RE - 12843 - Sessão: 26/01/2017 às 14:00

RELATÓRIO

A COLIGAÇÃO UNIÃO POR GRAMADO, CARLOS HENRIQUE NUNEZ MALUF MARQUEZ e GERSON SORGETZ interpõem recursos contra a sentença (fls. 85-91), a qual julgou procedente a representação ajuizada pela COLIGAÇÃO A VOZ E A VEZ DOS GRAMADENSES, condenando-os ao pagamento de multa no valor de R$ 53.203,00, em vista da divulgação prematura de pesquisa eleitoral na rede social Facebook. A decisão entendeu caracterizada a irregularidade pelo fato de que os recorrentes teriam divulgado pesquisa de intenção de voto em prazo anterior aos 5 (cinco) dias determinados pela legislação de regência.

Carlos Henrique Nunez Maluf Marquez e Gerson Sorgetz, no recurso (fls. 94-110), indicam a impossibilidade de entender o fato como crime eleitoral. Aduzem ter ocorrido exercício da liberdade de imprensa, tendo sido realizado “furo de reportagem”, de parte de Carlos Henrique, consistente na divulgação de pesquisa devidamente registrada. Afirmam que Gerson apenas reproduziu a matéria, em momento que ela já havia “viralizado” na rede social. Sustentam inexistir fraude, abuso de poder ou uso indevido dos meios de comunicação social. Requerem o provimento do recurso, com a reforma da sentença.

A COLIGAÇÃO UNIÃO POR GRAMADO argumenta não ser responsável pela divulgação, pois a informação teria sido obtida de forma extraoficial, conforme afirmado pelo próprio jornalista. Aduz que a influência da pesquisa divulgada foi mínima, pois chegou ao conhecimento público bem antes da eleição. Entende que o fato não deve ser punido, pois a legislação eleitoral não prevê penalidade em relação à divulgação extemporânea. Subsidiariamente, entende aplicável a multa relativa à propaganda eleitoral irregular. Requer a reforma da sentença, afastando-se a multa aplicada (fls. 111-121).

Com as contrarrazões (fls. 125-132), nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo desprovimento dos recursos (fls. 136-141v.).

É o relatório.

 

VOTO

Os recursos são tempestivos, e merecem conhecimento.

No mérito, cumpre bem estabelecer o objeto da presente demanda: trata-se de investigar a obediência, ou eventual desobediência, ao art. 33 da Lei n. 9.504/97, matéria de cunho cível eleitoral, e que desborda de outras questões igualmente não criminais como, por exemplo, abuso de poder dos meios de comunicação social, como ventilado nos autos.

Portanto, a questão cinge-se a verificar se as veiculações de informações sobre pesquisa eleitoral, por meio das páginas do Facebook dos recorrentes Carlos Henrique Nunez Maluf Marquez e Gerson Sorgetz, ambos jornalistas, constituem irregularidade apta a ensejar a multa prevista no art. 17 da Resolução TSE n. 23.453/15, como entendido pelo juízo de origem:

Art. 17. A divulgação de pesquisa sem o prévio registro das informações constantes do art. 2º sujeita os responsáveis à multa no valor de R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil, duzentos e cinco reais) a R$ 106.410,00 (cento e seis mil, quatrocentos e dez reais) (Lei n. 9.504/1997, arts. 33, § 3º, e 105, § 2º).

De início, cumpre ressaltar que, originariamente, é o art. 33 da Lei n. 9.504/97 que disciplina as pesquisas eleitorais, nos seguintes termos:

Art. 33. As entidades e empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, para cada pesquisa, a registrar, junto à Justiça Eleitoral, até cinco dias antes da divulgação, as seguintes informações:

I - quem contratou a pesquisa;

II - valor e origem dos recursos despendidos no trabalho;

III - metodologia e período de realização da pesquisa;

IV - plano amostral e ponderação quanto a sexo, idade, grau de instrução, nível econômico e área física de realização do trabalho a ser executado, intervalo de confiança e margem de erro;

V - sistema interno de controle e verificação, conferência e fiscalização da coleta de dados e do trabalho de campo;

VI - questionário completo aplicado ou a ser aplicado;

VII - nome de quem pagou pela realização do trabalho e cópia da respectiva nota fiscal.

§ 1º As informações relativas às pesquisas serão registradas nos órgãos da Justiça Eleitoral aos quais compete fazer o registro dos candidatos.

[…]

§ 3º A divulgação de pesquisa sem o prévio registro das informações de que trata este artigo sujeita os responsáveis a multa no valor de cinquenta mil a cem mil UFIR.

A regra é igualmente reproduzida na Resolução TSE n. 23.453/15:

Art. 2º A partir de 1º de janeiro de 2016, as entidades e as empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, para cada pesquisa, a registrar no Juízo Eleitoral ao qual compete fazer o registro dos candidatos, com no mínimo cinco dias de antecedência da divulgação, as seguintes informações (Lei n. 9.504/1997, art. 33, caput, incisos I a VII e §1º):

I – contratante da pesquisa e seu número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) ou no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ);

II - valor e origem dos recursos despendidos no trabalho;

III - metodologia e período de realização da pesquisa;

IV - plano amostral e ponderação quanto a sexo, idade, grau de instrução, nível econômico e área física de realização do trabalho a ser executado, nível de confiança e margem de erro, com a indicação da fonte pública dos dados utilizados;

V - sistema interno de controle e verificação, conferência e fiscalização da coleta de dados e do trabalho de campo;

VI - questionário completo aplicado ou a ser aplicado;

VII - nome de quem pagou pela realização do trabalho e seu número de inscrição no CPF ou no CNPJ;

VIII – cópia da respectiva nota fiscal;

IX – nome do estatístico responsável pela pesquisa e o número de seu registro no Conselho Regional de Estatística competente (Decreto n. 62.497/1968, art. 11);

X – indicação do município abrangido pela pesquisa, bem como dos cargos aos quais se refere.

No caso, os recorrentes Carlos Henrique e Gerson publicaram informações relativas à pesquisa eleitoral encomendada pela  COLIGAÇÃO UNIÃO POR GRAMADO ao Instituto Plural de Pesquisas Políticas e Sociais EIRELI – ME.

A referida pesquisa, fato incontroverso, foi registrada junto ao Tribunal Superior Eleitoral em 18.9.2016, conforme assentado à fl. 10 dos autos.

A partir disso, convém tratar as condutas de Carlos Henrique Marquez e de Gerson Sorgetz de maneira individualizada, eis que elas diferem nas circunstâncias e merecem tratamento apartado.

Carlos Henrique publicou em 22.9.2016, às 22h52min, em sua página na rede social Facebook, um link denominado “Pesquisa registrada aponta Pedro Bala na frente com 49% das intenções de votos” (fl. 12).

Indico, e tal dado é importante: é o único documento legível apresentado pelos representantes/recorridos relativo à postagem de Carlos Henrique. Os demais documentos, cópias de páginas da internet, ou são absolutamente ilegíveis, dada a baixa qualidade da reprodução (fls. 13 e 16), ou simplesmente não possuem data (fls. 11 e 14). Além, o documento de fl. 15 não diz respeito ao caso dos autos, pois trata de pesquisa realizada no mês de junho de 2016.

Ou seja: inexistente, nos autos, o conteúdo do link, de forma que somente poderá ser considerada a postagem constante à fl. 12.

Daí, tenho que não pode incidir o art. 33 da Lei n. 9.504/97 – pois, a rigor, não houve a publicação da pesquisa, mas sim a disponibilização de um link cujo conteúdo não consta nos autos. Não há elementos suficientes para que se afirme ter sido publicada a pesquisa antes dos cinco dias do registro a que alude a legislação.

Até mesmo porque, note-se: uma vez registrada a pesquisa no dia 18.9.2016, o primeiro dia para divulgação é a data de 23.9.2016, e não 24.9.2016, como afirmado ao longo de todo o processo, conclusão que se extrai da redação do § 2º do art. 2º da Resolução TSE n. 23.453/15:

Art. 2º  A partir de 1º de janeiro de 2016, as entidades e as empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, para cada pesquisa, a registrar no Juízo Eleitoral ao qual compete fazer o registro dos candidatos, com no mínimo cinco dias de antecedência da divulgação, as seguintes informações (Lei n° 9.504/1997, art. 33, caput, incisos I a VII e § 1º):

[...]

§ 2º  Na contagem do prazo de que cuida o caput, deve ser excluído o dia do início e incluído o do vencimento. O sistema de registro de pesquisa eleitoral deve informar o dia a partir do qual a pesquisa poderá ser divulgada.

Então, mesmo considerando que Carlos Henrique disponibilizou um link às 22h52min do dia 22.9.2016, não resta comprovado que tenha publicado a pesquisa, ou sequer parte dela. Simplesmente não consta nos autos.

Sublinho aqui a gravidade financeira da multa para irregularidades da espécie ora sob análise – o patamar mínimo é de mais de R$ 53.000,00 (cinquenta e três mil reais), e uma condenação deve ocorrer com prova maciça, indiscutível. É claro que a tese esposada pelos recorrentes, de “furo jornalístico”, não pode prosperar, eis que a vedação de publicação antecipada de pesquisa é aplicável a todos, indistintamente; contudo, há de estar devidamente demonstrado, no caderno processual, a publicação, friso, da pesquisa.

Daí, estabeleço a necessária distinção com os precedentes do TSE que tratam do tema, para asseverar que a base fática, aqui, é distinta.

Isso porque o RE em Rp n. 79.988, sendo relatora para o acórdão a Ministra Carmen Lúcia, entendeu aplicável o art. 33 da Lei n. 9.504/97 também para a publicação antecipada de pesquisa devidamente registrada – em interpretação com a qual se concorda integralmente. Lá, todavia, havia sido demonstrada, no campo probatório, a publicação dos resultados, das perguntas feitas aos eleitores, et cetera, circunstâncias, repito, não ocorrentes no caso posto.

Tal quadro se agrava quando é verificada a situação do recorrente Gerson Sorgetz, que publicou notícia (fl. 17) às 08h39min do dia 23.9.2016, ou seja, quando já decorridos os cinco dias do registro da pesquisa, 18.9.2016, como acima delineado. A conduta de Gerson, assim, sequer é hipoteticamente irregular.

Ademais, os conteúdos veiculados, quer por Carlos Henrique, quer por Gerson, não trouxeram informações de ordem técnica, próprias de levantamentos estatísticos, assim como não se citou o instituto responsável pela pesquisa, de modo que não se configura a irregularidade.

Na linha do exposto, as recentes manifestações desta Corte, conforme segue grifado:

Recurso. Representação. Pesquisa eleitoral. Internet. Facebook. Art. 33 da Lei n. 9.504/97. Eleições 2016.

Decisão de piso que julgou parcialmente procedente a representação e aplicou multa.

Matéria preliminar afastada.

Suposta divulgação de pesquisa por meio de postagem na rede social Facebook. A simples referência a intenções de voto, desprovida de qualquer dado concreto, a exemplo do número de entrevistados, período de realização, margem de erro, comparativos, índices, entre outros, não se equipara à divulgação de pesquisa eleitoral. Veiculação sem qualquer informação de ordem técnica e sem citar o instituto responsável pela pesquisa.

A norma proibitiva trazida no art. 17 da Resolução TSE n. 23.453/15 é dirigida aos protagonistas do pleito, e aos institutos de pesquisas e grupos midiáticos que auferem ganhos diretos e indiretos com a produção, contratação e divulgação das pesquisas eleitorais. Situação diversa do caso concreto. Inviável a aplicação da multa. Provimento.

(RE n. 167-72, Rel. Dr. Luciano André Losekann. Julgado em 19.12.2016, unânime).

 

Recurso. Representação. Pesquisa eleitoral. Art. 33, § 3º, da Lei n. 9.504/97. Parcial procedência. Multa. Eleições 2016.

Alegada divulgação, em perfil da rede social Facebook, de pesquisa eleitoral sem prévio registro na Justiça Eleitoral.

Postagens consistentes em comentários sobre supostos resultados favoráveis à candidatura apoiada pelos recorrentes, obtidos a partir do levantamento de intenções de voto contratado por partido para o seu planejamento político-eleitoral interno. Publicações realizadas em período anterior às convenções partidárias, quando inexistente certeza sobre os candidatos e acerca da formação de coligações. Não evidenciados os elementos legais caracterizadores da pesquisa eleitoral. Provimento.

(RE n. 27-96, Rel. Dr. Sílvio Ronaldo Moraes. Julgado em 21.11.2016, unânime).

Ainda conforme o voto do e. Relator do RE n. 167-72, Dr. Luciano André Losekann, “[...] a simples referência a intenções de voto, desprovida de qualquer dado concreto, a exemplo do número de entrevistados, período de realização, margem de erro, comparativos, índices, entre outros, não se equipara à divulgação de pesquisa eleitoral”, de forma que há a norma proibitiva deve ser entendida como destinada “[…] aos partidos, candidatos, coligações, empresa responsável pela pesquisa e meios de comunicação de massa, compreendidos como jornais, canais de televisão, sites de notícias”.

Na doutrina, cumpre registrar a lição de Rodrigo López Zilio (Direito Eleitoral, 5. ed., p. 432):

A divulgação de pesquisa sem o prévio registro sujeita os responsáveis a multa no valor de 50.000 a 100.000 UFIRs (art. 33, §3º, da LE). Trata-se de infração eleitoral, com sanção exclusivamente pecuniária, que é aplicável a todo aquele que – seja partido, candidato, coligação, meio de comunicação social ou empresa responsável pela pesquisa – procedeu, de qualquer modo, à divulgação da pesquisa sem o prévio registro junto à Justiça Eleitoral. Para o TSE, o veículo de comunicação social arcará com as consequências da publicação de pesquisa não registrada, mesmo que esteja reproduzindo matéria veiculada em outro órgão de imprensa (art. 21 da Res. n. 23.453/15).

Ou seja, a norma é dirigida aos protagonistas do pleito, e aos institutos de pesquisas e grupos midiáticos que auferem ganhos diretos e indiretos com a produção, contratação e divulgação das pesquisas eleitorais.

E exatamente aí está o motivo de a norma prever, já inicialmente, valores bastante altos de sancionamento.

Levando em consideração os argumentos expostos, entendo não haver elementos suficientes para a caracterização de divulgação irregular de pesquisa eleitoral no moldes exigidos pelo art. 33, § 3º, da Lei n. 9.504/97, motivo pelo qual resta inviável a aplicação da penalidade pecuniária prevista no art. 17 da Resolução TSE n. 23.453/15.

 

Ante o exposto, VOTO pelo provimento dos recursos, para reformar a sentença e julgar improcedente a representação, afastando a multa aplicada.