INQ - 19620 - Sessão: 12/12/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de inquérito instaurado para investigar a suposta prática de delitos eleitorais por parte de IAD MAHOUD ABDER RAHIM CHOLI (Prefeito de Barra do Quaraí), DANILO FERNANDO TRINDADE RODRIGUES (Vice-prefeito de Barra do Quaraí) e TOLENTINO JESUS DE ALMEIDA.

A Procuradoria Regional Eleitoral veio aos autos (fls. 35-38v.) para (i) ratificar a requisição de instauração de inquérito policial feita pelo Promotor de Justiça de Uruguaiana; (ii) encaminhar os autos a esta Corte, para confirmação da competência originária e exercício das funções de supervisão judicial; e (iii) requerer a continuidade das investigações.

É o relatório.

 

VOTO

Sra. Presidente: o caso é peculiar e por isso trago à mesa a presente questão de ordem, apenas para que esta Corte manifeste-se sobre o andamento da investigação.

O momento do presente inquérito demandaria apenas uma decisão monocrática, pela afirmação da competência originária deste Tribunal para o seu desenvolvimento e supervisão, nos termos do art. 29, inc. X, da Constituição Federal, haja vista constar, dentre os investigados, detentor de cargo com prerrogativa de foro. Investiga-se, ainda em fase prematura, a possível prática de atos tipificados no art. 350 do Código Eleitoral.

Ocorre, todavia, como bem indicado pelo d. Procurador Regional Eleitoral, que a investigação policial foi deflagrada à míngua tanto do impulso oficial do órgão competente do Parquet Eleitoral quanto da supervisão judicial desta Corte.

Entende o d. Procurador pelo aproveitamento dos atos investigatórios já praticados, fundamentalmente porque o inquérito trata de procedimento administrativo de natureza informativa, o qual não vincula o titular da ação penal ou o juízo competente e, também, porque a supervisão judicial destina-se “à apreciação das questões incidentes nos inquéritos originários”, circunstância a qual não entende ocorrida na presente apuração, pois inexistentes medidas constritivas de direitos.

Salienta que o deslocamento do inquérito não converte o relator do processo em presidente da investigação ou autoridade investigadora, mas sim supervisor, permanecendo as atribuições e diligências a cargo da autoridade policial.

Contudo, e tal circunstância igualmente é destacada no parecer, a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral aponta no sentido de que a supervisão do juízo competente deve ocorrer ao longo de todo o procedimento investigatório, sob pena de nulidade.

Note-se o teor dos precedentes:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2012. PREFEITO. VEREADOR. AÇÃO PENAL. CORRUPÇÃO. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL. FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO. INQUÉRITO POLICIAL. SUPERVISÃO POR JUÍZO INCOMPETENTE. NULIDADE. DESPROVIMENTO. 1. Insere-se na prerrogativa de foro - assegurada a determinadas autoridades - a investigação perante órgãos jurisdicionais de maior hierarquia. Precedentes do c. Supremo Tribunal Federal. 2. Inquérito instaurado diante de suposto crime eleitoral cometido por prefeito exige supervisão do órgão a quem compete processar e julgar a respectiva ação penal, sob pena de nulidade de todos os atos (precedentes do TSE e do STF). Esse entendimento visa proteger as instituições públicas, e não interesses de titulares de cargos eletivos. 3. Na espécie, o TRE/SC declarou nulos o inquérito e os atos posteriores, inclusive a denúncia. A Polícia Federal, atendendo a requerimento de promotor de justiça, instaurou inquérito em que, desde o início, um dos suspeitos era detentor do cargo de prefeito. Contudo, toda a investigação, que durou mais de dois anos, foi supervisionada pelo juízo singular, sem nenhuma ciência por parte da Corte Regional. 4. Inexiste similitude com o HC 1364-13/SP, em que este Tribunal excepcionou a regra e assentou válido inquérito presidido por juiz incompetente. Enquanto naquele caso houve sucessivas mudanças de prefeito e o TRE/SP acompanhou as investigações e ratificou os atos anteriores, na hipótese o TRE/SC teve conhecimento dos fatos apenas após a denúncia, quando não poderia mais sequer proceder à ratificação. 5. Agravo regimental não provido.

(TSE - RESPE: 610 BRASÍLIA - DF, Relator: ANTONIO HERMAN DE VASCONCELLOS E BENJAMIN, Data de Julgamento: 23.8.2016, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Volume -, Tomo 188, Data 29.9.2016, Página 64/65.)

 

ELEIÇÕES 2012. HABEAS CORPUS. PENAL. CRIME. CORRUPÇÃO ELEITORAL. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL. RÉU. PREFEITO. FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO. INQUÉRITO INSTAURADO SOB A SUPERVISÃO DE JUIZ ELEITORAL. NULIDADE. DESNECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DO EFETIVO PREJUÍZO. ORDEM CONCEDIDA. 1. Conforme o sistema acusatório, acolhido pela Lei Maior, é dever do Poder Judiciário zelar pelas garantais dos investigados. 2. A supervisão judicial da investigação penal originária deve ser desempenhada - desde a abertura dos procedimentos investigatórios até o eventual oferecimento de denúncia - pelo juízo competente, sob pena de nulidade absoluta. Assim, a instauração de inquérito policial para apurar suposto crime praticado por Prefeito depende de supervisão do Tribunal Regional. 3. A prerrogativa de foro é uma garantia voltada não exatamente para a defesa de interesses de titulares de cargos relevantes, mas para a própria regularidade das instituições. Se a interpretação das normas constitucionais leva à conclusão de que o chefe do Executivo municipal responde por crime eleitoral perante o respectivo TRE, não há razão plausível para que as atividades diretamente relacionadas à supervisão judicial (abertura de procedimento investigatório) sejam retiradas do controle judicial daquele órgão (HC nº 429-07/MT, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 13.5.2014), sendo inadmissível a condução inicial das investigações por promotor eleitoral e juiz eleitoral, pelo prazo de 2 anos, até a conclusão do relatório policial. 4. Ordem concedida para trancar a ação penal, sem prejuízo do disposto no art. 358, parágrafo único, do Código Eleitoral.

(TSE - HC: 36878 SANTA LUZIA DO PARÁ - PA, Relator: LUCIANA CHRISTINA GUIMARÃES LÓSSIO, Data de Julgamento: 15.10.2015, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 222, Data 24.11.2015, Página 195.)

E pondera o d. Procurador Regional Eleitoral que não seria possível ignorar que o posicionamento foi fixado com base em precedentes nos quais o inquérito policial tramitou por vasto período de tempo perante o juízo competente, sustentando que, no caso em apreço, considerando o curto lapso temporal em que o inquérito tramitou perante a primeira instância, bem assim que o juízo de primeiro grau em momento algum emitiu qualquer juízo valorativo acerca dos atos investigatórios levados a cabo pela autoridade policial, não há razão para se cogitar em supostas nulidades ou irregularidades a contaminar eventual futura ação penal.

Entendo pertinente a manifestação do Tribunal, na peculiar situação.

Posiciono-me, desde já, pela inexistência de mácula à investigação.

Além dos motivos elencados pelo d. Procurador Regional Eleitoral, acima transcritos e aos quais adiro, sublinho que, até o momento e a rigor, foram tomados termos de informações pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (fls. 08 e verso); juntadas informações do sistema de Segurança Pública (fls. 09 e 10); e fotografias relativas aos fatos (fls. 11-15). Penso que mais relevantes foram as tomadas de declarações de MARIA ANTONIA OLIVEIRA GODOI (fls. 21-22), de DELIBIO FERREIRA BARROS (fl. 23) e de TOLENTINO JESUS ALMEIDA MORAES (fls. 28-29), em sede policial.

Tais diligências foram requeridas pelo Promotor Eleitoral da 57ª ZE (fl. 16 e verso), as quais o d. Procurador, em sua manifestação, expressamente ratifica (fl. 38v.), de maneira que a iniciativa de instauração de inquérito encontra-se, a meu juízo, convalidada, sem prejuízo aos investigados.

Ademais, imperioso ressaltar, de fato, a inexistência de incidente de constrição de liberdade, privacidade ou patrimônio dos investigados, como também apontado no parecer.

Nessa linha, impõe-se estabelecer a distinção do caso posto à jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral. Aqui, a rigor, a investigação encontra-se em ponto absolutamente prematuro, como já dito, de maneira que a supervisão não resta minimamente prejudicada.

Em tais termos, já houve manifestação desta Corte:

Inquérito policial. Art. 299 do Código Eleitoral. Prefeito. Competência por prerrogativa de foro. Eleições 2012.

Abertura de inquérito policial a pedido do promotor eleitoral, contra autoridade com prerrogativa de foro. Atividade de supervisão desempenhada pela Procuradoria Regional Eleitoral e esta Corte no curso da investigação.

Questão de ordem. Convalidação dos atos  praticados anteriormente pela autoridade policial.

Não executados atos de constrição, mas tão somente investigações de praxe, as quais não requerem a intervenção judicial. Agrega-se, ainda, a não incidência do art. 5º da Res. TSE n. 23.396/2013, que regulamenta a investigação dos supostos crimes nas eleições de 2014, situação distinta do caso em tela.

Confirmação da competência deste Tribunal para julgar os fatos apurados no inquérito, e convalidação dos atos até aqui praticados.

Acolhida a promoção ministerial.

(Inq. n. 59-84, Rel. Dr. Hamilton Langaro Dipp. Julgado em 14.02.14. Unânime.)

Diante do exposto, VOTO para acolher a promoção ministerial e, nesses termos:

i) firmar a competência originária deste Tribunal Regional Eleitoral, considerado o art. 29, inc. X, da Constituição Federal, e a ocupação de cargo detentor de prerrogativa de foro, por um dos investigados;

ii) determinar a remessa dos autos à Procuradoria Regional Eleitoral, para a continuidade das investigações.