RE - 33583 - Sessão: 19/12/2016 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pela COLIGAÇÃO FRENTE PELOTAS (PT-PCdoB), MIRIAN MARRONI e PAULO LUIZ RODRIGUES DE SOUZA em face de sentença proferida pelo Juízo da 60ª Zona Eleitoral – Pelotas – (fls. 100-105) que julgou procedente representação movida pela COLIGAÇÃO A MUDANÇA NÃO PODE PARAR (PSDB-PTB-SD-PR-PRB-PMDB-PSD-PV-PSC-PPS-PSB), por propaganda eleitoral irregular relativa à publicação de vídeo na rede social Facebook, na qual confirmou a liminar de retirada da propaganda e a proibição de sua veiculação, em caráter definitivo, bem como condenou os representados à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) cada, nos termos no art. 24, § 1º, da Resolução TSE n. 23.457/15.

Em sua irresignação (fls. 110-120), os representados alegam, preliminarmente, a falta de ciência prévia da coligação e da candidata, bem como a inépcia da inicial e cerceamento de defesa, uma vez que a recorrida solicita “aplicação da multa prevista no art. 24, § 1º”, sem mencionar a lei ou resolução correspondente. No mérito, sustentam que a postagem, na rede social Facebook, de um vídeo com cenas do filme “A Queda” consiste em uma paródia, sendo que as legendas foram substituídas com o nítido objetivo de brincar com a campanha eleitoral de Pelotas. Reiteram que a brincadeira não apresenta nada de ofensivo, não traz nenhum elemento capaz de confundir o imaginário do eleitorado, bem como não é nenhuma espécie de meio publicitário destinado a afetar a opinião pública. Requereram a revogação da pena de multa.

Apresentadas contrarrazões (fls. 129-131), nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo provimento do recurso (fls. 133-136) para afastar a penalidade aplicada.

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do prazo de 24 horas previsto no art. 35 da Resolução TSE n. 23.462/15.

Preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade, dele conheço.

Preliminares

Os recorrentes suscitam, preliminarmente, a inépcia da inicial e o cerceamento de defesa, em razão de o representante, em que pese requerer aplicação da multa e apontar o dispositivo – art. 22, § 1º –, deixar de referir a correspondente resolução ou lei aplicável. Também em matéria preliminar, ressaltam a ausência de prova do prévio conhecimento pela coligação e pela candidata representada acerca da veiculação da propaganda supostamente irregular, não bastando a ciência por parte de terceiros.

Ressalto que não identifico inépcia da inicial quanto ao pedido de aplicação de multa, suscitada pelos recorrentes, diante da indicação incompleta do dispositivo violado.

A representante requereu na inicial, de forma clara, a “aplicação de multa prevista no art. 24, § 1º”.

O juiz eleitoral, ao apreciar a liminar, assim aduziu (fl. 14):

[…]

Pediu a retirada do vídeo e sua proibição de veiculação, além da aplicação da multa de que trata o artigo 24, § 1º, da Resolução – TSE nº 23.457/15.

In casu, resta evidente que o “art. 24, § 1º” refere-se a dispositivo da regulamentação específica expedida para a propaganda eleitoral, nas eleições municipais de 2016.

Ademais, o Tribunal Superior Eleitoral editou a Súmula n. 62, cujo verbete leciona:

Súmula-TSE n. 62. Os limites do pedido são demarcados pelos fatos imputados na inicial, dos quais a parte se defende, e não pela capitulação legal atribuída pelo autor.

Assim, afasto a alegação de inépcia da inicial quanto ao pedido de aplicação de multa, haja vista que os fatos estão devidamente delineados, bem como porque não vislumbro prejuízo à defesa.

Por sua vez, a aplicação da multa e a consequente responsabilização dos beneficiários da propaganda eleitoral exige o prévio exame do mérito acerca da sua irregularidade.

Por essas razões, afasto as preliminares.

Mérito

Trata-se de representação por propaganda irregular proposta pela COLIGAÇÃO A MUDANÇA NAO PODE PARAR (PSDB-PTB-SD-PR-PRB-PMDB-PSD-PV-PSC-PPS-PSB) em defavor da COLIGAÇÃO FRENTE PELOTAS (PT-PCdoB), MIRIAN MARRONI e PAULO LUIZ RODRIGUES DE SOUZA.

A coligação recorrida afirma que Paulo Luiz Rodrigues de Souza publicou, em 24.9.2016, na rede social Facebook, vídeo de uma sátira ao filme “A Queda”, atacando os seus candidatos à chapa majoritária. Refere, ainda, que o “vídeo surge na rede social de Paulo Souza, que afirma ter sido, o vídeo, criado por Ederson Silva”.

A adaptação do filme “A Queda – As últimas horas de Hitler”, o qual mostra os últimos dez dias da vida de Adolf Hitler no Führerbunker, em 1945, foi diversas vezes utilizado por internautas para ridicularizar e/ou ofender personalidades, instituições e, inclusive, candidatos.

O art. 57-D da Lei n. 9.504/97 dispõe:

Art. 57-D. É livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato durante a campanha eleitoral, por meio da rede mundial de computadores - internet, assegurado o direito de resposta, nos termos das alíneas “a”, “b” e “c” do inciso IV do § 3º do art. 58 e do 58-A, e por outros meios de comunicação interpessoal mediante mensagem eletrônica.

A livre manifestação do pensamento – vedado o anonimato – é um direito constitucionalmente assegurado no art. 5º, inc. IV, da Constituição Federal. O inc. V do mesmo artigo também assegura “o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”.

Pelo conteúdo do vídeo, verifica-se montagem com o objetivo de atacar e/ou ridicularizar a coordenação de campanha da coligação recorrida e seus correlegionários, com a vinculação à figura de Adolf Hitler. Desse modo, por tudo que o líder nazista representa, é suficiente a ensejar o direito de resposta, pois fere a honra e a dignidade dos envolvidos.

O argumento de que a montagem do vídeo, mediante substituição das legendas, não passaria de uma “brincadeira” não é admissível, uma vez que palavras e imagens podem acarretar danos, humilhações e constrangimentos.

A circunstância de envolver pessoas públicas, na esfera municipal, não lhes retira seu direito à honra e à intimidade.

Ademais, é nítido o propósito eleitoral, uma vez que o diálogo envolve críticas à administração e à possibilidade de segundo turno das eleições municipais de Pelotas.

Por essas razões, a sentença (fls. 100-105) acertadamente confirmou a liminar, a fim de determinar a retirada da propaganda, bem como proibir sua veiculação.

TODAVIA, relativamente à multa aplicada aos recorrentes, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com fundamento no art. 24, § 1º, da Resolução TSE n. 23.457/15, a decisão proferida deve ser reformada.

Dispõe o art. 24, caput e § 1º, da Resolução TSE n. 23.457/15:

Art. 24. É livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato durante a campanha eleitoral, por meio da rede mundial de computadores Internet, assegurado o direito de resposta, nos termos dos arts. 58, § 3º, inciso IV, alíneas a, b e c, e 58-A da Lei n. 9.504/1997, e por outros meios de comunicação interpessoal mediante mensagem eletrônica. (Lei n. 9.504/1997, art. 57-D, caput)

§ 1º A violação do disposto neste artigo sujeitará o responsável pela divulgação da propaganda e, quando comprovado seu prévio conhecimento, o beneficiário à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais). (Lei n. 9.504/1997, art. 57-D, § 2º)

A multa prevista no referido dispositivo refere-se apenas à divulgação da propaganda por meio de anonimato, o que é vedado.

A disciplina do direito de resposta, por sua vez, prevê a aplicação da sanção somente nos casos de descumprimento de ordem judicial e de reiteração da conduta.

Lei n. 9.504/97:

Art. 58. A partir da escolha de candidatos em convenção, é assegurado o direito de resposta a candidato, partido ou coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social.

[...]

§ 3º Observar-se-ão, ainda, as seguintes regras no caso de pedido de resposta relativo a ofensa veiculada:

IV - em propaganda eleitoral na internet:

a) deferido o pedido, a divulgação da resposta dar-se-á no mesmo veículo, espaço, local, horário, página eletrônica, tamanho, caracteres e outros elementos de realce usados na ofensa, em até quarenta e oito horas após a entrega da mídia física com a resposta do ofendido;

b) a resposta ficará disponível para acesso pelos usuários do serviço de internet por tempo não inferior ao dobro em que esteve disponível a mensagem considerada ofensiva;

c) os custos de veiculação da resposta correrão por conta do responsável pela propaganda original.

§ 8º O não-cumprimento integral ou em parte da decisão que conceder a resposta sujeitará o infrator ao pagamento de multa no valor de cinco mil a quinze mil UFIR, duplicada em caso de reiteração de conduta, sem prejuízo do disposto no art. 347 da Lei n. 4.737, de 15 de julho de 1965 - Código Eleitoral.

Identificado o autor da divulgação, torna-se inaplicável a multa prevista no art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97, razão pela qual prejudicada a análise acerca dos eventuais beneficiários.

Nesse sentido, colaciono os seguintes precedentes:

RECURSO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2012. DIVULGAÇÃO DE MENSAGEM COM CONTEÚDO OFENSIVO EM PÁGINA PESSOAL DE REDE SOCIAL (FACEBOOK). COMPROVAÇÃO DAS ALEGAÇÕES EM ATA NOTARIAL. SANÇÃO PECUNIÁRIA PREVISTA NO ART. 57-D DA LEI 9.504/97, INAPLICABILIDADE POR AUSÊNCIA DE ANONIMATO. EXCLUSÃO DA MULTA IMPOSTA EM SENTENÇA. RECURSO PROVIDO.

1 - Incabível a imposição da multa, fundada no art. 57-D, da Lei nº 9.504/97, ainda que fixada no grau mínimo, por ausência de anonimato.

2 - Não há que se falar que o dispositivo seria inócuo por considerar apenas as manifestações anônimas como passíveis de aplicação de multa. Com o avanço da tecnologia e dos meios de investigação, é possível identificar de qual computador a mensagem teria sido postada, somado a todos os meios legítimos de prova admitidos em direito, em especial a prova testemunhal.

3 - Recurso conhecido e provido, para excluir a imposição de multa. (grifei)

(TRE-ES. RE 25648, Relator GUSTAVO CÉSAR DE MELLO CALMON HOLLIDAY, julgado em 03.4.2013, DJE - Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral em 12.4.2013, Página 16.)

 

ELEIÇÕES 2016. RECURSO ELEITORAL. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. INTERNET. FACEBOOK. CALÚNIA, DIFAMAÇÃO, INJÚRIA. PROPAGANDA RETIRADA. MULTA. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. DESPROVIMENTO DO RECURSO.

1. A veiculação da propaganda difamatória por meio de página própria de facebook não enseja o pagamento de multa em razão de ausência de previsão legal. Veda-se no caso, o anonimato (art. 57-D, § 2º, da lei das eleicoes). Ausente este, não há que se falar em condenação em multa.

2. As críticas, ainda que contundentes, quando dirigidas à atuação política de então candidato à reeleição, não configuram injúria, estando protegidas pelo direito à livre manifestação do pensamento. Eventuais danos causados por tais críticas que transbordem os limites da crítica política e atinjam a imagem e a reputação do ofendido podem ser reparados no juízo cível competente, sem prejuízo da ação penal cabível.

3. Recurso desprovido. (grifei)

(TRE-MT, RE 22909, Relator PAULO CÉZAR ALVES SODRÉ, publicado em sessão, volume 10:17, julgamento em 24.11.2016.)

O TRE-RS, da mesma forma, recentemente assim decidiu:

Recurso. Representação. Direito de resposta. Propaganda eleitoral. Internet. Art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2016.

Procedência da representação no juízo de piso, deferindo o direito de resposta, sem aplicação de multa.

Insurgência restrita ao pedido de fixação de multa. Divulgação, em site de relacionamentos, de afirmação ofensiva à honra do candidato. Inaplicável a fixação da sanção prevista no § 2º do art. 57-D da Lei das Eleições, restrita aos casos de anonimato, situação não evidenciada nos autos.

Provimento negado. (grifei)

(TRE-RS - Relator: Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz – P. Sessão 09.11.2016)

 

Recurso. Representação. Direito de resposta. Propaganda eleitoral. Internet. Multa. Art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2016.

Sentença que julgou parcialmente procedente representação por propaganda irregular, determinando a retirada da publicação da página da internet e indeferindo, por outro lado, o pedido de direito de resposta e de aplicação de multa.

Irresignação postulando a fixação de multa. Divulgação, em site de relacionamentos, de afirmação ofensiva à honra do candidato. Inaplicável a pretendida aplicação da multa prevista no § 2º do art. 57-D da Lei das Eleições, penalidade restrita aos casos de anonimato, situação não evidenciada nos autos.

Provimento negado. (grifei)

(TRE-RS. RE 414-24.2016.6.21.0008, Rel. Dr. Silvio Ronaldo Santos de Moraes, julgado em 28.9.2016.)

Consoante se verifica à fl. 7 dos autos, o autor da postagem, na página da rede social Facebook, em “24 de setembro às 20:52”, foi o representado “Paulo Souza”.

Logo, pelas razões expostas, deve ser parcialmente mantida a sentença, apenas para excluir a multa aplicada, por ausência de previsão legal.

Dispositivo

Ante o exposto, afastada a matéria preliminar, VOTO pelo parcial provimento do recurso interposto pela COLIGAÇÃO FRENTE PELOTAS (PT-PCdoB) de Pelotas, MIRIAN MARRONI e PAULO LUIZ RODRIGUES DE SOUZA, tão somente para afastar a multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) aplicada aos recorrentes.