RE - 1088 - Sessão: 30/11/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Os partidos políticos PP/PT/PDT/PMDB/PSB/PTB, todos de Gramado dos Loureiros, recorrem da decisão do Juízo da 99º Zona – Nonoai – que deferiu a quinze requerentes a transferência de domicílio eleitoral.

Os processos foram autuados em separado, tratando o presente feito da situação da eleitora KARINE CARDOSO DA SILVA.

Nas razões recursais, os partidos argumentam que as transferências impugnadas estão alicerçadas em declarações fornecidas pela FUNAI aos indígenas. Alegam que os eleitores transferidos nunca residiram no Município de Gramado dos Loureiros. Entendem que a regularidade do processo eleitoral constitui matéria de interesse público e deve ser conhecida de ofício pelo Juízo Eleitoral, consoante o art. 71, § 1º, do Código Eleitoral.

Com as contrarrazões da recorrida, nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

Em contrarrazões, a eleitora Karine Cardoso da Silva suscitou preliminar de ausência de capacidade postulatória dos recorrentes.

Efetivamente, firmaram a peça recursal os presidentes das respectivas agremiações partidárias, sem que tenha sido demonstrada habilitação para demandar em juízo.

Entretanto, como bem pontuado pela Procuradoria Regional Eleitoral em seu parecer, a matéria em exame diz respeito à impugnação de alistamento eleitoral deferido pelo Juízo Eleitoral, hipótese em que é admitida a interposição de recurso pelos delegados dos partidos, que poderão acompanhar os processos de inscrição e promover a exclusão de qualquer eleitor inscrito ilegalmente, nos exatos termos do disposto no art. 66 do Código Eleitoral, reproduzido a seguir:

Art. 66. É lícito aos partidos políticos, por seus delegados:

I - acompanhar os processos de inscrição;

II - promover a exclusão de qualquer eleitor inscrito ilegalmente e assumir a defesa do eleitor cuja exclusão esteja sendo promovida;

III - examinar, sem perturbação do serviço e em presença dos servidores designados, os documentos relativos ao alistamento eleitoral, podendo deles tirar cópias ou fotocópias.

§ 1º Perante o juízo eleitoral, cada partido poderá nomear 3 (três) delegados. § 2º Perante os preparadores, cada partido poderá nomear até 2 (dois) delegados, que assistam e fiscalizem os seus atos.

§ 3º Os delegados a que se refere este artigo serão registrados perante os juízes eleitorais, a requerimento do presidente do Diretório Municipal.

§ 4º O delegado credenciado junto ao Tribunal Regional Eleitoral poderá representar o partido junto a qualquer juízo ou preparador do Estado, assim como o delegado credenciado perante o Tribunal Superior Eleitoral poderá representar o partido perante qualquer Tribunal Regional, juízo ou preparador.

A matéria está regulamentada pela Resolução TSE n. 21.538/03:

Art. 27. Os partidos políticos, por seus delegados, poderão:

I – acompanhar os pedidos de alistamento, transferência, revisão, segunda via e quaisquer outros, até mesmo emissão e entrega de títulos eleitorais, previstos nesta resolução;

II – requerer a exclusão de qualquer eleitor inscrito ilegalmente e assumir a defesa do eleitor cuja exclusão esteja sendo promovida;

III – examinar, sem perturbação dos serviços e na presença dos servidores designados, os documentos relativos aos pedidos de alistamento, transferência, revisão, segunda via e revisão de eleitorado, deles podendo requerer, de forma fundamentada, cópia, sem ônus para a Justiça Eleitoral.

Parágrafo único. Qualquer irregularidade determinante de cancelamento de inscrição deverá ser comunicada por escrito ao juiz eleitoral, que observará o procedimento estabelecido nos arts. 77 a 80 do Código Eleitoral.

Não há falar em falta de capacidade postulatória, pois a legitimidade é conferida pela lei aos partidos políticos. No mesmo sentido, seguiu a jurisprudência, conforme precedente colacionado pela douta Procuradoria Regional Eleitoral:

RECURSO. DOMICÍLIO ELEITORAL. TRANSFERÊNCIA. DEFERIMENTO NA ORIGEM. RESOLUÇÃO TSE Nº 21.538/03. MATÉRIA ADMINISTRATIVA. DELEGADO DE PARTIDO POLÍTICO. CAPACIDADE POSTULATÓRIA. ADVOGADO HABILITADO. DESNECESSIDADE. ELEITORES. VÍNCULO COM A LOCALIDADE. NÃO DEMONSTRADA. PROVIMENTO DO RECURSO. INDEFERIMENTO DOS PEDIDOS DE TRANSFERÊNCIA DE DOMICÍLIO ELEITORAL.

1. Nos termos do art. 18, § 5º, da Resolução TSE nº 21.538/03, do despacho que deferir o requerimento de transferência, caberá recurso interposto pelo eleitor no prazo de cinco dias e, do que o deferir, poderá recorrer qualquer delegado de partido político no prazo de dez dias.

2. O alistamento eleitoral lato sensu constitui-se em procedimento eminentemente administrativo, e, sendo assim, dispensa a exigência de representação em juízo por advogado devidamente habilitado.

3. Mera declaração de vínculo econômico, histórico, cultural e familiar com a localidade para onde se pretende transferir o domicílio eleitoral não representa documento hábil para, por si só, autorizar o deferimento do pleito.

4. Recurso conhecido e provido em ordem de reformar a sentença do Juízo Eleitoral a quo e indeferir os pedidos de transferência de domicílio eleitoral formulados pelos recorridos.

(RECURSO ELEITORAL n. 12893, Acórdão n. 39/2012 de 08.02.2012, Relator JUVENAL FRANCISCO DA ROCHA NETO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 28, Data 16.02.2012, Página 06 – TRE-SE.)

Dessa forma, por ser o presente processo eminentemente administrativo, é dispensada a representação em juízo por advogado habilitado.

Com essas considerações, rejeito a prefacial suscitada e conheço do recurso.

Mérito

Discute-se o deferimento da transferência de título eleitoral da indígena Karine Cardoso da Silva, conforme Relação de Inscrições e Transferências da 99ª Zona Eleitoral, publicada no dia 15.4.2016 (fl. 04), nos termos dos art. 777 a 779 do CNJE (Consolidação Normativa Judicial Eleitoral):

DO RECURSO AO REQUERIMENTO DE ALISTAMENTO ELEITORAL Art. 777.

O delegado de partido político, o eleitor e o MPE poderão interpor recurso da decisão proferida no RAE nos casos de alistamento e de transferência.

Parágrafo único. Da decisão proferida no RAE de revisão de dados cadastrais e de solicitação de segunda via:

I - não caberá recurso, exceto no período de revisão do eleitorado, hipótese em que obedecerá os prazos e procedimentos regulamentares específicos;

II - poderá o eleitor impetrar habeas data, em caso de indeferimento.

Art. 778. Interposto o recurso pelo eleitor, após regular autuação, o juiz eleitoral poderá:

I - reconsiderar a decisão, determinando a intimação do eleitor; ou

II - determinar a remessa dos autos ao TRE.

Art. 779. Interposto o recurso por delegado de partido político ou pelo MPE, após regular autuação, intimar-se-á o eleitor para que, querendo, apresente contrarrazões no prazo de 10 (dez) dias.

Parágrafo único. Apresentadas ou não as contrarrazões, o juiz eleitoral poderá:

I - reconsiderar a decisão, determinando a intimação das partes; ou

II - determinar a remessa dos autos ao TRE.

Tendo em vista que o juízo eleitoral não reconsiderou sua decisão, os autos vieram a esta instância.

Com efeito, dispõe o art. 42 do Código Eleitoral:

Art. 42. O alistamento se faz mediante a qualificação e inscrição do eleitor. Parágrafo único. Para o efeito da inscrição, é domicílio eleitoral o lugar de residência ou moradia do requerente, e, verificado ter o alistando mais de uma, considerar-se-á domicílio qualquer delas.

No presente caso, a Fundação Nacional do Índio – FUNAI firmou declaração de que a indígena Karine Cardoso da Silva reside há 6 meses na Terra Indígena Nonoai – Aldeia Benjamin –, pertencente ao Município de Gramado dos Loureiros, conforme documento juntado aos autos. A referida declaração foi firmada por duas testemunhas (fl. 8).

Ademais, Karine foi intimada pessoalmente para apresentar contrarrazões, tendo sido localizada na própria Aldeia Indígena Benjamin pela oficial de justiça.

Os partidos recorrentes não produziram qualquer prova capaz de afastar a declaração firmada pela FUNAI, razão pela qual deve ser mantido o deferimento da transferência de domicílio eleitoral.

Em precedente recente desta Corte, a decisão restou assim ementada:

Recurso. Impugnação. Transferência eleitoral. Domicílio. Indígena. Deferimento.

Transferência de eleitor indígena embasada em declaração sobre domicílio fornecida pela FUNAI - Fundação Nacional do Índio.

Preliminar de ilegitimidade ativa afastada. Natureza administrativa do procedimento de alistamento eleitoral, circunstância que autoriza a dispensa de advogado devidamente habilitado para representação em juízo. Reconhecimento da legitimidade dos partidos políticos recorrentes, nos termos do art. 66 do Código Eleitoral.

Ausência de provas capazes de atestar município diverso do declarado pelo órgão de representação. Fraude não configurada.

Provimento negado.

(RECURSO ELEITORAL n. 1-29 de 21.11.2016, Relatora Dra. Maria de Lourdes Braccini de Gonzalez, – TRE-RS.)

ANTE O EXPOSTO, VOTO para afastar a preliminar suscitada pelo recorrido e, no mérito, pelo desprovimento do recurso para manter o alistamento de KARINE CARDOSO DA SILVA no Município de Gramado dos Loureiros.