RE - 27702 - Sessão: 31/01/2017 às 13:30

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pela COLIGAÇÃO GENTE, TRABALHO E RESULTADO (PSDB, PMDB, PP, PDT, PSB, PPS e PMB) em face de sentença do Juízo da 86ª Zona que – nos autos de Ação de Investigação Judicial Eleitoral movida em 06.09.2016 em face da COLIGAÇÃO PRA TRÊS PASSOS SEGUIR EM FRENTE (PTB, PSD, PT e PCdoB) e dos seus candidatos à majoritária JOSÉ CARLOS ANZILIERO AMARAL e JORGE LEANDRO DICKEL, bem como dos candidatos a vereador JAIR LAGEMANN e MARCOS RODRIGO HEINECK –, relativamente ao pleito de 2016 em Três Passos, julgou improcedente (fls. 248-249v.) o pedido de condenação por abuso de poder econômico e político formulado com fundamento nos arts. 19 e 22 da Lei Complementar n. 64/90.

Nas razões recursais (fls. 251-255), a coligação recorrente insurgiu-se quanto a duas condutas supostamente praticadas pelos ora recorridos, as quais, conforme afirmado, constituíram abuso do poder econômico. A saber: (i) a distribuição gratuita de comida e bebida em campanha eleitoral; e (ii) o aumento de forma considerável das despesas com horas extras para servidores públicos do Município de Três Passos, nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores ao término do mandato do então prefeito e ora demandado José Carlos Anziliero Amaral. Afirmou que a prova colhida demonstra a oferta de comida – salsichão com pão – e bebida, o que revelaria a compra de votos. Requereu o provimento do recurso, a fim de ser julgada procedente a ação proposta com os consectários legais.

Com contrarrazões (fls. 259-261), nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 264-266).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade.

A Ação de Investigação Judicial Eleitoral proposta pela Coligação Gente, Trabalho e Resultado (PSDB, PMDB, PP, PDT, PSB, PPS e PMB) em desfavor dos representados, Coligação Pra Três Passos Seguir Em Frente (PTB, PSD, PT e PCdoB), José Carlos Anziliero Amaral, Jorge Leandro Dickel, Jair Lagemann e Marcos Rodrigo Heineck, imputou-lhes as seguintes condutas ilícitas, as quais, em tese, caracterizariam abuso de poder econômico e político (fls. 02-06):

a) a distribuição de bebidas e alimentação gratuita durante a campanha eleitoral;

b) a execução de diversas obras públicas, como a pavimentação de vias – mormente a remodelação e asfaltamento da Rua Gaspar Silveira Martins no mês de julho, utilizando-se de mão de obra dos servidores do Parque de Máquinas, nos últimos quatro meses que antecederam o pleito;

c) o pagamento, pela Prefeitura de Três Passos, nos meses de julho e agosto, de horas extras superando a média obtida no ano, em afronta ao parágrafo único do art. 21 da Lei Complementar n. 101/00;

d) não ter o prefeito, candidato à reeleição e ora recorrido José Carlos Anziliero Amaral, atentado para a arrecadação dos serviços de máquinas previstos na rubrica orçamentária correspondente;

e) o descumprimento do percentual gasto em folha de pagamento, atualmente em 55,86%, superando o limite previsto na al. “b” do inc. III do art. 20 da Lei Complementar n. 101/00; e

f) a nomeação de quatro cargos em confiança, em 1º.7.2016, no limiar do prazo previsto em lei, no uso do cargo de prefeito.

Apresentada a defesa (fls. 84-96), e após regular tramitação do feito, inclusive com a oitiva de testemunhas, foi proferida sentença pela improcedência da ação (fls. 248-249v.).

Irresignada, a Coligação Gente, Trabalho e Resultado interpôs recurso no que concerne a duas daquelas condutas inicialmente imputadas, quais sejam: (i) a distribuição gratuita de comida e bebida em campanha eleitoral e (ii) o aumento de forma considerável das despesas com horas extras com servidores.

Não foram objeto de recurso os demais fatos e/ou condutas referidos na exordial.

Prossigo.

Afirmou a coligação recorrente que os candidatos recorridos promoveram reuniões políticas com a distribuição de bebida e comida a eleitores, em diversas oportunidades, o que caracterizaria abuso do poder econômico em campanha política.

Relativamente à referida conduta, são mencionados os seguintes fatos:

i) os candidatos a prefeito, José Carlos Anziliero Amaral, e a vereador, Jair Lagemann e Marco Rodrigo Heineck, promoveram reunião política e distribuição de bebidas alcoólicas e alimentação a eleitores, no bar localizado em frente ao estádio de futebol Luiz de Medeiros, em Três Passos, de propriedade de Márcio Rodrigo de Oliveira Macedo;

ii) nas localidades de Romana Seca, Vista Alegre - distrito de Padre Gonzales -, e Vista - distrito de Alegre Bela Vista-, em reuniões políticas, os candidatos a prefeito e vice-prefeito ofereceram aos presentes bebidas e alimentação;

iii) na Linha Santo Antônio, distrito de Padre Gonzales, no salão da comunidade, os representados ofereceram salsichão, pão e bebidas; e

iv) na localidade de Lajeados dos Marrecos, Herval Novo, na “cancha de bocha”, os representados promoveram reunião política, no dia 27.8.2016, regada a salsichão e pão.

Nesse toar, desde já consigno que a prova produzida pela recorrente restringe-se a fotografias, obtidas a partir do perfil do Facebook de Marcio Rodrigo de Oliveira Macedo, e à oitiva de uma testemunha, o Sr. Auri Morgenstern (fls. 224-227).

Por intermédio das imagens é possível identificar os candidatos requeridos e algumas pessoas reunidas, acompanhados de copos de bebidas e pratos de comida (fls. 08-15).

Já quanto ao depoimento da testemunha Auri Morgenstern, este aduziu:

[…] que no mês de agosto, eles passaram, com o carro do 14 e…, de casa em casa, e avisaram que era para ir até lá, para comer pão com salsichão […] avisaram, foram de casa em casa avisar para ir à reunião lá, para comer salsichão e pão que iam distribuir; que o depoente comeu e bebeu e não pagou nada; que era na linha Santo Antônio, num salão comunitário; que o “Tipica” assou; que o “Tipica” e mais um da turma do 14 serviu; que há 30 anos participa de festas na localidade; que o depoente participa é sempre o assador de carnes lá; que nas festas da comunidade até hoje nunca teve salsichão com pão; que já teve em outras campanhas salsichão com pão; que os candidatos Zilá e Marcelo estiveram na comunidade sábado agora e não teve salsichão com pão; […] que não ofereceram salsichão em troca de votos; […] que teve distribuição de santinho. (Grifei.)

O abuso de poder econômico, segundo as lições de Rodrigo López Zilio, caracteriza-se “quando o uso indevido de parcela do poder financeiro é utilizado com o intuito de obter vantagem, ainda que indireta ou reflexa, na disputa do pleito” (Direito Eleitoral. 5.ed., Porto Alegre:Verbo Jurídico, 2016. p. 541).

Exige-se, para o seu reconhecimento (art. 22, inc. XVI, LC n. 64/90), a comprovação da gravidade das circunstâncias do caso concreto que caracterizam a prática abusiva, de modo a macular a lisura da disputa eleitoral.

Da prova colacionada, não se permite identificar gravidade ou o abuso de poder econômico.

As reuniões referidas pela ora recorrente, conforme demonstram as fotos juntadas, considerando todos os presentes – candidatos, correligionários/apoiadores e demais convidados –, não ultrapassaram uma ou, no máximo, duas dúzias de pessoas.

Nesse diapasão, colaciono ementa do TSE segundo a qual, em casos tais, para a configuração do abuso de poder econômico mister esteja demonstrada a gravidade tendente a comprometer a normalidade e a legitimidade do pleito correspondente:

RECURSOS ORDINÁRIOS. ELEIÇÕES 2014. GOVERNADOR. AIJE. PRELIMINARES. ILEGITIMIDADE PASSIVA, CARÊNCIA DA AÇÃO E VIOLAÇÃO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL, AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. REJEIÇÃO. MÉRITO. ABUSO DO PODER ECONÔMICO. NÃO CONFIGURAÇÃO. PROVIMENTO.

1. O candidato supostamente beneficiado pelo abuso de poder possui legitimidade para figurar no polo passivo da ação de investigação judicial eleitoral ainda que a conduta investigada não seja atribuída a ele.

2. A abertura de investigação judicial eleitoral demanda a indicação de provas, indícios e circunstâncias da suposta prática ilícita, não sendo exigível prova pré-constituída dos fatos alegados. Na espécie, a representante atendeu à exigência legal, pois narrou, na exordial, o fato que entendeu caracterizar abuso do poder econômico e anexou quatro DVDs contendo fotos e vídeos da distribuição de comida e bebida durante a convenção partidária, além de ter arrolado testemunhas.

3. Não viola o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa o fato de o julgador formar sua convicção pela livre apreciação de fatos públicos e notórios, de indícios e presunções e da prova produzida, atentando para fatos e circunstâncias, ainda que não alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral, a teor dos arts. 7º, parágrafo único, e 23 da LC 64/90.

4. No caso dos autos, a conduta praticada - fornecimento de alimentação e bebida, no horário de almoço, aos participantes de convenção partidária - não configurou abuso do poder econômico, porquanto não apresentou gravidade para prejudicar a normalidade e a legitimidade do pleito.

5. Recursos ordinários de Confúcio Aires Moura e de Daniel Pereira providos para reformar o acórdão regional, julgando-se improcedentes os pedidos formulados na AIJE. Procedência do pedido na ação cautelar.

6. Prejudicado o recurso ordinário da Coligação Frente Muda Rondônia.

(TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 158836 - Porto Velho/RO, Acórdão de 30.9.2015, Relator Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 222, Data 24.11.2015, Páginas 191/193.) (Grifei.)

Igualmente, como ressaltado, do caderno probatório destes autos não se retira elementos suficientes para o desiderato da pretensão inicial.

Cabe referir ainda que, em que pese a ação de investigação judicial eleitoral ter sido fundada em suposto abuso de poder econômico ou político, a coligação requerente, a partir das alegações finais (fls. 231 e 233) e no recurso (fls. 252-255), menciona que tais fatos – distribuição de bebida e comida – poderiam caracterizar “captação ilícita de votos”.

A rigor, trata-se de inovação que não foi objeto da inicial, mas que não compromete o seu enfrentamento, por não conferir, igualmente, melhor sorte à recorrente. Senão vejamos:

A captação ilícita de sufrágio está prevista no art. 41-A e § 1º da Lei n. 9.504/97:

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990.

§ 1º Para a caracterização da conduta ilícita, é desnecessário o pedido explícito de votos, bastando a evidência do dolo, consistente no especial fim de agir.

Nas lições de José Jairo Gomes (Direito Eleitoral. 12.ed., São Paulo: Atlas, 2016. p. 725), a perfeição dessa categoria legal requer:

(i) realização de uma das condutas típicas: doar, oferecer, prometer ou entregar bem ou vantagem pessoal a eleitor, bem como contra ele praticar violência ou grave ameaça; (ii) fim especial de agir, consistente na obtenção do voto do eleitor; (iii) ocorrência do fato durante o período eleitoral.

In casu, restou evidente, inclusive por parte da testemunha arrolada pela coligação representante, que não houve pedido explícito de voto.

Verifica-se que, para caracterizar captação ilícita de sufrágio, ainda que não haja o pedido explícito de voto, é necessário o fim especial de agir.

Os requeridos afirmaram, em defesa (fls. 84-96), que foi permitida a venda de bebidas durante as reuniões políticas realizadas em pequenos estabelecimentos comerciais ou em salões das respectivas comunidades. Mencionaram, também, que, após o término da reunião política, sempre um morador local ou a própria diretoria da comunidade patrocinava a janta.

Nada impede que correligionários do partido, como é o caso de Marcio Rodrigo de Oliveira Macedo, proprietário do bar, distribua bebidas, sem que isso configure captação ilícita de sufrágio.

Nesse sentido, é o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral:

ELEIÇÕES 2008. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA DE CERVEJAS. EVENTO PÚBLICO DE CAMPANHA. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. DESCARACTERIZAÇÃO. PROVIMENTO.

1. Hipótese em que os fatos delineados no acórdão regional não se prestam para demonstrar a existência do dolo, consistente no especial fim de agir necessário à caracterização do ilícito do art. 41-A, qual seja, o condicionamento da entrega da vantagem - no caso, distribuição de cervejas em praça pública por pessoas ligadas aos candidatos ao pleito majoritário municipal, após a realização de evento público de campanha - à obtenção do voto do eleitor.

2. Recurso especial conhecido e provido. Decisão: O Tribunal, por unanimidade, proveu recurso para julgar improcedente a ação de investigação judicial eleitoral, nos termos do voto da Relatora.

(TSE. REspe - Recurso Especial Eleitoral n. 1366059 – Ituaçu/BA Acórdão de 17.3.2015, Relatora Min. MARIA THEREZA ROCHA DE ASSIS MOURA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 60, Data 27.3.2015, Página 35.) (Grifei.)

 

RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2006. REPRESENTAÇÃO ELEITORAL. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO (ART. 41-A DA LEI Nº 9.504/97). DESCARACTERIZAÇÃO. DEPUTADO ESTADUAL. CANDIDATO. OFERECIMENTO. COMIDA. BEBIDA .

1. É cabível o recurso ordinário, nos termos do art. 121, § 4º, III, da CF, quando seu julgamento puder resultar na declaração de inelegibilidade, na perda do diploma ou mandato obtido em eleições federais ou estaduais.

2. Para a caracterização de captação ilícita de sufrágio é necessário que o oferecimento de bens ou vantagens seja condicionado à obtenção do voto, o que, no caso, não ficou comprovado nos autos.

3. A simples realização de um evento, ainda que com a oferta de comida e bebida, no qual esteja presente o candidato, não caracteriza, por si só, captação ilícita de sufrágio.

4. Recurso ordinário não provido.

(TSE. Recurso Ordinário n. 2311 - São Paulo/SP, Acórdão de 06.10.2009, Relator Min. MARCELO HENRIQUES RIBEIRO DE OLIVEIRA, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Volume -, Tomo 203/2009, Data 26.10.2009, Página 30.) (Grifei.)

Dito de outro modo, é imprescindível que o oferecimento de comida e bebida seja condicionado à obtenção do voto, o que não restou comprovado nos autos.

Ademais, o Tribunal Superior Eleitoral exige provas robustas e incontestes para que seja configurada captação ilícita de sufrágio, não podendo ancorar-se em frágeis ilações ou mesmo em presunções.

Nesse sentido, colaciono o seguinte aresto:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ART. 41-A DA LEI 9.504/97. ELEIÇÕES 2012. AUSÊNCIA DE CONFIGURAÇÃO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. DESNECESSIDADE.

1. A configuração de captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei 9.504/97) demanda a existência de prova robusta de que a doação, o oferecimento, a promessa ou a entrega da vantagem tenha sido feita em troca de votos, o que não ficou comprovado nos autos.

2. Conforme a jurisprudência do TSE, o fornecimento de comida e bebida a serem consumidas durante evento de campanha, por si só, não configura captação ilícita de sufrágio.

3. A alteração das conclusões do aresto regional com fundamento nos fatos nele delineados não implica reexame de fatos e provas. Na espécie, a mudança do que decidido pela Corte Regional quanto à finalidade de angariar votos ilicitamente foi realizada nos limites da moldura fática do acórdão, sem a necessidade de reexame fático-probatório.

4. Agravo regimental não provido.

(TSE. Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 47845, Acórdão de 28.4.2015, Relator Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 95, Data 21.5.2015, Página 67.)

A participação ou a anuência dos referidos candidatos, a seu turno, deve ser contundente e irrefragável:

Ação de investigação judicial eleitoral. Candidatos a prefeito e vice-prefeito. Conduta vedada, captação ilícita de sufrágio e abuso de poder. Decisão regional. Não configuração. Reexame impossibilidade.

[...]

2. Na hipótese da infração descrita no art. 41-A da Lei nº 9.504/97, cujas consequências jurídicas são graves, a prova do ilícito e da participação ou anuência do candidato deve ser precisa, contundente e irrefragável, como exige a jurisprudência deste Tribunal.

3. A regra do art. 41 da Lei nº 9.504/97 destina-se aos candidatos, ainda que se admita a sua participação indireta ou anuência quanto à captação ilícita de sufrágio. Não há como, entretanto, aplicá-la em relação a quem não é candidato, sem prejuízo de apuração do fato em outra seara [...].

(TSE. Ac. de 07.10.2014 no AgR-AI n. 21284, Relator Min. HENRIQUE NEVES.)

Relativamente à segunda conduta alvo do recurso, imputada ao então prefeito e candidato à reeleição, consistente no pagamento de horas extras para a realização de obras em valores superiores à média mensal do ano, novamente melhor sorte não assiste à recorrente.

Ressalta-se que o referido aumento na despesa, por si só, não é vedado ao agente público no período que antecede as eleições, de modo que o legislador não elencou como sendo uma das hipóteses “tendentes a afetar a igualdade de oportunidade entre os candidatos”, cujo rol encontra-se previsto no art. 73 da Lei n. 9.504/97.

A prova carreada limitou-se a demonstrar o aumento das despesas com horas extras por intermédio de informações obtidas no portal de transparência do Município de Três Passos (fls. 17-39).

Não restou demonstrada a ilegalidade do ato, o desvio de finalidade ou o abuso de poder político, com finalidade eleitoral, cuja alegação de ilicitude é desprovida de qualquer adminículo de prova.

Por fim, cumpre transcrever trecho da bem-lançada decisão proferida pelo Juízo a quo, o qual agrego às razões de decidir:

[…] Os episódios referidos abusivos, onde teriam sido fornecida cerveja e alimentação, seriam três, segundo a exordial: a postagem de fotos no facebook de Márcio Rodrigo de Oliveira, reunião política no salão da comunidade da Linha Santo Antônio e reunião política na localidade de Lajeado dos Marrecos, Herval Novo, na cancha de bocha. Foram ouvidas testemunhas para verificação de como os eventos efetivamente ocorreram. Nesse ponto, não obteve êxito o autor, em demonstrar suas alegações. Inicialmente, no tocante às fotografias no facebook, a testemunha Márcio referiu ser proprietário de um bar/mini mercado onde frequentemente realiza jantas em dias de jogo de futebol para atrair clientes. Quanto ao dia específico, contou ter realizado, coincidentemente, uma janta no mesmo dia da reunião eleitoral da Coligação “Para Três Passos Seguir em Frente”, sem agendamento com os candidatos. Sobre a presença destes, ressalvou que lá chegaram ao serem convidados quando saíam do comício. Que, inclusive, algumas pessoas já haviam jantado. Os candidatos teriam permanecido por um curto período de tempo, não tendo feito qualquer apelo político. Outrossim, não pagaram alimentos e nem bebidas. No que tange ao fato ocorrido no salão da linha Santo Antônio, em Padre Gonzales, a testemunha Auri Morgenster referiu ter ocorrido a distribuição de pão com salsichão “em reunião do 14”, sem pagamento por parte dos consumidores. Contudo, disse não conhecer quem o convidou para a reunião onde havia salsichão e pão, aduzindo, ainda, que não o houve pedidos de voto em troca de alimentação. Quanto à reunião política ocorrida no dia 27 de agosto de 2016, na localidade de Lajeado dos Marrecos, Herval novo, com salsichão e pão, o responsável Ivanes Schwatzbach, responsável pela sede/cancha de bocha da sociedade, negou os fatos narrados na exordial. Não soube denominar o nome de quem marcou a reunião, mas confirmou o fato no dia 03 de setembro do corrente ano, às 14h30min, sendo o estabelecimento aberto em 12h40min. Enquanto o comício ocorreu, não houve comercialização de mercadorias, não foi fornecida bebida alcoólica, nem alimento. Apenas ao final do dia, com o término da reunião, passaram a comercializar alimentos – venderam cerca de 10 pães com salsichão e aproximadamente meia caixa de cerveja. Logo após a reunião, os candidatos saíram, não tendo presenciado nenhuma distribuição ou fornecimento de itens pelos candidatos participantes da reunião. Ou seja, a despeito dos argumentos levantados na inicial, não há provas suficientes para se acolher a pretensão dos representantes. Pelo contrário, houve desistência de grande parte das testemunhas a serem ouvidas, de modo que aquelas que depuseram em juízo, em sua maioria, não mencionaram a ocorrência do alegado abuso do poder econômico.

Por derradeiro, com relação ao abuso de poder político (execução de obras públicas e pagamento de horas extras), mister a demonstração da ocorrência de uso indevido de cargo ou função pública, com a finalidade de obter votos para determinado candidato, afrontando, assim, a normalidade e legitimidade das eleições. Pois bem. Nesse caso, melhor sorte não assiste aos representantes. O abuso do poder político ocorre quando, aqueles que exercem função pública e posição de destaque, em especial, os agentes políticos, utilizam-se dessa posição para beneficiar interesses particulares, próprios ou alheios, especialmente em favor de candidatos, desequilibrando o processo eleitoral em detrimento da isonomia. Em suma, é a utilização do múnus público para influenciar o eleitorado ou fornecer vantagem política. […]

Portanto, dentro de todo esse contexto e, na linha do parecer do Procurador Regional Eleitoral (fls. 264-266), a manutenção da sentença é medida que se impõe.

Dispositivo

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso interposto pela COLIGAÇÃO GENTE, TRABALHO e RESULTADO (PSDB, PMDB, PP, PDT, PSB, PPS e PMB) de Três Passos.