RE - 6283 - Sessão: 07/12/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso (fls. 02-03) interposto nos termos do § 1º do art. 17 da Resolução TSE n. 21.538/03 e do art. 841 da Consolidação Normativa Judicial Eleitoral do TRE-RS por BRUNA VALDAMERI em face da decisão de fl. 16, que indeferiu requerimento de alistamento eleitoral por ausência de comprovação de domicílio em Anta Gorda.

Em suas razões, a recorrente apresenta demonstrativos de endereço.

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo conhecimento e pelo provimento do recurso (fls. 36-38v.).

É o breve relatório.

 

VOTO

Embora intempestivo, entendo que o recurso deva ser conhecido, nos termos dos fundamentos expostos pelo Procurador Regional Eleitoral, que a seguir transcrevo (fls. 36-38v.):

Da decisão que indeferiu o requerimento de alistamento eleitoral foi informada a eleitora em 24/05/2016 (fl. 16). O recurso, por sua vez, foi interposto em 31/05/2016, ou seja, um dia após o prazo limite, 30/05/2016, razão pela qual não deveria ser conhecido, tendo presente que ultrapassado o quinquídio estipulado pelo art. 17, §1º, da Resolução TSE n 21.538/2003.

No entanto, tendo presente tratar-se de procedimento de natureza administrativa, e portando matéria de ordem pública, como é o caso do domicílio eleitoral, ancorado em precedentes desse Colendo Tribunal, tenho deva ser conhecido o recurso, conforme trecho do voto de precedente jurisprudencial ora colacionado:

"(...) Todavia, em que pese a interposição do recurso desacompanhado de advogado, e a sua intempestividade, tenho que a irresignação merece conhecimento, uma vez que se trata de procedimento de natureza administrativa, versado em matéria de ordem pública, como é o caso do domicílio eleitoral.

Cito, nesse sentido, o seguinte precedente deste Tribunal: Recurso.

Decisão que determinou o cancelamento de filiações partidárias efetuadas em duplicidade. Matéria preliminar afastada. Prejudicada a aferição da tempestividade recursal diante da intimação, por meio do DEJERS, à parte sem representação por procurador habilitado.

Flexibilização da obrigação de assistência por advogado aos eleitores em procedimentos de cunho administrativo, versados em matéria de ordem pública, na seara eleitoral. Inexistência de comprovação hábil da comunicação de desfiliação dirigida ao partido ou à Justiça Eleitoral. Descumprimento da exigência prevista no artigo 22, parágrafo único, da Lei n. 9.096/95.

Provimento negado.

(TRE-RS - RE: 6071 RS, Relator: DESA. ELAINE HARZHEIM MACEDO, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 124, Data 12/07/2012, Página 2, grifei.).

(Trecho do voto extraído do PROCESSO: RE 2-38.2014.6.21.0049, de relatoria do Dr. Leonardo Tricot Saldanha)."

Logo, embora intempestivo, há que ser conhecido o recurso. (Grifei.)

Outrossim, reconheço a excepcional possibilidade de atuação perante esta Justiça Eleitoral sem a necessidade de constituição de advogado.

Isso em razão do caráter administrativo do presente feito, na linha da jurisprudência, sendo que a Consolidação Normativa Judicial Eleitoral (CNJE) estatui, em seu art. 837 e seguintes, os procedimentos tanto para a impugnação quanto para o recurso relativo à decisão de primeiro grau.

Ao que importa, transcrevo o art. 842, o qual trata do recurso ao requerimento de alistamento eleitoral:

Art. 842. O delegado de partido político, o eleitor e o MPE poderão interpor recurso da decisão proferida no RAE nos casos de alistamento e de transferência. Parágrafo único. Da decisão proferida no RAE de revisão de dados cadastrais e de solicitação de segunda via:

I - não caberá recurso, exceto no período de revisão do eleitorado, hipótese em que obedecerá os prazos e procedimentos regulamentares específicos;

II - poderá o eleitor impetrar habeas data, em caso de indeferimento.

A norma regulamentar, ressalvo, dá efetividade ao comando constante no art. 66 do Código Eleitoral, que em seu inc. I determina que “é lícito aos partidos políticos, por seus delegados, acompanhar os processos de inscrição”.

Note-se, ainda, o seguinte precedente:

RECURSO. DOMICÍLIO ELEITORAL. TRANSFERÊNCIA. DEFERIMENTO NA ORIGEM. RESOLUÇÃO TSE Nº 21.538/03. MATÉRIA ADMINISTRATIVA. DELEGADO DE PARTIDO POLÍTICO. CAPACIDADE POSTULATÓRIA. ADVOGADO HABILITADO. DESNECESSIDADE. ELEITORES. VÍNCULO COM A LOCALIDADE. NÃO DEMONSTRADA. PROVIMENTO DO RECURSO. INDEFERIMENTO DOS PEDIDOS DE TRANSFERÊNCIA DE DOMICÍLIO ELEITORAL.

1. Nos termos do art. 18, § 5º, da Resolução TSE nº 21.538/03, do despacho que deferir o requerimento de transferência, caberá recurso interposto pelo eleitor no prazo de cinco dias e, do que o deferir, poderá recorrer qualquer delegado de partido político no prazo de dez dias.

2. O alistamento eleitoral lato sensu constitui-se em procedimento eminentemente administrativo, e, sendo assim, dispensa a exigência de representação em juízo por advogado devidamente habilitado.

3. Mera declaração de vínculo econômico, histórico, cultural e familiar com a localidade para onde se pretende transferir o domicílio eleitoral não representa documento hábil para, por si só, autorizar o deferimento do pleito.

4. Recurso conhecido e provido em ordem de reformar a sentença do Juízo Eleitoral a quo e indeferir os pedidos de transferência de domicílio eleitoral formulados pelos recorridos.

(RECURSO ELEITORAL n. 12893, Acórdão n. 39/2012 de 08.02.2012, Relator JUVENAL FRANCISCO DA ROCHA NETO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 28, Data 16.02.2012, Página 06 – TRE-SE.)

Prossigo.

Quanto ao mérito, adianto que o recurso merece ser provido.

A questão cinge-se a verificar se a documentação juntada pela recorrente tem aptidão para demonstrar seu domicílio no Município de Anta Gorda, a fim de garantir o direito de permanecer como eleitora naquela localidade.

Examinando os autos, verifica-se que a recorrente trouxe elementos probatórios suficientes a comprovar sua pretensão:

(a) contrato particular de aluguel em nome de seu pai (fl. 4);

(b) contrato de arrendamento agrícola (fls. 5-6);

(c) notas fiscais de produtor rural (fls. 9-12) em nome de sua mãe;

(d) fatura de serviços de água referente ao apartamento alugado em Anta Gorda (fl. 03 e 20), que foi paga em farmácia localizada naquele município, e coincide com o endereço declinado na inicial.

No aspecto, agrego do parecer do Procurador Regional Eleitoral a seguinte passagem (fl. 38):

Embora as tentativas frustradas de intimação da recorrente via AR por três vezes, tendo os Avisos de Recebimento das notificações de números 22, 23 e 24 retornado por inexistência do número de residência indicado na inicial (fl. 27), bem como ter o Oficial de Justiça devolvido o mandado não cumprido ao Cartório, confirmando a inexistência do número indicado na inicial, tenho que deva prevalecer a prova documental produzida, até porque o endereço declinado na peça portal coincide com aquele constante das contas de água juntadas aos autos (fls. 03 e 21), embora em nome do locador referido no contrato de locação de fl. 04, documentos esses suficientes para dar conta dos vínculos de natureza econômica e familiar com o município em questão.

Ademais, cabe registrar que no e. Tribunal Superior Eleitoral é pacífico o entendimento de que o conceito de domicílio na seara eleitoral é mais elástico do que o do Direito Civil, satisfazendo-se com vínculos de natureza política, econômica, social e familiar:

ELEIÇÃO 2012. RECURSO ESPECIAL. REGISTRO DE CANDIDATO. DEFERIMENTO. DOMICÍLIO ELEITORAL. ABRANGÊNCIA. COMPROVAÇÃO. CONCEITO ELÁSTICO. DESNECESSIDADE DE RESIDÊNCIA PARA SE CONFIGURAR O VÍNCULO COM O MUNICÍPIO. PROVIMENTO.

1) Na linha da jurisprudência do TSE, o conceito de domicílio eleitoral é mais elástico do que no Direito Civil e se satisfaz com a demonstração de vínculos políticos, econômicos, sociais ou familiares. Precedentes.

2) Recurso especial provido para deferir o registro de candidatura.

(RESP 374-81.2012.6.15.0062 – Rel. Min. Marco Aurélio, Redator Min. Dias Toffoli, Sessão de 18.02.2014.)

Trago, igualmente, o recente aresto deste Tribunal:

Recurso. Requerimento de alistamento eleitoral. Domicílio. Indeferimento.

Superada a intempestividade recursal por tratar-se de procedimento de natureza administrativa e, portanto, matéria de ordem pública.

Configurada a regularidade da inscrição, pois comprovado o domicílio eleitoral mediante a demonstração dos vínculos de natureza econômica e familiar da eleitora com o município.

Provimento.

(TRE/RS – RE 61-98.2016.6.21.0067 – PROCEDÊNCIA: ANTA GORDA – Rel. DR. LUCIANO ANDRÉ LOSEKANN – J. Sessão de 28.11.2016)

Consequentemente, entendo que os documentos trazidos pela recorrente comprovam os vínculos de natureza econômica e familiar com aquele município, estando aptos a demonstrar o domicílio da eleitora na localidade de Anta Gorda.

 

Diante do exposto, VOTO pelo provimento do recurso para manter o alistamento de BRUNA VALDAMERI no Município de Anta Gorda/RS.