa.

Ademais, tratando-se de nulidade advinda da ausência de análise sobre a incidência do direito objetivo sancionador de ordem pública ínsito à desaprovação das contas, seu reconhecimento não é vulnerado pelo instituto de preclusão.

Consigno, ainda, que a hipótese não se amolda à chamada “teoria da causa madura”, consoante o previsto no art. 1.013, § 3º, do CPC, tendo em vista que a natureza penalizadora da norma não comporta a mitigação do devido processo legal e da duplicidade de instâncias em favor da celeridade processual. A imposição, por esta Corte, implicaria supressão de instância.

Dessa forma, acolho a manifestação ministerial para reconhecer a nulidade da sentença, devendo os autos retornarem ao juízo de origem para que nova decisão seja proferida em seu lugar, com a análise das cominações legais aplicáveis ao caso.

Resta, portanto, prejudicado o exame do mérito recursal.

Ante todo o exposto, acolho a preliminar arguida pela Procuradoria Regional Eleitoral e VOTO pela anulação da sentença, determinando o retorno dos autos à origem, nos termos da fundamentação.

Destaco.

 

Mérito

O Juízo da 8ª Zona Eleitoral desaprovou as contas do exercício financeiro de 2015 do Partido Progressista (PP) de Pinto Bandeira, porque verificada a existência de recursos de origem não identificada nos extratos bancários da agremiação, contrariando o art. 13 da Resolução TSE n. 23.432/14. O total de recursos irregulares soma R$ 1.623,00, dentro de um montante de R$ 1.719,00 de ingressos bancários.

Por sua vez, a agremiação alegou que os valores em questão consistiram em contribuições de filiados e, visando sanear a falha, juntou aos autos comprovante de recolhimento de R$ 72,00 ao Tesouro Nacional (fls. 58-59) e recibos de devolução do numerário remanescente aos seus doadores originais (fls. 66-80).

Contudo, os esclarecimentos prestados não são suficientes para afastar a inconsistência das contas.

Conforme apontado pelo órgão técnico no parecer conclusivo final (fl. 82), o somatório das receitas dos recibos apresentados totaliza R$ 2.164,00. Porém o total de valores com origem sem identificação guardam o montante de R$ 1.623,00, persistindo, então, a incongruência das informações prestadas.

Ademais, os esclarecimentos não foram oferecidos de modo individualizado para cada ingresso bancário e não estão fornecidas as informações completas exigidas pelo art. 26, § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14, em especial os números dos CPFs dos doadores – requisito indispensável para se verificar a autenticidade e legitimidade da origem das receitas, permitindo a fiscalização, até mesmo, quanto à ocorrência de eventual fonte vedada.

Por fim, a restituição levada a efeito pela agremiação encontra expressa vedação no art. 14, caput, da aludida resolução, que comanda recolhimento do montante integralmente ao Tesouro Nacional, verbis:

Art. 14. O recebimento direto ou indireto dos recursos previstos no art. 13 desta Resolução sujeitará o órgão partidário a recolher o montante ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito em qualquer das contas bancárias de que trata o art. 6º desta Resolução, sendo vedada a devolução ao doador originário.

Dessa forma, conforme bem entendeu a sentença, o conjunto de irregularidades verificadas prejudicou a regularidade e a confiabilidade das contas, impondo-se a sua desaprovação.

Quanto ao sancionamento de suspensão de quotas do Fundo Partidário, a jurisprudência firmou-se no sentido de fixar sanção proporcional, nos moldes do art. 37, § 3º, da Lei n. 9.096/95, como se depreende dos seguintes julgados:

Prestação de contas de campanha. Partido político. Exercício financeiro de 2008.

1. A ausência de comprovação de verbas originárias do Fundo Partidário e a existência de recurso de origem não identificada configuram irregularidades capazes de ensejar a desaprovação das contas.

2. O agravante recebeu do Fundo Partidário o montante de R$ 222.808,17 e as irregularidades das receitas oriundas deste totalizaram R$ 29.885,94, o que equivale a 13,41% do montante total dos recursos arrecadados, além de ter sido registrada a existência de falha, no valor de R$ 15.240,39, referente a recursos de origem não identificada, o que revela que a suspensão do repasse das quotas do Fundo pelo período de seis meses é razoável e não contraria o art. 30, § 2º, da Lei 9.096/95.

Agravo regimental a que se nega provimento.

(TSE, Agravo Regimental em Agravo de Instrumento n. 378116, Acórdão de 07.11.2013, Relator Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 228, Data 29.11.2013, Página 15.)

Recurso. Prestação de contas de partido. Diretório Municipal. Artigos 10 e 11 da Res. TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2012. Desaprovam-se as contas quando verificada a utilização de recursos com origem não identificada e não apresentados os livros contábeis obrigatórios, impedindo a fiscalização da escrituração pela Justiça Eleitoral.

Redução da fixação da suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário. Provimento parcial.

(Recurso Eleitoral n. 3489, Acórdão de 10.7.2014, Relator Dr. LUIS FELIPE PAIM FERNANDES, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 123, Data 16.7.2014, Página 2.)

Na hipótese em tela, diante da natureza grave da irregularidade, do valor monetário envolvido em termos absolutos e percentuais, da pequena dimensão do munícipio e das evidências de que o partido buscou superar as falhas, utilizando-se, contudo, de modo vedado pela regulamentação, com devoluções aos doadores, a fixação de suspensão das quotas do Fundo Partidário pelo período de 6 (seis) meses revela-se suficiente para reprovar a conduta.

Inviável a aplicação de qualquer outro consectário legal punitivo, sob pena de incursão em vedada reformatio in pejus.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.

É como voto, Senhora Presidente.