RE - 24447 - Sessão: 22/11/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pela COLIGAÇÃO NOVOS CAMINHOS contra sentença proferida pelo Juízo da 42ª Zona Eleitoral – Santa Rosa, que julgou improcedente a Ação de Investigação Judicial Eleitoral proposta contra EDUARDO FERREIRA RICHTER, fundamentalmente por não entender configurada propaganda eleitoral antecipada e, ainda, não caracterizado abuso de poder econômico (fls. 45-47v.).

Nas razões de reforma, sustenta que o recorrido publicou, em revista periódica da qual é proprietário, notícias de sua filiação a partido político e, também, as suas condições de pré-candidato e candidato a vereador em Santa Rosa. Indica que a conduta não pode ser albergada pelo art. 36-A da Lei n. 9.504/97, e que caracteriza abuso do poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação social (fls. 53-58).

Com as contrarrazões (fls. 61-67), os autos vieram ao grau recursal, no qual a Procuradoria Regional Eleitoral exarou parecer pelo desprovimento do recurso (fls. 70-74).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é regular e tempestivo, pois foi interposto no prazo de três dias, previsto no art. 258 do Código Eleitoral e, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, dele conheço.

No mérito, a recorrente sustenta a presença de provas suficientes para atrair as penalidades impostas pela legislação, especialmente do art. 22, XIV, da Lei Complementar n. 64/90, e intenta afastar a incidência do art. 36-A da Lei n. 9.504/97, invocado pelo juízo de origem para entender pela improcedência do pedido.

Eduardo Richter teve sua filiação ao Partido Progressista de Santa Rosa publicada na Revista “GENTE NEWS”, no mês de abril, bem como sua pré-candidatura anunciada pelo mesmo periódico, na edição do mês de junho, conforme incontroverso nos autos. A revista pertence ao próprio recorrido, fato também inconteste. A coligação recorrente, assim, sustenta a ocorrência de abuso de poder e de propaganda antecipada.

Contudo, a sentença não merece reparos, pois a prova restou muito bem avaliada. Transcrevo largo trecho da decisão, por esclarecedor:

Tenho que a presente investigação não merece prosperar. Nesse sentido, reporto-me aos argumentos delineados pelo ilustre representante do Ministério Público Eleitoral, os quais adoto como razões de decidir, e que reproduzo abaixo:

"A Coligação Novos Caminhos ingressou com a presente Ação de Investigação Judicial Eleitoral alegando propaganda irregular e abuso de poder econômico por parte do candidato Eduardo Ferreira Richter.

No que diz respeito ao mérito da presente ação, entende este Órgão que os elementos que vieram aos autos mostram-se insuficientes para comprovar, de forma robusta e incontroversa, a ocorrência de propaganda irregular ou abuso de poder econômico a ensejar a inelegibilidade do representado.

Registra-se, inicialmente, que Propaganda Eleitoral é aquela que visa captar o voto do eleitor, com o fim de conquistar o mandato eletivo.

A Lei 9.504/1997 estabelece, em seu artigo 36, que a propaganda eleitoral somente é permitida após o dia 15 de agosto do ano da eleição. In verbis:

Art. 36. A propaganda eleitoral somente é permitida após o dia 15 de agosto do ano da eleição. (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)

[…]

§ 3º A violação do disposto neste artigo sujeitará o responsável pela divulgação da propaganda e, quando comprovado o seu prévio conhecimento, o beneficiário à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), ou ao equivalente ao custo da propaganda, se este for maior.

Sendo assim, toda a propaganda eleitoral veiculada antes desse período com o intuito de captar o voto do eleitor é considerada extemporânea e, portanto, sujeita as sanções previstas naquele dispositivo.

Ocorre que, no caso em tela, verifica-se nas cópias anexadas ao feito às fls. 09/14, que consta anúncio de pré-candidatura e filiação a partido político, bem como manifestações de posicionamentos políticos e apoio político, albergados pelo artigo 36-A, inciso V, da Lei 9.504/2017, redação dada pelo art. 2º da Lei nº 13.165/15.

Assim, ainda que houve explicitamente o anuncio da pré-candidatura do representado Eduardo Ferreira Richter, o fato está autorizado pelo art. 36-A, §2º, da mesma Lei, in verbis:

Art. 36-A. Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e os seguintes atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet:

I - a participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na Internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, observado pelas emissoras de rádio e de televisão o dever de conferir tratamento isonômico;

II - a realização de encontros, seminários ou congressos, em ambiente fechado e a expensas dos partidos políticos, para tratar da organização dos processos eleitorais, discussão de políticas públicas, planos de governo ou alianças partidárias visando às eleições, podendo tais atividades ser divulgadas pelos instrumentos de comunicação intrapartidária;

III - a realização de prévias partidárias e a respectiva distribuição de material informativo, a divulgação dos nomes dos filiados que participarão da disputa e a realização de debates entre os pré-candidatos;

(Inciso III com redação dada pelo art. 2º da Lei nº 13.165/15.

IV - a divulgação de atos de parlamentares e debates legislativos, desde que não se faça pedido de votos;

V - a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive nas redes sociais;

(Inciso V com redação dada pelo art. 2º da Lei nº 13.165/15).

VI - a realização, a expensas de partido político, de reuniões de iniciativa da sociedade civil, de veículo ou meio de comunicação ou do próprio partido, em qualquer localidade, para divulgar ideias, objetivos e propostas partidárias.

(Inciso VI acrescido pelo art. 2º da Lei nº 13.165/15).

§ 1º É vedada a transmissão ao vivo por emissoras de rádio e de televisão das prévias partidárias, sem prejuízo da cobertura dos meios de comunicação social.

§ 2º Nas hipóteses dos incisos I a VI do caput, são permitidos o pedido de apoio político e a divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver.

§ 3º O disposto no § 2º não se aplica aos profissionais de comunicação social no exercício da profissão.

(Parágrafos 2º e 3º acrescidos pelo art. 2º da Lei nº 13.165/15. grifo nosso)

Ainda, o art. 21, da Resolução n.º 23.457/15 do TSE, que estabelece regras para a propaganda eleitoral para as eleições de 2016:

Art. 21. É permitida a propaganda eleitoral na Internet a partir do dia 16 de agosto de 2016.

§ 1º A livre manifestação do pensamento do eleitor identificado na Internet somente é passível de limitação quando ocorrer ofensa à honra de terceiros ou divulgação de fatos sabidamente inverídicos.

(…)

§ 2º O disposto no § 1º se aplica, inclusive, às manifestações ocorridas antes da data prevista no caput, ainda que delas conste mensagem de apoio ou crítica a partido político ou a candidato, próprias do debate político e democrático. (grifo nosso)

Assim, todas as publicações em questão não caracterizam pedido de votos explícito, mas apenas a opinião pessoal do eventual pré-candidato. E mesmo que se entenda a intenção do representado em concorrer ao pleito de 2016, o fato é permitido pela legislação, como demonstrado alhures.

Por outro lado, os supostos abusos de poder econômico não restaram configurados, ao menos com a amplitude e gravidade que lhes pretende conferir a autora.

Nesse sentido, o artigo 22, inciso XVI, da LC 64/90 estabelece que 'para configuração do ato abusivo não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam'.

Para corroborar, segue acórdão do TSE, proferido nos autos do Recurso Ordinário nº 6213-34.2010.6.21.0000, Classe 37, Campo Grande, Mato Grosso do Sul, de relatoria do Ministro Dias Tófoli:

ELEIÇÕES 2010. RECURSO ORDINÁRIO. IMPROCEDÊNCIA. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. AUSÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. PRECLUSÃO. ABUSO DO PODER ECONÔMICO E CORRUPÇÃO ELEITORAL. MANUTENÇÃO DE PROGRAMA SOCIAL NO PERÍODO ELEITORAL. PEDIDO DE VOTOS. FRAGILIDADE DA PROVA. MATÉRIAS JORNALÍSTICAS FAVORÁVEIS AOS CANDIDATOS. AUSÊNCIA DE POTENCIALIDADE LESIVA. RECURSO DESPROVIDO.

1.Houve a preclusão da matéria relativa à não apreciação do pedido de oitiva de testemunha, uma vez que a parte, mesmo tendo sido intimada da inclusão do feito em pauta para julgamento, nada suscitou a respeito do tema.

2.Ademais, ausente o necessário prejuízo, uma vez que os depoimentos das testemunhas, prestados em juízo no bojo de AIJE na qual se discutiram os mesmos fatos, foram considerados pela Corte Regional no presente feito.

3.A procedência da AIME exige a demonstração de que os fatos foram potencialmente graves a ponto de ensejar o desequilíbrio no pleito, o que não se observou na espécie. Precedentes.

4.A manutenção, no período eleitoral, de programa social criado por lei e em execução orçamentária no exercício anterior encontra amparo no disposto no § 10 do art. 73 da Lei n° 9.504197. Grifado.

No caso dos autos, considerando que as manifestações não são consideradas ilegais, não se visualiza a gravidade necessária ao juízo de procedência.

No que toca à propaganda tida como antecipada, o principal ponto de irresignação das razões recursais vem suportado na tese de que o legislador não incluiu, na redação do art. 36-A, I, da Lei n. 9.504/97, a possibilidade de veiculação de pré-candidaturas na imprensa escrita, mas tão somente no rádio, na televisão e na internet.

Sem razão.

Isso porque a regularidade dos atos praticados pelo recorrido tem suporte no próprio caput do art. 36-A, verbis:

Art. 36-A. Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e os seguintes atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet. (Grifei.)

O grifo do comando vem proposital. Note-se que se trata de norma permissiva aberta: “que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social”.

Daí, os incisos do art. 36-A devem ser lidos, parece claro, em conjunto com a cabeça do artigo. Nessa linha, a expressa menção do caput a todos os meios de comunicação social, inclusive naqueles em que ocorre outorga estatal mediante concessão (rádio e televisão), pelo legislador, pretendeu deixar clara a questão de que, mesmos nesses em que há maior controle da Justiça Eleitoral, é possível a veiculação de conteúdo de pré-candidatura, desde que inexistente o pedido expresso de voto.

Ou seja, o inc. I do art. 36-A não delimita condutas e, ao contrário do argumentado no recurso, abre a possibilidade de divulgação de pré-candidatos, inclusive naqueles meios de comunicação social mais fortemente fiscalizados no que toca à propaganda eleitoral. Nessa linha, a doutrina de Rodrigo López Zilio:

A legislação eleitoral, acolhendo discrimen traçado pela Carta Magna, dispensou tratamento diferenciado entre a propaganda eleitoral veiculada na imprensa escrita e através do rádio e da televisão. O legislador constitucional estabeleceu regimes jurídicos diversificados para os veículos de comunicação social na imprensa escrita e de radiodifusão sonora e de sons e imagens. De conseguinte, previu que “a publicação de veículo impresso de comunicação independe de licença de autoridade” (art. 220, §6º, da CF), estabelecendo ampla liberdade de difusão de ideias e circulação de informação e opinião nos meios de comunicação escrita. De outro vértice, estatuiu que “compete ao Poder Executivo outorgar e renovar concessão, permissão e autorização para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens, observado o princípio da complementaridade dos sistemas privados, público e estatal” (art. 223 da CF), propugnando um sistema de controle, mediante concessões e permissão, do poder público em relação ao particular […]

(Direito Eleitoral, 5. ed. Porto Alegre, 2016. Verbo Jurídico, p. 379).

Na sequência, e por derivação lógica, os anúncios de filiação e de pré-candidatura de Eduardo Richter, ainda que veiculados em destaque pela revista e em benefício da pré-candidatura, não podem ser considerados irregulares também sob o foco do abuso de poder, pois carente o requisito da “gravidade” exigida pela legislação. Nesses termos é, também, a opinião do d. Procurador Regional Eleitoral (fl. 72v.), a qual adoto expressamente como razões de decidir, no que concerne à não caracterização do abuso e à percepção de que as publicações não foram graves o suficiente para fazer incidir a norma do art. 22 da LC n. 64/90:

Os fatos do caso concreto em testilha versam sobre duas matérias veiculadas pela revista Gente News, uma que noticia a filiação do recorrido e outra que informa a sua pré-candidatura. Referidas matérias foram publicadas nos meses de abril e junho, ou seja, em datas relativamente distantes do pleito, sendo que não se trata de veículo de comunicação de grande circulação, eis que consiste em periódico mensal.

 

Diante do exposto, e na linha do parecer ministerial, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo a sentença pelos próprios fundamentos.