RC - 1766 - Sessão: 23/11/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Sra. Presidente: apenas refiro que o presente processo volta à mesa de julgamento após ter recebido adiamento, na sessão do dia 20.07.2016, para que fossem oferecidas contrarrazões pela Defensoria Pública da União, agora constantes às fls. 340-349 e, refiro de forma expressa, lidas com atenção.

Após, seguiram os autos à Procuradoria Regional Eleitoral, que ratificou o parecer de fls. 318-322.

Repiso o relatório de fls. 324-326, encaminhado à revisão do douto Des. Paulo Afonso Brum Vaz, em 21.06.2016:

Trata-se de recurso interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL contra decisão do Juízo Eleitoral da 18ª ZE, sediado em Dom Pedrito, que julgou improcedente a denúncia oferecida pelo Parquet e absolveu JARBAS CARDOSO DE MATEO das acusações de prática, por cinco vezes, do delito previsto no art. 350 do Código Eleitoral. Os fatos foram assim descritos na denúncia:

1º FATO

No dia 06 de novembro de 2012, na avenida Rio Branco, n.º 1.817, em Dom Pedrito/RS, o denunciado JARBAS CARDOSO DE MATEO inseriu declaração falsa, para fins eleitorais, em prestação de contas apresentada à Juíza Eleitoral da 18ª Zona da Circunscrição Eleitoral do Rio Grande do Sul.

Na ocasião, o denunciado JARBAS CARDOSO DE MATEO, ao prestar contas de sua campanha eleitoral do ano de 2012, ao cargo de Vereador de Dom Pedrito/RS, inseriu declaração falsa no Demonstrativo dos Recursos Arrecadados, apresentado à Juíza Eleitoral da 18ª Zona, oportunidade em que informou a utilização de recursos próprios na campanha eleitoral no valor de R$ 4.750,00 (fl. 10 do I.P.), os quais foram, em realidade, alcançados ao denunciado pela Direção Nacional do Partido dos Trabalhadores (fl. 188 do I.P.);

A declaração falsa foi prestada com fim de ludibriar a Juíza Eleitoral e obter a aprovação das contas.

 

2º FATO

No dia 06 de novembro de 2012, na avenida Rio Branco, n.º 1.817, em Dom Pedrito/RS, o denunciado JARBAS CARDOSO DE MATEO inseriu declaração falsa, para fins eleitorais, em prestação de contas apresentada à Juíza Eleitoral da 18ª Zona da Circunscrição Eleitoral do Rio Grande do Sul.

Na ocasião, o denunciado JARBAS CARDOSO DE MATEO inseriu declaração falsa, ao prestar contas de sua campanha eleitoral do ano de 2012, ao cargo de Vereador de Dom Pedrito, inseriu declaração falsa no relatório de Despesas Efetuadas, oportunidade em que informou a realização de despesa no valor de R$ 80,00, supostamente pagos a FERNANDA CLAMENTINA ESPONOSA DE MORAES, sob a rubrica 'Serviços prestados por terceiros'. No entanto, quando prestados esclarecimentos, o denunciado suprimiu a despesa realizada sob esta rubrica sem qualquer justificativa (Relatório de Despesas Efetuadas - fls. 80/82 do I.P.).

A declaração falsa foi prestada com o fim de ludibriar a Juíza Eleitoral e obter a aprovação das contas.

 

3º FATO

No dia 06 de novembro de 2012, na avenida Rio Branco, n.º 1.817, em Dom Pedrito/RS, o denunciado JARBAS CARDOSO DE MATEO inseriu declaração falsa, para fins eleitorais, em prestação de contas apresentada à Juíza Eleitoral da 18ª Zona da Circunscrição Eleitoral do Rio Grande do Sul.

Na ocasião, o denunciado JARBAS CARDOSO DE MATEO, ao prestar contas de sua campanha eleitoral do ano de 2012, ao cargo de Vereador de Dom Pedrito/RS, inseriu declaração falsa no Relatório de Despesas Efetuadas, oportunidade em que informou a realização de despesas no valor de R$ 77,00, supostamente pagos a ÁLVARO RAUL DE SOUZA ZANOLETE, com o cheque n.º 850010 (fl. 18 do I.P. e Recibo da fl. 37 DO I.P.). No entanto, quando prestados esclarecimentos, o denunciado informou que o cheque n.º 850010 foi emitido, no valor de R$ 157,00, em favor de JEZIEL GOMES MORAIS (Relatório de Despesas Efetuadas, fls. 82/80 do I.P.).

A declaração falsa foi prestada com o fim de ludibriar a Juíza Eleitoral e obter a aprovação das contas.

 

4º FATO

No dia 06 de novembro de 2012, na avenida Rio Branco, n.º 1.817, em Dom Pedrito/RS, o denunciado JARBAS CARDOSO DE MATEO inseriu declaração falsa, para fins eleitorais, em prestação de contas apresentada à Juíza Eleitoral da 18ª Zona da Circunscrição Eleitoral do Rio Grande do Sul.

Na ocasião, o denunciado JARBAS CARDOSO DE MATEO, ao prestar contas de sua campanha eleitoral do ano de 2012, ao cargo de Vereador de Dom Pedrito/RS, inseriu declaração falsa, tendo afirmado que não houve despesas com o uso de combustível. No entanto, os cupons fiscais n.º 1556 e 1557 demonstram que forma despendidos R$ 140,00 com a aquisição de gasolina para o automóvel de placas HCI 5802 (fl. 32 do I.P.), o qual foi cedido para o uso na campanha eleitoral (Termo de Cessão sobre Uso de Veículos da fl. 54 do I.P.)

A declaração falsa foi prestada com o fim de ludibriar a Juíza Eleitoral e obter a aprovação das contas.

 

5º FATO

No dia 06 de novembro de 2012, na avenida Rio Branco, n.º 1.817, em Dom Pedrito/RS, o denunciado JARBAS CARDOSO DE MATEO inseriu declaração falsa, para fins eleitorais, em prestação de contas apresentada à Juíza Eleitoral da 18ª Zona da Circunscrição Eleitoral do Rio Grande do Sul.

Na ocasião, o denunciado JARBAS CARDOSO DE MATEO, ao prestar contas de sua campanha eleitoral do ano de 2012, ao cargo de Vereador de Dom Pedrito/RS, inseriu declaração falsa no Demonstrativo de Doações Efetuadas a Candidatos/Comitês Financeiros/Partidos, oportunidade em que informou a doação de adesivos ao também candidato ao cargo de Vereador de Dom Pedrito/RS CARLOS ELI JESUS FERNANDES no valor de R$ 690,00 (fl. 77 do I.P.). No entanto, a referida importância foi paga a JEIZEL GOMES MOREAIS, por meio do cheque n.º 85005 (fls. 17 e 39 do I.P.)

A declaração falsa foi prestada com o fim de ludibriar a Juíza Eleitoral e obter a aprovação das contas.

A denúncia foi recebida no dia 15.7.2015 (fl. 05).

O acusado ofereceu defesa e o feito foi instruído. A audiência foi realizada em 25.8.2015, com a oitiva das testemunhas de acusação, de defesa e, ao final, com o interrogatório do acusado (fls. 273-275).

As alegações finais foram apresentadas apenas pelo Ministério Público Eleitoral (fls. 284-291).

A defesa técnica do réu, devidamente intimada, não apresentou memoriais, o que provocou a intimação pessoal do réu (fl. 299), que também se quedou silente (fl. 300).

Na sentença (fls. 301-304v), o juízo considerou não demonstrada a potencialidade do ato, de forma que entendeu a conduta incapaz de lesar a fé pública eleitoral. Afastou o argumento do Ministério Público, que defendia a prática de 5 (cinco) fatos distintos, considerando que, ainda que em tese, as condutas constituiriam crime único, e absolveu o réu.

O Ministério Público Eleitoral recorreu (fls. 311-314), aduzindo não restar dúvida que as condutas perpetradas pelo recorrido foram capazes de colocar em risco o processo eleitoral, estando demonstrada a potencialidade lesiva.

Sem a apresentação de contrarrazões, os autos foram remetidos à Procuradoria Regional Eleitoral, que se manifestou pelo provimento parcial do recurso para condenar JARBAS CARDOSO DE MATEO pela prática de 1 (um) crime de falsidade ideológica eleitoral.

Vieram os autos conclusos.

 

VOTO

Ao caso dos autos.

Tempestividade

O recurso é tempestivo. O Ministério Público Eleitoral foi intimado em 11.02.2016 (fl. 309v.), constando nos autos termo de juntada (fl. 310) que informa que o recurso foi recebido em cartório no dia 22.02.2016 – embora o carimbo do protocolo indique 23.02.2016 – sendo que a data informada no termo corresponde ao primeiro dia útil após o transcurso do prazo de 10 (dez) dias, previsto no art. 362 do Código Eleitoral.

A denúncia afirma que os fatos imputados ao recorrido estariam descritos no art. 350 do Código Eleitoral, conforme segue:

Art. 350. Omitir, em documento público ou particular, declaração que dêle devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais:

Pena - reclusão até cinco anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa, se o documento é público, e reclusão até três anos e pagamento de 3 a 10 dias-multa se o documento é particular.

Como cediço, em relação aos crimes eleitorais, quando o preceito secundário da norma penal não indicar o grau mínimo, este será de um ano para a pena de reclusão, conforme redação do art. 284 do Código Eleitoral.

O delito em comento equivale, na seara eleitoral, ao crime do art. 299 do Código Penal, que define a falsidade ideológica ou intelectual. No crime da lei especial, o legislador apenas alterou o elemento subjetivo, fazendo constar “para fins eleitorais”.

Assim, para a configuração do delito, é essencial que se demonstre potencial lesivo à realização das eleições ou, ainda, ao processo eleitoral.

Jaime Barreiros Neto (Direito Eleitoral, 6a. Ed. Salvador, JusPODIVM, 2016, pág. 261) assim leciona:

Um dos pontos nevrálgicos que envolvem uma eleição diz respeito ao processo de arrecadação de recursos financeiros e prestação de contas de partidos, coligações e candidatos. É sabido que o Direito Eleitoral existe para garantir a normalidade das eleições e a legitimidade do exercício do poder de sufrágio popular, devendo, para isso, buscar manter o equilíbrio da disputa, combatendo o abuso do poder político e econômico. O controle e fiscalização da arrecadação de recursos e a prestação de contas dos participantes do processo eleitoral, desta forma, reveste-se de uma grande importância, sendo fator determinante para a lisura das eleições.

Assim, e forte na compreensão de que o processo eleitoral não se encerra no dia da votação, é de se entender que eventual conduta perpetrada no bojo do processo de prestação de contas pode, em tese, estar revestida de finalidade eleitoral, restando claro igualmente: as declarações incorporadas nos autos de prestação de contas encaminhadas à Justiça Eleitoral são aptas a preencher o elemento subjetivo do tipo penal insculpido no art. 350 do Código Eleitoral, uma vez que o documento que se analisa é a prestação de contas.

A peça inicial imputa ao réu as condutas de inserção de declarações falsas em prestação de contas de campanha:

1º fato. Utilização de recursos próprios na campanha eleitoral, os quais teriam sido, na verdade, repassados pelo partido político;

2º fato. Realização de despesa posteriormente suprimida sem qualquer justificativa;

3º fato. Emissão de cheque cujo valor e beneficiário foram posteriormente retificados;

4º fato. Inexistência de despesas com o uso de combustível, enquanto cupons fiscais demonstrariam dispêndios dessa ordem;

5º fato. Doação de adesivos, cujo valor teria sido pago a beneficiário diverso do donatário, através de cheque.

Todos os fatos se deram nos autos da Prestação de Contas n. 307-86.2012.6.21.0018, referente à Campanha Eleitoral de 2012, na qual Jarbas concorreu ao cargo de vereador, com cópia nas fls. 66-166. Naquela demanda, após a apresentação da contabilidade pelo réu em razão de inconsistências, foram realizadas análises técnicas pelo Cartório Eleitoral (fls. 109-110 e 155 e verso). Intimado para prestar esclarecimentos, o candidato retificou alguns dos dados iniciais, o que indicaria a falsidade das primeiras declarações.

A prestação de contas foi desaprovada, nos termos da sentença que transitou em julgado, conforme segue:

Vistos etc.

I – RELATÓRIO:

Trata-se de prestação de contas do candidato a Vereador Jarbas Cardoso de Mateo, referente às eleições municipais de 2012 (fls. 02 à 23). O candidato juntou documentos de fls. 24. à 37.

No relatório preliminar para expedição de diligências, solicitou-se a complementação do preenchimento dos recibos eleitorais emitidos, adequação e comprovação da regularidade das doações estimáveis em dinheiro e apresentação dos extratos bancários de todo o período da campanha eleitoral, com o saldo inicial zerado. E, ainda, esclarecimentos sobre: a utilização de recursos próprios não declarados no patrimônio durante o registro de candidatura; a divergência entre as informações, relativas às despesas, constantes na prestação de contas e na base de dados da Justiça Eleitoral, obtidos por circularização prévia; a existência de gastos com combustíveis sem que houvesse em contrapartida o registro de utilização de meios de transporte ou deslocamento seja para a campanha ou para publicidade; as despesas não comprovadas por meio de documento fiscal hábil; a despesa correspondente ao recibo n.º 044 que não foi incluída na prestação de contas; a divergência, nos dados de identificação da conta corrente, entre as informações prestadas e as constantes nos extratos bancários; e, sobre a divergência na identificação do doador, entre o informado no extrato eletrônico e o informado na prestação de contas pelo candidato.

Intimado para manifestar-se no prazo de 72 horas, conforme possibilita o art. 48 da Resolução TSE nº 23.376/2012, o candidato juntou os documentos de fls. à , solicitou o desentranhamento de recibos e manifestou-se alegando que houve equívoco na emissão do recibo eleitoral n. º 1301386290RS000002, e, que ao invés de recurso próprio, como informado inicialmente, a receita teria origem em doação financeira realizada pela Direção Nacional do Partido dos Trabalhadores. O candidato afirma que não houve despesa com combustível e, portanto, não emitiu recibo eleitoral; em contrapartida, junta documentos comprovando a propriedade do automóvel, declaração de locação a termo de cessão de uso do veículo. Não houve manifestação sobre despesa no valor de R$ 80,00 (oitenta reais), fl. 12, a qual foi simplesmente excluída da prestação de contas. Ainda, não foi apresentada nota explicativa, contudo, conforme a documentação juntada, deduz-se que o candidato repute as despesas com o fornecedor Braspor Grafica e Editorial Ltda, CNPJ nº 07.263.666/0001-81, como receitas estimáveis em dinheiro, originadas de doação realizada pelo Diretório Nacional. Por fim, declara ter doado ao candidato Carlos Eli Jesus Fernandes adesivos no valor estimado de R$ 690,00 (seiscentos e noventa reais), contudo, não junta recibo eleitoral emitido e preenchido de forma adequada e nota fiscal em seu nome para corroborar a regularidade da doação; existindo, inclusive, outro recibo neste mesmo valor e data, contudo, tal quantia foi debitada somente uma vez na conta corrente.

A analista designada para o exame técnico emitiu Relatório Conclusivo apontando as irregularidades, indicou que o candidato não comprovou a regularidade das doações, recebidas a título de receita estimável em dinheiro, consubstanciadas nos recibos eleitorais n.º 1301386290RS000003, 1301386290RS000004 e 1301386290RS000005, em contrariedade à previsão constante no art. 41 da da Resolução TSE 23.376/2012. Esclarecendo que, em contradição à alegação de que não houve despesas com combustível, foram apresentados documentos visando comprovar regularidade de doação estimável em dinheiro, consubstanciada na cessão de uso de veículo automotor, sem a emissão do recibo eleitoral correspondente. E, apontando, ainda, que não foi evidenciada a regularidade da doação efetuada pelo candidato ao Sr. Carlos Eli Jesus Fernandes.

O Ministério Público Eleitoral manifestou-se pela desaprovação das contas prestadas (fls. 84 à 87).

Vieram os autos conclusos para sentença.

É O RELATÓRIO.

DECIDO.

II – FUNDAMENTAÇÃO

Cuida-se de apreciar contas de campanha eleitoral oferecidas por Jarbas Cardoso de Mateo, candidato a vereador do município de Dom Pedrito pelo Partido dos Trabalhadores.

Inicialmente, registre-se que a prestação de contas apresentada tempestivamente pelo candidato foi instruída com os documentos arrolados no art. 40 da Resolução TSE nº 23.376/2012, estando suas peças devidamente assinadas.

Apesar disso, a análise técnica verificou a existência de irregularidade insanável, que compromete as contas, tendo em vista a utilização na campanha eleitoral de recurso estimável em dinheiro cuja doação não satisfez as condições de regularidade, existência de receita estimável em dinheiro sem a emissão de recibo eleitoral ou inclusão na prestação de contas, e, a existência de despesas nas quais é impossível auferir a origem do gasto eleitoral.

Conforme os recibos eleitorais n.º 1301386290RS000003, 1301386290RS000004 e 1301386290RS000005, as notas fiscais (fl. 48 e 49) não correspondem a despesas, mas sim a doações estimáveis em dinheiro feitas pelo Diretório Nacional. Todavia, os documentos juntados não corroboram tal ideia; não foram apresentados o termo de doação e a nota fiscal no nome do doador – os documentos fiscais apresentados foram emitidos em nome do candidato – salientando que a declaração feita pelo fornecedor à Justiça Eleitoral foi realizada no CNPJ do candidato e não dirigida ao Órgão Partidário. Tais fatos afrontam explicitamente a regra contida no art. 41, da Resolução nº 23.376/2012:

“Art. 41 A receita estimada, oriunda de doação/cessão ao candidato, ao comitê financeiro e ao partido político de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, deverá ser comprovada com a apresentação dos seguintes documentos:

I - documento fiscal emitido pela pessoa jurídica doadora e termo de doação por ele firmado;

II - documentos fiscais emitidos em nome do doador ou termo de doação por ele firmado, quando se tratar de doação feita por pessoa física;

III - termo de cessão, ou documento equivalente, quando se tratar de bens pertencentes ao cedente, pessoa física ou jurídica, cedidos temporariamente ao candidato, comitê financeiro ou partido político. ”

Assim, além da ausência dos documentos referidos anteriormente, os recibos eleitorais correspondentes à referida doação não foram devidamente preenchidos - a despeito da nota explicativa de que os mesmos foram enviados pelo correio para que fossem assinados com a promessa de juntada posterior aos autos – não restando nos autos nenhuma prova de que a doação realizada foi regular.

Em tempo, existe despesa sem o correspondente registro de gasto eleitoral, no valor de R$ 80,00 (oitenta reais). Solicitado esclarecimento em diligência o candidato procedeu à exclusão da referida despesa na prestação de contas retificadora sem que houvesse qualquer justificativa para tanto.

O candidato se manifesta sustentado que não foram realizadas despesas com combustíveis, afirmando que os cupons fiscais foram apresentados por equívoco. Todavia, junta aos autos termo de cessão de uso (fl. 43) e certificado de registro e licenciamento (fl. 44) do veículo Fiat/Palio Fire, placa HCI5802. As alegações do candidato estão em contradição com a documentação juntada pelo mesmo. Não é crível atribuir vericidade aos referidos argumentos, inclusive, porque, como bem apontado no parecer ministerial, o recibo de combustível emitido no dia16/09/2012 (fl. 25) aponta que a placa do veículo abastecido é exatamente a mesma do automóvel sobre o qual haveria a cessão de uso. Não há que se considerar tal situação como impropriedade, um mero esquecimento do candidato, quando este categoricamente afirma a inexistência de gastos, os quais estão devidamente provados nos autos. Somando-se a isso, constata-se que não houve a emissão do recibo eleitoral ou a inclusão da receita estimada nas contas apresentadas, configurando grave irregularidade.

Por fim, existe dúvida quanto a origem do gasto eleitoral na quantia de R$ 690,00 (seiscentos e noventa reais). O candidato apresenta recibo de assessoria contábil no referido valor (fl.46) informando no Relatório de Despesas Efetuadas (fl. 11 e 68) que tal gasto foi adimplido por meio do cheque n.º 85005 em 25/09/2012. Na prestação de contas retificadora o candidato informa no Demonstrativo de Doações Efetuadas a Candidatos/Comitês Financeiros/Partidos que houve doação de adesivos, também no valor de R$ 690,00 (seiscentos e noventa reais) e na data de 25/09/2012 ao candidato Carlos Eli Jesus Fernandes. Todavia, não foi apresentado a “via do doador” do recibo eleitoral que deveria ter sido emitido pelo beneficiário ou quaisquer documentos fiscais que comprovem a existência de gasto eleitoral com adesivos neste valor. Salienta-se por fim, que no extrato bancário somente foi constatada a existência de um único débito realizado naquele valor no dia em questão. Nesse sentido, impossível determinar o destino do pagamento realizado.

Diante do caso em tela, há que se levar em conta que a gestão dos recursos destinados às campanhas e a respectiva prestação de contas estão intimamente ligadas à transparência e à própria legitimidade das eleições, verifica-se, assim, irregularidade insanável nas suas contas, fazendo-se necessária a desaprovação das mesmas nos termos do art. 51, III, da Resolução 23.376/2012.

Em tempo, diante dos indícios de sonegação e/ou falsidade de dados apontados no parecer ministerial, os quais poderão ser averiguados em procedimento próprio, indefiro o pedido de desentranhamento dos documentos requeridos pelo candidato (fl. 42).

III - DISPOSITIVO

Isso posto, DESAPROVO as contas do candidato Jarbas Cardoso de Mateo, relativas às eleições municipais de 2012, nos termos dos arts. 27, IX e 51, III, da Resolução TSE n.º 23.376/2012, ante os fundamentos declinados; e INDEFIRO o pedido de desentranhamento requerido pelo candidato.

Remeta-se cópia de todo o processo ao Ministério Público Eleitoral para os fins previstos no art. 22 da Lei Complementar nº 64/90 (Lei nº 9.504/97, art. 22, § 4º).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Após, arquive-se com baixa.

Registro o teor do julgamento de mérito do processo apenas para contextualização, uma vez que o deslinde daquela ação não serve de parâmetro para o exame da ocorrência do delito. A rejeição das contas não implica a necessária ocorrência de crime, bem como da aprovação da contabilidade também não decorre a inexistência de ilícitos na campanha.

As cortes eleitorais têm se pautado pela aplicação do princípio da proporcionalidade no julgamento das contas, de modo que uma irregularidade (correspondente ou não à descrição do tipo) de valor vultoso tem a possibilidade de implicar em juízo de reprovação, e uma dezena de ilícitos de pequeno valor pode ser reputada irrelevante para fins contábeis, por exemplo.

Acrescento: na verificação da falsidade eleitoral se apura a lesão à fé pública, e o valor do montante envolvido no ilícito configura parâmetro para aplicação da pena, e não circunstância de configuração do delito.

À análise do acervo probatório.

Além da prova documental, foi realizada audiência em 25.08.2015, com a oitiva das testemunhas de acusação, de defesa e, ao final, com o interrogatório do acusado (fls. 273-275).

A primeira testemunha, IVANUNCIA MACIEL SEVERO, afirmou:

“[…] tanto a depoente quanto Álvaro trabalhavam voluntariamente. O automóvel foi emprestado para publicidade, mas quem dirigia era o próprio Raul. Não receberam nenhum pagamento por emprestar o automóvel, apenas para manutenção e combustível. Acredita que os pagamentos feitos ao Álvaro era para gasolina, em nenhum momento foi cobrado a ajuda na campanha do acusado. [...]

Em seguida, ÁLVARO RAUL DE SOUZA ZANOLETE disse que:

[…] Contribuiu na campanha de Jarbas, colocando som com o automóvel que era da sua namorada. O acusado pagava uma quantia para manutenção do automóvel, gasolina, peças estragadas. Os pagamentos eram feitos por meio de dinheiro. O depoente não lembra de ter recebido cheque do acusado. Trabalhou direto na campanha, havia uma pasta com todos os recibos e eram entregues ao contador. Os valores que o depoente recebeu do acusado era para a caixa de som e manutenções. Os pagamentos eram em dinheiro. [...]

JEIZEL GOMES DE MORAIS, o contador que elaborou a prestação de contas, ao se reportar sobre trabalho efetuado, relatou:

[…] Foi há bastante tempo atrás, no começo tinham informações que não apareciam em nota, foi feito “mais ou menos” um fechamento de primeira, quando foi feito o pedido de retificação já tinham mais tempo. Os recibos apresentados não foram entregues e preenchidos pelo Sr. Jarbas, o depoente ajudou o acusado a preencher alguns recibos com informações dadas pelo acusado. Álvaro somente assinou alguns recibos. […] Em primeiro momento para elaborar a prestação de contas do acusado não tinham todos os documentos, tiveram que correr atrás. O correto seria o candidato apresentar com todos os recibos preenchidos. [...]

Por seu turno, FERNANDA CLEMENTINA ESPINOSA DE MORAES, esposa do contador, narrou que:

[…] A depoente assinou um recibo como se tivesse prestado ajuda na campanha. Não sabe quem entregou o recibo para a testemunha assinar. Faltava recibos, comprovantes e pelo que a depoente lembra, seu esposo pediu para que ela assinasse para que as contas pudessem fechar. Como faltavam recibos e a Justiça precisava, foi pedido a depoente que assinasse os recibos para fechar as contas [...]

Das testemunhas de defesa, JORGE OMAR DE MELLO LOPES apenas abona a conduta do réu, e CARLOS ELI JESUS FERNANDES, além de abonar, afirma que “Não recebeu nada do Jarbas, não sabe os motivos de constar seu nome no recibo”.

Em seu interrogatório, Jarbas Cardoso de Mateo declarou que:

[…] Muitas vezes, não conseguia pegar as despesas na hora, em 15 e 15 dias eram levados alguns recibos para o escritório, isso era requisitado pelo partido. Não apresentava todos os recibos de todas as despesas, chegou no final, na hora de prestar contas e ocorreu o problema. Tudo ficava dentro de uma pastinha de recibos. Quando foi chamado de que não tinha fechado as prestações de conta se surpreendeu, tudo era levado para o escritório, essa era a menor das preocupações do acusado. O valor disponibilizado para a campanha do acusado era tão pequeno, que era preciso fazer um “jogo de cintura” para tudo. Muitos recibos foram pegos depois, mas recibos verdadeiros. [...]

Ainda, relata que os problemas ocorreram em virtude de desorganização por parte do contador, e que tal profissional foi contratado pelo partido.

Note-se que, relativamente aos fatos ocorridos, as justificativas foram as seguintes:

1º fato: na fl. 69, consta declaração de utilização de recursos próprios no valor de R$ 4.750,00, datada de 06.11.2012, assinada por Jarbas Cardoso de Mateo.

Apontada inconsistência pela Justiça Eleitoral (fl. 109-110), o réu refere no formulário “Declaração e Nota Explicativa” (fl. 112), em data de 30.11.2012, que “quanto ao depósito de 4.750,00 foi lançado de forma correta no sistema usando o Doador CNPJ 00.676.262/0001-70”.

Também veio aos autos manifestação do Partido dos Trabalhadores – Diretório Nacional (fl. 249) – consignando doação à campanha eleitoral de Jarbas  no valor de R$ 4.750,00.

Antecipo, aqui, parecer claro que o réu declarou falsamente o uso de recursos próprios, quando na verdade tratava-se de doação recebida do partido. A rigor, o réu assumiu a falsidade da declaração inicial, retificada apenas após a intervenção da fiscalização da Justiça Eleitoral.

2º fato: na fl. 77, Jarbas Cardoso de Mateo declara, em 06.11.2012, a ocorrência de despesa relativa a “serviços prestados por terceiros”, cujo fornecedor seria FERNANDA CLEMENTINA ESPINOSA, no valor de R$ 80,00.

Na declaração retificadora de 30.11.2012, a despesa foi suprimida do Relatório de Despesas Efetuadas (fls. 139-414), sem exposição de razões, o que leva a crer, igualmente, ser falsa a declaração inicial.

Aliás, repiso que Fernanda Clementina Espinosa de Moraes afirmou ter assinado recibo para prestar “ajuda” na campanha, para viabilizar o “fechamento” das contas (fl. 274), de forma que o conteúdo da declaração da fl. 77, na qual o réu afirma ter havido prestação de serviços à campanha eleitoral por Fernanda, é falso, e excluído da prestação de contas apenas após a intervenção da fiscalização da Justiça Eleitoral.

3º fato: na fl. 77, o réu informa a ocorrência de “despesas com pessoal”, cujo fornecedor seria ALVARO RAUL DE SOUZA ZANOLETE, no valor de R$ 77,00, a qual teria sido quitada com o cheque n. 850010.

Todavia, o extrato bancário da fl. 128 evidencia que o cheque n. 850010 correspondeu ao valor de R$ 157,00, e o demonstrativo da fl. 141 indica o mesmo documento de crédito como tendo sido emitido em favor de JEZIEL GOMES DE MORAIS.

Assim, conclui-se que a declaração da fl. 77, despesa paga com o cheque n. 850010, está revestida de falsidade ideológica, tendo sido declarado seu real conteúdo apenas após a intervenção da fiscalização da Justiça Eleitoral.

4º fato: Jarbas omite da prestação de contas qualquer dado referente à locação ou cessão de veículo, publicidade com carro de som, despesa com transporte ou deslocamento. Na declaração da fl. 112, manifesta que “Quanto as despesas de gasolina não houve nenhuma, pois os cupons fiscais de nº 1556 e 1557 foram colocados nos autos por equívoco, já na Ocasião peço o 'Desentranhamento' dos mesmos”.

O cupom n. 1557 foi colacionado na fl. 91 e indica a placa automotiva HCI-5802. Além, o réu juntou termo de cessão sobre uso de veículo (placas HCI-5802, fls. 113-114), onde consta como cedente IVANUNCIA MACIEL SEVERO, e o candidato como cessionário.

Em seu depoimento (fl. 273), Ivanuncia afirma que “O automóvel foi emprestado para publicidade” e Álvaro Raul de Souza Zanolete confirma que “contribuiu na campanha de Jarbas, colocando som com o automóvel que era da sua namorada. O acusado pagava uma quantia para manutenção do automóvel, gasolina, peças estragadas. Os pagamentos eram feitos por meio de dinheiro”.

Como se percebe, apesar da contraditória indicação do uso de veículo para campanha na prestação de contas e, ao mesmo tempo, ter sido declarado inexistência de despesas com combustível, o conjunto probatório dos autos revela a utilização de automóvel e o empenho de valores em manutenção, de modo a configurar declaração falsa (fl. 112) sobre a não ocorrência de despesas com combustível. Aliás, em paralelo, o réu pretendeu reverter a situação inicial que indicava o veículo em sua prestação de contas, mas restou desacreditado diante dos testemunhos colhidos.

5º fato: - Na fl. 136, consta demonstrativo de doação em favor de CARLOS ELI JESUS FERNANDES assinado por Jarbas Cardoso de Mateo, referente à “doação de adesivos” estimados em R$ 690,00. Em seu depoimento (fl. 274v.), Carlos Eli afirma que “Não recebeu nada do Jarbas, não sabe os motivos de constar seu nome no recibo”.

O réu não logrou êxito em trazer aos autos comprovação da entrega de tal doação ao destinatário indicado no recibo ou mesmo da produção do material.

Assim, é de se entender presente a falsidade ideológica do demonstrativo de doações efetuadas da fl. 136, de modo que a conduta do recorrido amolda-se a inserir, em prestação de contas, declaração falsa para fins eleitorais.

Ao que parece, o réu, ignorando a normatização da prestação de contas, movimentava valores livremente, preocupando-se em “regularizar” posteriormente ao pleito, contando com a participação de correligionários e simpatizantes para assinar recibos e declarações não correspondentes à realidade.

O recorrido postulou a manutenção da decisão por ausência de lesividade da conduta.

Rogério Greco (Curso de Direito Penal, Vol. 1, 18. ed. Rio de Janeiro, Impetus, 2016, pag. 101), citando Nilo Batista, indica as quatro principais funções do princípio da lesividade: a) proibir a incriminação de uma atitude interna; b) proibir a incriminação de uma conduta que não exceda o âmbito do próprio autor; c) proibir a incriminação de simples estados ou condições existenciais; d) proibir a incriminação de condutas desviadas que não afetem qualquer bem jurídico.

O que se tem, no caso, são condutas que atingem a fé pública eleitoral.

É certo que as condutas do réu ultrapassaram o âmbito do autor, envolvendo terceiros na empreitada criminosa. Atos da espécie aqui examinada maculam a fé pública eleitoral e a confiança na transparência do processo eleitoral.

Ainda, cito Rodrigo López Zilio (Crimes Eleitorais. Salvador: JusPODIVM, 2014. págs. 209-212), que traz percuciente reflexão acerca da falsidade no processo de prestação de contas e do abalo na credibilidade do sistema eleitoral:

A falsidade ideológica eleitoral deve também recair sobre fato juridicamente relevante, pois o falso sobre fato desprezível ou irrelevante juridicamente não tem o condão de afetar a lisura e da credibilidade da fé pública eleitoral. Justamente neste ponto é que o julgador deve demonstrar extremo zelo e comprometimento com os valores ínsitos ao processo eleitoral, preservando a disputa entre candidatos, partidos e coligações de condutas danosas e que causam abalo na própria credibilidade do sistema eleitoral. O TSE, no entanto, não tem dispensado um tratamento adequado a determinadas condutas de falso que pairam sobre o processo de prestação de contas, circunstância que tem dado ênfase à falência total desse procedimento de controle de arrecadação e gastos de recursos nas campanhas eleitorais, contribuindo, também, para o descrédito do próprio Poder Judiciário. Neste norte, decidiu a Corte Superior Eleitoral: a) “a declaração falsa do paciente de que não havia efetuado movimentação financeira na conta bancária de campanha é irrelevante no processo de prestação de contas de campanha, visto que o art. 30 da Resolução-TSE 22.715/2008 exige a apresentação do extrato bancário para demonstrar a movimentação financeira” e “desse modo, a conduta é atípica, pois não possui aptidão para lesionar a fé pública eleitoral” (Habeas Corpus nº 71.519 – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 20.03.2013); b) a omissão ou afirmação falsa na declaração de bens que instrui o pedido de registro de candidatura não configura o crime de falsidade ideológica eleitoral, por ausência de aptidão para ofender a fé pública eleitoral.

Problema bem mais significativo é a punição criminal da conduta denominada “caixa dois” ou, na dicção legal, recursos e gastos eleitorais ilícitos ou não contabilizados. Neste ponto, é perceptível o prejuízo decorrente da inexistência de um tipo penal específico criminalizando a conduta de “caixa dois”, na medida em que a única forma de – tentar – punir o infrator é por meio do crime de falsidade ideológica eleitoral (art. 350 do Código Eleitoral).

A jurisprudência eleitoral tem demonstrado enorme resistência em enquadrar a omissão de declaração de recursos recebidos na prestação de contas como crime de falsidade ideológica eleitoral. Nesta alheta, o TSE decidiu que “a rejeição da prestação de contas, decorrente de omissão em relação a despesa que dela deveria constar, não implica, necessariamente, na caracterização do crime capitulado no art. 350 do CE”, argumentando que “não há como reconhecer, na espécie, a finalidade eleitoral da conduta omissiva, elemento subjetivo do tipo penal em apreço, porquanto as contas são apresentadas à Justiça Eleitoral após a realização do pleito” (Recurso Especial Eleitoral nº 26010 – Rel. Min. Marcelo Ribeiro – j. 08.05.2008). A ausência de finalidade eleitoral também foi argumento para defender a não-configuração do crime do art. 350 do Código Eleitoral, em caso de indicação errônea do número da conta bancária de campanha na prestação de contas (Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 35.518 – Rel. Min. Felix Fischer – j. 25.08.2009).

Não há como compartilhar com esse posicionamento sufragado pela Corte Superior Eleitoral, porquanto a finalidade eleitoral não se resume apenas até o momento da realização da eleição – até mesmo porque esse entendimento fulmina a possibilidade (sempre prestigiada pelo TSE) de a coligação partidária possuir legitimidade para o manuseio do Recurso Contra a Expedição do Diploma ou, ainda, da Ação de Impugnação ao Mandato Eletivo. Aliás, se a prestação de contas – que tem por objetivo maior verificar a regularidade dos recursos arrecadados e dos gastos efetuados por partidos, candidatos e coligações – não tem finalidade eleitoral, cabe questionar o motivo da própria existência, na lei das eleições, de regras específicas para o desenvolver desse procedimento ? Se não há finalidade eleitoral na prestação de contas, a Justiça Eleitoral – por incompetência em razão da matéria – sequer deveria conhecê-las. A argumentação utilizada é precária e, com a devida vênia, não possui mínima sustentação lógica e jurídica. Insuperável, no ponto, a crítica de CARLOS AUGUSTO CAZARRÉ: “Dizer que a falsidade contida na prestação de contas de campanha não tem finalidade eleitoral é retirar sua importância como documento inerente ao processo eleitoral. Ora, ela é o principal instrumento de controle do financiamento e dos gastos de campanha. Representa a arma mais eficaz no combate ao abuso do poder econômico, tendo em vista o necessário equilíbrio material entre os candidatos em um sistema democrático. Resta claro, então, que a distinção a ser feita do falso eleitoral em relação à falsidade comum, que reclama a incidência do delito previsto no Código Eleitoral, não chega a ser tão específica a ponto de se verificar se a conduta tem aptidão ou não para interferir no resultado do pleito. Como dito, a norma tem por escopo proteger a fé pública eleitoral e, para tanto, se a ação ou omissão verificada abalar a transparência e, por conseguinte, a confiança atrelada aos documentos do processo eleitoral, em qualquer de suas fases, resta configurada a conduta. Dessa forma, não há como definir finalidade eleitoral unicamente como a possibilidade de alterar o resultado do pleito, uma vez que o processo eleitoral envolve, também, atos praticados após as eleições que, igualmente, devem ser guiados pela verdade e transparência. Portanto, deve ser afastado o entendimento segundo o qual a omissão de informação na prestação de contas não pode caracterizar o crime previsto no art. 350, por ela ser apresentada após o pleito e não ter capacidade de alterar seu resultado” (p. 478). No mesmo diapasão, EDSON DE RESENDE CASTRO observa que “na prestação de contas, quando o candidato omite receitas e despesas, deixando-as à margem da contabilidade da campanha, operando-as em ‘caixa 2’, também caracteriza-se o crime do art. 350 do Código Eleitoral, porque essa informação é fundamental ao exercício da fiscalização da Justiça Eleitoral” (pp. 536/537).

Ou seja, a falsidade no bojo do processo de prestação de contas atinge a fé pública eleitoral e a credibilidade da Justiça Eleitoral, órgão responsável pela análise da contabilidade.

O réu também argumenta que o fato de a prestação de contas ser analisada, pela Justiça Eleitoral, excluiria a tipicidade.

Na análise de delitos semelhantes ao dos autos, em que se examina a lesão à fé pública geral, anoto a existência de jurisprudência a afirmar a atipicidade da conduta quando a falsificação é facilmente perceptível ou que não tem aptidão, por si só, para macular o bem jurídico protegido. Cito precedente do Superior Tribunal de Justiça:

HABEAS CORPUS. USO DE DOCUMENTO FALSO. DENÚNCIA. FALSIFICAÇÃO GROSSEIRA. ADULTERAÇÃO PERCEBIDA Á PRIMEIRA VISTA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. DESNECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. COAÇÃO ILEGAL CONFIGURADA. ORDEM CONCEDIDA.

1. O reconhecimento da atipicidade da conduta, pela via mandamental, é medida excepcional, só admitida quando restar provada inequivocamente e sem a necessidade de uma incursão aprofundada na seara probatória dos autos.

2. O deslinde do presente feito não perpassa pela necessidade de se vislumbrar o conjunto fático-probatório, pois consignado pelas instâncias ordinárias que o falsum foi percebido pelos milicianos ainda na abordagem policial, confirmado na delegacia, antes mesmo da realização de perícia, dada a existência de erros ortográficos e má qualidade da impressão.

3. Esta Corte de Justiça, seguindo a jurisprudência do Pretório Excelso, firmou o entendimento de que a mera falsificação grosseira de documento, afasta o delito previsto no art. 304 do Código Penal (Precedentes STJ).

4. In casu, constatada que a adulteração da carteira funcional foi detectada à primeira vista, numa simples análise do documento, não se pode falar em tipicidade da conduta, tendo em vista que o objeto do ilícito em apreço era inapto a atingir o bem jurídico tutelado pela norma penal incriminadora, qual seja, a fé pública.

5. Ordem concedida para reconhecer a atipicidade da conduta.

(HC 206.758/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 27.9.2011, DJe 13.10.2011.) (Grifei.)

Não é o caso, aqui. A análise da prestação de contas apenas detectou a presença de irregularidades em razão do zelo e do preparo técnico dos servidores altamente especializados, os quais examinaram os documentos. A falsidade, em si considerada, nitidamente teria potencial para atingir a credibilidade dos demonstrativos de arrecadação e dispêndio de recursos na campanha eleitoral, circunstância que entendo fundamental para o deslinde do feito.

Nessa linha, o exame dos documentos pelo corpo técnico da Justiça Eleitoral tem equivalência a uma perícia contábil. A prestação de contas inicialmente apresentada iludiria indivíduo não detentor de conhecimento especializado, de forma que é inafastável a configuração da tipicidade.

Acerca da configuração de lesão à fé pública eleitoral, colaciono precedente do Tribunal Superior Eleitoral:

HABEAS CORPUS. CRIME. ARTIGO 350 DO CÓDIGO ELEITORAL. FALSIDADE IDEOLÓGICA. INÉPCIA DA DENÚNCIA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO. VANTAGEM OU BENEFÍCIO. LESÃO AO BEM JURÍDICO. DESNECESSIDADE. CRIME FORMAL. DENEGAÇÃO DA ORDEM.

1. Nosso ordenamento jurídico consagra regra da impossibilidade do trancamento da ação penal por meio de habeas corpus. Permite-se, excepcionalmente, o exame de plano quando evidenciada a atipicidade da conduta, extinção da punibilidade, ilegitimidade da parte ou ausência de condição para o exercício da ação penal.

2. No caso, a denúncia não é inepta, pois obedece aos ditames do artigo 41 do Código de Processo Penal e do artigo 358 do Código Eleitoral, expondo os fatos com suas circunstâncias, a qualificação do acusado e a classificação do crime.

3. Questões relacionadas à inexistência de indicação na peça acusatória do dolo específico do tipo descrito no artigo 350 do Código Eleitoral não podem ser analisadas em sede de habeas corpus, pois tal matéria deverá ser esclarecida durante a instrução do processo criminal, sendo objeto de apreciação pela Corte Regional, sob pena de indevida supressão de instância.

4. O tipo previsto no art. 350 do CE - falsidade ideológica - é crime formal. É irrelevante para sua consumação aferir a existência de resultado naturalístico, basta que o documento falso tenha potencialidade lesiva, o que afasta a alegação de inépcia da denúncia ante a ausência de descrição da vantagem ou benefício auferido na prática do suposto ilícito penal e de efetiva lesão ao bem jurídico tutelado.

5. Ordem denegada.

(Habeas Corpus n. 154094, Acórdão de 07.12.2011, Relator Min. GILSON LANGARO DIPP, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 32, Data 14.02.2012, Página 49.) (Grifei.)

O recorrido alega, por fim, o reconhecimento do delito de bagatela, em razão de o dano resultante da infração não causar impacto no objeto jurídico do tipo penal.

Ocorre que, aqui, o objeto é a fé pública, sob o prisma eleitoral.

Mais uma vez, tomo emprestada a concepção jurisprudencial acerca de delito que atinge a fé pública:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. MOEDA FALSA. CONDENAÇÃO PELO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL. RESP INADMITIDO. ARESP NÃO PROVIDO. PLEITO DE ATIPICIDADE DA CONDUTA OU REDIMENSIONAMENTO DA PENA. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DO ACERVO PROBATÓRIO PARA REFORMA DO ACÓRDÃO RECORRIDO. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ.

[...]

PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE AO TIPO PENAL.

PRECEDENTES DO STJ E DO STF. AGRAVO NÃO PROVIDO. DECISÃO MONOCRÁTICA MANTIDA.

2. Consolidada se mostra a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça que, em harmonia com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, afasta a incidência do princípio da insignificância ao delito de moeda falsa, independentemente do valor ou quantidade de cédulas apreendidas, uma vez que o bem jurídico tutelado por esta norma penal é a fé pública.

3. Agravo regimental não provido.

(STJ. AgRg no AREsp 454.465/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 12.8.2014, DJe 21.8.2014.) (Grifei)

Como reiteradamente decidem os tribunais superiores, “a fé pública não tem preço”, de modo que não há como reconhecer, como delito de bagatela, condutas que atentem contra tal bem jurídico.

Ou seja, a desorganização e a inaptidão para a devida observância aos parâmetros contábeis não se traduzem necessariamente em ilícitos. No entanto, na medida em que o candidato se propôs a declarar formalmente fatos inexistentes ou ocultar fatos ocorridos, a conduta adquiriu relevância penal. Em outras palavras: o fato de a contabilidade “não fechar” atraiu a desaprovação das contas; contudo, no momento em que o candidato inseriu declarações falsas na prestação de contas, atraiu a incidência da norma penal.

Aponto que o réu, conforme documentos das fls. 34-39, ocupou o posto de Administrador do Legislativo Municipal de Dom Pedrito no exercício de 2011, o que faz presumir mínima intimidade com conteúdos normativos.

Portanto, tenho que, da análise de todos os fatos, infere-se que Jarbas Cardoso de Mateo declarou falsamente o uso de recursos próprios, quando na verdade tratava-se de doação recebida do partido (1º fato); declarou falsamente a ocorrência de despesa relativa a “serviços prestados por terceiros” (2º fato); declarou falsamente a prestação de serviços à campanha eleitoral por Fernanda Clementina Espinosa (3º fato); omitiu declaração que deveria constar na prestação de contas acerca da utilização de automóvel e despesas com combustível (4º fato); e declarou falsamente a doação de bens em favor de Carlos Eli Jesus Fernandes (5º fato), tudos os fatos ocorridos em prestação de contas de campanha eleitoral.

Embora as ações sejam várias, observo que foi em apenas um documento público que recaiu a falsidade: a prestação de contas relativa à arrecadação e aplicação de recursos financeiros na campanha eleitoral de 2012, o que configura a ocorrência de crime único.

Repelidas as teses de defesa e em face do reconhecimento do cometimento delito de falsidade eleitoral, cumpre proceder à dosimetria da pena do réu.

Por força do que dispõe o art. 284 do Código Eleitoral, o mínimo da pena é de 1 ano de reclusão.

Logo, a pena em abstrato prevista para o crime previsto no art. 350 do Código Eleitoral é de 1 a 5 anos de reclusão e multa de 5 a 15 dias-multa.

Circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal:

Culpabilidade: A reprovabilidade da conduta do réu deve ser entendida como além da normal, uma vez que, ao produzir documentos que viabilizassem a aprovação de sua prestação de contas, o acusado envolveu terceiros no ilícito, como Fernanda Clementina Espinosa de Moraes, a qual afirmou ter assinado recibo como se tivesse prestado ajuda na campanha para fins de “fechamento” (fls. 273-275).

Antecedentes: não há nos autos qualquer registro de existência de antecedentes criminais do acusado.

Os elementos constantes nos autos trazem depoimentos abonadores da conduta do réu (depoimento – fls. 273-275) e elementos que evidenciam condutas não compatíveis com a boa gestão da coisa pública – condenação por parte do Tribunal de Contas do Estado (fls. 31-47). Dessa forma, tal circunstância deve ser considerada neutra.

Personalidade: não há evidências de que o acusado tenha personalidade que desborde da normalidade, mas o fato de já estar integrado à vida pública recomendaria maior zelo com o trato de sua prestação de contas. No entanto, o fato de os demais envolvidos terem, aparentemente, aderido sem resistência, favorece o réu.

Motivos comuns à espécie.

As circunstâncias do crime – elementos acidentais não participantes da estrutura do tipo, embora envolvendo o delito – não são favoráveis ao réu. Embora se trate de crime único, por envolver a elaboração de apenas um documento ideologicamente falso, foi apurada a realização de cinco ocorrências (declarações inverídicas e omissões), o que deve ser considerado como circunstância apta para gravar a pena.

As consequências do crime não desbordam da normalidade, sobretudo porque a fiscalização da Justiça Eleitoral foi eficiente para detectar irregularidades. Do mesmo modo, envolve valores de pequena monta, as declarações falsas e omissões não redundaram em abuso de poder econômico ou desequilibraram a disputa eleitoral.

A vítima é o próprio Estado, não havendo que se falar em sua colaboração para o crime.

Tendo em conta as operantes do art. 59 do Código Penal, e considerando-se negativos os vetores culpabilidade e circunstâncias do crime, a pena-base deve ser fixada em 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão.

Reconheço a atenuante da confissão, tendo em conta que as declarações retificadores de Jarbas Cardoso de Mateo evidenciaram a falsidade das declarações iniciais.

Sobre o tema, colaciono precedente do Superior Tribunal de Justiça:

[…] REPRIMENDA. CONFISSÃO UTILIZADA PARA EMBASAR A CONDENAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIA REDUTORA DO ART. 65, III, D, DO CP. RECONHECIMENTO E APLICAÇÃO QUE SE IMPÕEM. COMPENSAÇÃO COM A REINCIDÊNCIA DEVIDA. COAÇÃO ILEGAL VERIFICADA. CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO.

1. Se a confissão do agente é utilizada como fundamento para embasar a conclusão condenatória, a atenuante prevista no art. 65, inciso III, alínea d, do CP, deve ser aplicada em seu favor, pouco importando se a admissão da prática do ilícito foi espontânea ou não, integral ou parcial, ou se houve retratação posterior em juízo.

[...]

(HC 176.405/RO, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 23.4.2013, DJe 03.5.2013.)

Com a aplicação da atenuante, reduzo a pena provisória para 1 ano de reclusão, tornando-a definitiva em razão da ausência de causas de aumento ou diminuição de pena, e fixo o regime aberto para início de cumprimento. Inocorrente a prescrição, haja vista o lapso temporal transcorrido entre a data dos fatos, 6.11.2012, e o recebimento da denúncia, 15.7.2015.

Relembro que não vislumbrei a ocorrência de concurso de crimes em razão de todos as ações terem se dado no bojo de um único documento, a prestação de contas de campanha eleitoral.

Cumulativamente, valendo-me da mesma análise, aplico a pena de multa num quantum correspondente a 5 (cinco) dias-multa, sendo que o valor do dia multa corresponderá a 1/30 do salário mínimo vigente à época do fato, observando-se o disposto no art. 49, caput e parágrafos 1º e 2º, do Código Penal.

O réu preenche os requisitos para substituição da pena privativa de liberdade por uma pena restritiva de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública, a ser definida pelo juízo da execução.

Da execução provisória da pena.

Em 05.10.2016, o Supremo Tribunal Federal julgou as ações declaratórias de constitucionalidade n. 43 e n. 44, cujo resultado se deu, ainda que em margem apertada, que o art. 283 do Código de Processo Penal “não impede o início da execução da pena após condenação em segunda instância”, e indeferiu liminares pleiteadas nas Ações Declaratórias de Constitucionalidade.

De início, ressalto que minha posição é pela inexistência de caráter vinculante ou de efeito erga omnes que determine aos tribunais de apelação, antes de transitado em julgado a sentença, executar a pena. Note-se que foi, nas decisões cautelares das referidas ações declaratórias de constitucionalidade, indicada apenas a inexistência de impedimento no art. 283 do CPP para o referido modo (no meu entender, precoce) de execução da pena.

Daí, parece claro que o Supremo Tribunal Federal não apontou cogência da execução da pena antes do trânsito em julgado – e nem mesmo poderia, pois o instituto da repercussão geral é reservado aos recursos especiais – art. 102, § 3º, da CF – e o caráter erga omnes das decisões em ADC cinge-se àquelas “definitivas de mérito” nos exatos termos do art. 102, § 2º, também da Constituição Federal.

Ademais, e posiciono-me apenas enquanto as Cortes de 2º grau assim podem proceder, nota-se dos conteúdos dos votos dos Ministros do STF, por ocasião do julgamento das ADC's n. 43 e 44, uma série de argumentos de caráter metajurídico – estatísticas de criminalidade, notas de impunidade, abusividade do direito de defesa, alta seletividade social do direito penal e da persecução criminal – ou seja, foram utilizados valores de política criminal e judiciária, os quais – ainda que verdadeiros e com os quais se concorde – podem demonstrar um excesso de valorização do que “deveria ser” em termos de sistema criminal e diminuir o significado de uma garantia fundamental de redação bastante clara, resultando em movimento com nuances de retorno à matriz neokantiana na seara penal – a decisão judicial erguida com embasamentos fortemente teleológicos.

Daí, não tendo sido modificada a redação constitucional – art. 5º, inc. LVII, da CF – ou tampouco o conceito de “trânsito em julgado”, apenas os argumentos metajurídicos é que estão a dar suporte à guinada jurisprudencial tomada pela Corte Suprema, pois sedimentada, há tempos (por exemplo, HC n. 84.078, do ano de 2009), a posição de que a execução da sanção penal era condicionada ao trânsito em julgado da respectiva condenação.

Nesses termos, entendo que o paradigma a ser seguido, nesta Corte, permanece sendo o Recurso Criminal n. 33-95, cujo julgamento foi finalizado em 15.6.2016, e designada como redatora para o acórdão a Dra. Gisele Anne Vieira de Azambuja. Na ocasião, restou assentada a “inviabilidade do pedido ministerial de execução provisória da sentença penal condenatória antes de consumado o seu trânsito em julgado, sob pena de solapar o princípio constitucional da presunção de inocência”. Na oportunidade, esta Corte considerou o teor do julgamento do Supremo Tribunal Federal (HC n. 126.292, ocorrido em 17.2.2016) para, respeitosamente, divergir da conclusão tomada pela Corte Suprema, até mesmo porque não vinculante, e conferiu exegese que, ao meu sentir, deu preferência à consagração da cláusula constitucional da presunção de inocência - art. 5º, inc. LVII, da Constituição Federal.

E, pelas premissas postas, tenho que a execução da pena só possa ocorrer após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, bastando agora elencar a presunção de inocência, pois o problema da demora na execução, parece-me, seja o do retardo no trânsito em julgado da decisão condenatória – nenhum outro. Nosso sistema permite que sejam levados à Corte Constitucional praticamente todos os casos criminais, o que gerou, há tempos, o colapso da engrenagem e a impunidade. O condenado acaba não cumprindo a sanção que lhe foi imposta.

É certo que cabe ao Supremo Tribunal Federal a derradeira palavra no que diz respeito à interpretação das normas constitucionais. Contudo, enquanto não sobrevier decisão vinculante, ou com efeitos erga omnes, tenho preferência por prestigiar a presunção de inocência, executando-se a pena somente após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

 

DIANTE DO EXPOSTO, VOTO por dar parcial provimento ao recurso, de forma a condenar JARBAS CARDOSO DE MATEO como incurso nas sanções do art. 350 do Código Eleitoral, fixando a pena em 1 ano de reclusão e 5 (cinco) dias-multa. Autorizo a substituição da pena privativa de liberdade por uma pena restritiva de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública, a ser definida pelo juízo da execução. No tocante ao pedido de execução provisória da pena, realizado pela Procuradoria Regional Eleitoral, entendo por indeferi-lo.

Após a intimação do recorrido, na pessoa de seu procurador, remetam-se os autos com vista à Defensoria Pública da União.