RE - 2050 - Sessão: 14/02/2017 às 17:00

RELATÓRIO

O PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT) de São Leopoldo interpõe recurso contra a sentença de fls. 95-99, que desaprovou suas contas relativas ao exercício de 2014, nos termos do art. 45, inc. IV, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.432/14; suspendeu o recebimento de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 1 (um) ano, nos termos dos arts. 46, inc. I, e 48, § 2º, da mesma resolução; e determinou o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 1.520,00 (um mil quinhentos e vinte reais).

Em suas razões, o recorrente sustenta que as doações encontram apoio no art. 5º, inc. IV, da Resolução TSE n. 21.841/04. Argumenta, ainda, que os valores doados são diminutos, representando menos de 10 % (dez por cento) do total de contribuições recebidas, motivo pelo qual, invocando os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, pugna pela aprovação das contas com ressalvas. Subsidiariamente, caso mantida a desaprovação, defende que a menor gravidade das irregularidades e demais circunstâncias do caso concreto permitem a redução da pena de suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário para o período de 1 (um) mês. Postula a reforma da sentença nos termos propostos (fls. 104-105v.).

O Ministério Público Eleitoral com atuação na origem opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 108-109v.).

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se, preliminarmente, pela anulação da sentença e retorno dos autos à origem a fim de que sejam citados os dirigentes partidários e, no mérito, pelo desprovimento do recurso (fls. 112-120v.).

É o relatório.

 

VOTOS

Dr. Luciano André Losekann (relator):

Senhora Presidente, eminentes colegas:

O apelo é tempestivo e atende aos demais pressupostos recursais, razão pela qual dele conheço.

Inicialmente, examino a prefacial arguida pela Procuradoria Regional Eleitoral, que sustenta a nulidade da sentença em face da ausência de observância ao art. 38 da Resolução TSE n. 23.432/14, pelo qual devem ser citados os dirigentes partidários em caso de parecer técnico ou ministerial pela desaprovação das contas, tal como na hipótese.

De fato, após o oferecimento do relatório conclusivo pela desaprovação das contas (fls. 69-72), não houve a citação das pessoas físicas responsáveis para manifestação.

Sobre a questão, esta Corte Regional havia consolidado o entendimento no sentido de que as normas acerca da responsabilização dos dirigentes partidários seriam de direito material, por conduzir à novel hipótese de solidariedade, devendo ser aplicadas nas prestações de contas dos exercícios financeiros do ano de 2015 em diante, nos termos do caput do art. 67 da mesma resolução.

Entretanto, o egrégio TSE, em reiteradas decisões monocráticas, tem manifestado o entendimento de que a regra de formação do aludido litisconsórcio tem cunho eminentemente processual, porquanto a aptidão de determinado sujeito para assumir o posto, seja de autor ou de réu, relaciona-se com normas instrumentais, não se subordinando ao mérito das contas. Assim, nos termos do art. 67, § 1º, da referida resolução, aplica-se aos processos de prestação de contas relativos ao exercício de 2009 e seguintes que ainda não tenham sido julgados.

Diante disso, este Tribunal revisou a sua direção jurisprudencial, passando a agasalhar o mesmo posicionamento da Corte Superior, conforme ilustra o seguinte julgado:

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Legitimidade. Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2014. Irresignação contra sentença que desaprovou as contas do partido e determinou a suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de seis meses.

Preliminar de ofício. Legitimidade "ad causam" dos dirigentes partidários, responsáveis à época do exercício financeiro ora analisado. Adequada a interpretação adotada pelo Tribunal Superior Eleitoral, à luz da legislação que rege a matéria, de que a citação dos responsáveis pela grei partidária prevista no art. 38 da Resolução TSE n. 23.464/15, ao contrário do que vinha sendo decidido por este Colegiado, configura norma de caráter processual, a qual não conduz à responsabilidade solidária dos dirigentes nas contas anteriores ao exercício de 2015. Em caso de apuração de responsabilidade, esta continuará tendo natureza subsidiária, conforme previsto na Resolução TSE n. 21.841/04, aplicável ao caso. Manutenção dos dirigentes partidários no feito.

Irregularidades apontadas pela unidade técnica deste Regional: não apresentação dos livros Diário e Razão, bem como de abertura de conta bancária e evidências de doações estimadas em dinheiro, em que pese a alegada ausência de movimentação financeira. A inobservância de procedimentos obrigatórios associada à ausência de documentos fundamentais maculam as contas com irregularidades insuperáveis que inviabilizam sua análise, comprometendo a atividade fiscalizadora da Justiça Eleitoral.

Redimensionamento, de ofício, da pena de suspensão das quotas do Fundo Partidário para quatro meses.

Provimento negado.

(Prestação de Contas n. 3587, Acórdão de 10.11.2016, Relator DES. CARLOS CINI MARCHIONATTI, Publicação DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 207, Data 16.11.2016, Página 5.) (Grifei.)

Nessa trilha, tenho que a prefacial deve ser acolhida.

Em seus recentes julgados sobre a questão, o TSE tem firmado duas premissas. A primeira (a) define que o art. 38 da Resolução TSE n. 23.464/15 tem cunho eminentemente processual e é aplicável de imediato aos processos em curso. A segunda (b) estabelece que a desaprovação das contas traz consequências também à esfera jurídica dos dirigentes partidários, ainda que de forma subsidiária, razão pela qual devem ser chamados para integrar a lide, oportunizando-lhes o direito de manifestação.

Nesses termos, cito os seguintes julgados: AI n. 11508 (Decisão monocrática, Relator: Min. Luiz Fux, DJE – 24.10.2016); AI n. 1198 (Decisão monocrática, Relator: Min. Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin, DJE – 04.10.2016); RESPE n. 6008 (Decisão monocrática, Relator: Min. Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin, DJE – 26.9.2016) e RESPE n. 11253 (Decisão monocrática, Relator: Min. Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin, DJE – 15.9.2016).

Portanto, a disposição da norma prescreve de maneira imperativa a citação das pessoas físicas responsáveis pela gestão contábil-financeira do diretório partidário, independentemente de cogitações a respeito da natureza do vínculo material subjacente à relação.

O art. 38 da Resolução TSE n. 23.464/15 já afastou aprioristicamente as situações nas quais a inclusão dos dirigentes resultaria tão só em demora e eventual tumulto processual, sem qualquer utilidade prática ou proveito ao direito de defesa, quais sejam, quando não houver apontamentos a respeito de irregularidades no parecer técnico contábil ou no pronunciamento do Ministério Público Eleitoral.

Afora desses casos, a citação das pessoas físicas responsáveis pelas contas deve ser de rigor.

É a própria regra jurídica que presume de maneira absoluta que, em tais casos, a não integração ao feito daqueles que enumera acarretará prejuízo aos seus direitos fundamentais referentes ao exercício do contraditório e da ampla defesa, exigindo a formação litisconsorcial, cuja inexistência é insuscetível de preclusão ou convalidação.

Nesses termos, lecionam Guilherme Marinoni, Daniel Mitidiero e Sérgio Cruz Arenhart (Novo curso de processo civil. Vol. 1. São Paulo: RT, 2015. pág. 88):

O litisconsórcio necessário é uma projeção infraconstitucional do direito fundamental ao contraditório (art. 5.°, LV, da CF). Sua violação importa, portanto, em violação do direito ao contraditório e, por consequência, violação do direito fundamental ao processo justo (art. 5.°, LV, da CF).

Acrescento que o litisconsórcio é do tipo necessário simples, ou seja, pode haver diferente solução da lide para os diferentes litisconsortes. Há possibilidade de a sorte no plano do direito material ser distinta para cada qual dos litisconsortes. Seja como for, inegável a necessidade de formação do litisconsórcio ab initio. Nesse sentido,  precisa a lição de Ovídio Araújo Baptista da Silva (Curso de Processo Civil. Vol 1., Porto Alegre: SAFe, 1987. pág. 202.), que ensina sobre o litisconsórcio necessário:

[...] obrigatoriamente formado, seja porque alguma disposição de lei assim o imponha, seja porque a relação jurídica de direito material torne impossível o tratamento da situação litigiosa,  sem a presença de todos os interessados no processo, formando litisconsórcio, caso em que ele se torna indispensável.

Segundo essa concepção, a indispensabilidade da formação do litisconsórcio abrangeria duas espécies, uma em que ele, além de obrigatório, seria também unitário, no sentido de ser uniforme a decisão da lide para todos os litisconsortes; na outra espécie, havendo obrigatoriedade de formação de litisconsórcio, de modo a torná-lo necessário por imposição de lei, a sentença nem sempre seria uniforme para todos os litisconsortes. Diz-se que o litisconsórcio da primeira espécie será, além de necessário também unitário, enquanto os da última categoria seriam apenas necessários simples. (Grifos no original.)

Nessa senda, o consórcio de partes no polo passivo das contas, estabelecido pelo art. 38 da Resolução TSE n. 23.432/14, configura um litisconsórcio necessário simples. Por conseguinte, vislumbrada a ausência de sua formação, o decisum é nulo pela carência de integração dialética de parte suscetível de ser afetada pelo julgamento das contas.

Trata-se de vício que vulnera o próprio direito ao contraditório, no qual são sonegados, a um só tempo, tanto a oportunidade de trazer argumentos e provas capazes de influir no resultado da lide quanto a possibilidade de figurar como parte da relação jurídico-processual, com o recebimento de comunicações processuais e a legitimidade para interposição de recursos, por exemplo.

Sedimentando a matéria no âmbito deste Regional, no julgamento do RE n. 35-04.2014.6.21.0057, sessão de 24.01.2017, de relatoria do Dr. Jamil Andraus Hanna Bannura, firmou-se a irrestrita necessidade de citação dos responsáveis das greis nos processos de prestação de contas partidárias.

O acórdão restou assim ementado:

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Preliminar. Citação. Dirigentes partidários. Resoluções TSE n. 23.432/14 e 23.464/15. Exercício financeiro de 2013.

Acolhida a preliminar de inclusão dos responsáveis partidários (presidente e tesoureiro) no polo passivo. Jurisprudência da Corte Superior no sentido da necessária citação dos responsáveis das agremiações nos processos de prestação de contas partidárias, ao argumento de que as novas disposições contidas na Resolução TSE n. 23.464/15 caracterizam-se como regras de direito processual, a serem aplicadas imediatamente aos processos em tramitação.

Anulação do feito desde a citação. Retorno dos autos ao juízo de origem.

(TRE-RS – RE 35-04.2014.6.21.0057 – Relator Dr. JAMIL ANDRAUS HANNA BANNURA – J. Sessão de 24.01.2017.)

Cabe a transcrição de trecho do elucidativo voto do relator naquela oportunidade:

A formação desse litisconsórcio necessário já na prestação de contas partidária se dá pela unificação de dois procedimentos previstos na revogada Resolução TSE n. 21.841/04: 1.o julgamento das contas e 2. tomada de contas especial contra os responsáveis.

Inicialmente, havia o julgamento das contas da agremiação e, caso não fossem prestadas ou não houvesse a regularização de valores do Fundo Partidário, seria iniciado um procedimento de tomada de contas especial 'visando a apuração dos fatos, identificação dos responsáveis e quantificação do dano' (art. 35 da Resolução TSE n. 21.841/04), no qual se verificava o nexo de causa entre o comportamento do responsável e o prejuízo ou o dano (art. 36, § 1º, da Resolução TSE n. 21.841/04).

Com a revogação da Resolução TSE n. 21.841/04 e a determinação da citação dos responsáveis partidários pela Resolução TSE n. 23.464/15, vislumbram-se duas consequências.

Primeiro, não há mais procedimento específico previsto no ordenamento jurídico para apurar a responsabilidade dos dirigentes partidários em caso de irregularidades praticadas com recursos do Fundo Partidário. Daí a importância, sob o viés do interesse público, da citação dos responsáveis na prestação de contas do partido.

Em segundo lugar, a participação do responsável pelas contas partidárias antes da decisão que as julga lhe permite trazer elementos, documentos e esclarecimentos capazes de levar à aprovação ou reduzir o montante irregular inicialmente apurado. Na antiga tomada de contas especial, buscava-se apurar a responsabilidade do dirigente pelas irregularidades já declaradas judicialmente. No atual procedimento, ao responsável partidário é permitido trazer esclarecimentos antes mesmo do julgamento das contas, o que pode, inclusive, impedir a formação do título executivo. Daí a importância, também sob o viés individual, da participação do responsável na prestação de contas.

Dessa forma, não se pode entender que a citação dos responsáveis lhes cause prejuízo, pois terão a possibilidade de trazer esclarecimentos capazes, inclusive, de levar à aprovação das contas.

O entendimento foi albergado pela Corte, ainda, nos julgamentos do RE n. 91-38.2015.6.21.0110, sessão de 25.01.2017, de relatoria do Dr. Jamil Andraus Hanna Bannura; e do RE n. 20-57.2015.6.21.0103, sessão de 27.01.2017, de relatoria do Des. Carlos Cini Marchionatti.

Diante do exposto, acolho a preliminar suscitada pelo douto Procurador Regional Eleitoral para anular o feito desde a citação do partido para apresentar defesa sobre o parecer conclusivo, determinando o retorno dos autos à origem a fim de que sejam citados os responsáveis pelas contas.

 

 

No mérito, trata-se de prestação de contas do Partido Democrático Trabalhista (PDT) de São Leopoldo desaprovada em virtude do recebimento de doações de fonte vedada, em afronta ao art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, pois realizadas por filiados ocupantes de cargo em comissão de chefia ou direção.

O art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, assim prescreve:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[….]

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38; (Grifei.)

O Tribunal Superior Eleitoral, até a edição da Resolução TSE n. 22.585/07, havia firmado entendimento no sentido de ser possível a contribuição de filiados ocupantes de cargos exoneráveis ad nutum, conforme se depreende da ementa do julgamento da Pet. n. 310 (Resolução TSE n. 20.844 de 14.8.2001), Relator Min. Nelson Jobim:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO DOS TRABALHADORES – PT.

EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 1996.

Contribuição de filiados ocupantes de cargos exoneráveis ad nutum.

Inexistência de violação ao art. 31, II, da Lei n. 9.096/95. Contas aprovadas.

(Petição n. 310, Resolução n. 20844 de 14.8.2001, Relator Min. NELSON AZEVEDO JOBIM, Publicação: DJ - Diário de Justiça, volume 1, data 09.11.2001, página 154 RJTSE - Revista de Jurisprudência do TSE, volume 13, tomo 1, página 302.)

No entanto, desde o advento da mencionada resolução, o tema não comporta mais as digressões trazidas pela recorrente, no sentido de que as contribuições dos filiados foram espontâneas e eventuais, não sendo alcançadas pelas vedações das Resoluções TSE n. 23.432/14 e n. 23.464/2015.

Por oportuno, reproduzo ementa da consulta que deu origem à Resolução TSE n. 22.585/07:

Partido político. Contribuições pecuniárias. Prestação por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta. Impossibilidade, desde que se trate de autoridade.

Resposta à consulta, nesses termos. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades.

(Consulta n. 1428, Resolução n. 22585 de 06.9.2007, Relator Min. JOSÉ AUGUSTO DELGADO, Relator designado Min. ANTONIO CESAR PELUSO, Publicação: DJ – Diário de Justiça, Data 16.10.2007, Página 172.)

Os fundamentos exarados para a mudança de interpretação deram-se nos seguintes termos:

[...] Estamos dando interpretação dilatada. Estamos dizendo que autoridade não é somente quem chefia órgão público, quem dirige entidade, o hierarca maior de um órgão ou entidade. Estamos indo além: a autoridade é também o ocupante de cargo em comissão que desempenha função de chefia e direção.

[…]

Está claro. A autoridade não pode contribuir. Que é a autoridade? É evidente que o hierarca maior de um órgão ou entidade já não pode contribuir, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista, e, além disso, os ocupantes de cargo em comissão.

[…]

As autoridades não podem contribuir. E, no conceito de autoridade, incluímos, de logo, nos termos da Constituição, os servidores que desempenham função de chefia e direção. É o artigo 37, inciso V.

[…]

Para mim, autoridade em sentido amplo: todo aquele que possa, por exemplo, em mandado de segurança, comparecer nessa qualidade, para mim é autoridade […]

O Tribunal responde à consulta apontando que não pode haver a doação por detentor de cargo de chefia e direção. (Grifei.)

Colaciono jurisprudência deste Tribunal no mesmo sentido:

Recurso. Prestação de contas. Exercício 2010. Desaprovação no juízo originário.

Expressiva parte da receita partidária oriunda de doações de pessoas físicas, ocupantes de cargos em comissão, na condição de autoridade. Prática vedada pelo disposto no artigo 31, incisos II e III, da Lei n. 9.096/95.

Provimento negado.

(TRE – RS, RE 1997. Relator EDUARDO KOTHE WERLANG, 30.7.2012.)

 

Recurso. Prestação de contas de partido político. Doação de fonte vedada. Exercício financeiro de 2008.

Doações de autoridades titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, prática vedada pela Resolução TSE n. 22.585/2007 e pelo inc. II do art. 31 da Lei n. 9.096/95.

Desaprovação das contas pelo julgador originário.

Configuram recursos de fonte vedada as doações a partidos políticos advindas de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que tenham a condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. Razoável e proporcional a aplicação, de ofício, de 6 meses de suspensão das quotas do Fundo Partidário, a fim de colmatar lacuna da sentença do julgador monocrático.

Provimento negado.

(TRE – RS, RE 100000525, Relatora Desa. ELAINE HARZHEIM MACEDO, 25.4.2013.)

Ressalto que o conceito de autoridade, segundo o atual entendimento, abrange os servidores ocupantes de cargos de direção e chefia (art. 37, inc. V, da Constituição Federal), sendo excluídos tão somente os que desempenham exclusivamente a função de assessor.

Como se verifica, transmudou-se de uma compreensão que privilegiava a proteção do partido político contra a influência do Poder Público para uma interpretação que ressalta a relevância dos princípios democráticos da moralidade, dignidade do servidor e preservação contra abuso de autoridade e do poder econômico.

A meu sentir, o regramento tem por finalidade evitar que servidores cuja situação jurídica funcional seja de livre nomeação e exoneração, exercendo cargo de chefia, direção ou coordenação, venham fazer doações aos partidos aos quais se encontrem vinculados. Em outras palavras, busca-se evitar a transferência do dinheiro público – parcela do vencimento auferido pelo titular demissível ad nutum – para a agremiação partidária.

A vedação imposta pela Resolução do Tribunal Superior Eleitoral não tem outra função que não obstar a partidarização da administração pública. Doações eleitorais advindas de servidores detentores de cargo em comissão estimulariam que fossem nomeados partidários para funções de confiança, facilitando o uso da máquina pública para fins eleitorais.

Examinando os autos, evidencia-se que Antônio Gomes realizou a doação de R$ 1.500,00 ao partido no período em que ocupou o cargo de diretor técnico da Corsan. Por sua vez, Fabíola da Rosa Haubert, enquanto detentora da nomeação para chefe de seção, contribuiu com o valor de R$ 20,00 aos cofres partidários.

Portanto, não paira dúvida sobre o enquadramento dos doadores detentores de cargos demissíveis ad nutum de diretor e de chefe de seção na condição de autoridade, conforme disposto no art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95. No mesmo sentido, colaciono ementa de recente julgado desta Corte:

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Fonte vedada. Art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95. Exercício financeiro de 2015.

Preliminar afastada. Uma vez que as doações ilícitas continuaram mesmo após a mudança dos dirigentes, não se pode falar em ilegitimidade passiva dos gestores atuais.

Configuram recursos de fonte vedada as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. No caso, os recursos oriundos de chefe de seção, de coordenador e de diretor revelam-se fontes vedadas, porquanto enquadrados no conceito de autoridade pública.

Nova orientação do TSE no sentido de que verbas de origem não identificada e de fontes vedadas devem ser recolhidas ao Tesouro Nacional. Manutenção da pena de suspensão de novas quotas do Fundo Partidário em seis meses, haja vista a ocorrência de única falha e a não evidência de má-fé.

Provimento negado.

(Recurso Eleitoral n. 2971, Acórdão de 15.12.2016, Relator DR. JAMIL ANDRAUS HANNA BANNURA, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 229, Data 19.12.2016, Página 10.) (Grifei.)

As doações por eles realizadas somaram a quantia de R$ 1.520,00, e foram identificadas na prestação de contas do partido por meio dos documentos que a instruem.

Em conformidade com reiterados julgados do TSE, o recebimento de recursos advindos de fonte vedada constitui irregularidade que, por si só, leva à desaprovação das contas, devendo a proporcionalidade ser considerada para fins de imposição da pena de suspensão de quotas do Fundo Partidário. Nessa linha: AgR-AI n. 74-12, Rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJE de 04.10.2016; AgR-REspe n. 212-69, Rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJE de 27.5.2015 e AgR-REspe n. 48-79, Rel. Min. Castro Meira, DJE de 19.9.2013.

Reconhecendo a irregularidade, o magistrado a quo corretamente desaprovou as contas do partido e determinou o recolhimento de R$ 1.520,00 ao Tesouro Nacional.

Com efeito, o valor doado à agremiação deverá ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do que prevê o art. 14, caput e §1º, da Resolução TSE n. 23.464/15, que manteve o disposto pela Resolução TSE n. 23.432/14. Este é o entendimento deste Tribunal, consolidado a partir do julgamento da PC n. 72-42.2013.6.21.0000, de relatoria da Dra. Maria de Lourdes Galvão Braccini de Gonzalez, na sessão do dia 04.5.2016.

Finalmente, no tocante à suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário, fixada pelo juízo de primeiro grau em 1 (um) ano, este Tribunal tem entendido pela aplicação dos parâmetros fixados no § 3º do art. 37 da Lei dos Partidos Políticos, que prevê a suspensão pelo prazo de 1 a 12 meses, adotando-se os critérios de razoabilidade e da proporcionalidade.

No mesmo sentido o Tribunal Superior Eleitoral utiliza tais parâmetros:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE PARTIDO. DOAÇÃO DE FONTE VEDADA. ART. 31, II, DA LEI 9.096/95. SUSPENSÃO DE COTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. ART. 36, II, DA LEI 9.504/97. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. INCIDÊNCIA.

1. Na espécie, o TRE/SC, com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, concluiu que o recebimento de recursos no valor de R$ 940,00 oriundos de fonte vedada de que trata o art. 31, II, da Lei 9.096/95 – doação realizada por servidor público ocupante de cargo público exonerável ad nutum – comporta a adequação da pena de suspensão de cotas do Fundo Partidário de 1 (um) ano para 6 (seis) meses.

2. De acordo com a jurisprudência do TSE, a irregularidade prevista no art. 36, II, da Lei 9.096/95 - consistente no recebimento de doação, por partido político, proveniente de fonte vedada – admite a incidência dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade na dosimetria da sanção.

3. Agravo regimental não provido

(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 4879, Acórdão de 29.8.2013, Relator Min. JOSÉ DE CASTRO MEIRA, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 180, Data 19.9.2013, Página 71.) (Grifei.)

Na hipótese, o partido obteve receitas no total de R$ 12.713,51 (fl. 04), das quais apenas R$ 1.520,00 são provenientes de fontes vedadas. Assim, os valores irregulares não podem ser considerados exíguos tanto no aspecto absoluto quanto em termos percentuais, representando cerca de 11% do montante arrecadado.

Outrossim, a agremiação apresentou esta única falha a macular a sua prestação contábil, esclarecendo a sua movimentação financeira sem evidenciar má-fé do ente partidário, o que é reforçado pela constatação de que os referidos doadores, após exonerados de seus cargos, continuaram a contribuir financeiramente com o partido em diversas oportunidades no curso do exercício (fls. 15-17).

Desse modo, a pena de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário comporta adequação para o período de 3 (três) meses.

 

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso, apenas para reduzir o período de suspensão de quotas do Fundo Partidário para 3 (três) meses.

É como voto, Senhora Presidente.